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Apelação Cível Nº 5050424-89.2017.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: INES DE PAIVA MENDONCA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença proferida sob a vigência do CPC/15 que julgou improcedente o pedido de auxílio-doença e/ou aposentadoria por invalidez, por não ter sido comprovada a qualidade de segurado do autor falecido na DII (data de início da incapacidade), condenando a parte autora ao pagamento de custas e honorários advocatícios, esses fixados em 10% do valor da causa, suspensa a exigibilidade em razão da Assistência Judiciária Gratuita.
A sucessão da parte autora recorre, alegando, em suma, que há nos autos prova material da atividade rural e que não há mais que se falar em ausência de contemporaneidade absoluta entre o início de prova meterial e o pedido de carência, requerendo seja anulada a sentença para determinar a baixa dos autos à origem para que seja possível a tomada dos depoimentos das testemunhas.
Processados, subiram os autos a esta Corte.
O MPF opinou pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
Controverte-se, na espécie, sobre o acerto da sentença proferida sob a vigência do CPC/15 que julgou improcedente o pedido de auxílio-doença e/ou aposentadoria por invalidez, por não ter sido comprovada a qualidade de segurado do autor falecido na DII (data de início da incapacidade).
Quanto à aposentadoria por invalidez, reza o art. 42 da Lei nº 8.213/91:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Já no que tange ao auxílio-doença, dispõe o art. 59 do mesmo diploma:
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Segundo entendimento dominante na jurisprudência pátria, nas ações em que se objetiva a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, ou mesmo nos casos de restauração desses benefícios, o julgador firma seu convencimento com base na prova pericial, não deixando de se ater, entretanto, aos demais elementos de prova, sendo certo que embora possível, teoricamente, o exercício de outra atividade pelo segurado, ainda assim a inativação por invalidez deve ser outorgada se, na prática, for difícil a respectiva reabilitação, seja pela natureza da doença ou das atividades normalmente desenvolvidas, seja pela idade avançada.
Durante a instrução processual foi realizada perícia médico-judicial em 07-04-12, da qual se extraem as seguintes informações (E1LAUDPERI33):
a) enfermidade: diz o perito que Sim. Lombociatalgia por hérnia de disco intervertebral. doença pulmonar obstrutiva crônica, insuficiência cardíaca congestiva e diabates insulino dependente. CID10 M51.1, J44.9, I42.0 e E10.0...Dor lombar de forte intensidade, dispnéia aos pequenos esforços, uso de insulina para controle da glicemia. Inicio dos sintomas em janeiro de 2004... Grave;
b) incapacidade: responde o perito que: A incapacidade da parte autora a impossibilita de exercer sua profissão habitual? Resposta: Sim... Início dos sintomas em janeiro de 2004, precisada com base em laudo de exame complementar. Início da incapacidade também nesta data. Em julho de 2010 começou o tratamento da doença pulmonar. Data também precisada com base em laudo de exame e atestado médico.
c) tratamento: refere o perito que Atualmente em uso contínuo de oxigênio, cansaço aos pequenos esforços, limitação até mesmo para atividades simples do cotidiano.
Do exame dos autos, colhem-se ainda as seguintes informações sobre a parte autora (E1=INIC3 a 7, OUT23 a 27, PET37):
a) idade na data do óbito: 59 anos (nascimento em 22-12-52 e óbito em 25-04-12);
b) histórico de benefícios: a parte autora gozou de auxílio-doença de 16-09-92 a 30-09-92, tendo sido indeferido(s) o(s) pedido(s) de benefício assistencial de 01-09-04 em razão de perícia contrária e de 11-10-05 em razão de renda superior a 1/4; ajuizou a ação em 10-08-10;
c) atestado médico de 08-07-10, onde consta DPOC em estágio avançado, com severas limitações, incapacitando-o para atividades laborativas, necessita O2 continuamente (CID J44.9 e I26.0); encaminhamento médico à perícia de 22-10-09, em que consta CID J45.0, J44.9 e K45.9, necessitando aposentadoria por DPOC severo; encaminhamento médico ao INSS de 2005; atestado médico de 15-07-05, onde consta necessidade de aposentadoria por CID J44.0 e J96.0; atestado médico de 29-09-04, onde consta CID M32.0 e E11.9 em tratamento, incapaz para o trabalho;
d) CT da coluna lombo sacra de 12-01-04; RX da coluna; RX do tórax de 13-10-04; TC do tórax de 08-07-10; solicitação de exame de urgência de 08-06-05; relatório de função pulmonar de 30-06-05;
e) laudo do INSS de 19-10-05, com diagnóstico de CID M54 (dorsalgia).
Diante de tal quadro, não há dúvida de que a incapacidade laborativa do autor falecido remontava a 2004. A ação foi julgada improcedente, pois não comprovada a qualidade de segurado nessa época.
O autor alegou que era lavrador/boia-fria.
Nos casos dos trabalhadores avulsos, os assim denominados boias-frias/safristas/diaristas, destaco que a orientação que desde algum tempo vinha sendo adotada de forma unânime pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça era no sentido de abrandamento da exigência de início de prova material, até dispensando-o em casos extremos, haja vista a informalidade com que exercida a profissão e a dificuldade de comprovar documentalmente o exercício da atividade rural nessas condições. Por ocasião do julgamento do REsp n.º 72.216-SP já manifestava o Relator, Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, em 19-11-1995 (DJU, Seção I, de 27-11-1995).
Esta era também a linha de orientação desta Corte para o exame das demandas que visam à concessão de aposentadoria para os trabalhadores avulsos, diaristas, safristas, etc., tendo em vista a dificuldade de apresentar um início razoável de prova material. Inúmeras vezes, neste tipo de demanda, estão envolvidos interesses de segurados não alfabetizados ou semialfabetizados, o que impelia esta Corte, mitigando o rigorismo da Súmula n.º 149 do STJ, manifestar posicionamento mais flexível no sentido da dispensa de prova material (AC n.º 0014149-76.2010.404.9999/PR, 6ª Turma, Rel. Des. Federal Luis Alberto D'Azevedo Aurvalle, DE em 10-03-2011, AC n.º 2009.70.99.001354-0/PR, 6ª Turma, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, DE em 18-06-2009, AC n.º 2009.70.99.001354-0/PR, 6ª Turma, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, DE em 18-06-2009, e AG n.º 1999.04.01.105217-6/PR, 6ª Turma, Rel. Juiz Nylson Paim de Abreu, DJU, Seção II, de 24-05-2000, e EIAC n.º 98.04.02984-7/PR, 3ª Seção, Rel. Juiz Wellington Mendes de Almeida, DJU, Seção I, de 18-11-1998
Não raras foram as manifestações do STJ, não se podendo deixar de mencionar parte do voto proferido pelo Exmo. Sr. Ministro Edson Vidigal, no REsp n.º 237.378, publicado no DJU, Seção I, de 08-03-2000, que com muita propriedade analisou tal circunstância:
"(...). A realidade no campo é bem diversa da que vivemos aqui na cidade. A imensidão de nosso país esconde por trás da civilização, pessoas alheias à realidade concreta, que sequer possuem meios suficientes à autosubsistência digna ou de seus familiares. Somos bombardeados todos os dias com notícias veiculadas na televisão ou em revistas da existência de "escravidão" nos campos, em pleno século XX, "boias-frias" que se desgastam dia e noite em troca de pão e água. E quando chega a ancianidade, ainda têm de lutar para conseguir um mínimo à sua sobrevivência. É nesse sentido que se deve buscar uma interpretação teleológica da regra contida na Lei n.º 8.213/91, Art. 55, § 3º. Ao contrário do que tenta fazer crer o INSS, quando o dispositivo se refere à expressão "início de prova material", essencial para a comprovação de tempo de serviço, busca se reportar a qualquer documento escrito que demonstre inequivocamente o exercício da atividade referida, ainda que não corresponda integralmente ao período exigido em lei, desde que complementado, é claro, por qualquer outro meio de prova idôneo, como os depoimentos testemunhais. Não fosse assim, seria praticamente inócua a disposição legal. (...)."
Diversas construções se fizeram ao longo destes anos sedimentando este entendimento.
Todavia, a decisão proferida pela Primeira Seção do egrégio STJ, na sessão de 10-10-2012, no julgamento do REsp n.º 1.321.493-PR, publicado no DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos prevista no artigo 543-C do CPC, se direciona no sentido de consolidar entendimento pela insuficiência da prova exclusivamente testemunhal.
Não obstante, o referido julgado não impõe aos "boias-frias" o mesmo rigorismo que aos demais segurados é o que se pode extrair de diversos trechos daquele julgado, considerando ainda, que o caso em concreto tratou apenas de segurado especial e não de avulsos e boias-frias.
Partindo-se da construção que ali se fez, no sentido da validade de início de prova material consubstanciada por certidão atestando a condição de rurícola, e não a prova do trabalho em si, como válida a respaldar a prova testemunhal idônea e robusta, tampouco me parece que se deva impor rigor maior do que ali se defendeu.
Conforme CNIS, o autor trabalhou como empregado entre 1974 e 17-11-92 em períodos intercalados, sendo que constou da CTPS vínculos como trabalhador rural e mecânico em 1987, como trabalhador rural em 1988 e entre 11/91 e 03/92 e como auxiliar de laticínios de 05/92 a 11/92.
Ressalto que o autor tinha requerido benefício assistencial na via administrativa em 2004 e 2005 e ajuizou ação anterior na qual postulou o benefício assistencial, cuja sentença de improcedência transitou em julgado em 15-09-06 (E1INIC8). No laudo de constatação realizado por oficial da Justiça Federal em 16-01-06 constou o seguinte (E1INIC7): Realizava serviços gerais na zona rural (mas, segundo informou, não consegue trabalhar há uns oito anos, devido a problemas de saúde).
Ou seja, conforme informação prestada pelo próprio autor, ele não trabalhava desde 1998. Dessa forma, como a incapacidade laborativa somente foi comprovada desde 2004, desnecessária a produção de prova testemunhal, para corroborar o início que entendo razoável de prova documental do exercício de atividade rural como lavrador. Isso porque a prova testemunhal somente poderia confirmar o trabalho até 1998, o que seria inócuo, pois, como a DII (data de início da incapacidade) remonta a 2004, houve evidente perda da qualidade de segurado nessa época.
Dessa forma, é de ser mantida a sentença de improcedência da ação.
Mantida a sentença, considerando o trabalho adicional em grau recursal realizado, a importância e a complexidade da causa, nos termos do art. 85, §8.º, §2.º e §11.º, do CPC/15, os honorários advocatícios devem ser majorados em 50% sobre o valor fixado na sentença, suspensa a exigibilidade em função do deferimento da Assistência Judiciária Gratuita.
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso.
Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000464800v20 e do código CRC 74b67c15.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5050424-89.2017.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: INES DE PAIVA MENDONCA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA E/ou APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. perda da qualidade de segurado na DII.
Como a incapacidade laborativa do autor somente foi comprovada nos autos desde 2004, e ele próprio afirmou em laudo social em ação anterior que parou de trabalhar em 1998, desnecessária a produção de prova testemunhal, para corroborar o início que entendo razoável de prova documental do exercício de atividade rural como lavrador/boia-fria. Isso porque a prova testemunhal somente poderia confirmar o trabalho rural até 1998, o que seria inócuo, pois, como a DII (data de início da incapacidade) remonta a 2004, houve evidente perda da qualidade de segurado nessa época.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 13 de junho de 2018.
Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000464801v5 e do código CRC 21fd8f4f.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 13/06/2018
Apelação Cível Nº 5050424-89.2017.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: INES DE PAIVA MENDONCA
ADVOGADO: MARCELO MARTINS DE SOUZA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 13/06/2018, na seqüência 61, disponibilizada no DE de 28/05/2018.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
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