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Apelação Cível Nº 5000733-58.2022.4.04.7016/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: ADRIANO FERNANDES (Relativamente Incapaz (Art. 4º CC)) (AUTOR)
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária, ajuizada contra o INSS, na qual a parte autora requer o restabelecimento do benefício assistencial de amparo à pessoa com deficiência, a partir da data da suspensão, em 01/11/2021 (NB 124.031.821-6, DIB em 22/04/2002).
Foi proferida sentença julgando procedente o pedido para restabelecer o benefício em favor do autor, com o seguinte dispositivo:
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, CONDENANDO o INSS a:
I) CONCEDER o benefício à parte autora, de acordo com os dados abaixo arrolados:
( )CONCESSÃO ( X )RESTABELECIMENTO ( )CONVERSÃO ( )REVISÃO |
SEGURADO | ADRIANO FERNANDES |
NB | 124.031.821-6 |
ESPÉCIE | 87 - benefício assistencial ao deficiente |
DIB (restabelecimento) | 02/11/2021 |
DIP | 01/05/2022 |
RMI | um salário mínimo |
II) DESCONSTITUIR o crédito apurado em revisão administrativa no benefício - NB 87/124.031.821-6, no período de 01/09/2016 a 31/10/2021, no valor de R$ 71.352,15, calculado em 02/11/2021 (
, pág. 57).III) PAGAR as verbas vencidas com correção monetária e juros na forma delineada no capítulo "Da Liquidação da Sentença".
Frise-se que quando do cálculo do benefício deverão ser descontados eventuais valores recebidos pela parte autora a título de auxílio-emergencial , de modo a não proporcionar seu enriquecimento ilícito.
IV) ARCAR com os honorários periciais, devendo reembolsar o valor à Seção Judiciária do Paraná (art. 12, § 1.º, Lei n.º 10.259/2001).
Estão presentes os requisitos para a antecipação dos efeitos da tutela (art. 300 do CPC), sendo que a falta de pagamento pelo INSS pode gerar dano irreparável ou de difícil reparação.
À Secretaria para que proceda à requisição eletrônica da agência do INSS para cumprimento. Prazo: 20 (vinte) dias.
Ratifico o deferimento da assistência judiciária gratuita. Sem custas. Sem honorários, nos termos do art. 55 da Lei n.º 9099/95.
Interposta apelação, intime-se a parte contrária para contrarrazões e remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Sem reexame necessário, pois o valor da condenação evidentemente não ultrapassa o limite previsto no artigo 496, parágrafo 3º, inciso I, do CPC.
Com o trânsito em julgado, adotem-se as seguintes providências:
a) considerando que já foi deferida a antecipação de tutela, requisite-se a Seção de Cálculos e Pagamentos Judiciais da Procuradoria Federal no Estado do Paraná, para a apresentação dos cálculos dos atrasados no prazo de 10 (dez) dias;
b) intimem-se as partes a se manifestarem sobre a implantação e cálculos, no prazo concorrente de 10 (dez) dias. Se houver discordância, deverão ser apresentados os cálculos dos valores que entendem corretos, bem como apontados os erros aritméticos e/ou jurídicos cometidos, sob pena de desconsideração de plano da impugnação e homologação do valor inicialmente apurado;
c) havendo anuência tácita ou expressa das partes, expeça-se RPV/Precatório.
Efetuado o pagamento e nada mais sendo requerido, arquivem-se.
Registro e publicação realizados eletronicamente.
Intimem-se.
O INSS apela sustentando, em síntese, que não está preenchido o requisito legal da miserabilidade, tendo em vista que a renda familiar per capita é superior a ¼ do salário mínimo. Isto porque o grupo familiar é composto por 3 pessoas e o rendimento total é de R$ 1.785,27 a R$ 2.348,12, decorrente da remuneração da genitora e do padrasto do demandante. Defende que o procedimento de rescisão foi legítimo e que a ilegalidade constatada residia na omissão quanto à efetiva remuneração dos integrantes de seu núcleo familiar, em especial, a renda percebida pela genitora e pelo padrasto, a qual superava o limite legal, o que autoriza ressarcimento em favor do INSS dos valores indevidamente recebidos pela parte autora o ressarcimento em favor do INSS dos valores indevidamente recebidos pela parte autora.
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos para este Tribunal.
VOTO
MÉRITO
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL
O benefício assistencial encontra-se previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal e regulamentado pelo artigo 20 da Lei nº 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS), a qual foi alterada pela pelas Leis nº 9.720, de 30.11.1998, que reduziu o critério etário para 67 anos, e nº 10.741, de 01.10.2003 (Estatuto do Idoso), que reduziu novamente o critério etário para 65 anos. Sobrevieram, ainda, as Leis nº 12.435, de 06.07.2011, nº 12.470, de 31.08.2011 e Lei n.º 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência).
Outrossim, novas alterações legislativas ocorreram em 2020 e 2021, ampliando o critério de miserabilidade, provisoriamente, no período de pandemia do COVID-19 e incluindo o art.20-A, resultando na seguinte redação:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja: (Redação dada pela Lei nº 13.982, de 2020)
I - igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, até 31 de dezembro de 2020; (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
§ 4o O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória.
§ 5o A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada.
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS.
§ 7o Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura.
§ 8o A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido.
§ 9o Os rendimentos decorrentes de estágio supervisionado e de aprendizagem não serão computados para os fins de cálculo da renda familiar per capita a que se refere o § 3o deste artigo.
§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
§ 11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015)
§ 12. São requisitos para a concessão, a manutenção e a revisão do benefício as inscrições no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal - Cadastro Único, conforme previsto em regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)
§ 14. O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
§ 15. O benefício de prestação continuada será devido a mais de um membro da mesma família enquanto atendidos os requisitos exigidos nesta Lei. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
Art. 20-A. Em razão do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (Covid-19), o critério de aferição da renda familiar mensal per capita previsto no inciso I do § 3º do art. 20 poderá ser ampliado para até 1/2 (meio) salário-mínimo. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
§ 1º A ampliação de que trata o caput ocorrerá na forma de escalas graduais, definidas em regulamento, de acordo com os seguintes fatores, combinados entre si ou isoladamente: (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
I - o grau da deficiência; (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
II - a dependência de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária; (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
III - as circunstâncias pessoais e ambientais e os fatores socioeconômicos e familiares que podem reduzir a funcionalidade e a plena participação social da pessoa com deficiência candidata ou do idoso; (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
IV - o comprometimento do orçamento do núcleo familiar de que trata o § 3º do art. 20 exclusivamente com gastos com tratamentos de saúde, médicos, fraldas, alimentos especiais e medicamentos do idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), ou com serviços não prestados pelo Serviço Único de Assistência Social (Suas), desde que comprovadamente necessários à preservação da saúde e da vida. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
§ 2º O grau da deficiência e o nível de perda de autonomia, representado pela dependência de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária, de que tratam, respectivamente, os incisos I e II do § 1º deste artigo, serão aferidos, para a pessoa com deficiência, por meio de índices e instrumentos de avaliação funcional a serem desenvolvidos e adaptados para a realidade brasileira, observados os termos dos §§ 1º e 2º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
§ 3º As circunstâncias pessoais e ambientais e os fatores socioeconômicos de que trata o inciso III do § 1º deste artigo levarão em consideração, observado o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 2015, entre outros aspectos: (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
I - o grau de instrução e o nível educacional e cultural do candidato ao benefício; (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
II - a acessibilidade e a adequação do local de residência à limitação funcional, as condições de moradia e habitabilidade, o saneamento básico e o entorno familiar e domiciliar; (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
III - a existência e a disponibilidade de transporte público e de serviços públicos de saúde e de assistência social no local de residência do candidato ao benefício; (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
IV - a dependência do candidato ao benefício em relação ao uso de tecnologias assistivas; e (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
V - o número de pessoas que convivem com o candidato ao benefício e a coabitação com outro idoso ou pessoa com deficiência dependente de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
§ 4º O valor referente ao comprometimento do orçamento do núcleo familiar com gastos com tratamentos de saúde, médicos, fraldas, alimentos especiais e medicamentos do idoso ou da pessoa com deficiência, de que trata o inciso IV do § 1º deste artigo, será definido pelo Instituto Nacional do Seguro Social, a partir de valores médios dos gastos realizados pelas famílias exclusivamente com essas finalidades, conforme critérios definidos em regulamento, facultada ao interessado a possibilidade de comprovação, nos termos do referido regulamento, de que os gastos efetivos ultrapassam os valores médios. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
Por fim, a Lei nº 14.176, de 2021, alterou novamente o art.20, incluindo o art. 20-B e revogando o art.20-A:
Art. 20-A. (Revogado pela Lei nº 14.176, de 2021)
Art. 20-B. Na avaliação de outros elementos probatórios da condição de miserabilidade e da situação de vulnerabilidade de que trata o § 11 do art. 20 desta Lei, serão considerados os seguintes aspectos para ampliação do critério de aferição da renda familiar mensal per capita de que trata o § 11-A do referido artigo:. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021) (Vigência)
I – o grau da deficiência;. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021) (Vigência)
II – a dependência de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária; e. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021) (Vigência)
III – o comprometimento do orçamento do núcleo familiar de que trata o § 3º do art. 20 desta Lei exclusivamente com gastos médicos, com tratamentos de saúde, com fraldas, com alimentos especiais e com medicamentos do idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados gratuitamente pelo SUS, ou com serviços não prestados pelo Suas, desde que comprovadamente necessários à preservação da saúde e da vida.. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021) (Vigência)
§ 1º A ampliação de que trata o caput deste artigo ocorrerá na forma de escalas graduais, definidas em regulamento.. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021) (Vigência)
§ 2º Aplicam-se à pessoa com deficiência os elementos constantes dos incisos I e III do caput deste artigo, e à pessoa idosa os constantes dos incisos II e III do caput deste artigo.. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021) (Vigência)
§ 3º O grau da deficiência de que trata o inciso I do caput deste artigo será aferido por meio de instrumento de avaliação biopsicossocial, observados os termos dos §§ 1º e 2º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), e do § 6º do art. 20 e do art. 40-B desta Lei.. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021) (Vigência)
§ 4º O valor referente ao comprometimento do orçamento do núcleo familiar com gastos de que trata o inciso III do caput deste artigo será definido em ato conjunto do Ministério da Cidadania, da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia e do INSS, a partir de valores médios dos gastos realizados pelas famílias exclusivamente com essas finalidades, facultada ao interessado a possibilidade de comprovação, conforme critérios definidos em regulamento, de que os gastos efetivos ultrapassam os valores médios. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021) (Vigência)
Portanto, nos termos da legislação vigente, cumpre ressaltar que o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: (a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou de idoso (nesse caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e (b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
Saliente-se, por oportuno, que a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei nº 8.742/93, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica jurisprudência do STJ (v.g. STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01-07-2002) e desta Corte (v.g. AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19-04-2006).
Desse modo, a delimitação da incapacidade para a vida independente deve observar os seguintes aspectos: (a) não se exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou seja incapaz de se locomover; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene pessoal e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de se expressar ou se comunicar; e (d) não pressupõe dependência total de terceiros.
No que diz respeito ao requisito econômico, cabe ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça admitiu, em sede de Recurso Repetitivo, a possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade por outros meios de prova, quando a renda per capita familiar fosse superior a ¼ do salário mínimo (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 3ª Seção, DJe 20/11/2009). Posteriormente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18/04/2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de miserabilidade.
Assim, forçoso reconhecer que as despesas necessárias ao cuidado da parte autora como decorrentes de compra de medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, podem ser levadas em consideração na análise da condição de miserabilidade da família da parte demandante.
A propósito, a eventual percepção de recursos do Programa Bolsa Família, que, segundo consta no site do Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome (http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/), destina-se à "transferência direta de renda que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o País" e "tem como foco de atuação os 16 milhões de brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$ 70,00 mensais, e está baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos", não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui prova indiciária acima de qualquer dúvida razoável de que a unidade familiar se encontra em situação de grave risco social.
Registre-se, ainda, que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário 580.963/PR, em 17/04/2013, declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelecia que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", baseado nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e àquelas portadoras de deficiência. Segundo o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados.
Dessa forma, no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso, com 65 anos ou mais, a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima, ou de benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido a título de benefício por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (EIAC nº 2004.04.01.017568-9/PR, 3ª Seção, Relator Juiz Federal JOÃO BATISTA LAZZARI, unânime, D.E. de 02/07/2009). Ressalte-se que tal pessoa, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerada na composição familiar, para efeito do cálculo da renda per capita.
CASO CONCRETO
A parte autora, com 35 anos de idade, busca o restabelecimento do benefício assistencial, concedido em 22/04/2002 (NB 544.891.324-1), na condição de pessoa com deficiência, o qual foi cessado em 01/11/2021 sob o fundamento de que a renda do grupo familiar é superior a 1/4 do salário-mínimo - em desacordo com o contido no §3° ou §4° Art. 20 da Lei 8.742/93.
Quanto à qualidade de pessoa com deficiência, não há discussão. Dessa forma, a controvérsia reside na alteração da condição econômica do grupo familiar a partir de 01/11/2021, uma vez que foi identificado vínculo empregatício com remunerações da genitora e do padrasto, superando o requisito da miserabilidade exigido para a manutenção do benefício.
A fim de averiguar as condições sócio econômicas da parte autora e de sua família, foi elaborado auto de constatação, do qual se depreende que o grupo familiar é composto pelo requerente e seus pais (
Sobre a renda familiar, é relatado que provém exclusivamente da remuneração do padrasto, no valor aproximado de R$ 1.370,00, o que resulta em uma renda per capita de R$ 456,67.
Quanto aos demais dados sobre a residência e contexto social em que vivem, consta as seguintes informações: a casa é alugada, em regulares condições de construção, segurança, conservação, conforto e higiene.
Sobre as despesas, foram relatados gastos com o aluguel (R$600,00); luz e água ( R$194,16); alimentação e higiene (em torno de R$400,00). Além disso, há as parcelas da compra da cadeira motorizada (R$ 309,00 -3 parcelas em atraso).
De acordo com o auto de constatação e os documentos previdenciários verifica-se que o padrasto do autor, Sr. Mário, possui vínculos empregatícios constantes, pelos quais recebeu entre 2021 e 2022, em torno de R$1,400,00 a R1.700,00 (
). Outrossim, foram encontrados vários registros em nome da genitora, Sra. Teresa de Fátima, após a concessão do benefício, até setembro de 2021 ( e ), todavia com remuneração inferior ao salário mínimo vigente à época.Não obstante a renda per capita ultrapassar o mínimo estipulado em lei (um quarto do salário mínimo), a vulnerabilidade social vivida pela requerente deve ser observada individualmente, podendo ser relativizado. Como dito acima, além da renda per capita, admite-se a utilização de outros meios probatórios para aferir a condição de hipossuficiência econômica familiar. No caso, é possível identificar que o grupo familiar vive uma situação desfavorável. O autor possui deficiência física e motora, o que exige auxílios especiais para o dia a dia, depende de cadeiras de rodas, que ainda está sendo paga; a casa é alugada, em regular estado de conservação, segurança, conforto e higiene, guarnecida com móveis e eletrodomésticos predominantemente antigos e desgastados pelo uso.
Outrossim, é de ser considerado que embora a genitora tenha trabalhado durante parte do período em que concedido o benefício, até setembro de 2021, as remunerações não alcançaram o valor de um salário mínimo, de modo que, por si só, não é suficiente para cessar a situação de vulnerabilidade detectada ao conceder o benefício.
No caso, diante dos fatores relatados pelo laudo social, especialmente pela deficiência do autor, que o impede de ter uma vida com independência, ainda que a renda per capita ultrapasse ligeiramente o limite de ¼ do salário-mínimo, existe situação de risco social a demandar o restabelecimento do benefício assistencial.
Assim, o benefício de prestação continuada deve ser restabelecido , não havendo que se falar em restituição de valores, uma vez que foi indevida a suspensão.
ANTECIPAÇÃO DA TUTELA
Confirmado o direito ao benefício, resta mantida a antecipação dos efeitos da tutela, concedida pelo juízo de origem.
PREQUESTIONAMENTO
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
CONCLUSÃO
Apelação improvida.
Confirmada a tutela antecipatória concedida na sentença.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003700240v15 e do código CRC b969c090.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 13/3/2023, às 15:14:43
Conferência de autenticidade emitida em 21/03/2023 04:00:58.
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Apelação Cível Nº 5000733-58.2022.4.04.7016/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: ADRIANO FERNANDES (Relativamente Incapaz (Art. 4º CC)) (AUTOR)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. RESTABELECIMENTO. REQUISITOS ATENDIDOS.
1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do artigo 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
2. É devido o restabelecimento do benefício assistencial indevidamente cessado. Hipótese em que não foi comprovada alteração da situação econômica capaz de justificar o cancelamento do benefício de prestação continuada.
3. Ainda que a renda mensal per capita ultrapasse ligeiramente o mínimo legal de 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, outros critérios podem ser observados para aferir a condição de hipossuficiência econômica.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 07 de março de 2023.
Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003700241v4 e do código CRC 94595c67.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 13/3/2023, às 15:14:43
Conferência de autenticidade emitida em 21/03/2023 04:00:58.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 17/02/2023 A 28/02/2023
Apelação Cível Nº 5000733-58.2022.4.04.7016/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: ADRIANO FERNANDES (Relativamente Incapaz (Art. 4º CC)) (AUTOR)
ADVOGADO(A): MARCO AURELIO CHEHBAN FELL (OAB PR102387)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/02/2023, às 00:00, a 28/02/2023, às 16:00, na sequência 453, disponibilizada no DE de 08/02/2023.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
RETIRADO DE PAUTA.
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 21/03/2023 04:00:58.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA DE 07/03/2023
Apelação Cível Nº 5000733-58.2022.4.04.7016/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART
PREFERÊNCIA: MARCO AURELIO CHEHBAN FELL por ADRIANO FERNANDES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: ADRIANO FERNANDES (Relativamente Incapaz (Art. 4º CC)) (AUTOR)
ADVOGADO(A): MARCO AURELIO CHEHBAN FELL (OAB PR102387)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 07/03/2023, na sequência 19, disponibilizada no DE de 24/02/2023.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 21/03/2023 04:00:58.