APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002874-67.2014.404.7004/PR
RELATOR | : | VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | MOACIR DESSIA |
ADVOGADO | : | JOÃO LUIZ SPANCERSKI |
: | ROSEMAR CRISTINA LORCA MARQUES VALONE | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFICIO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. RISCO SOCIAL. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.
1. Não comprovado o risco social, é indevida a concessão do benefício assistencial.
2. Para a caracterização da litigância de má-fé, capaz de ensejar a imposição de multa nos termos do art. 17 do CPC, necessário o elemento subjetivo, qual seja, a intenção dolosa. Logo, o reconhecimento da litigância de má-fé pressupõe que a conduta da parte e de seu procurador seja realizada na intenção de prejudicar.
3. Ao ajuizar a presente ação, alterando a verdade dos fatos, a autora procedeu na forma do inciso II, do art. 17, do CPC, devendo ser mantida a condenação em litigância de má-fé.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de maio de 2015.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7518099v5 e, se solicitado, do código CRC 9D046619. | |
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Signatário (a): | Vânia Hack de Almeida |
Data e Hora: | 21/05/2015 11:32 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002874-67.2014.404.7004/PR
RELATOR | : | VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | MOACIR DESSIA |
ADVOGADO | : | JOÃO LUIZ SPANCERSKI |
: | ROSEMAR CRISTINA LORCA MARQUES VALONE | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária objetivando o benefício assistencial ao deficiente à parte.
A sentença julgou improcedente a demanda com julgamento de mérito, com base no art. 269, inc. I, do CPC (Evento 35).
Apela a parte autora, sustentando ter sido comprovado o risco social e a incapacidade, razão pela qual entende fazer jus ao benefício assistencial. Requer seja afastada a condenação em litigancia de má-fe, assim como, nas subsequentes multa e indenização a que foi condenada. (Evento 41).
Oportunizadas as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte para julgamento.
O MPF deixou de se manifestar por entender ausente o interesse público.
É o relatório.
VOTO
O MM. Juiz a quo manifestou-se nos seguintes termos, os quais adoto parcialmente como fundamentos para decidir:
2. Fundamentação
[...]
2.2. Mérito: análise do direito ao benefício almejado
A Constituição da República de 1988 estabeleceu, em seu art. 203, caput e inciso V, que a assistência social deve ser prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, prevendo como objetivo, dentre outros, "a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei".
A lei a que se refere esse dispositivo constitucional é a denominada Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), editada em 07.12.1993, sob o n.º 8.742/1993. Essa lei disciplinou o benefício assistencial, de prestação continuada, previsto na Constituição, em seu art. 20, nos seguintes termos (com as alterações promovidas pelas Leis n.º 12.435/2011 e 12.470/2011):
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
§ 1.º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2.º Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
§ 3.º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.
§ 4.º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória.
§ 5.º A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada.
§ 6.º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2º, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS.
§ 7.º Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura. § 8.º A renda familiar mensal a que se refere o § 3.º deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido.
§ 9.º A remuneração da pessoa com deficiência na condição de aprendiz não será considerada para fins do cálculo a que se refere o § 3.º deste artigo.
§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
Posteriormente, a Lei n.º 9.720/1998, ao alterar a redação do art. 38 da LOAS, reduziu o requisito etário para 67 anos, a partir de 01.01.1998, para o idoso carente alcançar o benefício. Finalmente, a Lei n.º 10.741/2003 (Estatuto do Idoso - com vigência a partir de 01.01.2004), estabeleceu que a idade mínima para a obtenção do benefício pelo idoso passava a ser de 65 anos (art. 34).
O aludido Estatuto, no parágrafo único do art. 34, trouxe outra importante inovação, ao prever que a percepção do benefício por idoso não pode mais ser computada para efeito do cálculo da renda familiar per capita, caso outro membro da mesma unidade familiar venha a requerer ou já receba idêntica prestação. Confira-se a redação do art. 34 do Estatuto do Idoso:
Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social - Loas.
Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas.
Cumpre ressaltar que o art. 21, § 1.º, da LOAS bem denota a relação jurídica precária e de trato continuado de que se reveste a prestação do benefício assistencial, sujeita, assim, à cláusula rebus sic stantibus, na medida em que o idoso e a pessoa portadora de deficiência somente farão jus ao amparo se e enquanto preencherem seus requisitos, o que implica dizer que eventual alteração do suporte fático da prestação, seja quanto à incapacidade para o trabalho e vida independente, seja quanto à miserabilidade, justificam o cancelamento do benefício (TRF4, APELREEX 2008.71.99.001228-4, Sexta Turma, Relator Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, D.E. 03/06/2009).
Tem-se, portanto, que o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1.º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família (TRF4, EINF 2007.72.99.003913-5, Terceira Seção, Relator Juiz Federal Alcides Vettorazzi, D.E. 29/05/2009).
No que se refere à condição de deficiente, é necessário tecer algumas considerações. Com efeito, a Constituição da República, ao instituir o benefício, remete sua disciplina à lei. Entretanto, conquanto tenha sido atribuído à lei disciplinar, concretizar, conformar, configurar ou organizar o direito à percepção do benefício da "pessoa portadora de deficiência" que não tenha condições de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, não pode a lei, nesse desiderato, estabelecer um conceito restritivo de deficiência (TRF4, APELREEX 2002.70.04.001297-8, Quinta Turma, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 10/11/2008).
A análise da norma constitucional autoriza a conclusão de que a assistência social deve ser prestada a quem dela necessitar, o que demonstra inequivocamente a intenção do legislador constituinte de ampliar o conjunto de beneficiários da assistência social. Se assim é, o disposto no caput do art. 203 da Constituição serve como princípio hermenêutico, quer dizer, como linha orientadora na interpretação dos demais dispositivos relativos à assistência social, dentre os quais o próprio comando exarada no inciso V do mesmo artigo. Daí se pode afirmar que se deve interpretar a locução "pessoa portadora de deficiência" (CRFB, art. 203, inciso) em um sentido amplo, jamais restritivo.
A impossibilidade de a lei estabelecer um conceito restritivo de deficiência é reforçada porque um dos objetivos constitucionais que devem servir de base à organização da seguridade social, em que se insere a assistência social, é o da universalidade da cobertura e do atendimento (CRFB, art. 194, parágrafo único, inciso I).
Destarte, a exigência legal, contida na redação original do dispositivo legal citado, para a percepção do benefício, de ser a pessoa portadora de deficiência incapaz para a vida independente, se entendida como incapacidade para todos os atos da vida, não se encontrava na Constituição. Ao contrário, essa exigência contrariava o sentido da norma constitucional. Se aquela fosse a interpretação para a locução incapacitada para a vida independente, constante do art. 20 § 2.º, da Lei n.º 8.742/1993, o legislador teria esvaziado indevidamente o conteúdo material do direito fundamental da pessoa portadora de deficiência, deixando fora de seu âmbito de abrangência, de forma ilegítima, uma ampla massa de pessoas portadoras de deficiência que são incapacitadas para o trabalho.
Pode-se concluir, assim, que a incapacidade para a vida independente a que se referia a Lei n.º 8.742/1993 deveria ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a um grupo maior possível de pessoas portadoras de deficiência que, pelo simples fato de apresentarem alguma limitação físico-psíquica, já se encontram, de algum modo, à margem da sociedade.
Diante do exposto, a incapacidade para a vida independente (a) não exigia que a pessoa possua uma vida vegetativa ou que seja incapaz de locomover-se; (b) não significava incapacidade para as atividades básicas do ser humano, como se alimentar, fazer a própria higiene ou vestir-se sozinho; (c) não impunha a incapacidade de expressar-se ou de comunicar-se; e (d) não pressupunha dependência total de terceiros. Vale dizer, a "pessoa portadora de deficiência" que faz jus ao benefício em tela é aquela que, em razão de sua limitação, não pode trabalhar para levar uma vida independente.
Deveras, o cidadão somente será independente se for apto para trabalhar e, com isso, angariar recursos para a sua própria manutenção, pois, em caso contrário, sempre dependerá de terceiros e jamais terá uma vida autônoma e livre (TRF4, APELREEX 2004.72.01.005793-6, Quinta Turma, Relator Juiz Federal Alcides Vettorazzi, D.E. 13/10/2008).
Confiram-se precedentes do Egrégio TRF da 4.ª Região:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REMESSA OFICIAL. NÃO CONHECIMENTO. ARTS. 203, V DA CF/88 E 20 DA LEI 8.742/93. REQUISITOS. RENDA MÍNIMA. PARCELAS COMPONENTES DO CÁLCULO QUANTO AO SEU LIMITE OBJETIVO. INCAPACIDADE PARA A VIDA INDEPENDENTE. VERBA HONORÁRIA [...] 2. A concessão do amparo assistencial é devida às pessoas portadoras de deficiências e idosos, mediante a demonstração de não possuírem meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família [...] 4. A incapacidade para a vida independente é um signo que deve ser inteligido na extensão do significado de que é ancilar, isto é, da impossibilidade de uma pessoa portadora de deficiência em prover a própria manutenção; logo, não pode ser reduzida à mera necessidade de ajuda que essa possa, eventualmente, apresentar para desincumbir-se daquilo que aos outros é mera rotina. Hermenêutica conducente à não discriminação. Leis 7.853/89 (art. 1º) e 8.742/93 (art. 4º, III) e Decreto 3.956/01 (n. 2, letra "a") [...] (TRF4, AC 2004.71.14.002034-0, Sexta Turma, Relator Victor Luiz dos Santos Laus, publicado em 22/03/2007, destaquei)
Agora, as Leis n.º 12.435/2011 e 12.470/2011 modificaram o panorama legal outrora vigente, tornando a norma regulamentadora do benefício consentânea com a realidade social há muito sentida pela jurisprudência, para o fim de asseverar que se considera pessoa com deficiência "aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas".
No que tange ao requisito da miserabilidade ou hipossuficiência econômica, a jurisprudência tem considerado que o disposto no § 3.º do artigo 20 da LOAS não pode ser interpretado literalmente, servindo o limite de renda per capita nele previsto muito mais como uma presunção de miserabilidade do que propriamente como limitador.
[...]
No caso concreto sob julgamento, a parte autora, nascida em 11.01.1964, atualmente, com 51 anos de idade, afirma que é portadora de "epilepsia" e, em virtude dessa doença, não possui condições de trabalhar.
Em razão da doença acometida pela parte autora, foi nomeado o médico do trabalho, Dr. JADYLSON LUIZ BORTOLATO, para realizar a perícia médica, o qual fez as seguintes considerações em seu laudo pericial (LAUDPERI2 - evento '25'):
"1- Respostas aos quesitos da parte autora:
a) O (a) autor(a) sofre de alguma doença/enfermidade/deficiência? Se positivo, qual e desde quando?
Resposta: Sim. Epilepsia. A definição de período do inicio esta prejudicado pois nos autos não apresenta dados que sejam congruente com o período alegado (desde o nascimento).
b) Qual a atual ou última atividade laboral do (a) autor(a)?
Resposta: Trabalhador rural.
c) Há incapacidade para o exercício dessa atividade? Em caso positivo, quais os motivos e quais as tarefas da atividade afetadas pela patologia?
Resposta: Sim. O atual estágio em que as doenças acometem autor dificultam realizar atividades que necessitem esforços físicos moderados a intensos como carregar pesos, esforços extenuantes, bem como atividades que exponham a riscos de acidentes.
d) Em caso negativo a resposta ao quesito anterior, há redução da capacidade de trabalho para essa atividade?
Resposta: Vide resposta ítem "c".
e) Em caso de incapacidade (parcial ou total) é temporária ou permanente? Por quê?
Resposta: A incapacidade que acomete autor é temporária, pois pode apresentar controle satisfatório com os tratamentos realizados.
f) É possível afirmar, ainda que aproximadamente, desde quando existe a incapacidade?
Resposta: Resposta prejudicada.
g) Em caso de incapacidade permanente, para qualquer atividade laboral, o autor necessita de assistência permanente de outra pessoa?
Resposta: Não se faz necessário no atual estagio em que a doença acomete autor.
h) Quais os exames que basearam as respostas dos quesitos?
Resposta:
Exame Clínico: idade - 50 anos. Autor é morador em Alto Piquiri, zona urbana, solteiro, dois filhos, alfabetizado - primeiro grau incompleto (SIC - segundo informações colhidas). Começou a trabalhar desde jovem ajudando os pais na lavoura (café, feijão, milho, arroz, soja, mandioca, café), entre outras culturas, aonde colhia, roçava, carpia e plantava. Para tanto utilizava enxada, empunhando com as duas mãos, fletindo o tronco sobre o abdômen e membros, roçando o mato rasteiro, realizando diferentes movimentos com membros, carregando pesos, deambulando a longas distancias e permanecendo em pé por várias horas, exposta as intempéries do tempo. Informa que mudou para cidade com cerca de 20 anos de idade quando parou de trabalhar, pois apresentava crises convulsivas frequentes. Relata que apresenta crises desde os 3 anos de idade, sendo submetido a diferentes tratamentos. Atualmente mantém quadro de epilepsia, cerca de 4 a 5 episódios de crise tonico clonicas generalizadas, em uso de gardenal, frisium e lamotrigina (SIC). Informa dificuldade para conseguir emprego devido a baixa escolaridade e serviços apresentados que são de risco (lavrador, servente de pedreiro, entre outras atividades). Em acompanhamento com neurologista. Nega diabetes mellitus e hipertensão. Nega tabagismo e etilismo.
Exame Físico: Peso: 84 Kg; Altura: 1,72 m; IMC: 27,90. Bom estado geral, corado e hidratado, anictérico, acianótico. Ao exame de boca, olhos, ouvidos, nariz e garganta apresenta diferentes cicatrizes antigas em língua. No tórax os pulmões estão limpos, com murmúrio vesicular preservado bilateralmente. Aparelho cardiovascular apresenta bulhas rítmicas e normofonéticas a cerca de 78 bpm, PA: 150 x 90 mmHg. Abdômen globoso, indolor, sem visceromegalias ou sinais de herniações, com ruídos hidroaéreos presentes e normais. Membros inferiores sem edemas, varizes ausentes, pulsos pediosos presentes e normais. Hiperqueratose ausente em mãos. Neurologicamente orientado, normoreflexo bilateral, eutonico e eutrófico. Aparelho ortopédico apresenta deambulação normal; sobe e desce escadas sem dificuldade; Lasegue negativo; inclina tronco sobre abdômen sem dificuldade.
Exames complementares (EC):
- Em INIC1, evento1 - 25/04/2011 - Atestado medico informando que autor e portador de epilepsia e encontra-se impossibilitado para o trabalho.
- Em EXMMED1 - 20/08/2013 - Laudo de ressonância nuclear magnética informando que autor apresenta imagem do encéfalo revelando esclerose hipocampal a direita.
Diagnósticos:
CID G 40 (epilepsia).
i) Qual o grau de instrução do autor?
Resposta: Primeiro grau incompleto.
2- Respostas aos quesitos do INSS:
1) Qual a idade atual do autor?
Resposta: 50 anos.
2) O autor é portador de algum tipo de deficiência/patologia? Em caso positivo, qual(is), como os respectivos CID's? É possível tratamento?
Resposta: Sim. G 40, sendo possível controle com tratamento adequado.
3) Qual a atividade laboral habitual do autor?
Resposta: Trabalhador rural, atualmente refere que esta sem trabalhar.
4) As anomalias ou lesões são irreversíveis? São de natureza hereditária, congênita ou adquirida?
Resposta: Não, cuja etiologia é multifatorial podendo ser congênita e/ou adquirida.
5) Sendo o autor portador de alguma deficiência, é possível se é incapacitante para a vida independente, ou seja, para alimentar-se, vestir-se, realizar higiene pessoal sem o auxilio de alguém?
Resposta: Não é incapacitante para a vida independente.
6) Sendo o autor portador de alguma deficiência, é possível afirma que incapacita-o para o trabalho?
a) Se positivo, total ou parcialmente?
Resposta: Sim, total no atual estagio em que a doença se apresenta.
b) Desde quando?
Resposta: Resposta prejudicada.
c) Qual da data provável da alta medica?
Resposta: Resposta prejudicada
d) Quando o autor devera ser submetido a outra pericia do INSS?
Resposta: No período de um ano.
7) Em razão das condições atuais de saúde do autor, ele pode ser considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de qualquer outra atividade laboral?
Resposta: O atual estagio em que a doença acomete autor impossibilita para realizar atividades laborais que necessitem esforços moderados a intensos ou que exponham a riscos de acidentes.
8) Diga o Sr. Perito se o autor encontra-se em uso de medicação especifica para o diagnostico declinado?
Resposta: Sim.
9) É possível determinar com quem o autor reside (membros familiares) e quantas pessoas compõem o respectivo conjunto familiar, bem como qual a idade dos seus membros?
Resposta: Resposta prejudicada.
[...] - grifos neste transcrito
Pela simples leitura do laudo pericial, dessume-se que a doença da qual a parte autora é portadora atualmente gera incapacidade para o trabalho. Assim, é possível afirmar que hoje essa doença o impede de participar de forma plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
De acordo com a resposta do Sr. Perito, a parte autora possui incapacidade total no atual estágio em que a doença se apresenta, tendo em vista que o impossibilita atualmente de realizar atividades laborais que necessitem esforços moderados a intensos ou que exponham a riscos de acidentes.
Contudo, apesar de total a incapacidade, ela é TRANSITÓRIA, pois, como ressaltado pelo perito na resposta à questão 'e', o autor pode apresentar controle satisfatório com os tratamentos realizados. A propósito, quando da respota ao quesito '6d', o Sr. Perito sugere que o autor seja submetido a outra perícia do INSS no prazo de um ano.
Diante desse quadro, considero que ATUALMENTE a parte autora preenche o requisito da deficiência previsto no caput e §2º do art. 20 da Lei n.º 8.742/1993, tendo em vista que, diante de sua condição de saúde, não tem aptidão de, por ora, por meio do desenvolvimento de atividade laboral regular, levar uma vida independente. Ademais, resta claro que a parte autora possui impedimentos de natureza neurólogica, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Quanto ao requisito da miserabilidade, a diligência realizada pela Assistente Social em 29.08.2014, conforme auto de constatação anexado no evento '24', comprova que a família do autor, composta por ele e sua companheira, ONEZITA GONÇALVES DA SILVA, residem, nos dias atuais, na Rua Projetada Gloriosa, 784, Conjunto Habitacional Alvorada.
Conforme certificado pela Assistente, o requerente informou que reside no endereço acima mencionado há aproximadamente 6 (seis) anos e que sua companheira é proprietária do imóvel em que residem. A casa é popular, financiado pela Caixa Econômica Federal (todas parcelas quitadas), de alvenaria, com cerâmica em todos os cômodos, e forro nos quartos e sala.
A assistente social concluiu que "a família vivencia situação de vulnerabilidade social, advinda da fragilidade da saúde do requerente e da ausência de condições de inserção ao mercado de trabalho por este, fator que implica diretamente na dificuldade de autossustentabilidade e de autonomia do mesmo".
Consta do estudo socioeconômico que o rendimento mensal auferido pelo núcleo familiar do requerente refere-se a um salário mínimo - R$ 724,00 referente a aposentadoria por idade de Ozenita Gonçalves da Silva, convivente. No entanto, em consulta efetuada por este magistrado no sistema CNIS, verificou-se que a companheira do autor, ONEZITA GONÇALVES DA SILVA, nascida em 10.01.1934, percebe dois benefícios previdenciários, a sua aposentadoria por idade rural (NB nº 086.952.317-1), desde 01.03.1993, e a pensão por morte devida a dependente de trabalhador rural (NB n.º 116.044.056-2), desde 01.04.2000, conforme documentos anexados aos autos no evento 34.
Portanto, a renda da família é de dois salários mínimos.
Antes de prosseguir, cumpre observar que o autor não adotou conduta ética no curso deste processo.
Inicialmente, registra-se que, na inicial, datada de 12.11.2011, disse residir na Rua Curitiba, n.º 1.108, em Umuarama/PR; talvez tenha sido equívoco do advogado informar que o autor residia em Umuarama/PR, quando o correto seria Alto Piquiri/PR, mas o fato é que o autor, antes e no início do processo, disse que residia na Rua Curitiba, n.º 1.108; na procuraração que acompanhou a inicial, datada de 18.04.2011 consta esse endereço; no pedido administrativo, como se observa no evento 01, INIC1, p. 11, formulado em 25.04.2011, o autor afirmou que residia no referido endereço, na companhia de um irmão.
Inclusive, no "Relatório Social" elaborado em 13.08.2012, por assistente social do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) do Município de Alto Piquiri/PR (evento 01, OUT6), após determinação do Juízo Estadual, consta que o autor, na época, residia com o irmão, na Avenida Curitiba, n.º 1.108, em Alto Piquiri/PR. É evidente que a assistente social do CRAS inseriu essa informação no relatório porque a obtivera do próprio autor.
Ocorre, porém, que, após a remessa dos autos a este Juízo Federal, constatou-se que o autor, em verdade, reside com sua companheira, em outro endereço, desde antes do pedido administrativo e do ajuizamento desta ação.
Com efeito, no "Estudo Socioeconômico" elaborado por profissional isenta nomeada por este Juízo Federal (evento 24), consta que, no dia 29.08.2014, ao diligenciar no endereço da Rua Curitiba, n.º 1.108, em Alto Piquiri/PR, para realizar a visita domiciliar, a assistente social obteve a informação de vizinhos que o autor não residia mais nesse endereço havia pelo menos 05 anos!
Então, a assistente social foi até o novo endereço indicado, localizado na Rua Profetada Gloriosa, n.º 784, Conjunto Habitacional Alvorada, em Alto Piquiri/PR, onde localizou o autor residindo com sua companheira, na residência desta.
À assistente social, o autor disse que residia nesse endereço há aproximadamente 06 anos, vale dizer, desde 2008/2009.
Quer dizer, o autor reside com sua companheira, no referido endereço, e não na Rua Curitiba, com o irmão, desde antes do requerimento administrativo.
Está claro que o autor faltou com a verdade na via administrativa e, pior, em juízo, alegando que residia com o irmão na Rua Curitiba e que sobrevivia apenas com o rendimento deste; omitiu, deliberadamente, que residia com sua companheira, a qual recebe dois benefícios previdenciários, e não apenas um, como informado à assistente social no parece do evento 24.
Veja-se que, mesmo na petição do evento 29, formulada após o estudo socioeconômico, é omitido que a companheira do autor recebe dois benefícios previdenciários, pois asseverado que a família sobrevive apenas com a aposentadoria por idade da companheira de valor mínimo.
O autor, inequivocamente, faltou com a verdade para induzir em erro o INSS e agora o juízo, tentando esconder seu estado civil (em união estável) e a renda familiar (dois benefícios previdenciários recebidos pela companheira).
[...]
Ademais, as imagens fotográficas da residência do autor e de sua companheira, que constam do estudo socioeconômico (evento 24), indicam que não se trata de pessoa que vive em estado de miséria ou em situação de vulnerabilidade socioeconômica, não obstante se tratar de família humilde, que vive com alguma dificuldade, como outros milhões de brasileiros.
Portanto, o autor não preenche o requisito da hipossuficiência econômica. Desse modo, o pedido é improcedente.
A jurisprudência desta Corte Regional, bem como do Superior Tribunal de Justiça, é pacífica no entendimento de que qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso de 65 anos ou mais (salvo quando recebido por força de deficiência, quando então o requisito etário é afastado) deve ser excluído da apuração da renda familiar, bem como essa renda mínima não é o único critério a balizar a concessão do benefício, devendo ser examinado juntamente com outros meios de aferição do estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo do autor e de sua família (Pet n.º 7203/PE - 3ª Seção - Unânime - Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura - DJe 11-10-2011; TRF4 - AC n.º 0019220-88.2012.404.9999 - 6ª T. - unânime - Rel. Des. Celso Kipper - D.E. 22-03-2013; REsp n.º 1112557/MG - 3ª Seção - unânime - Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho - DJe 20-11-2009).
Mesmo desconsiderado o valor recebido pela companheira do autor, porquanto benefícios de valor mínimo, e o gasto com medicamentos de R$ 100,00, não resta demonstrado o risco social.
Como bem observou o MM. Magistrado, as fotografias juntadas aos autos, demonstram que o autor não vive em estado de miserabilidade. A casa, além de já estar totalmente quitada, possui: 02 fogões a gás, 01 aparelho de televisor com tela plana, mais 01 televisor num dos quartos, uma geladeira com freezer, chuveiro elétrico, aparelho de som.
Veja-se que não se nega dificuldades financeiras da família, contudo a teleologia da LOAS é proteger os miseráveis, e não aqueles que, embora com dificuldades, conseguem se manter razoavelmente.
Assim, entendo que não restou demonstrada o risco social, não fazendo a parte autora jus ao benefício assistencial requerido, impondo-se a manutenção da sentença.
No tocante à multa imposta, colho excerto da sentença:
[...]
Por fim, cumpre reconhecer que o autor, indubitavelmente, como analisado acima, não cumpriu seu dever processual de expor os fatos em juízo conforme a verdade (CPC, art. 14, incido I), tendo sido desleal com o INSS desde o requerimento administrativo, ao não afirmar a verdade sobre o local correto de seu domicílio e a omitir a existência de uma companheira com quem vive em união estável há pelo menos seis anos. Destarte, é inegável que o autor litigou com má-fé, ao alterar a verdade dos fatos (CPC, art. 17, II).
[...]
Condeno o autor, ainda, pela litigância de má-fé, a pagar multa ao INSS no valor correspondente a 1% (um por cento) do valor atualizado da causa (INPC/IBGE), nos termos do art. 18 do CPC. Essa condenação não é suspensa pelo benefício da justiça gratuita, tendo em vista que este não tem por finalidade albergar condutas ilícitas, como a constatada neste processo.
Para a caracterização da litigância de má-fé, capaz de ensejar a imposição de multa nos termos do art. 17 do CPC, necessário o elemento subjetivo, qual seja, a intenção dolosa. Logo, o reconhecimento da litigância de má-fé pressupõe que a conduta da parte e de seu procurador seja realizada na intenção de prejudicar.
No caso em tela, entendo que houve litigância de má-fé, pois a parte autora alterou a verdade dos fatos, contradizendo-se nos laudos socioeconômicos apresentados no feito (Evento 1- OUT6 e Evento 24), quanto ao local onde vive, omitindo dados no tocante à renda auferida pela companheira, a fim de induzir o Juízo em erro.
Portanto, deve ser mantida a condenação em litigância de má-fé.
Por fim, lembre-se que a concessão da gratuidade judiciária não tem o condão de tornar o beneficiário infenso às penalidades processuais legais por atos de litigância de má-fé praticados no curso da lide (STJ, 4ª Turma, RMS n. 15.600, Relator Ministro Aldir Passarinho Jr., DJe 23-06-2008).
Não merece reparos, portanto, o decisum.
Sucumbência
Mantida como fixada.
Prequestionamento
Quanto ao prequestionamento, não há necessidade de o julgador mencionar os dispositivos legais e constitucionais em que fundamentam sua decisão, tampouco os citados pelas partes, pois o enfrentamento da matéria através do julgamento feito pelo Tribunal justifica o conhecimento de eventual recurso pelos Tribunais Superiores (STJ, EREsp nº 155.621-SP, Corte Especial, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 13-09-99).
Dispositivo
ANTE O EXPOSTO, voto por negar provimento ao recurso da parte autora.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7518098v4 e, se solicitado, do código CRC 3F73F680. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 20/05/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002874-67.2014.404.7004/PR
ORIGEM: PR 50028746720144047004
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Fábio Kurtz Lorenzoni |
APELANTE | : | MOACIR DESSIA |
ADVOGADO | : | JOÃO LUIZ SPANCERSKI |
: | ROSEMAR CRISTINA LORCA MARQUES VALONE | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 20/05/2015, na seqüência 314, disponibilizada no DE de 06/05/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal CELSO KIPPER |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7565140v1 e, se solicitado, do código CRC 1C582491. | |
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