Experimente agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PERÍCIA SOCIOECONÔMICA. SENTENÇA ANULADA. TRF4. 5076660-11.2018....

Data da publicação: 14/08/2020, 09:56:07

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PERÍCIA SOCIOECONÔMICA. SENTENÇA ANULADA. 1. É devido o benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência e ao idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Mostrando-se necessário o aprofundamento das investigações acerca das condições socioeconômicas, impõe-se a realização do estudo social. 3. Sentença anulada, para que o feito retorne ao juízo de origem e prossiga-se à sua regular instrução. (TRF4, AC 5076660-11.2018.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 06/08/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5076660-11.2018.4.04.7100/RS

RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: EDSON FAGUNDES DOS SANTOS (AUTOR)

ADVOGADO: DEBORA DE OLIVEIRA SCHULTZ (OAB RS090086)

ADVOGADO: THAIS PACHECO QUEVEDO (OAB RS111987)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de ação previdenciária ajuizada em 03/12/2018 contra o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, postulando a concessão de benefício assistencial ao portador de deficiência.

O juízo a quo, em sentença publicada em 07/11/2019, julgou improcedentes os pedidos. Condenou a parte autora ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, bem como ao ressarcimento dos honorários periciais. A exigibilidade de tais verbas, contudo, restou suspensa em virtude do deferimento da gratuidade de justiça.

A parte autora apelou sustentando que a incapacidade para atividade habitual restou comprovada pelo laudo judicial. Alega que apresentou acidente vascular cerebral no ano de 2014, que desde então apresenta impedimento de natureza física de longa duração, sem perspectiva de recuperação plena. Aponta que exigir seu retorno às suas atividades laborais anteriores é afronta à dignidade da pessoa humana, uma vez que necessitava de esforço físico para desempenhar as suas funções. Registra, ainda, que possui 55 anos e não é alfabetizado, o que configura uma grande barreira para o retorno das atividades laborais. Defende que a necessidade de produção perícia socioeconômica, a qual foi indeferida pelo juízo de origem. Requer seja decretada a nulidade da sentença, tendo em vista o cerceamento do direito à produção da prova, com reabertura da instrução processual e realização da perícia socioeconômica. Sucessivamente, requer o julgamento de total procedência com reconhecimento de seu direito ao benefício.

Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.

O MPF ofertou parecer pelo regular prosseguimento do feito (evento 4 desta instância).

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.

Do benefício assistencial devido à pessoa com deficiência

Os critérios de concessão do benefício assistencial estão previstos na Lei nº 8.742/1993, que assim dispõe:

Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.

§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

§ 3o Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.

§ 4o O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória.

§ 5o A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada.

§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS.

§ 7o Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura.

§ 8o A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido.

§ 9º A remuneração da pessoa com deficiência na condição de aprendiz não será considerada para fins do cálculo a que se refere o § 3o deste artigo.

§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.

Consoante se depreende da leitura desses dispositivos legais, a avaliação atinente à incapacidade da pessoa com deficiência deve ser feita considerando mais do que as condições médico-biológicas do requerente.

Incorporando o significado de pessoa com deficiência já previsto na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (promulgada pelo Decreto 6.949, de 25 de agosto de 2009), a nova redação dada ao artigo 20, §2º da LOAS pela Lei 12.470/2011 passou a associar o conceito de incapacidade a "impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas", do que se infere que a análise dos requisitos ao benefício deve alcançar fatores sociais, ambientais e familiares cuja influência seja tão negativa no desempenho da pessoa a ponto de impedir sua inserção na sociedade em igualdade de condições com os demais.

Há que se ponderar sobre a história de vida do requerente, seu contexto social e familiar, estabelecendo-se como premissa um conceito ampliado de incapacidade/deficiência que traduza a situação capaz de comprometer a funcionalidade do indivíduo na tentativa de prover o próprio sustento, quando não há também a possibilidade de tê-lo provido pelos seus familiares.

A nova legislação não tratou separadamente os requisitos da incapacidade e socioeconômico, mas tomando-os como aspectos integrantes e correlacionados de um mesmo pressuposto para a concessão do benefício de prestação continuada.

Do aspecto socioeconômico

O art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993, estabelecia que se considerava hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo.

O Supremo Tribunal Federal, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993 - LOAS, assim como do parágrafo único do art. 34 da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso.

No primeiro caso, o STF identificou a ocorrência de um processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro), assentando, assim, que o critério econômico presente na LOAS não pode ser tomado como absoluto, cabendo a análise da situação de necessidade à luz das circunstâncias em concreto.

Reconhecida a inconstitucionalidade do critério objetivo para aferição do requisito econômico do benefício assistencial, em regime de repercussão geral, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, avaliar os aspectos socioeconômicos que cercam a subsistência da parte autora e de sua família.

Quanto ao parágrafo único do art. 34, que estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", entendeu a Suprema Corte que violou o princípio da isonomia. Isso porque abriu exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais por idosos, mas não permitiu a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente ou de qualquer outro previdenciário. Em consequência, o STF afastou a restrição, com o que, qualquer benefício previdenciário ou assistencial, de até um salário mínimo, não deve ser considerado na renda familiar per capita.

Do caso concreto

A parte autora nasceu em 02/05/1964, contando, ao tempo do requerimento administrativo, formulado em 09/06/2014, com 50 anos de idade.

A incapacidade de prover a própria subsistência ou tê-la suprida de outra forma ficou comprovada, consoante atestados médicos juntados à inicial e perícia médica judicial.

Conforme documentos médicos (ev. 1., exmed17, exmed20, exmed 24, exmed25), datados de 13/06/2014, 20/02/2018 e 14/11/2017, o autor sofreu acidente vascular cerebral (CID 10 I 64) em abril de 2014, apresentando diminuição da força muscular em hemicorpo esquerdo, hemiparesia à direita, perda de audição bilateral neuro-sensorial, défict cognitivo, de fala e de memória.

Em prova pericial (ev.20), informou a médica perita, Dra. Isabel Cristina Driemeyer, especialista em neurologia, que a parte autora possui sequela de traumatismo de crânio e de acidente vascular cerebral, ocorrido em abril de 2014. Ao exame físico, verificou hemiparesia direita, linguagem com disartria e hipoacusia. Referiu a perita que não há perspectiva de recuperação da plena funcionalidade, que a perda de força no lado direito do corpo limita o exercício de atividade que demande esforços físicos e deambulação constante.

A perita considerou que a condição física do autor não impede toda e qualquer atividade laboral, sendo possível a reabilitação para atividades que não demandem esforço físico. Contudo observa-se que o demandante não é alfabetizado e exercia anteriormente a atividade de serviços gerais e funções de limpeza.

Tratando-se de pessoa de idade avançada, que não obteve durante sua vida laboral, maior grau de formação acadêmico-profissional, a permitir, hoje em dia, que venha a se dedicar a funções que não exijam esforço físico, cabível reconhecer-se o direito ao benefício postulado, pois são mínimas as chances de recolocação no mercado de trabalho, especialmente em funções burocráticas. Negar-se o benefício em casos tais equivaleria a condenar a parte autora a voltar a desempenhar as únicas atividades para as quais se qualificou ao longo de sua vida profissional, agravando cada vez mais seu quadro de saúde.

Não obstante comprovado o requisito da deficiência, verifica-se que não foi realizado estudo socioeconômico para verificar a situação de vulnerabilidade econômica alegada pelo autor.

Portanto, não se encontrando o processo pronto para julgamento, e considerando a necessidade de realização de estudo social no caso, deve ser anulada a sentença, determinando que seja reaberta a instrução processual, com a realização do referido estudo.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença a fim de que seja reaberta a instrução para a realização de estudo social.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Juíza Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001880645v20 e do código CRC 2fe193fe.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 6/8/2020, às 17:57:2


5076660-11.2018.4.04.7100
40001880645.V20


Conferência de autenticidade emitida em 14/08/2020 06:56:06.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5076660-11.2018.4.04.7100/RS

RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: EDSON FAGUNDES DOS SANTOS (AUTOR)

ADVOGADO: DEBORA DE OLIVEIRA SCHULTZ (OAB RS090086)

ADVOGADO: THAIS PACHECO QUEVEDO (OAB RS111987)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. necessidade de produção de perícia SOCIOECONÔMICA. sentença anulada.

1. É devido o benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência e ao idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.

2. Mostrando-se necessário o aprofundamento das investigações acerca das condições socioeconômicas, impõe-se a realização do estudo social.

3. Sentença anulada, para que o feito retorne ao juízo de origem e prossiga-se à sua regular instrução.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença a fim de que seja reaberta a instrução para a realização de estudo social, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 05 de agosto de 2020.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Juíza Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001880646v5 e do código CRC 0111888c.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 6/8/2020, às 17:57:2


5076660-11.2018.4.04.7100
40001880646 .V5


Conferência de autenticidade emitida em 14/08/2020 06:56:06.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 27/07/2020 A 05/08/2020

Apelação Cível Nº 5076660-11.2018.4.04.7100/RS

RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

PROCURADOR(A): RODOLFO MARTINS KRIEGER

APELANTE: EDSON FAGUNDES DOS SANTOS (AUTOR)

ADVOGADO: DEBORA DE OLIVEIRA SCHULTZ (OAB RS090086)

ADVOGADO: THAIS PACHECO QUEVEDO (OAB RS111987)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 27/07/2020, às 00:00, a 05/08/2020, às 14:00, na sequência 678, disponibilizada no DE de 16/07/2020.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA ANULAR A SENTENÇA A FIM DE QUE SEJA REABERTA A INSTRUÇÃO PARA A REALIZAÇÃO DE ESTUDO SOCIAL.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 14/08/2020 06:56:06.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Experimente agora