Apelação Cível Nº 5023628-27.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO SCHONS
ADVOGADO: MARCIANO LEAL DE SOUZA
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária originalmente distribuída em 01/03/2016, número 0005583-31.2016.4.04.9999/RS com pedido de tutela antecipada objetivando a concessão de benefício assistencial, desde o requerimento administrativo, em 06/10/2015.
A sentença julgou extinto o feito sem julgamento de mérito, forte no art. 267, VI, do CPC/73, ao argumento da inexistência do interesse de agir da parte autora na esfera da competência delegada.
A parte autora apelou afirmando a competência da Comarca de Triunfo/RS para processar e julgar o feito.
Na sessão de 14/12/2016 a Sexta Turma desta Corte, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, declarando a competência da Comarca de Triunfo para processar e julgar o feito.
Prolatada nova sentença, em 14/06/2018 na vigência do NCPC, que julgou procedente o pedido de benefício assistencial, cujo dispositivo reproduzo a seguir:
ISSO POSTO, JULGO PROCEDENTE o pedido contido na AÇÃO PREVIDENCIÁRIA movida por JOÃO SCHONS contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, para condenar o réu a conceder, em favor do autor, o benefício de prestação continuada (artigo 20 da Lei nº 8.742/1993), a partir da DER (06/10/2015).
Sobre as parcelas vencidas e não pagas administrativamente, devem incidir os índices oficiais de remuneração básica, a partir de cada vencimento, até 25/03/2015, e, a partir de então, os créditos deverão ser corrigidos pelo IPCA-E, acrescidos de juros aplicados à caderneta de poupança, a contar da citação.
Em razão do deferimento da antecipação de tutela, o réu deverá implantar o benefício assistencial em favor do autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a contar da intimação, sob pena de multa diária.
Diante da sucumbência, condeno o réu ao pagamento dos honorários periciais e de honorários ao procurador do autor, que fixo em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até esta data (Súmula nº 111 do egrégio Superior Tribunal de Justiça), considerando a natureza da causa, o trabalho desenvolvido e o tempo de tramitação da demanda, forte no artigo 85, §§ 2º, incisos I a IV, e 3º, do Código de Processo Civil.
Isento o réu do pagamento das custas processuais, na forma do artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/1985, devendo arcar, porém, com as despesas do processo, nos termos do Ofício-Circular nº 011/2011-CGJ.
A Autarquia Previdenciária alegou, em apertada síntese, que o Autor não preencheu o requisito econômico exigido para a concessão do benefício previdenciário de Amparo Social, pois que a renda mensal auferida pelo grupo familiar em que inserida a parte recorrida é superior ao limite legal. Requereu o provimento do recurso para reformar a sentença na íntegra.
Na eventualidade, pugnou que a data de início do benefício seja fixada da data da citação.
Apresentada as contrarrazões, vieram os autos para esta Corte para julgamento.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento da apelação.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Benefício de prestação continuada ao idoso e ao deficiente (LOAS)
A Constituição Federal de 1988 dispôs em seu artigo 203:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A regulamentação desse dispositivo constitucional veio com a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, denominada Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), que, em seu artigo 20, passou a especificar as condições para a concessão do benefício, no valor de um salário mínimo mensal, à pessoa com deficiência e ao idoso com 70 anos ou mais comprovadamente carentes.
Após as alterações promovidas pelas Leis nº 9.720, de 30 de novembro de 1998, e nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), relativas à redução do critério etário para 67 e 65 anos, respectivamente, sobrevieram as Leis nº 12.435, de 06 de julho de 2011, e nº 12.470, de 31 de agosto de 2011, as quais conferiram ao aludido artigo 20, da LOAS, a seguinte redação, ora em vigor:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
(...)
Portanto, o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos:
1.a) idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor do Estatuto do Idoso) ou
1.b) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, conforme redação original do artigo 20, da LOAS, e, após as alterações da Lei nº 12.470, de 31-10-2011, tratar-se de pessoa com impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas);
2) Situação de risco social (ausência de meios para, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família).
Requisito etário
Tratando-se de benefício requerido na vigência do Estatuto do Idoso, é considerada idosa a pessoa com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. O requisito é objetivo, ou seja, comprovado o atributo etário, a análise do requisito incapacitante é desnecessária, bastando apenas verificar a situação de vulnerabilidade socioeconômica a que submetido o idoso.
Condição de deficiente
No que se refere à incapacidade para a vida independente constante no artigo 20, da Lei 8.742/93, em sua redação original, este Tribunal consolidou entendimento segundo o qual a interpretação que melhor se coaduna ao princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), de modo a assegurar a ampla garantia de prestação da assistência social (CF, art. 203) e atender ao objetivo da seguridade social de universalidade da cobertura e do atendimento (CF, art. 194, parágrafo único), é a que garante o benefício assistencial a maior gama possível de pessoas portadoras de deficiência. Sob essa orientação, ao analisar o caso concreto, cumpre ao julgador observar que a incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou que seja incapaz de locomover-se; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de expressar-se ou de comunicar-se; e (d) não pressupõe dependência total de terceiros (TRF4, EINF 0016689-58.2014.404.9999, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 29/05/2015).
A ratificação pelo Brasil, em 2008, da Convenção Internacional Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a qual fora incorporada ao nosso ordenamento jurídico com status de emenda constitucional (artigo 5º, § 3º, da Constituição Federal de 1988), conferiu ainda maior amplitude ao tema, visando, sobretudo, promover, proteger e assegurar o exercício pleno e equitativo dos direitos humanos e das liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência (Artigo 1, da Convenção).
Assim é que a Lei nº 12.470, de 2011, que alterou o §2º do artigo 20, da LOAS, e, mais recentemente, o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei n. 13.146, de 6 de julho de 2015, com início de vigência em 5 de janeiro de 2016), praticamente reproduziram os termos do artigo 1, da Convenção, redimensionando o conceito de pessoa com deficiência de maneira a abranger diversas ordens de impedimentos de longo prazo capazes de obstaculizar a plena e equânime participação social do portador de deficiência, considerando o meio em que este se encontra inserido.
Com a consolidação desse novo paradigma, o conceito de deficiência desvincula-se da mera incapacidade para o trabalho e para a vida independente - abandonando critérios de análise restritivos, voltados ao exame das condições biomédicas do postulante ao benefício -, para se identificar com uma perspectiva mais abrangente, atrelada ao modelo social de direitos humanos, visando à remoção de barreiras impeditivas de inserção social.
Nesse contexto, a análise atual da condição de deficiente a que se refere o artigo 20, da LOAS, não mais se concentra na incapacidade laboral e na impossibilidade de sustento, mas, senão, na existência de restrição capaz de obstaculizar a efetiva participação social de quem o postula de forma plena e justa.
Situação de risco social
Tendo em vista a inconstitucionalidade dos artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e do artigo 34, § único, da Lei 10.741/2003, reconhecida no julgamento dos REs 567985 e 580963 em 18.04.2013, a miserabilidade para fins de benefício assistencial deve ser verificada em cada caso concreto.
Nesse sentido, os cuidados necessários com a parte autora, em decorrência de sua deficiência, incapacidade ou avançada idade, que acarretarem gastos - notadamente com medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, entre outros -, configuram despesas a ser consideradas na análise da condição de risco social da família do demandante (TRF4, APELREEX 5002022-24.2011.404.7012, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 27/06/2013).
Também, o fato de a parte autora ser beneficiária e perceber renda proveniente do Programa Bolsa Família, não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social (TRF4, APELREEX 2009.71.99.006237-1, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 07/10/2014).
Logo, em linhas gerais, para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, a situação de risco social a que se encontra exposta a pessoa idosa ou portadora de deficiência e sua família deve ser analisada em cada caso concreto (TRF4, EINF 0016689-58.2014.404.9999, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 29/05/2015).
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
O julgador de origem decidiu pela procedência do pedido inicial. Nesse diapasão, nenhum reparo há a considerar na sentença recorrida. Para evitar tautologia, transcrevo trecho dos fundamentos, fazendo-os parte integrante de minhas razões de decidir, in verbis (evento 3, SENT25, p.1):
(...)
No caso, o autor possui mais de 65 anos de idade, porque nascido em 25/09/1950 (fl. 17). Além disso, no que diz respeito ao requisito “ser portador de deficiência (incapacidade para a vida independente e para o trabalho)”, verifico que está satisfeito, porquanto comprovado pelo estudo social de fls. 88-90, apontando que o autor sente fraqueza em todo o corpo e não tem a visão de um dos olhos, e pelos documentos de fls. 95-97 e 102-106, estes últimos dando conta de que o demandante é portador de neoplasia maligna do esôfago com lesão invasiva.
O segundo dos elementos essenciais à obtenção do benefício assistencial, qual seja, renda familiar mensal per capita inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo, restou igualmente comprovado.
O estudo social realizado (fls. 88-90) demonstra que o núcleo familiar é composto atualmente por duas pessoas – o autor e sua esposa –, sendo que a renda familiar é proveniente unicamente do benefício de prestação continuada recebido pela esposa, Ebe, com 67 anos, no valor de um salário mínimo nacional.
Sobre isso, a Assistente Social relatou a seguinte situação (fl. 89):
“Há poucos meses, Ebe, que ingressou com solicitação de BPC para idoso junto ao INSS, teve o benefício deferido e passou a receber um salario mínimo. Em virtude de honorários advocatícios, o valor do Benefício recebido tem descontos durante seis meses, segundo declaram. O restante do valor é utilizado para a alimentação do casal, sem consumo de carne e o pagamento da conta de Energia Elétrica de cerca de R$ 110,00.”
Diante disso, veio o seguinte parecer (fl. 90):
“Conforme relatos dos entrevistados acerca de um ano e meio o filho Adriano Schons, beneficiário do BPC para pessoa com deficiência não reside mais com o casal. Ebe Derlam Santos, 67 anos, esposa de João recebe o BPC para pessoa Idosa; portanto, conforme Lei 10.741/03, art. 34, parágrafo único, em relação aos requisitos socioeconômicos, salienta-se que a percepção de outro benefício assistencial para idoso não é computado para fins de apuração da renda familiar a que se refere o LOAS. Sendo assim, João cumpre, neste momento, todos os critérios para concessão do BPC para pessoa idosa.
Ao que se refere à situação familiar do autor, observou-se durante a visita que o casal vem passando por dificuldades financeiras decorrente da renda insuficiente que os impossibilita de ter suas necessidades básicas atendidas. A vulnerabilidade social relaciona-se ao ciclo de vida, dificuldade de obter os recursos materiais para garantir a sobrevivência; os recursos de direitos, em decorrência de seu nível de renda, que impossibilita garantir melhor qualidade de vida.”
Verifica-se, com efeito, que a renda per capita dos integrantes desse núcleo excede o limite de ¼ do salário mínimo (critério objetivo) estabelecido na LOAS. No entanto, ainda que a renda mensal per capita ultrapasse o mínimo legal, observo que a outra fonte de renda da família, pago à esposa do autor, é, igualmente, benefício assistencial ao idoso, o qual, por expressa disposição do artigo 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), não é computado para fins de apuração da renda familiar. De toda forma, o núcleo familiar em questão não apresenta condições favoráveis para suprir suas necessidades básicas, considerando a renda percebida e os gastos mensais necessários.
Entendo razoável considerar o critério objetivo preestabelecido com outros fatores indicativos do contexto socioeconômico – estes amparados por laudos, documentos e avaliação socioeconômica –, considerando ainda que o direito ao benefício de prestação continuada não pressupõe a verificação de um estado de miserabilidade extremo, bastando estar demonstrada a insuficiência de meios para o beneficiário, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Partindo dessas premissas, tenho por configurada a situação de risco social necessária à concessão do benefício ao autor.
Assim, atendidos os requisitos legais definidos pela Lei nº 8.742/1993, deve ser reconhecido o direito da parte autora ao benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Quanto ao termo inicial do benefício, para o caso de amparo social, as parcelas devidas restringem-se ao período em que todos os requisitos para sua concessão forem atendidos.
No caso em tela, deve remontar à data da DER (06/10/2015 – fl. 13), haja vista que o autor já preenchia os requisitos exigidos para o deferimento do benefício quando do requerimento.
(...)
Nessa senda, não se sustenta a tese do INSS no que se refere à renda do grupo familiar da parte autora, a qual afastaria o requisito de vulnerabilidade social.
Deflui do laudo social que o grupo familiar é composto por duas pessoas, o autor, Sr. João Schons e sua esposa Sra. Ebe, com 67 anos de idade quando do laudo, com uma única fonte de renda proveniente do benefício assistencial titulada pela esposa, de valor mínimo, para fazer frente aos gastos com alimentação, vestuário, gás, luz, água e medicação; o laudo relata as precárias condições de habitação na qual vive o casal (evento 3, LAUDPERI19).
Ademais, no tocante ao benefício de Amparo Social ao Idoso percebido pela esposa do requerente, apontado pela assistente social, deve preponderar o entendimento do TRF 4ª Região no sentido de se excluí-lo do cômputo da renda mensal do grupo familiar. Nesse sentido, precedente deste Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IDOSO. CRITÉRIO ECONÔMICO. RENDA PER CAPITA. EXCLUSÃO DO VALOR PERCEBIDO POR CONTA DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. O benefício assistencial é devido à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Em relação ao pressuposto econômico, o art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993 - LOAS estabelecia que seria considerada hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo. Entretanto, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993, assim como do art. 34 da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso, permitindo que o requisito econômico, para fins de concessão do benefício assistencial, seja aferido caso a caso. O valor percebido a título de benefício assistencial por membro da família não deve ser computado para fins de cálculo da renda per capita familiar. Comprovado o preenchimento dos requisitos legais, é devida a concessão do benefício assistencial, desde a DER. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014422-45.2016.404.9999, 5ª TURMA, (Auxílio Favreto) Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ, POR UNANIMIDADE, D.E. 01/03/2017, PUBLICAÇÃO EM 02/03/2017)
Assim, frente a esse contexto, aliado aos demais elementos carreados pelo estudo social, entendo que restou demonstrada a insuficiência de meios para o beneficiário, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, tenho por configurada a situação de risco social necessária à concessão do benefício.
Dessa forma, comprovados ambos os requisitos, a decisão recorrida que estabeleceu o benefício à parte autora, merece ser mantida hígida.
Termo inicial
Presentes os requisitos etário e a situação de risco social no caso em concreto, tem direito a parte autora ao benefício assistencial de prestação desde a DER em 06/10/2015 (evento 3, ANEXOS PET4, p.6), cumprindo ao INSS pagar as parcelas vencidas.
Nego provimento à apelação no ponto.
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94;
- INPC a partir de 04/2006, de acordo com a Lei n.º11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, sendo que o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, determina a aplicabilidade do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado, no recurso paradigma a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Interpretando a decisão do STF, e tendo presente que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial), o Superior Tribunal de Justiça, em precedente também vinculante (REsp 1495146), distinguiu, para fins de determinação do índice de atualização aplicável, os créditos de natureza previdenciária, para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização,deveria voltar a incidir, em relação a tal natureza de obrigação, o índice que reajustava os créditos previdenciários anteriormente à Lei 11.960/09, ou seja,o INPC.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde julho de 2009 até setembro de 2017, quando julgado o RE 870947, pelo STF (IPCA-E: 64,23%; INPC 63,63%), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Em data de 24 de setembro de 2018, o Ministro Luiz Fux, relator do RE 870947 (tema 810), deferiu efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos pela Fazenda Pública, por considerar que a imediata aplicação da decisão daquela Corte, frente à pendência de pedido de modulação de efeitos, poderia causar prejuízo "às já combalidas finanças públicas".
Em face do efeito suspensivo deferido pelo STF sobre o próprio acórdão, e considerando que a correção monetária é questão acessória no presente feito, bem como que o debate remanescente naquela Corte Suprema restringe-se à modulação dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade, impõe-se desde logo, inclusive em respeito à decisão também vinculante do STJ, no tema 905, o estabelecimento do índice aplicável - INPC para os benefícios previdenciários e IPCA-E para os assistenciais -, cabendo, porém, ao juízo de origem observar, na fase de cumprimento do presente julgado, o que vier a ser deliberado nos referidos embargos declaratórios.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgnoAgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Honorários Advocatícios
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária para 15% (quinze por cento) sobre as parcelas vencidas até a data da sentença, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Custas e despesas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS).
Da antecipação da tutela
Uma vez confirmado o direito ao benefício, resta mantida a antecipação dos efeitos da tutela, concedida no juízo de origem.
Prequestionamento
O prequestionamento da matéria segue a sistemática prevista no art. 1.025 do CPC/2015.
Conclusão
Nego provimento à apelação. Majorada verba honorária em 15% sobre o valor das parcelas vencidas, adequando consectários à orientação do STF no RE 870947, mantida a antecipação de tutela.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação, mantida a antecipação de tutela.
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Apelação Cível Nº 5023628-27.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO SCHONS
ADVOGADO: MARCIANO LEAL DE SOUZA
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IDOSO. RENDA PER CAPITA. EXCLUSÃO DO VALOR PERCEBIDO POR CONTA DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CONSECTÁRIOS.
1. Comprovados os requisitos da idade avançada e hipossuficiência econômica do grupo familiar, cabível a concessão do benefício assistencial.
2. O valor percebido a título de benefício assistencial por membro da família não deve ser computado para fins de cálculo da renda per capita familiar.
3. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR.
4. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E.
5. Estando pendentes embargos de declaração no STF para decisão sobre eventual modulação dos efeitos da inconstitucionalidade do uso da TR, impõe-se fixar desde logo os índices substitutivos, resguardando-se, porém, a possibilidade de terem seu termo inicial definido na origem, em fase de cumprimento de sentença.
6. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade negar provimento à apelação, mantida a antecipação de tutela, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 14 de novembro de 2018.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 14/11/2018
Apelação Cível Nº 5023628-27.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO SCHONS
ADVOGADO: MARCIANO LEAL DE SOUZA
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 14/11/2018, na sequência 243, disponibilizada no DE de 29/10/2018.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA, DECIDIU, POR UNANIMIDADE NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, MANTIDA A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 15:53:16.