Apelação Cível Nº 5004085-96.2022.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CARLOS ROBERTO DE SOUZA NUNES
ADVOGADO: GUSTAVO FELLER MARTHA (OAB RS053932)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação contra sentença publicada na vigência do Código de Processo Civil de 2015 em que foram julgados parcialmente procedentes os pedidos, com dispositivo de seguinte teor:
Isso posto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado por CARLOS ROBERTO DE SOUZA NUNES em face de INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS para:
a) DETERMINAR que o réu implemente em favor do autor o benefício de auxílio-doença, até que seja reabilitado profissionalmente, ou implemente-se o benefício da aposentadoria por invalidez na forma do art. 62, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91;
b) CONDENAR o réu ao pagamento das parcelas vencidas a partir do dia seguinte ao pedido administrativo, corrigidas nos termos da fundamentação acima.
Isento o demandado do pagamento da taxa única (art. 5º, inc.I da Lei n. 14.634/2014). Condeno-o ao pagamento integral das despesas processuais (arts. 14 e 16 da Lei n. 14.634/2014). Condeno a parte ré, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, incidindo tão-somente sobre as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região), excluídas as parcelas vincendas (Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça).
Decisão não sujeita a reexame necessário, tendo em vista que embora ilíquido o valor da condenação, este nitidamente não ultrapassa mil salários mínimos, conforme exige o art. 496 CPC.
Por fim, considerando que o §3º, do art. 1.010, do Código de Processo Civil retirou o juízo de admissibilidade deste 1º grau de jurisdição, uma vez interposto recurso de apelação, caberá ao Cartório abrir vista à parte contrária para contrarrazões, querendo, no prazo de 15 (quinze) dias, consoante art. 1.010, §1º, do mesmo diploma legal e, prazo em dobro à autarquia federal. Idêntico procedimento deverá ser adotado na hipótese de recurso adesivo, conforme §2º do artigo supramencionado.
Transcorrido o prazo legal sem interposição de recurso voluntário, certifique-se o trânsito em julgado, requisite-se o pagamento dos honorários periciais (se necessário) e dê-se baixa nos autos.
Publicada e registrada a sentença, bem como intimadas as partes, automaticamente, via sistema Eproc.
O INSS, em suas razões de apelação, sustenta que a parte autora não faz jus à concessão do benefício, pois de acordo com o laudo pericial não há incapacidade para o trabalho. Requer o provimento do apelo, com a reforma da sentença.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos de admissibilidade
Mérito
O INSS, em suas razões, sustenta que a parte autora não está incapacitada para suas atividades.
A prova pericial, nos casos de benefício por incapacidade, tem como função elucidar os fatos trazidos ao processo. Submete-se ao princípio do contraditório, oportunizando-se, como no caso dos autos, a participação das partes na sua produção e a manifestação sobre os dados e conclusões técnicas apresentadas. Não importa, por outro lado, que seu resultado não atenda à expectativa de um dos demandantes ou mesmo de ambos, porque se destina a colher elementos necessários à formação do convencimento do juízo, ao qual incumbe decidir sobre a sua realização e eventual complementação e, posteriormente, apreciar seu poder de esclarecimento dos fatos, cotejando a perícia com os demais elementos carreados ao processo.
O ponto controvertido foi assim analisado na decisão recorrida:
O autor subsidia sua pretensão em laudos médicos, os quais foram corroborados em parte pelas perícias judiciais realizadas no curso do processo. Nesse sentido, restou estancada qualquer dúvida a respeito a atual condição do demandante, que apresenta certa redução na capacidade laboral que ainda o incapacita para o desempenho da profissão exercida à época do início do benefício, dependendo a cura de tratamento cirúrgico, em razão da ineficácia do tratamento conservador até então prescrito. Ademais, esclareceu o perito sobre a viabilidade da reabilitação profissional do autor junto ao INSS.
Como se vê das informações prestadas pelo expert (evento 61, DOC2), resta o autor impossibilitado temporariamente de desempenhar a mesma profissão que vinha exercendo e que deu causa à implementação do benefício do auxílio-doença administrativamente. Sem prejuízo deste, o laudo ainda apontou a possibilidade do autor submeter-se a um processo de reabilitação profissional apto a reincluí-lo no mercado de trabalho. Trata-se de mecanismo previsto pela Lei nº 8.213/91, por meio do art. 62, para que o segurado em gozo de auxílio-doença que seja insuscetível de recuperação para a atividade que vinha exercendo não permaneça eternamente no gozo do benefício, enquanto apresentar capacidade laborativa.
Art. 62. O segurado em gozo de auxílio-doença, insuscetível de recuperação para sua atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade.
Parágrafo único. O benefício a que se refere o caput deste artigo será mantido até que o segurado seja considerado reabilitado para o desempenho de atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não recuperável, seja aposentado por invalidez.
Portanto, da análise dos elementos acima mencionados, verifica-se que há comprovação suficiente de que o requerente apresenta incapacidade para o exercício de suas atividades habituais, no entanto, tal incapacidade é temporária e restringe-se, ainda, às atividades desempenhadas na função exercida, o que torna a situação incompatível com a aposentadoria por invalidez. Não há que se falar, neste momento, em aposentadoria por invalidez, porque diante da conclusão pericial apresentada, somente poderá ser perquirida a presença dos requisitos aptos à aposentadoria quando constatada a impossibilidade de reabilitação profissional do segurado.
Logo, deverá o benefício do auxílio-doença perdurar até que a autarquia previdenciária insira o segurado em programa de habilitação ou reabilitação profissional e social, obrigação que lhe compete nos moldes dos artigos 89 a 92, da Lei nº 8.213/91.
Art. 89. A habilitação e a reabilitação profissional e social deverão proporcionar ao beneficiário incapacitado parcial ou totalmente para o trabalho, e às pessoas portadoras de deficiência, os meios para a (re)educação e de (re)adaptação profissional e social indicados para participar do mercado de trabalho e do contexto em que vive.
Parágrafo único. A reabilitação profissional compreende:
a) o fornecimento de aparelho de prótese, órtese e instrumentos de auxílio para locomoção quando a perda ou redução da capacidade funcional puder ser atenuada por seu uso e dos equipamentos necessários à habilitação e reabilitação social e profissional;
b) a reparação ou a substituição dos aparelhos mencionados no inciso anterior, desgastados pelo uso normal ou por ocorrência estranha à vontade do beneficiário;
c) o transporte do acidentado do trabalho, quando necessário.
Art. 90. A prestação de que trata o artigo anterior é devida em caráter obrigatório aos segurados, inclusive aposentados e, na medida das possibilidades do órgão da Previdência Social, aos seus dependentes.
Art. 91. Será concedido, no caso de habilitação e reabilitação profissional, auxílio para tratamento ou exame fora do domicílio do beneficiário, conforme dispuser o Regulamento.
Art. 92. Concluído o processo de habilitação ou reabilitação social e profissional, a Previdência Social emitirá certificado individual, indicando as atividades que poderão ser exercidas pelo beneficiário, nada impedindo que este exerça outra atividade para a qual se capacitar.
Oportuno mencionar, derradeiramente, a necessidade de permanência do segurado na condição de beneficiário do auxílio-doença até que se conclua o programa de habilitação ou reabilitação, nos termos do art. 62, parágrafo único, da lei de benefícios citada. A interrupção do benefício somente será legítima no caso do autor negar adesão ao que determina a lei, ou restar inserido novamente no mercado de trabalho.
Cumpre ressaltar que o perito judicial é o profissional de confiança do juízo, cujo compromisso é examinar a parte com imparcialidade. Embora o juiz não fique adstrito às conclusões do perito, a prova em sentido contrário ao laudo judicial, para prevalecer, deve ser suficientemente robusta e convincente, o que não ocorreu no presente feito no tocante à alegada permanência do estado incapacitante, sendo cabível no caso a concessão do auxílio-doença.
No caso, o perito concluiu pela existência de incapacidade temporária e a possibilidade de reabilitação do segurado para o exercício de outra atividade. Entretanto, o autor possui 58 anos de idade e está afastado de suas funções há 20 anos aproximadamente.
Assim, considerando as condições pessoais do demandante, deve ser mantida a sentença que determinou a implementação do benefício de auxílio-doença, até que seja reabilitado profissionalmente, ou implementado o benefício da aposentadoria por invalidez na forma do art. 62, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91.
- Correção monetária e juros de mora
A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da Lei 8.213/91, na redação da Lei 11.430/06, precedida da MP 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).
- INPC ou IPCA em substituição à TR, conforme se tratar, respectivamente, de débito previdenciário ou não, a partir de 30/06/2009, diante da inconstitucionalidade do uso da TR, consoante decidido pelo STF no Tema 810 e pelo STJ no tema 905.
Os juros de mora, por sua vez, devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.
Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).
Por fim, a partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve incidir o artigo 3º da Emenda n. 113, segundo o qual, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.
Honorários advocatícios
Negado provimento ao recurso do INSS, deve ser observada, em cumprimento de sentença, a majoração de 50% da verba honorária fixada na origem, pela incidência do §11 do artigo 85 do CPC.
Tutela específica - implantação do benefício
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Dados para cumprimento: ( ) Concessão ( x) Restabelecimento ( ) Revisão | |
NB | 1192990746 |
Espécie | 31- Auxílio-doença previdenciário |
DIB |
|
DIP | No primeiro dia do mês da implantação do benefício |
DCB | Não se aplica |
RMI | a apurar |
Observações |
|
Por fim, na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.
Conclusão
Apelo do INSS não provido.
Adequados os critérios de juros de mora e de correção monetária.
Honorários advocatícios majorados nos termos do §11 do artigo 85 do CPC. Nos demais pontos, mantida a sentença.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e determinar o restabelecimento do benefício, via CEAB.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003558434v26 e do código CRC 2f257002.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 30/11/2022, às 20:10:1
Conferência de autenticidade emitida em 07/12/2022 04:00:58.
Apelação Cível Nº 5004085-96.2022.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CARLOS ROBERTO DE SOUZA NUNES
ADVOGADO: GUSTAVO FELLER MARTHA (OAB RS053932)
EMENTA
AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. restabelecimento. REABILITAÇÃO COMO CONDIÇÃO PARA O CANCELAMENTO DO BENEFÍCIO.
1. Comprovada a incapacidade temporária para o exercício das atividades laborativas habituais, é cabível o restabelecimento de auxílio-doença, devendo-se reconhecer efeitos financeiros retroativos à data da indevida cessação do benefício, quando demonstrado que, embora descoberto do amparo previdenciário, o segurado permaneceu incapacitado.
2. Nos casos em que o cancelamento do benefício for submetido a uma condição fixada judicialmente, como a reabilitação profissional ou a realização de procedimento cirúrgico, não há falar em fixação prévia de termo final.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e determinar o restabelecimento do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 30 de novembro de 2022.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003558435v6 e do código CRC b2749776.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 30/11/2022, às 20:10:1
Conferência de autenticidade emitida em 07/12/2022 04:00:58.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 23/11/2022 A 30/11/2022
Apelação Cível Nº 5004085-96.2022.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CARLOS ROBERTO DE SOUZA NUNES
ADVOGADO(A): GUSTAVO FELLER MARTHA (OAB RS053932)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 23/11/2022, às 00:00, a 30/11/2022, às 14:00, na sequência 620, disponibilizada no DE de 11/11/2022.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DETERMINAR O RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal PAULO PAIM DA SILVA
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 07/12/2022 04:00:58.