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LOAS. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. COMPROVADOS OS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL. RECURSO DO INSS CONHECIDO E DESPROVI...

Data da publicação: 27/06/2024, 11:01:08

EMENTA: LOAS. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. COMPROVADOS OS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL. RECURSO DO INSS CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. O benefício assistencial, previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pela Lei 8.742/1993, é devido ao idoso (idade superior a 65 anos) e à pessoa com deficiência que não têm condições de prover o próprio sustento ou de tê-lo provido pela própria família. 2. Embora não esteja adstrito à perícia, a conclusão do laudo pericial somente poderá ser afastada pelo julgador com amparo em robusto contexto probatório, uma vez que o perito do juízo possui o conhecimento técnico necessário à solução da controvérsia e se encontra em posição equidistante das partes. 3. Situação em que restou comprovado o atendimento aos requisitos socioeconômico e de deficiência para concessão do benefício. (TRF4, AC 5055264-75.2018.4.04.7100, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relator VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, juntado aos autos em 19/06/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5055264-75.2018.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MARIA TERESA DOS SANTOS SILVA (Sucessão) (AUTOR)

APELADO: ALICIO DA SILVA VIANNA (Sucessor) (AUTOR)

RELATÓRIO

​Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS contra sentença proferida nos autos do Procedimento Comum nº 50552647520184047100, a qual julgou parcialmente procedente os pedidos da autora, tendo condenado o ora apelante a conceder o benefício de amparo assistencial NB 87/702.642.281-3 à apelada, à data retroativa de 17-8-2016.

Em suas razões, a parte apelante argumenta, em síntese, que a apelada não se enquadra como deficiente, por não apresentar impedimento de longo de prazo, além de não ser idosa, na forma da lei. Outrossim, assevera que não se enquadra em situação de miserabilidade, visto que a avaliação social foi realizada em 03-10-2019, mais de três anos após o requerimento de concessão do benefício pleiteado nos autos. (evento 109, APELAÇÃO1).

A parte apelada apresentou contrarrazões (evento 112, CONTRAZ1), alegando ter logrado êxito em comprovar o impedimento que a obstava de exercer atividade laborativa e que vivia em situação de vulnerabilidade desde a época do requerimento administrativo de concessão do benefício.

Ato contínuo, os autos foram remetidos a este e. Tribunal.

É o relatório.

VOTO

Cinge-se a controvérsia à irresignação do apelante quanto ao deferimento, pelo Juízo a quo, do benefício assistencial à parte apelada, por entender que a autora não teria cumprido os requisitos impostos no artigo 20 da Lei 8.742/93, em especial no diz respeito à idade, miserabilidade e deficiência permanente.

Inicialmente, incumbe trascrever a sentença objurgada (evento 100, SENT1), in verbis:

MARIA TERESA DOS SANTOS SILVA ajuíza a presente Ação Ordinária contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS visando à obtenção de provimento jurisdicional que condene a autarquia-ré a conceder-lhe o benefício de amparo assistencial devido ao deficiente físico e ao idoso, bem assim a indenizar o dano moral decorrente do indeferimento da prestação.

Alega ser portador(a) de moléstias que o(a) incapacitam para o exercício de atividade laborativa que lhe assegure a subsistência. Referiu que, apesar de sua notória condição de saúde, bem assim de sua situação de vulnerabilidade social, o INSS indeferiu o benefício assistencial requerido, sob o fundamento de que o(a) autor(a) não se inclui no critério insculpido no artigo 20, da Lei n.º 8.742/93. Requer, em decorrência a concessão do benefício de amparo assistencial (NB 87/702.642.281-3), previsto no art. 203, inciso V, da CF/88, desde a data do requerimento administrativo formulado para sua obtenção (17-08-2016). Junta documentos.

Deferido o benefício da gratuidade da justiça.

Devidamente citado, o INSS apresentou contestação no prazo legal, alegando, em preliminar, a incompetência do Juízo. No mérito, sustenta, em síntese, a improcedência total do pedido, forte em que o(a) autor(a) não preenche os requisitos legais para a concessão do amparo assistencial postulado. Junta cópia do processo administrativo.

Determinada a produção de prova pericial, o laudo médico restou anexado ao evento 40, tendo sido complementado no evento 52.

Considerando a necessidade de avaliação das condições sócio-econômicas do grupo familiar do(a) requerente, foi determinada a produção da prova pericial respectiva, tendo o laudo sido juntado ao evento 72, e posteriormente complementado no evento 85.

Dada vista ao MPF, este deixou de apresentar parecer nos presentes autos (evento 66).

Não havendo outras provas a serem produzidas, vieram-me os autos conclusos para sentença.

É o relatório.

Decido.

Trata-se de ação na qual a parte autora pretende obter a concessão do benefício de amparo assistencial.

PRELIMINAR - INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO

A preliminar de incompetência do Juízo suscitada pelo INSS não merece prosperar, porquanto, embora o valor das parcelas vencidas acrecidas de doze vincendas, considerando o montante do benefício pleiteado, efetivamente não superasse o limite de 60 (sessenta) salários-mínimos na data do ajuizamento da ação, a parte autora requereu na inicial a condenação do INSS ao pagamento de alegado dano moral decorrente do indeferimento da pretensão, em montante equivalente às parcelas antes referidas - que serviriam para a fixação do valor da causa, conforme bem ressaltado pela autarquia-ré -, motivo pelo qual, analisado o cálculo do evento 01 (CALC14), considero adequada a fixação do valor total da causa em R$ 70.061,72 (setenta mil sessenta e um reais e setenta e dois centavos), sendo clara a competência deste Juízo para instruir e julgar o feito.

BENEFÍCIO ASSISTENCIAL

O conceito do benefício pleiteado está no art. 20 da LOAS (Lei Orgânica de Assistência Social), "in verbis":

"Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 2º Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)

§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

(...)

§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2º deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (...)"

O benefício de caráter assistencial visa à manutenção da vida daqueles a que não há outra forma de garantia de dignidade, senão a intervenção do Estado, por meio de subsídio econômico, ou porque são idosos e não lhes é exigido permanência no mercado de trabalho, ou porque são absolutamente incapazes de desempenhar atividade econômica que lhes garanta a sobrevivência, em razão de doença incapacitante, física ou mental.

O direito ao benefício, portanto, decorre da presença simultânea e indissociável de dois requisitos, um de ordem excludente do mercado de trabalho (idade avançada ou incapacidade) e outro de ordem econômica, ou seja, a renda mensal individualizada insuficiente para prover o cidadão, somada à impossibilidade do grupo familiar de fazê-lo.

Inicialmente, verifico que é inequívoco que a autora se encontra total e permanentemente incapacitada para o exercício de sua atividade profissional habitual, tudo conforme conclusão do laudo médico pericial produzido em Juízo (evento 40, LAUDOPERIC1). Tal incapacidade, nas palavras do experto nomeado pelo Juízo, decorre do fato da autora apresentar cirrose hepática alcoólica, varizes esofagianas, diabetes mellitus não especificado e hipertensão essencial (primária) (CID/10 K70.3, I8, E14 e I10, respectivamente), o que a incapacita para o labor pelo menos desde o ano de 2015 (evento 40, LAUDOPERIC1, p. 03). Referiu, finalmente, o vistor judicial que o quadro clínico da autora a impede por longo prazo (superior a dois anos) de participar plena e ativamente na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, o que caracteriza deficiência para os fins do § 2º do artigo 20 da Lei n.º 8.742/93 (evento 52, RESPOSTA1).

A alegação do INSS de que a autora não está incapacitada para a vida independente não merece prosperar porque, segundo reiterado entendimento jurisprudencial, a incapacidade a que se refere o § 3º do art. 20 da LOAS é aquela que solicita atenção especial ao incapaz e não no sentido de que necessite de auxílio para quaisquer atos da vida, caso em que a regulamentação da norma constitucional esvaziaria o conteúdo protetivo do texto Constitucional.

Nesse sentido, os arestos que seguem:

"PREVIDENCIÁRIO. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NO ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. REQUISITOS. INCAPACIDADE LABORAL E PARA A VIDA INDEPENDENTE. INTERPRETAÇÃO DO ART. 20 DA LEI 8742/93 CONFORME A CONSTITUIÇÃO.

1. Não se conhece de parte do apelo que inova, introduzindo insurgência não veiculada contestação.

2. A doutrina constitucional, nacional ou estrangeira, é torrencial no sentido de que o legislador, em sua tarefa de concretização, está obrigatoriamente vinculado, antes de mais nada, ao texto constitucional, ou, em outras palavras, o texto constitucional limita a interpretação feita pelo legislador ao concretizar a norma constitucional (KONRAD HESSE). Em conseqüência, o legislador encontra-se vinculado ao conteúdo constitucionalmente declarado dos direitos fundamentais, e se aparta deste, cabe ao juiz protegê-lo, com o que é o juiz e não a lei a garantia última dos direitos (RUBIO LLORENTE).

3. A Constituição Federal exige apenas dois requisitos no tocante ao benefício assistencial de que trata o art. 203, V: (a) condição de deficiente (pessoa portadora de deficiência) ou idoso e (b) situação de desamparo (não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família). Ou seja, buscou a norma constitucional garantir o benefício assistencial a toda pessoa portadora de deficiência que não possuísse mínimas condições econômicas de subsistência, próprias ou de sua família.

4. A exigência, para a percepção do benefício, de ser a pessoa incapaz para a vida independente, se entendida como incapacidade para todos os atos da vida, não se encontra na Constituição. Ao contrário, tal exigência contraria o sentido da norma constitucional, seja considerada em si, seja em sintonia com o princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), ao objetivo da assistência social de universalidade da cobertura e do atendimento (CF, art. 194, parágrafo único, I) e à ampla garantia de prestação da assistência social (CF, art. 203, caput). Se aquela fosse a interpretação para a locução incapacitada para a vida independente, constante no art. 20 § 2º, da Lei 8.742/93, o legislador teria esvaziado indevidamente o conteúdo material do direito fundamental da pessoa portadora de deficiência, deixando fora do seu âmbito uma ampla gama de pessoas portadoras de deficiência incapacitante para o trabalho, e, em conseqüência, incorreria em inconstitucionalidade.

5. Segundo o princípio da interpretação conforme a Constituição - que tem suas raízes no princípio da unidade da ordem jurídica - nenhuma lei deve ser declarada inconstitucional quando ela pode ser interpretada em consonância com a Constituição.

6. O art. 203, V, da Constituição, naquilo que é objeto desta ação, refere-se a duas hipóteses: a) pessoa portadora de deficiência que comprove não possuir meios de prover à própria manutenção (primeira hipótese); b) pessoa portadora de deficiência que comprove que sua família não pode prover à sua manutenção (segunda hipótese). O § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93 diz respeito à segunda hipótese, centrada na incapacidade da família de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência. O § 2º do art. 20 da Lei 8.742/93, por sua vez, diz respeito à primeira hipótese, centrada na incapacidade da pessoa portadora de deficiência de prover à própria manutenção, que se traduz em uma incapacidade para o trabalho e em uma incapacidade econômica de prover à própria manutenção por outros meios. Esta incapacidade de prover à própria manutenção por outros meios (que não o trabalho) foi denominada pela lei de incapacidade para a vida independente. De forma que a incapacidade para a vida independente, para coadunar-se com o conteúdo da norma constitucional, deve ser interpretada não no sentido de incapacidade para a prática de todos os atos da vida, mas no sentido de incapacidade para prover à própria manutenção por meios diferentes do trabalho (pois a incapacidade para o trabalho encontra-se referida expressamente). A pessoa não está capacitada para a vida independente porque não possui condições econômicas para prover à própria manutenção.

7.(...)' (Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Apelação Cível n° 2000710550006373, Relator o Dr. Celso Kipper, 5ª Turma, DJU em 12.03.03, p. 742).

'PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. FATO INCONTROVERSO. CABIMENTO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REQUISITO DA INCAPACIDADE PARA A VIDA INDEPENDENTE. DISPENSA DE DILAÇÃO PROBATÓRIA.

É possível a impetração de mandado de segurança quando os fatos revelam-se desde logo incontroversos.

O §2º do art. 20 da Lei nº 8.742/93, ao dispor que, para efeito de concessão do benefício assistencial, "a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho", instituiu uma espécie de presunção de dependência das pessoas deficientes e idosas, as quais, ainda que possam cumprir normalmente as tarefas do cotidiano, reclamam, de modo constante, a atenção de terceiros, sejam parentes ou terceiros próximos a elas. (Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Apelação em Mandado de Segurança nº 2000.71.03.000803-0/RS, 5ª Turma, Relator o Desembargador Federal Paulo Brum Vaz, DJ2 nº 210, 21.11.2001, p. 368)

A própria Advocacia-Geral da União já editou administrativamente enunciado reconhecendo que a incapacidade necessária para a concessão do benefício assistencial é aquela que impossibilite prover a subsistência, ou seja, para o trabalho, nos seguintes termos:

"Enunciado n° 30. A incapacidade para prover a própria subsistência por meio do trabalho é suficiente para a caracterização da incapacidade para a vida independente, conforme estabelecido no art. 203, V, da Constituição Federal, e art. 20, II, da Lei nº 9.742, de 7 de dezembro de 1993."

Quanto à possibilidade da família em lhe prover a subsistência, já que a autora não pode fazê-lo por si, tenho que a mesma é inexistente, já que o laudo sócio-econômico produzido nos presentes autos (evento 72) atesta a carência econômica da requerente, que atualmente reside apenas com seu companheiro, sendo que toda a renda familiar provém do trabalho prestado informalmente pelo Sr. Alicio da Silva Vianna na atividade de reciclagem de lixo, equivalente a aproximadamente R$ 320,00 (trezentos e vinte reais) mensais, tendo referido a vistora judicial que "com relação à situação socioeconômica da autora, foi possível verificar que a renda auferida é proveniente do trabalho de catador de lixo de seu companheiro, não sendo este valor suficiente para cobrir todas as despesas básicas de sobrevivência. Autora se encontra em situação de extrema vulnerabilidade social. Recebe ajuda com alimentação e vestuário das cunhadas, da Igreja Católica Cristo redentor e do Posto de Saúde próximo a sua casa" (evento 72, LAUDO1, p. 09). Finalmente, esclareceu a experta que, à época do requerimento administrativo, residiam com a autora e seu companheiro mais quatro netos, que não recebiam qualquer auxílio de seus pais, o que, certamente, tornava ainda menor a renda mensal "per capita" naquela ocasião, visto que os rendimentos auferidos eram similares aos atuais (evento 85, INF1). Sendo assim, tenho que a situação de miserabilidade da autora - amplamente atestada pela perícia sócio-econômica realizada nos autos - inclui-se claramente dentre a presunção de carência absoluta contida no §4° do art. 20 da Lei 8.742/93.

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL

Alega o(a) autor(a) que, devido ao indeferimento/cancelamento do benefício previdenciário postulado nestes autos, obteve uma série de inconvenientes, inclusive dificuldades da manutenção própria e de seu grupo familiar. Em consequência de tais fatores, referiu como resultado danos à sua saúde, moral e qualidade de vida.

Com o respeito que parece merecer, a tese da parte autora, nesse particular, não prospera.

Ainda que reconhecido o direito que funda a sua pretensão principal - restabelecimento/concessão de benefício previdenciário -, não vislumbro a possibilidade de condenação do INSS em indenização por danos morais. Mesmo que tenha ocasionado um dilatado transtorno em sua vida o fato de o réu ter indeferido/cancelado o benefício, o dano moral não restou comprovado nos autos. Não houve demonstração de que o(a) autor(a) teve violadas sua honra, imagem ou intimidade pelos servidores do INSS, durante o decorrer do processo administrativo.

Entendo que a reposição da perda do(a) autor(a) em não ter percebido anteriormente o valor de seu benefício fica "ressarcida" com o pagamento de correção monetária e juros de mora das diferenças apuradas, tão-somente.

Não se pode falar em responsabilidade objetiva do Estado quando quer se trata de dano moral. Deve sim a parte que entende lesada provar que, em decorrência de um ato ilícito do Estado, houve perda moral ou ofensa a sua pessoa, capaz de determinar o seu ressarcimento, o que, 'in casu', não procedeu o(a) postulante.

Quanto à impossibilidade de condenação do réu à indenização decorrente de danos morais em face de indeferimento administrativo, em virtude da ausência de elementos probatórios que a justifique, já decidiram os Egrégios Tribunais Regionais Federais, cujas ementas abaixo transcrevo:

'CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. SUSPENSÃO DE BENEFÍCIO. AUSÊNCIA DE PRÉVIO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA. AGRAVO RETIDO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.

1. Presentes os requisitos legais, é de ser deferido o pedido de antecipação de tutela para restabelecimento de benefício previdenciário indevidamente suspenso.

2. Não comprovado que a suspensão do benefício foi precedida de regular procedimento administrativo, em que foi assegurada ampla defesa à segurada, é de ser reconhecido o direito do autor ao restabelecimento do benefício previdenciário e o pagamento dos valores não recebidos desde a data da suspensão.

3. Não é devida indenização por dano moral , se não demonstrada a existência de dano diverso do patrimonial.

4. Agravo retido provido

5. Apelação provida' (Tribunal Regional da 1ª Região; Apelação Cível n.º 01000075033; 1ª Turma Suplementar; Rel. Conv. Juíza. Magnólia Silva da Gama e Souza; DJ em 10.09.01, pág. 922).

'PREVIDENCIÁRIO - PENSÃO - SEGURADO DESEMPREGADO - DILAÇÃO DO PRAZO DE GRAÇA (art.15,§ DA LEI 8213/91)- DANO MORAL - DESCABIMENTO

I- O recebimento de auxílio desemprego é prova suficiente para demonstrar que o assegurado havia comunicado sua situação de desemprego, o o que permite a dilação do prazo de graça previsto no § 2º do art.15 da Lei 8213/91.

II - A recusa no deferimento de pensão por parte do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL- INSS não comporta o pagamento de dano moral , cabendo, tão-somente, a incidência de juros moratórios e correção monetária sobre as diferenças apuradas;

III - Apelação parcialmente provida' (Tribunal Regional da 2ª Região; Apelação Cível n.º 229751; 1ª Turma; Rel. Des. Fed. Ney Fonseca; DJU em 08.02.01).

'PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. LEI Nº 8.213/91. ARTS. 48 E 142 C/C 143. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA. CORREÇÃO MONETÁRIA. TERMO A QUO. DANOS MORAIS.

1. Restando comprovado nos autos, mediante início de prova material e coleta de prova testemunhal, o requisito idade e o exercício, pela parte autora, da atividade laborativa rurícola em período de, pelo menos, idêntico à carência - 90 meses - procede o pedido de concessão de aposentadoria rural por idade.

2. A correção monetária é devida a partir do vencimento de cada parcela.

3. O simples indeferimento administrativo da inativação pretendida não é suficiente, por si só, para caracterizar ofensa à honra ou à imagem do postulante, mostrando-se indevida qualquer indenização por dano moral . (Tribunal Regional da 4ª Região; Apelação Cível n.º 232487; 5ª Turma; Rel. Des. Fed. Tadaaqui Hirose; DJU em 23.02.00, pág. 675).

ANTE O EXPOSTO, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS formulados na presente ação ordinária, condenando o INSS a conceder ao(à) autor(a) MARIA TERESA DOS SANTOS SILVA o benefício de amparo assistencial NB 87/702.642.281-3, à data retroativa de 17-08-2016. Em decorrência da concessão acima determinada, deverá o réu pagar ao(à) autor(a) os valores relativos ao benefício, que é equivalente ao valor mensal do salário-mínimo, desde aquela data de concessão até a efetiva implementação em folha de pagamento.

O montante, a ser apurado, sofrerá a incidência da correção monetária, desde o período em que seriam devidas as respectivas parcelas, e dos juros moratórios a contar da citação. A atualização monetária se dará pela aplicação dos índices IGP-DI até 03/2006, INPC a partir de 04/2006, visto que a decisão do STF nas ADI’s nº 4.357 e 4.425 afastou a sistemática de correção monetária determinado pela redação dada pelo art. 5º da Lei n 11.960/2009 ao artigo 1º - F da Lei nº 9.494/97, e IPCA-E a contar de 07/2009, nos termos da decisão proferida pelo Colendo STF no julgamento do RE 870.947, representativo do Tema 810, com repercussão geral reconhecida. Saliento que a recente decisão que admitiu os embargos de declaração no RE acima referido no âmbito do STF não tem o condão de alterar a determinação de aplicação do IPCA-E. Os juros de mora serão devidos a contar da citação sendo utilizado como taxa (acaso ocorrida a citação anteriormente a junho/2009) 1% ao mês (Decreto-lei nº 2.322/87) até junho/2009 e, a partir de 01-07-2009, ocorrerá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, daqueles juros aplicáveis à caderneta de poupança, de forma não capitalizada, já que não houve o afastamento dos critérios da Lei nº 11.960 quanto aos juros, conforme decidido na Apelação Cível nº 0018722-55.2013.404.99994 (TRF4, AC 0018722-55.2013.404.9999, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 03/12/2013). Ressalte-se, no entanto, que até maio/2012, data de vigência da MP nº 567/2012, a taxa mensal é de 0,5% e, a partir de então, deve ser observada a variação determinado pelo inciso II do artigo 12 da Lei nº 8.177/91, na redação dada por aquela MP, convertida na Lei nº 12.703/12.

Fixação dos honorários: O Código de Processo Civil ora vigente estabeleceu inovação em relação à fixação dos honorários advocatícios, prescrevendo pormenorizadamente critérios de apuração, faixas de "valor da condenação" e limites mínimos e máximos dos percentuais, tudo no artigo 85. Acolhido o pleito da parte autora, resta estabelecer, desde logo a verba honorária, não apenas porque tenho por líquida a sentença que contém em si todos elementos necessários à apuração mediante simples cálculo aritmético (consoante reiterada posição jurisprudencial) como também a fim de evitar a instauração de uma fase de liquidação de sentença futura, que apenas postergaria a obtenção do resultado econômico, abrindo eventual nova via recursal ao INSS e privando a parte de ter, desde logo, acaso interposto recurso, majorada a verba, nos termos do § 11 do artigo 85.

Sendo o INSS considerado "Fazenda Pública", aplicáveis os §§ 3º e 4º, I, do artigo 85 do CPC/2015, incidindo o percentual dos honorários sobre o valor da condenação e, considerando para essa finalidade as prestações vencidas até a data da prolação da sentença (conforme a Súmula 111 do STJ, compatível com o CPC/2015).

Por conseguinte, tendo em conta os critérios dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85, inexistindo por ora motivo a ensejar diferenciado tratamento e majoração do percentual, os honorários advocatícios em favor da parte autora são fixados no percentual mínimo de cada uma das faixas de valor no § 3° daquele preceito, contadas as prestações vencidas até a presente data, aplicando-se a evolução tratada no § 5º.

Por outro lado, verificada a sucumbência parcial e a proibição da compensação da verba honorária entre as partes (art. 85, § 14), também é devido o pagamento, pela parte autora, dos honorários aos advogados públicos (§ 19), no percentual mínimo de cada uma das faixas de valor do § 3° do artigo 85, observada a diferença entre o valor da pretensão máxima deduzida na petição inicial e o da efetivamente deferida acima. Tendo sido regulamentada a questão da verba honorária das carreiras da advocacia pública (§ 19 do artigo 85) pela Lei nº 13.327/16, especialmente artigos 29 e seguintes, tais honorários devidos pela parte autora serão pagos em prol dos ocupantes dos cargos da advocacia pública, para posterior rateio nos moldes daquela legislação e regulamentação administrativa. A condenação tem sua exigibilidade suspensa, no entanto, face à gratuidade da justiça deferida, na forma do artigo 98, § 3º do CPC/2015, razão pela qual desnecessária a apuração em futura liquidação.

Da mesma forma os honorários periciais, provisoriamente fixados em R$ 248,53 (duzentos e quarenta e oito reais e cinquenta e três centavos, em janeiro/2019 - evento 11) e em R$ 248,53 (duzentos e quarenta e oito reais e cinquenta e três centavos, em julho/2019 - evento 54) e ora ratificados, serão suportados por ambas as partes. Tendo em conta a sucumbência, restam os honorários periciais distribuídos entre as partes na proporção de 60% (sessenta por cento) a serem satisfeitos pelo INSS e 40% pelo(a) demandante, na forma do "caput" do artigo 86 do CPC/2015. A quantia será atualizada monetariamente até o adimplemento, pela variação do INPC, sendo que os honorários periciais têm termo inicial de atualização na data do laudo e os advocatícios na prolação desta sentença. A condenação da parte autora tem sua exigibilidade suspensa, no entanto, face à gratuidade da justiça deferida, na forma do artigo 98, § 3º do CPC/2015.

Em virtude das restrições orçamentárias no exercício fiscal de 2020, os honorários periciais devem ser requisitados conforme o resultado do processo, pelo sistema da AJG ou por RPV. Em cumprimento à recomendação do e. Corregedor Regional, nos termos do Despacho nº 4034853, de 19/04/2018, no processo SEI nº 0001595-14.2018.4.04.80000, se: (I) apresentada apelação, requisite-se a íntegra dos honorários periciais no sistema AJG antes da remessa do processo ao TRF ou (II) se transitada em julgado nesta instância, requisitem-se, de imediato, os honorários periciais devidos pelo INSS por RPV e os devidos pela parte autora pelo sistema AJG.

Demanda isenta de custas.

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se, inclusive o MPF.

Havendo recurso(s) voluntário(s) tempestivo(s), intime(m)-se a(s) parte(s) contrária(s) para apresentação de contrarrazões. Acaso suscitadas em contrarrazões as matérias referidas no artigo 1.009, § 1º, do CPC/2015, dê-se vista a(s) parte(s) contrária pelo prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do § 2º do referido dispositivo legal. Juntados os eventuais recursos e as respectivas contrarrazões apresentadas no prazo legal devem ser os autos remetidos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Sentença não-sujeita a reexame necessário, pois inexiste a possibilidade do valor da condenação atingir o limite mínimo de mil salários-mínimos estabelecido para esta providência no artigo 496, § 3°, inciso I, do CPC/ 2015. Isso porque, em valores atualizados e acrescidos de juros de mora, o citado limite somente seria alcançado pela condenação ao pagamento do valor integral das prestações mensais pelo teto previdenciário devidas desde, ao menos, janeiro de 2005. Por estes motivos, deixo de aplicar a Súmula 490 do STJ.

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço do recurso interposto e passo à análise do apelo.

I - Mérito

A controvérsia posta sub judice cinge-se a verificar se a autora faz jus ao benefício assistencial de prestação continuada.

Inicialmente, cumpre registrar que o benefício assistencial está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal e é regulamentado pelo artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pelas Leis nos 12.435, de 06-7-2011, e 12.470, de 31-8-2011. Eis o teor dos referidos dispositivos:

Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:

(...)

V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.

§ 2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)

§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja: (Redação dada pela Lei nº 13.982, de 2020)

I - igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, até 31 de dezembro de 2020; (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)

§ 4o O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória.

§ 5o A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada.

§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS.

§ 7o Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura.

§ 8o A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido.

§ 9o Os rendimentos decorrentes de estágio supervisionado e de aprendizagem não serão computados para os fins de cálculo da renda familiar per capita a que se refere o § 3o deste artigo.

§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.

§ 11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015)

§ 12. São requisitos para a concessão, a manutenção e a revisão do benefício as inscrições no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal - Cadastro Único, conforme previsto em regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)

§ 14. O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)

§ 15. O benefício de prestação continuada será devido a mais de um membro da mesma família enquanto atendidos os requisitos exigidos nesta Lei. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)

Assim, tem-se que o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos:

1.1. Etário ou Condição de Deficiência

(a) idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor do Estatuto do Idoso), que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. O requisito é objetivo, ou seja, comprovado o atributo etário, a análise do requisito incapacitante é desnecessária, bastando apenas verificar a situação de vulnerabilidade socioeconômica a que submetido o idoso ou

(b) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, conforme redação original do artigo 20, da LOAS, e, após as alterações da Lei nº 12.470, de 31-10-2011, tratar-se de pessoa com impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas);

Saliente-se que a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei 8.742/93, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica jurisprudência do STJ (v.g. STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01-07-2002) e desta Corte (v.g. AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19-04-2006).

Desse modo, a incapacidade para a vida independente:

a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou seja incapaz de se locomover; b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene pessoal e vestir-se sozinho; c) não impõe a incapacidade de se expressar ou se comunicar; e d) não pressupõe dependência total de terceiros.

1.2. Situação de risco social

O art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, em sua redação original, estabelecia que se considerava hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo.

O Supremo Tribunal Federal, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do art. 20, § 3º da Lei 8.742/1993, assim como do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso.

No primeiro caso, o STF identificou a ocorrência de um processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro), assentando, assim, que o critério econômico presente na LOAS não pode ser tomado como absoluto, cabendo a análise da situação de necessidade à luz das circunstâncias fáticas.

É dizer, o critério objetivo de ¼ do salário mínimo per capita - que orientou a análise dos benefícios assistenciais por vários anos - é mantido, sem excluir, contudo, a análise subjetiva, caso a caso, dos aspectos socioeconômicos que cercam a subsistência da parte autora e de sua família.

No que tange ao art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", entendeu a Suprema Corte a existência de violação ao princípio da isonomia.

Isso porque, o dispositivo legal aludido abriu exceção apenas para o recebimento de dois benefícios assistenciais por idosos maiores de 65 anos, discriminando os portadores de deficiência e os idosos titulares de benefício previdenciário mínimo.

Assim, numa interpretação extensiva do referido artigo, eventual percepção de benefício previdenciário de valor mínimo por membro da família idoso (maior de 65 anos) ou inválido/deficiente deve, também, ser desconsiderado para fins de apuração da renda familiar.

Cito recentes precedentes a respeito da conclusão acerca da situação de risco social pelo magistrado verificada mediante a análise do estudo social apresentado e dos demais elementos de prova coligidos, in verbis (destaquei):

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA IDOSA. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO ANTERIOR À PERÍCIA SOCIAL. NÃO COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO. CERCEAMENTO DA DEFESA PELA NÃO PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL. INOCORRÊNCIA. REQUISITO SOCIOECONÔMICO. NÃO COMPROVAÇÃO MISERABILIDADE.
1. O benefício assistencial, previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e 2.regulamentado pela Lei 8.742/1993, é devido ao idoso (idade superior a 65 anos) e à pessoa com deficiência que não têm condições de prover o próprio sustento ou de tê-lo provido pela própria família.
2. Não há nulidade processual em face da não intimação prévia dos procuradores da autora acerca da data e hora da perícia socioeconômica, visto que não demonstrado prejuízo na produção da prova. Assim como, não há cerceamento da defesa pela não determinação de prova testemunhal, pois cabe ao magistrado determinar as provas necessárias ao feito.
3. Quanto ao requisito socioeconômico para concessão do amparo assistencial, o critério objetivo de ¼ do salário mínimo per capita - que orientou a análise dos benefícios assistenciais por vários anos - é mantido, sem excluir contudo, a análise subjetiva, caso a caso, dos aspectos socioeconômicos que cercam a subsistência da parte autora e de sua família.
4. A conclusão acerca da situação de risco social, para fins de percepção de benefício assistencial, compete apenas ao magistrado, mediante a análise do estudo social apresentado e dos demais elementos de prova coligidos. Situação de vulnerabilidade social não comprovada no caso concreto. (TRF4, AC 5004301-91.2021.4.04.9999, 11ª Turma, Rel. Des. Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO, DJe 07-12-2022).

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA IDOSA. REQUISITO SOCIOECONÔMICO. MISERABILIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO. 1. O benefício assistencial, previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pela Lei 8.742/1993, é devido ao idoso (idade superior a 65 anos) e à pessoa com deficiência que não têm condições de prover o próprio sustento ou de tê-lo provido pela própria família. 2. Quanto ao requisito socioeconômico para concessão do amparo assistencial, o critério objetivo de ¼ do salário mínimo per capita - que orientou a análise dos benefícios assistenciais por vários anos - é mantido, sem excluir contudo, a análise subjetiva, caso a caso, dos aspectos socioeconômicos que cercam a subsistência da parte autora e de sua família. 3. A conclusão acerca da situação de risco social, para fins de percepção de benefício assistencial, compete apenas ao magistrado, mediante a análise das provas coletadas. Situação de vulnerabilidade social não comprovada no caso concreto. (TRF4, AC 5004652-35.2019.4.04.9999, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relator MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS, juntado aos autos em 17-5-2023)

Feitas essas consideração preliminares, passo à análise da situação específica dos autos.

Maria Teresa dos Santos Silva ajuizou ação em face do INSS, postulando a concessão do benefício assistencial de prestação continuada à pessoa com deficiência (BPC/LOAS), com base no artigo 20 da nº Lei 8.742/1993.

Primeiramente, no que tange à incapacidade da apelada, consta dos autos que a mesma era portadora de cirrose hepática alcoólica, varizes esofagianas, diabetes mellitus não especificado e hipertensão essencial (primária) (CID/10 K70.3, I8, E14 e I10, respectivamente) o que a incapacitou para o labor pelo menos desde o ano de 2015 (evento 40, LAUDOPERIC1).

Ademais, o expert refere que a apelada, em razão das doenças crônicas que era portadora, apresentava dificuldades para realizar atividades corriqueiras, além de sofrer com dores abdominais, constipação, fadiga, dificuldade de locomoção sem auxílio e vômitos com presença de sangue, tendo referido, ainda, o caráter progressivo e incurável das moléstias.

Constato, portanto, que a apelada apresentava incapacidade para o trabalho e para a vida independente, por se tratar de pessoa com impedimento de longo prazo de natureza física, que a impediam de participar da sociedade de maneira plena e efetiva, em igualdade de condições com as demais pessoas, cumprindo o requisito imposto pelo artigo 20, da LOAS, e, após as alterações da Lei nº 12.470, de 31-10-2011.

No que tange ao requisito da situação de risco social, à luz do exposto no tópico 1.2, é necessário proceder a análise da situação de necessidade do postulante ao benefício, vez que o critério econômico presente na LOAS não é absoluto.

Na situação em apreço, ao contrário do alegado pelo INSS em seu recurso de apelação, ficou devidamente demonstrado nos autos que a apelada vivia em situação de vulnerabilidade social.

Conforme demonstrado pelo laudo elaborado pela assistente social (evento 72, LAUDO1), a renda familiar da apelada provinha exclusivamente do trabalho prestado informalmente por seu companheiro, que à época laborava como reciclador de lixo, auferindo aproximadamente R$ 320,00 (trezentos e vinte reais) mensais, tendo a assistente social referido que tal valor não era suficiente para cobrir as despesas básicas de sobrevivência do casal, sendo que recebiam ajuda com alimentação e vestuário das cunhadas, da Igreja Católica Cristo Redentor e do Posto de Saúde localizado próximo de sua residência.

Também ficou demonstrado que à epoca do requerimento administrativo de concessão do benefício, além do companheiro Sr. Alicio da Silva Vianna, também residiam com a apelada mais quatro netos, que não recebiam auxílio dos pais, sendo que a renda auferida pelo Sr. Alicio era similiar à constatada pela assistente social no laudo (evento 72, LAUDO1, conforme descrito na resposta aos quesitos complementares (evento 85, INF1).

No que diz respeito ao critério objetivo de ¼ do salário mínimo per capita, observa-se que a renda familiar da apelada, seja à época do requerimento administrativo, seja quando da elaboração do laudo pericial pela assistente social, é objetivamente inferior ao estabelecido na LOAS.

Finalmente, no que tange ao termo inicial de concessão do benefício, foi devidamente demonstrado nos autos que a apelada atendia os requisitos legais exigidos pela lei 8.742/1993 quando do requerimento na via administrativa, ou seja, em 17-8-2016. Neste sentido, verifica-se que, conforme reconhecido no laudo pericial (evento 40, LAUDOPERIC1), a apelada apresentava incapacidade desde 2015, ao passo que a condição de miserabilidade ta0mbém era preexistente.

Sendo assim, seja pela análise subjetiva dos aspectos socioeconômicos que circundavam a vida da apelada, seja pelo critério objetivo que diz respeito à renda familiar auferida, fica constatado que a autora encontrava-se em situação de risco social desde a época em que realizado o requerimento administrativo da concessão do benefício, além de sofrer com a já constatada incapacidade permanente para o labor.

Ademais, não houve prova produzida pela autarquia apta a elidir o quanto consignado nos elementos probantes supraditos, de modo que improcede o apelo do INSS em todos os seus aspectos.

II- Honorários Advocatícios

Desprovida a apelação, mantenho os ônus sucumbenciais conforme fixados na sentença. Contudo, levando em conta o trabalho adicional dos advogados na fase recursal, a verba honorária fica majorada em 1% (um por cento), conforme previsão do § 11 do artigo 85 do Código de Processo Civil, totalizando 11% (onze por cento) sobre a base de cálculo fixada. Esclareço que, nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, "não é exigível a comprovação de trabalho adicional do advogado do recorrido no grau recursal, tratando-se apenas de critério de quantificação da verba" (STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1.357.561/MG, Terceira Turma, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze,​​​​​​ DJe 19-4-2017).

III - Prequestionamento

Em face do disposto nas Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal e 98 do Superior Tribunal de Justiça, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a presente decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.

IV - Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso, nos termos da fundamentação.



Documento eletrônico assinado por VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004406784v74 e do código CRC b3daea78.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Data e Hora: 19/6/2024, às 16:18:39


5055264-75.2018.4.04.7100
40004406784.V74


Conferência de autenticidade emitida em 27/06/2024 08:01:07.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5055264-75.2018.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MARIA TERESA DOS SANTOS SILVA (Sucessão) (AUTOR)

APELADO: ALICIO DA SILVA VIANNA (Sucessor) (AUTOR)

EMENTA

loas. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. COMPROVADOS OS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL. RECURSO DO INSS CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. O benefício assistencial, previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pela Lei 8.742/1993, é devido ao idoso (idade superior a 65 anos) e à pessoa com deficiência que não têm condições de prover o próprio sustento ou de tê-lo provido pela própria família.

2. Embora não esteja adstrito à perícia, a conclusão do laudo pericial somente poderá ser afastada pelo julgador com amparo em robusto contexto probatório, uma vez que o perito do juízo possui o conhecimento técnico necessário à solução da controvérsia e se encontra em posição equidistante das partes.

3. Situação em que restou comprovado o atendimento aos requisitos socioeconômico e de deficiência para concessão do benefício.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 18 de junho de 2024.



Documento eletrônico assinado por VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004406785v6 e do código CRC e1362d02.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Data e Hora: 19/6/2024, às 16:18:39


5055264-75.2018.4.04.7100
40004406785 .V6


Conferência de autenticidade emitida em 27/06/2024 08:01:07.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 18/06/2024

Apelação Cível Nº 5055264-75.2018.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

PROCURADOR(A): DANIELE CARDOSO ESCOBAR

SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA: LUCIANA ZAIONS por MARIA TERESA DOS SANTOS SILVA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MARIA TERESA DOS SANTOS SILVA (Sucessão) (AUTOR)

ADVOGADO(A): LUCIANA ZAIONS (OAB RS086387)

ADVOGADO(A): ADRIANA GARCIA DA SILVA (OAB RS054703)

APELADO: ALICIO DA SILVA VIANNA (Sucessor) (AUTOR)

ADVOGADO(A): LUCIANA ZAIONS (OAB RS086387)

ADVOGADO(A): ADRIANA GARCIA DA SILVA (OAB RS054703)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 18/06/2024, na sequência 101, disponibilizada no DE de 07/06/2024.

Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO. ADVOGADA DISPENSOU A SUSTENTAÇÃO ORAL TENDO EM VISTA O RESULTADO FAVORÁVEL.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 27/06/2024 08:01:07.

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