
Apelação Cível Nº 5025540-88.2020.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: CLAUDIA VANUSA DE SOUZA DA SILVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Trata-se de recursos de apelação interpostos em face de sentença que julgou procedente em parte o pedido e confirmou a liminar concedida, para reconhecer o direito da parte autora a perceber o auxílio-doença, condenando o INSS a pagá-lo, desde a data da cessação na esfera administrativa (23/03/2018). Os valores devidos deverão ser corrigidos pelo INPC e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês. O INSS também foi condenado ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador da parte autora, arbitrados em R$ 300,00.
Nas razões de apelação, a parte autora sustenta que não foram consideradas as suas condições pessoais nem as provas acostadas aos autos. Declara que não possui capacidade para dar continuidade às suas atividades laborais, estando incapacitada de forma permanente, e que o juiz não está adstrito à conclusão do laudo pericial. Requer o provimento do recurso, com a concessão de aposentadoria por invalidez, bem como a condenação do INSS ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes no percentual de 20% sobre o proveito econômico obtido.
O INSS, por sua vez, alega que deve ser mantida a aplicação da Lei 11.960/09 no tocante aos juros e requer a reforma da sentença quanto ao ponto.
Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.
No evento 33, a parte autora requer o restabelecimento do benefício, cessado na via administrativa em 23/04/2021.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
Os apelos preenchem os requisitos de admissibilidade.
Mérito
A prova pericial nos casos de benefício por incapacidade tem como função elucidar os fatos trazidos ao processo e se destina à formação do convencimento do juízo. No entanto, o juiz não está adstrito ao laudo pericial, devendo indicar os motivos que o levam a entendimento diverso se entender por não acolher as conclusões do perito, à luz dos demais elementos presentes nos autos, nos termos do art. 479 do CPC.
No caso, foram realizadas duas perícias médicas. A primeira perícia (evento 2 - out5 - p. 01/03), realizada em 23/03/2019, pelo Dr. Cézar Roberto Van Der Sand, especialista em Cardiologia, concluiu que a autora, agricultora, que conta com 49 anos de idade, é portadora de Hipertensão essencial - primária (CID I10) e não apresenta incapacidade para o labor.
De acordo com o perito:
"Documentos médicos analisados: NÃO APRESENTA NENHUM EXAME E NEM EXISTE EXAMES ANEXOS AO PROCESSO.
Exame físico/do estado mental: Com relação ao seu exame clinico, trata-se de uma pessoa em bom estado geral, eupneico, mucosas úmidas e coradas, hidratado, sem confusão e orientado. Ao exame cardiovascular apresentou frequência cardíaca de 70 batimentos por minuto, regular, bulhas normofonéticas, sem arritmias sem sopro. A sua pressão arterial durante o exame apresentou os seguintes valores: em repouso foi de 140/95 mmHG. O aparelho respiratório apresentou murmúrio vesicular simétrico e sem estertores. Os membros inferiores estavam sem edemas."
"Conclusão: sem incapacidade atual
- Justificativa: Não apresenta qualquer exame que comprove os referidas doenças do laudo médico (cateterismo cardíaco/ecocardiografia ???)
- Houve incapacidade pretérita em período(s) além daquele(s) em que o(a) autor(a) já esteve em gozo de beneficio previdenciário? NÃO
- Caso não haja incapacidade atual, o(a) autor(a) apresenta sequela consolidada decorrente de acidente de qualquer natureza? NÃO" (Grifei)
A segunda perícia médica (evento 2 - out5 - p. 04/07) foi realizada em 12/08/2019, pela Dra. Marcia Gianlupi, especialista em Psiquiatria, que concluiu que a autora é portadora de Transtorno afetivo bipolar (CID F31) e está incapacitada de forma temporária para o exercício de sua atividade laboral. Fixou o início da incapacidade em 14/06/2018.
Assim afirmou a perita:
"Conclusão: com incapacidade temporária
- Justificativa: Apresenta sintomas depressivos, dentro de um quadro de transtorno afetivo bipolar, com uma internação em psiquiatria em 2018, após tentativa de suicídio por enforcamento.
Atualmente encontra-se em tratamento regular com psiquiatra. No meu entendimento necessita de acompanhamento multidisciplinar em serviço de saúde mental. Concedo tempo para adequação da terapêutica e esbatimento dos sintomas depressivos.
- DII - Data provável de início da incapacidade: 14/06/2018.
- Justificativa: Conforme internação em psiquiatria, por agravo do quadro depressivo.
- Caso a DII seja posterior à DER/DCB, houve outro(s) período(s) de incapacidade entre a DER/DCB e a DII atual? A DII é anterior ou concomitante à DER/DCB
- Data provável de recuperação da capacidade: 12/08/2020
- A recuperação da capacidade laboral depende da realização de procedimento cirúrgico? NÃO
- A parte apresenta incapacidade para os atos da vida civil? NÃO"
Cumpre ressaltar que o perito judicial é o profissional de confiança do juízo, cujo compromisso é examinar a parte com imparcialidade. Embora o juiz não fique adstrito às conclusões do perito, a prova em sentido contrário ao laudo judicial, para prevalecer, deve ser suficientemente robusta e convincente, o que não ocorreu no presente feito no tocante à alegada permanência da incapacidade, porquanto os atestados médicos acostados aos autos (evento 2 - vol1 - p. 22/34) são anteriores à cessação do benefício que a autora pretende restabelecer (23/03/2018), sendo os mais recentes datados de janeiro de 2018 (evento 2 - vol1 - p. 22/23).
Assim, não tendo sido comprovada nos presentes autos a existência de incapacidade total e permanente para o exercício de atividades laborais, mas apenas a incapacidade temporária, não há direito ao benefício de aposentadoria por invalidez, devendo ser mantida a sentença quanto ao ponto.
Nada obsta, contudo, a que, agravado o quadro, a parte autora formule novo pedido de aposentadoria por invalidez.
Cabe aqui destacar, no que tange ao pedido de restabelecimento do benefício, formulado no evento 33, que constou da fundamentação da sentença (evento 16):
"A hipótese, em verdade, enseja o reconhecimento à percepção de auxílio-doença, porque resta demonstrado e afirmado pelo perito judicial que a parte autora é portadora de incapacidade superada por tratamento.
Nesse quadro, dispõe a lei de regência que não cessará o benefício até que a parte autora seja dada como habilitada para o desempenho de nova atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não-recuperável, for aposentado por invalidez."
O INSS não apelou desta parte da sentença.
Conforme consulta ao sistema Plenus, o benefício (NB 31/6200320369, DIB 05/09/2017), foi cessado em 23/04/2021, pelo motivo "009 DCA ACP2005.33.00.020219-8".
Em tais condições, resulta evidente que foi absolutamente indevido e arbitrário o cancelamento do benefício. O INSS simplesmente ignorou os elementos considerados em juízo e tentou fazer prevalecer a sua perícia administrativa à decisão judicial.
Cabível, portanto, o restabelecimento do benefício.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.
Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).
Custas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas na Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (art. 5º, inciso I, da Lei Estadual/RS nº 14.634/2014, que instituiu a Taxa Única de Serviços Judiciais).
Honorários Advocatícios
Considerando a natureza previdenciária da causa, bem como a existência de parcelas vencidas, e tendo presente que o valor da condenação não excederá de 200 salários mínimos, os honorários de sucumbência devem ser fixados em 10% sobre as parcelas vencidas, nos termos do artigo 85, §3º, inciso I, do CPC. Conforme a Súmula n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça, a verba honorária deve incidir sobre as prestações vencidas até a data da decisão de procedência (sentença).
Tutela específica - implantação do benefício
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do CPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Dados para cumprimento: ( ) Concessão (X) Restabelecimento ( ) Revisão | |
NB | 6200320369 |
Espécie | 31 - Auxílio-doença previdenciário |
DIB | |
DIP | No primeiro dia do mês da implantação do benefício |
DCB | |
RMI | a apurar |
Observações |
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Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.
Conclusão
Apelo da parte autora parcialmente provido, para fixar os honorários advocatícios a cargo do INSS em 10% sobre o valor das parcelas vencidas.
Apelo do INSS provido, para adequar os critérios de juros de mora.
Determinada a implantação do benefício, via CEAB.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora, dar provimento ao apelo do INSS e determinar a implantação do benefício, via CEAB.
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Apelação Cível Nº 5025540-88.2020.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: CLAUDIA VANUSA DE SOUZA DA SILVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PROVA PERICIAL. INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. JUROS. HONORÁRIOS.
1. Dentre os elementos necessários à comprovação da incapacidade, com vistas à concessão de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, a prova pericial, embora não tenha valor absoluto, exerce importante influência na formação do convencimento do julgador. Afastá-la, fundamentadamente, seja para deferir, seja para indeferir o benefício previdenciário, exige que as partes tenham produzido provas consistentes que apontem, de forma precisa, para convicção diversa da alcançada pelo expert.
2. Comprovada a incapacidade temporária para o exercício das atividades laborativas habituais, é cabível o restabelecimento de auxílio-doença, devendo-se reconhecer efeitos financeiros retroativos à data da indevida cessação do benefício, quando demonstrado que, embora descoberto do amparo previdenciário, o segurado permaneceu incapacitado.
3. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29/06/2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança.
4. Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas, na forma do art. 85, §3º, I, do CPC.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora, dar provimento ao apelo do INSS e determinar a implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 02 de junho de 2021.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002536861v12 e do código CRC a730f91a.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 02/06/2021
Apelação Cível Nº 5025540-88.2020.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): CAROLINA DA SILVEIRA MEDEIROS
APELANTE: CLAUDIA VANUSA DE SOUZA DA SILVA
ADVOGADO: ANNA MARIA VICENTE DORNELES (OAB RS050196)
ADVOGADO: CRISTIANE BOHN (OAB RS044490)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 02/06/2021, na sequência 734, disponibilizada no DE de 24/05/2021.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, DAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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