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BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IRREGULARIDADE NA CONCESSÃO. MÁ-FÉ CONFIGURADA. RESTITUIÇÃO DOS VALORES. TRF4. 5033476-38.2018.4.04.9999...

Data da publicação: 07/07/2020, 07:33:26

EMENTA: BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IRREGULARIDADE NA CONCESSÃO. MÁ-FÉ CONFIGURADA. RESTITUIÇÃO DOS VALORES. 1. Verificado que a autora omitiu informações (de que era casada com segurado aposentado, com benefício no valor de quase dois salários mínimos) e que requereu o benefício assistencial em cidade diversa do seu domicílio, com fins de obtenção irregular de LOAS, resta afastada a presunção da boa-fé. Cabível a restituição dos valores indevidamente recebidos, por meio de descontos no benefício previdenciário ora titularizado pela demandante. (TRF4, AC 5033476-38.2018.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 25/07/2019)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5033476-38.2018.4.04.9999/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

APELANTE: IGNES MIRIAN DE LIMA BUSNELLO

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Trata-se de ação ordinária ajuizada por Ignes Mirian de Lima Busnello em face do INSS, em que requer que seja declarado inexigível o débito lançado pelo INSS a título de recebimento indevido de benefício assistencial, a cessação dos descontos efetuados na pensão por morte que titulariza e a devolução dos valores já debitados.

Narra na inicial que era titular de benefício assistencial ao idoso desde 09/2005 e que em 13/04/2013, com o óbito do marido, Sergio Antônio Busnello, requereu a pensão por morte e o cancelamento do LOAS. O pleito foi atendido pela autarquia e houve a implantação da pensão por morte a contar do óbito. No entanto, em 09/2016, passou a ter descontados de seu benefício mensalmente R$ 474,61, sob o argumento de que o benefício assistencial fora recebido de forma indevida.

No curso do processo, foi deferida a antecipação de tutela, para que cessados os descontos na pensão por morte titularizada pela autora (evento 3, Despadec6), comando que foi atendido pela autarquia (evento 3, Pet11).

O magistrado de origem, da Comarca de Encantado/RS, proferiu sentença em 01/06/2018, em que julgou improcedente o pedido, sob o fundamento de que cabível a restituição dos valores recebidos de forma irregular ante a verificação da má-fé da autora, que obteve o benefício assistencial mediante fraude. A demandante foi condenada ao pagamento de custas processuais, cuja exigibilidade encontra-se suspensa em virtude da concessão de gratuidade da justiça. Não houve condenação em honorários advocatícios (evento 3, Sent12).

A requerente apelou, sustentando que não restou comprovada a má-fé e que o critério miserabilidade para concessão de benefício assistencial não se restringe à aferição de que a renda per capita é inferior a 1/4 do salário mínimo. Aduz que, mesmo diante do pagamento indevido do benefício assistencial, os valores não podem ser restituídos de forma arbitrária pela autarquia em razão do caráter alimentar, devendo o INSS pleitear a cobrança em ação judicial própria. Pede a reforma da sentença, para que julgado procedente o pedido veiculado na inicial (evento 3, Apelação 13).

O Ministério Público opinou pelo desprovimento do recurso (evento 10, Parecer1).

Com contrarrazões (evento 3, Contraz14), os autos vieram a esta Corte para julgamento.

VOTO

Trata-se de apelação da parte autora.

CPC/2015

Conforme o art. 14 do CPC/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Logo, serão examinados segundo as normas do CPC/2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.

Tendo em vista que a sentença foi publicada posteriormente a esta data, o recurso será analisado em conformidade com o CPC/2015.

Controvérsia dos autos

A controvérsia recursal cinge-se à: a) verificação da regularidade da concessão do benefício assistencial à autora; b) atuação de boa-fé ou de má-fé pela requerente; e c) exigibilidade do débito lançado pela autarquia.

Caso concreto

A autora, Ignes Mirian de Lima Busnello, nascida em 18/06/1939, aos 66 anos de idade requereu benefício assistencial ao idoso em 19/09/2005, o qual foi concedido e mantido ativo até 12/04/2013 (evento 3, Contes7, p. 14). Com o óbito do marido, Sérgio Antonio Busnello, em 13/04/2013 (certidão de óbito, evento 3, AnexosPet4, p. 12), a demandante requereu a pensão por morte, em 24/04/2013, e o cancelamento do LOAS (evento 3, AnexosPet4, p. 18).

A pensão foi concedida, com DIB em 13/04/2013, ou seja, na data do óbito do instituidor, benefício com valor superior a um salário mínimo e meio (evento 3, AnexosPet4, p. 22).

No entanto, após o recebimento de denúncia de que a autora sempre residira em Encantado/RS com o marido, sem nunca ter se separado dele (casados desde 1959), e que requereu o benefício assistencial em Erechim/RS informando ser separada, o INSS a partir de 06/2014 passou a apurar a regularidade da concessão do benefício assistencial, oportunizando à autora prazo para defesa, que não foi apresentada, procedendo à regular procedimento administrativo (evento 3, Contes7, p. 15-50), que culminou com o lançamento de débito de R$ 57.482,91, relativo ao recebimento indevido do LOAS, dando início ao processo de cobrança.

Importa referir que os municípios gaúchos de Encantado e Erechim distam 240 quilômetros. Ademais, a autora requereu o benefício assistencial em 2005, sendo que o cônjuge já estava aposentado por tempo de contribuição desde 04/1995, percebendo benefício em valor superior a um salário mínimo e meio (evento 3, AnexosPet4, p. 11).

Tendo em vista que o magistrado de origem analisou de forma detalhada na sentença as provas carreadas aos autos, transcrevo framento do decisum, cujos fundamentos adoto como razões de decidir, verbis (evento 3, Sent12):

Da análise dos autos, verifica-se que, após o recebimento de denúncia pela APS de Encantado - no sentido de que a segurada sempre residiu naquela cidade e encaminhou o benefício de amparo social em Erechim, local onde não era conhecida, referindo ser separada do marido -, foi instaurado processo administrativo, sendo identificado indício de irregularidade, consistente no recebimento de benefício de amparo social ao idoso, por omitir no grupo familiar seu esposo Sergio Antonio Busnello, que possuía renda através de benefício.

No curso do processo administrativo, a demandante deixou de apresentar defesa ou recurso (fls. 80 e 85/86).

De igual sorte, nos autos da presente demanda, a autora não se manifestou acerca dos documentos juntados pelo INSS em réplica, nada referindo sobre a irregularidade constatada pela autarquia.

Assim, diante do conjunto probatório acostado nos autos, verifica-se que Ignes Miriam de Lima Busnello solicitou o benefício – LOAS em 19/09/2005 (fl. 64), data em que já estava casada com Sérgio Antônio Busnello – assento firmado em 30/09/1959 (fl. 28), sendo que, conforme apurado pela APS de Encantado (fls. 67/68), o casal nunca foi separado.

Desse modo, omitiu a autora a informação da manutenção do matrimônio com Sérgio Antônio Busnello, pois quando do requerimento do benefício LOAS, levado a efeito em cidade diversa daquela na qual sempre residiu, deixou de mencionar que o de cujus fazia parte de seu grupo familiar.

Saliento que, para a concessão do benefício de prestação continuada, consoante dispõe o artigo 20, §3º da Lei nº 8.742/93 é necessário que a renda familiar mensal seja inferior a ¼ do salário mínimo.

Logo, se a autora tivesse informado, ao demandado, o seu casamento com Sérgio Antônio Busnello – aposentado desde 20/04/1995, não faria jus ao benefício LOAS, pois não preencheria o requisito da renda familiar de ¼ do salário-mínimo nacional.

Dessarte, não há como presumir a boa-fé da autora quando da omissão de informações, vez que no processo constam somente provas documentais, das quais infere-se a sua má-fé.

Assim, considerando que foi obtido o benefício LOAS mediante fraude e não sendo possível conceber a hipótese de que a autora tenha agido de boa-fé, os valores indevidamente pagos e apurados devem por ela ser ressarcidos ao demandado.

Registro que, embora o benefício previdenciário tenha caráter alimentar, nos casos em que demonstrada a má-fé do segurado para sua concessão, é permitida a sua devolução. Nesses casos, é necessária a ponderação entre os valores da conduta contrária à boa-fé e o caráter alimentar do benefício, prevalecendo a necessidade de comportamento probo, honesto, conforme o princípio da eticidade nas relações sociais, não podendo ser obtido benefício de caráter alimentar mediante ação fraudulenta, conduta essa contrária, inclusive, à solidariedade social, que norteia o regime de repartição sob o qual se constitui o RGPS.

Ademais, não pode o direito favorecer aquele que se utiliza da fraude para a obtenção de algum bem jurídico.

Além disso, consoante dispõe o art. 115 da Lei n° 8.213/91, o INSS é competente para proceder ao desconto dos valores pagos indevidamente ao segurado, quando comprovada a sua má-fé.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO CANCELADO. FRAUDE CONSTATADA EM PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. POSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO DO BENEFÍCIO RECEBIDO INDEVIDAMENTE. MÁ-FÉ COMPROVADA. RESTITUIÇÃO DEVIDA. 1. Os valores pagos a título de benefício cancelado, diante da constatação de fraude na sua concessão, devem ser restituídos pelo segurado. 2. Embora o benefício previdenciário tenha caráter alimentar, nos casos em que demonstrada a má-fé do segurado para sua concessão fraudulenta é permitida a sua devolução. 3. Nos termos do art. 115 da Lei n° 8.213/91, o INSS é competente para proceder ao desconto dos valores pagos indevidamente ao segurado, pois comprovada a má-fé do segurado com provas que superam a dúvida razoável”. (TRF4, AC 5000504-90.2011.404.7208, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Ezio Teixeira, D.E. 09/05/2013) (grifei)

Não merece, pois, prosperar a presente demanda.

A boa-fé se presume. No entanto, diante dos elementos trazidos aos autos, de que a autora omitiu informações (que era casada com um segurado aposentado, cujo benefício tinha valor de quase dois salários mínimos), além de ter requerido o benefício em município diverso do seu domicílio (distante 240km deste), para obtenção irregular de benefício assistencial, a boa-fé resta afastada, sendo cabível a devolução dos valores recebidos por meio dos descontos no benefício ora titularizado pela autora, conforme referido na sentença. Mantida a sentença de improcedência.

Desprovido o apelo da autora e mantida a condenação em custas processuais, cuja exigibilidade resta suspensa em virtude da concessão de gratuidade da justiça.

Conclusão

Desprovido o apelo da parte autora.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da autora.



Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001171816v9 e do código CRC ab23ef1f.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 2/7/2019, às 18:16:7


5033476-38.2018.4.04.9999
40001171816.V9


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 04:33:26.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5033476-38.2018.4.04.9999/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

APELANTE: IGNES MIRIAN DE LIMA BUSNELLO

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

benefício assistencial. irregularidade na concessão. má-fé configurada. restituição dos valores.

1. Verificado que a autora omitiu informações (de que era casada com segurado aposentado, com benefício no valor de quase dois salários mínimos) e que requereu o benefício assistencial em cidade diversa do seu domicílio, com fins de obtenção irregular de LOAS, resta afastada a presunção da boa-fé. Cabível a restituição dos valores indevidamente recebidos, por meio de descontos no benefício previdenciário ora titularizado pela demandante.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 23 de julho de 2019.



Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001171817v5 e do código CRC 68aa4e94.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 25/7/2019, às 14:56:15


5033476-38.2018.4.04.9999
40001171817 .V5


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 04:33:26.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 23/07/2019

Apelação Cível Nº 5033476-38.2018.4.04.9999/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: IGNES MIRIAN DE LIMA BUSNELLO

ADVOGADO: Michele Rüdiger (OAB RS055771)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 23/07/2019, na sequência 43, disponibilizada no DE de 11/07/2019.

Certifico que a 5ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA , DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA AUTORA.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal GISELE LEMKE

Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 04:33:26.

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