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Apelação Cível Nº 5070592-15.2017.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: VERIDIANA DA SILVA XAVIER
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra a sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de benefício assistencial a portador de deficiência, condenando a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como ao pagamento dos honorários advocatícios fixados em R$ 800,00, suspendendo a exigibilidade do pagamento em face da concessão da AJG.
Da sentença apelou a parte autora propugnando por sua reforma. Argumenta que a questão dos autos não passa pela existência ou não da incapacidade, uma vez que comprovado que se trata de segurado portador do vírus HIV, deve ser concedido o benefício, restando irrelevante a discussão acerca das condições de saúde do segurado. Sustenta, outrossim, que restou demonstrado o requisito da hipossuficiência familiar.
Sem contrarrazões de apelação, subiram os autos.
O Ministério Público Federal, com assento nesta Corte, opinou pelo provimento da apelação.
É o relatório.
VOTO
Controverte-se nos autos acerca do direito da parte autora à percepção de benefício assistencial a portador de deficiência.
A Constituição Federal instituiu o benefício assistencial ao deficiente e ao idoso nos seguintes termos:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A Lei n.º 8.742, de 7 de dezembro de 1993, veio a regular a matéria, merecendo transcrição o caput e os parágrafos 1º a 3º do art. 20, in verbis:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei n. 9.720, de 30.11.1998)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa cuja renda mensal per capita seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.(...)
A redação do art. 20 da LOAS, acima mencionado, foi alterada pelas Leis nº 12.435, de 06-07-2011 e nº 12.470, de 31-08-2011, passando a apresentar o seguinte teor:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 4o O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 5o A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2º, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
(...)
§ 8º A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
(...)
§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
No tocante ao idoso, o art. 38 da mesma Lei, com a redação dada pela Lei n.º 9.720, de 30 de novembro de 1998, dispunha (antes de ser revogado pela Lei 12.435/2011) que a idade prevista no art. 20 reduz-se para 67 anos a partir de 1º de janeiro de 1998. Esta idade sofreu nova redução, desta feita para 65 anos, pelo art. 34, caput, da Lei n.º 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), idade esta que deve ser considerada a partir de 1º de janeiro de 2004, data de início da vigência do Estatuto, nos termos do seu art. 118.
Portanto, o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação original do art. 20 da LOAS, ou aquela pessoa que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, consoante a redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) do autor e de sua família.
Acerca dos critérios para aferição da pobreza, vinha justificando a consideração do § 3º do art. 20 da LOAS, nos seguintes termos:
O Tribunal parece caminhar no sentido de se admitir que o critério de 1/4 do salário mínimo pode ser conjugado com outros fatores indicativos do estado de miserabilidade do indivíduo e de sua família para concessão do benefício assistencial de que trata o art. 203, inciso V, da Constituição.
Entendimento contrário, ou seja, no sentido da manutenção da decisão proferida na Rcl 2.303/RS, ressaltaria ao menos a inconstitucionalidade por omissão do § 3 do art. 20 da Lei n° 8.742/93, diante da insuficiência de critérios para se aferir se o deficiente ou o idoso não possuem meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, como exige o art. 203, inciso V, da Constituição.
A meu ver, toda essa reinterpretação do art. 203 da Constituição, que vem sendo realizada tanto pelo legislador como por esta Corte, pode ser reveladora de um processo de inconstitucionalização do § 3o do art. 20 da Lei n° 8.742/93.
Diante de todas essas perplexidades sobre o tema, é certo que o plenário do Tribunal terá que enfrentá-lo novamente.
Ademais, o próprio caráter alimentar do benefício em referência torna injustificada a alegada urgência da pretensão cautelar em casos como este.
(STF, Rcl 4374 MC/PE, Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJ 06-02-07)
Nesse sentido, a orientação consolidada do Superior Tribunal de Justiça:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. LOAS. ASSISTÊNCIA SOCIAL. PREVISÃO CONSTITUCIONAL. AFERIÇÃO DA CONDIÇÃO ECONÔMICA POR OUTROS MEIOS LEGÍTIMOS. VIABILIDADE. PRECEDENTES. PROVA. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N.º 7/STJ. INCIDÊNCIA.
1. Este Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido de que o critério de aferição da renda mensal previsto no § 3.º do art. 20 da Lei n.º 8.742/93 deverá ser observado como um mínimo, não excluindo a possibilidade de o julgador, ao analisar o caso concreto, lançar mão de outros elementos probatórios que afirmem a condição de miserabilidade da parte e de sua família.
2. "A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo." (REsp 1.112.557/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 20/11/2009).
3. "Em respeito aos princípios da igualdade e da razoabilidade, deve ser excluído do cálculo da renda familiar per capita qualquer benefício de valor mínimo recebido por maior de 65 anos, independentemente se assistencial ou previdenciário, aplicando-se, analogicamente, o disposto no parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso." (Pet 2.203/PE, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 11/10/2011).
4. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no Ag 1394595/SP2011/0010708-7, Min. Og Fernandes, Sexta Turma, DJ de 09-05-2012)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. LOAS. ASSISTÊNCIA SOCIAL. PREVISÃO CONSTITUCIONAL. AFERIÇÃO DA CONDIÇÃO ECONÔMICA POR OUTROS MEIOS LEGÍTIMOS. VIABILIDADE. PRECEDENTES. PROVA. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N.° 7/STJ.INCIDÊNCIA. REPERCUSSÃO GERAL. RECONHECIMENTO. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. SOBRESTAMENTO. NÃO APLICAÇÃO.
1. Este Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido de que o critério de aferição da renda mensal previsto no § 3.° do art. 20 da Lei n.° 8.742/93 deverá ser observado como um mínimo, não excluindo a possibilidade de o julgador, ao analisar o caso concreto, lançar mão de outros elementos probatórios que afirmem a condição de miserabilidade da parte e de sua família.
2. "A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo." (REsp 1.112.557/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 20/11/2009).
3. Assentando a Corte Regional estarem demonstrados os requisitos à concessão do benefício assistencial, verificar se a renda mensal da família supera ou não um quarto de um salário-mínimo encontra óbice no Enunciado n.° 7 da Súmula da Jurisprudência deste Tribunal.
4. O reconhecimento de repercussão geral pelo colendo Supremo Tribunal Federal, com fulcro no art. 543-B do CPC, não tem o condão de sobrestar o julgamento dos recursos especiais em tramitação nesta Corte.
5. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1267161/PR, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 13/09/2011, DJe 28/09/2011)
Recentemente, o Egrégio Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 567985/MT (18-04-13), com repercussão geral reconhecida, revendo o seu posicionamento anterior (ADI nº 1.232/DF e Reclamações nº 2303/RS e 2298/SP), reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93, que estabelecia a renda familiar mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo para a concessão de benefício a idosos ou deficientes, em razão da defasagem do critério caracterizador da miserabilidade contido na mencionada norma. Segundo o Relator do acórdão, Min. Gilmar Mendes, os programas de assistência social no Brasil utilizam atualmente o valor de meio salário mínimo como referencial econômico para a concessão dos respectivos benefícios, tendo referido o Programa Nacional de Acesso à Alimentação - Cartão Alimentação (Lei n.º 10.689/03), o Programa Bolsa Família - PBF (Lei n.º 10.836/04), o Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à Educação - Bolsa Escola (Lei 10.219/2001), Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à Saúde - Bolsa Alimentação (MP 2.206-1/2001) Programa Auxílio-Gás (Decreto n.º 4.102/2002), Cadastramento Único do Governo Federal (Decreto 3.811/2001).
Assim, inexistindo critério numérico atual tido por constitucional pelo STF, como referencial econômico para aferição da pobreza, e tendo sido indicada a razoabilidade de considerar o valor de meio salário mínimo per capita, utilizado pelos programas de assistência social no Brasil, tal parâmetro também deve ser utilizado como balizador para aferição da miserabilidade para a concessão de benefício assistencial, conjugado com outros fatores indicativos da situação de hipossuficiência.
Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal por decisões monocráticas de vários de seus Ministros vinha mantendo decisões que excluíam do cálculo da renda familiar per capita os valores percebidos por pessoa idosa a título de benefício previdenciário de renda mínima, não as considerando atentatórias à posição daquele Excelso Tribunal (Reclamação 4270/RN, Rel. Ministro EROS GRAU).
Mais do que isso, recentemente (sessão de 18-04-13), no julgamento do RE 580963/PR, o Pretório Excelso, por maioria de votos, reconheceu e declarou incidenter tantum a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 da Lei nº 10.741/03 (Estatuto do idoso), por reputar violado o princípio da isonomia, uma vez que o legislador abrira exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais de idoso, mas não permitira a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente ou de qualquer outro previdenciário.
Aponto, apenas, que a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 da Lei 10.741/2003 deu-se por omissão parcial, permitindo sua interpretação de forma extensiva. Assim, o critério da exclusão dos benefícios assistenciais continua sendo aplicado, mas não somente ele, admitindo-se, extensivamente, em razão da omissão declarada.
Assim, no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima (EIAC nº 0006398-38.2010.404.9999/PR, julgado em 04-11-2010), ou de benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (EIAC N.º 2004.04.01.017568-9/PR, Terceira Seção, julgado em 02-07-2009. Ressalto que tal pessoa, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerada na composição familiar, para efeito do cálculo da renda per capita.
Por outro lado, não podem ser incluídos no cálculo da renda familiar os rendimentos auferidos por irmãos ou filhos maiores de 21 anos e não inválidos, bem assim por avós, tios, sobrinhos, primos e outros parentes não relacionados no art. 16 da Lei de Benefícios, conforme disposto no art. 20, § 1º, da Lei n.º 8.742/93, na redação dada pela Lei n.º 9.720, de 30-11-1998, ao entender como família, para efeito de concessão do benefício assistencial, o conjunto de pessoas, que vivam sob o mesmo teto, elencadas no art. 16 da Lei de Benefícios - entre as quais não se encontram aquelas antes referidas.
O egrégio Supremo Tribunal Federal tem assentado, por decisões monocráticas de seus Ministros, que decisões que excluem do cálculo da renda familiar per capita os rendimentos auferidos por pessoas não relacionadas no art. 16 da Lei de Benefícios não divergem da orientação traçada no julgamento da ADI 1.232-1, como se constata, v. g., de decisões proferidas pelos Ministros GILMAR MENDES (AI 557297/SC - DJU de 13-02-2006) e CARLOS VELLOSO (Reclamação 3891/RS - DJU de 09-12-2005).
Porém, a partir da entrada em vigor da Lei n.º 12.435, de 06-07-2011, que alterou a redação do art. 20, § 1º, da Lei n.º 8.742/93, o conceito de família, para efeito de concessão do benefício assistencial, passou a ser o conjunto de pessoas, que vivam sob o mesmo teto, ali elencadas ("Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.").
Ressalto, outrossim, que cuidados que se fazem necessário com a parte autora, em decorrência de sua deficiência, incapacidade ou idade avançada, geram despesas com aquisição de medicamentos, alimentação especial, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, entre outros -, tais despesas podem ser levadas em consideração na análise da condição de miserabilidade da família do demandante. Referido entendimento não afronta o entendimento do Supremo Tribunal Federal esposado na ADI 1.232-1, como demonstram as decisões monocráticas dos Ministros CARLOS VELLOSO (Reclamação 3891/RS - DJU de 09-12-2005), CELSO DE MELLO (Reclamações 3750/PR, decisão de 14-10-2005, e 3893/SP, decisão de 21-10-2005) e CARLOS BRITTO (RE 447370 - DJU de 02-08-2005).
Destaca-se, por fim, que eventual circunstância de a parte autora ser beneficiária e perceber renda proveniente do Programa Bolsa Família, não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social.
Do caso concreto
VERIDIANA DA SILVA XAVIER, atualmente com 23 anos de idade (nascimento em 29-11-1994 - ev. 3 - anexos pet4), profissão: serviços gerais, vivendo em união estável, ingressou com ação de concessão de benefício assistencial ao deficiente em face do INSS, com o objetivo de obter a concessão do benefício assistencial por ser portadora do CID 10 - Z21- Estado de infecção assintomática pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV).
A autora requereu administrativamente o benefício em 18-09-2014, tendo sido indeferido pelo INSS porque não comprovada a incapacidade para o trabalho e para a vida independente.
Do exame do laudo pericial judicial, extremamente sucinto, acostado no ev. 3 (laudperi15), verifica-se que a autora embora apresente o diagnóstico "Síndrome da Imuno Deficiência Adquirida B24", não há incapacidade laborativa.
Em que pese conste do laudo pericial judicial que a requerente demonstra condições para estar inserida no mercado de trabalho, a fim de melhor examinar a questão posta no feito, há precedente da Turma Regional de Uniformização da 4ª região reafirmando o entendimento de que há necessidade de se avaliar adequadamente as condições pessoais e sociais, bem como o grau de restrição para o trabalho do segurado portador de doença pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV):
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO REGIONAL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA. PORTADOR DE hiv. CONSIDERAÇÃO DAS CONDIÇÕES PESSOAIS, SOCIAIS E GRAU DE RESTRIÇÃO PARA TRABALHO. PRECECENTES DA TRU E DA TNU. 1. "A configuração da incapacidade laboral, com o intuito de concessão do benefício de auxílio-doença, encontra-se caracterizada quando são evidenciadas restrições para o desempenho de tarefas que compõem as atividades laborais habituais do segurado, segundo a avaliação das condições pessoais de segurado, tais como tipo de moléstia, grau de comprometimento, tipo de atividade exercida, bem como do grau de restrição para o trabalho, de acordo as atividades que vinha desenvolvendo até o momento, não podendo a incapacidade para o trabalho ser avaliada tão somente do ponto de vista médico." (IUJEF 0000926-76.2010.404.7050, Relatora Luísa Hickel Gamba, D.E. 15/12/2011) 2. Precedentes da TNU: PEDILEF 50108579720124047001, Relator Juiz Federal Adel Américo de Oliveira, DJ 26/10/2012; e PEDILEF 0021275-80.2009.4.03.6301, Relatora Juíza Federal Kyu Soon Lee, publicada no DOU, de 21/06/2013, Seção 1, p. 117). 3. O acórdão recorrido, ao fundamentar o provimento do recurso do réu com base apenas na conclusão do laudo da perícia judicial, contraria a jurisprudência atual desta TRU e da TNU. 4. Reafirmação do entendimento desta Turma Regional de que há necessidade de se avaliar adequadamente as condições pessoais e sociais, bem como o grau de restrição para o trabalho do segurado portador de doença pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV). 5. Incidente conhecido e provido. Determinação de retorno dos autos à Turma Recursal de origem. ( 5030193-27.2011.404.7000, TURMA REGIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO DA 4ª REGIÃO, Relator p/ Acórdão ANDRÉ DE SOUZA FISCHER, juntado aos autos em 07/08/2013)
O entendimento da c. TNU é no sentido de que a estigmatização da doença relacionada ao vírus HIV por si só não autoriza a presunção de incapacidade laborativa. Compreende, também, que os portadores do vírus da AIDS, mesmo que assintomáticos, devem ter sua incapacidade aferida com base nas condições pessoais, sociais, econômicas e culturais (PEDILEF n. 5003198-07.2012.4.04.7108, JUIZ(A) FEDERAL KYU SOON LEE, DOU 17/9/2014; PEDILEF n. 0021275-80.2009.4.03.6301, julgamento: 12/6/2013. DOU 21/6/2013; PEDILEF n. 0502848-60.2008.4.05.8401, julgamento: 9/10/2013. DOU 28/10/2013).
Nesse sentido, a Turma Nacional de Uniformização editou a Súmula 78, com a seguinte redação:
Súmula 78. Comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisar a incapacidade em sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença.
Assim, é essencial averiguar, além do estado de saúde da apelante, suas condições pessoais. Na hipótese dos autos, a apelante Veridiana, 22 anos, grau de instrução: ensino fundamental incompleto, casada com Rudimar da Silva Osório, união de quatro anos, possui uma filha registrada apenas no nome da mãe. A família reside em casa própria, terreno de invasão, sendo a família beneficiária do Programa Bolsa Família no valor de R$ 200,00. Descobriu que possuía HIV positivo no parto da filha, sendo que a menina foi tratada desde o nascimento e hoje, não possui HIV, sendo que após a descoberta da doença se separou do pai de Vitória, com quem não tem contato algum e o mesmo não possui vínculo com a filha, Vitória reconhece Rudimar como pai e não sabe dos fatos acontecidos, relata ainda que na época trabalhava em um restaurante e que quando os proprietários souberam da doença dispensaram os serviços da mesma. Refere dificuldades de inclusão no mercado de trabalho em razão do preconceito que sofre em decorrência do HIV, refere que realiza acompanhamento no posto PAI e que no momento está fazendo uso de medicação, relata que possui ínguas pelo corpo e que lhe causam desconforto e dor, durante o dia realiza os afazeres da casa e os cuidados da filha. (grifei)
Constou, ainda, do estudo social, in verbis:
Veridiana vivencia situação de vulnerabilidade por sua trajetória de vida, família é beneficiária de Programa Social Bolsa Família o que auxilia no seu sustento, o pai biológico de sua filha não auxilia financeiramente, renda do núcleo familiar é oriunda do trabalho como servente de Rudimar, o mesmo não possui vínculo empregatício, moradia da família precária mas limpa e organizada, Vitória está inserida na rede municipal de educação, Veridiana relata sofrer preconceito em relação a sua doença o que compromete sua inclusão no mercado de trabalho, não possuem auxílio de demais familiares. Em relação à renda per capta conforme informações da família a mesma é de R$ 300,00.
Nesse contexto, considerando a pouca instrução, a restrita experiência profissional, bem como a difícil colocação no mercado de trabalho, agravada à estigmatização que ainda existe dos portadores de HIV, a solução mais acertada é a reforma da sentença para condenar o INSS à implantação do benefício.
Referido entendimento está em consonância com recente jurisprudência do STJ, conforme se vê da decisão a seguir transcrita, com publicação no Dje de 13-03-2018, in verbis:
Trata-se de agravo manejado pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, contra decisão que não admitiu recurso especial, este interposto com fundamento no art. 105, III, a, da CF, desafiando acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim ementado (fl. 256):
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PORTADOR DE HIV. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Ainda que a perícia médica judicial tenha atestado a ausência de incapacidade do segurado, portador do vírus do HIV, é possível conceder o benefício por incapacidade, considerando as condições pessoais, o estigma social da doença e a dificuldade de inserção no mercado de trabalho.
2. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante.
Precedentes do STJ e do TRF da 4- Região.
3. Invertidos os ônus sucumbenciais, os honorários advocatícios são fixados em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas (Súmulas 111, do STJ e 76 do TRF4).
4. Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do CPC.
Nas razões do recurso especial, aponta o recorrente violação ao art. 42 da Lei 8.213/91, na medida em que o acórdão recorrido concedeu "aposentadoria por invalidez para a parte autora, mesmo tendo o laudo pericial afirmado a inexistência de incapacidade laboral" (fl. 265).
Aduz que "O acórdão recorrido deferiu à parte autora o benefício de aposentadoria por invalidez, com fundamento no artigo 42 da lei previdenciária, sem exigir, no entanto, a comprovação de incapacidade total e permanente" (fl. 266).
Devidamente intimada, a parte recorrida apresentou contrarrazões, conforme petição de fls. 273/285.
É o relatório.
A irresignação não merece prosperar.
Defende a autarquia que deve prevalecer a conclusão do laudo pericial de que a autora é parcialmente capaz para atividade laborativa, uma vez que o benefício não deve ser concedido à pessoa que não estiver total e permanentemente incapacitada para o trabalho.
Entretanto, é importante ressaltar que o juiz não está adstrito às conclusões da perícia técnica e pode se pautar em outros elementos de prova aptos à formação de seu livre convencimento, estando autorizado a concluir pela incapacidade laborativa fundado no conjunto probatório produzido nos autos e nas particularidades do caso concreto. AgRg no AREsp 136.474/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/06/2012, Dje 29/06/2012.
Na espécie, o Tribunal de origem, com base no conjunto fático-probatório dos autos, concluiu que, embora o laudo pericial não atestasse incapacidade total e permanente da parte autora para a atividade laboral, outros aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado, impunham o reconhecimento do direito ao benefício pleiteado, conforme se vê do seguinte excerto do acórdão recorrido (fl. 250/252):
CASO CONCRETO
Trata-se de trabalhador avulso, portuário, atualmente com 48 anos de idade, que postula a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez desde a DCB, em 30/03/2013. Sucessivamente, requer o restabelecimento do benefício de auxílio-doença desde a mesma data.
A perícia judicial, realizada por médico do trabalho, em 17/06/2016 (evento 22), atesta que o autor está acometido de infecção assintomática pelo vírus da imunodeficiência humana, HIV, CID Z21, desde 2006. Quanto à incapacidade, conclui que está apto para a atividade profissional informada.
A sentença julgou a ação improcedente, com base na perícia judicial que concluiu pela ausência de incapacidade laboral.
Inicialmente, oportuno salientar que o julgador não está vinculado às conclusões dos peritos, podendo formar sua convicção com outros elementos ou fatos . demonstrados nos autos (art. 479 do CPC ).
Destaque-se que o diagnóstico indicando a existência de HIV, por si só, não presume incapacidade laborativa, principalmente quando a doença está em seu estado assintomático, o que é o caso do apelante, conforme afirmado pelo médico perito.
Contudo, ainda que assintomática, a situação do portador de doença pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV), tem ensejado a concessão do benefício, diante de certas condições pessoais e sociais, nos termos da jurisprudência deste Tribunal.
(...).
Nesse sentido, também é o entendimento da Turma Nacional de Uniformização da 4ª- Região, expresso na Súmula 78, consignando que Comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisar a incapacidade em sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença.
Assim, é essencial averiguar, além do estado de saúde do apelante, suas condições pessoais. Na hipótese dos autos, o autor possui 48 anos, ensino fundamental incompleto e sua experiência profissional limita-se ao trabalho portuário - arrumador, cuja última atividade informada foi em 16/06/2016.
Registre-se que o perito judicial informa a existência de redução da mobilidade do cotovelo direito, a qual determina incapacidade laborativa para atividades que demandem transporte manual de carga.
Portanto, a limitação apontada é incompatível com as principais atividades desenvolvidas pelo autor, na construção civil e como trabalhador portuário, segundo registros do CNIS, as quais se caracterizam por trabalhos manuais e desgastantes.
Nesse contexto, considerando a pouca instrução, a restrita experiência profissional, bem como a difícil colocação no mercado de trabalho, agravada à estigmatização que ainda existe dos portadores de HIV, a solução mais acertada é a reforma da sentença para condenar o INSS à implantação do benefício da aposentadoria por invalidez.
Referido entendimento está em consonância com a jurisprudência desta Corte sobre o tema, como demonstram os seguintes precedentes:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ASPECTOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS DO SEGURADO. VALORAÇÃO DA PROVA COLHIDA NA INSTÂNCIA ORDINÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 07 DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.
I. Conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, "A concessão da aposentadoria por invalidez deve considerar, além dos elementos previstos no art. 42 da Lei nº 8.213/91, os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado, ainda que o laudo pericial apenas tenha concluído pela sua incapacidade parcial para o trabalho. Precedentes. Agravo regimental não provido" (STJ, AgRg no REsp 1338869/DF, Relator Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, DJe de 29/11/2012).
II. Reconhecido, pelo Tribunal de origem, que o recorrido faz jus ao benefício de aposentadoria por invalidez, a mudança de entendimento acerca da questão demandaria incursão no conjunto fático-probatório dos autos, o que é vedado, pelo enunciado da Súmula 07 desta Corte.
III. Consoante a jurisprudência do STJ, "concluindo o juízo de origem, com base no contexto fático-probatório dos autos, que a parte autora faz jus ao benefício, a revisão desse posicionamento encontra óbice no enunciado nº 7 da Súmula n. 7/STJ. (...)" (STJ, AgRg no Ag 1368042/SP, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, DJe de 12/09/2011).
IV. Agravo Regimental improvido. (AgRg no AREsp 36.281/MS, Rel. Min.
ASSUSETE MAGALHÃES, SEXTA TURMA, DJe 1/3/2013)
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO PELA INCAPACIDADE PARCIAL DO SEGURADO. NÃO VINCULAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA SÓCIO-ECONÔMICA, PROFISSIONAL E CULTURAL FAVORÁVEL À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO DO INSS DESPROVIDO.
1. Os pleitos previdenciários possuem relevante valor social de proteção ao Trabalhador Segurado da Previdência Social, devendo ser, portanto, julgados sob tal orientação exegética.
2. Para a concessão de aposentadoria por invalidez devem ser considerados outros aspectos relevantes, além dos elencados no art. 42 da Lei 8.213/91, tais como, a condição sócio-econômica, profissional e cultural do segurado.
3. Embora tenha o laudo pericial concluído pela incapacidade parcial do segurado, o Magistrado não fica vinculado à prova pericial, podendo decidir contrário a ela quando houver nos autos outros elementos que assim o convençam, como no presente caso.
4. Em face das limitações impostas pela moléstia incapacitante, avançada idade e baixo grau de escolaridade, seria utopia defender a inserção do segurado no concorrido mercado de trabalho, para iniciar uma nova atividade profissional, motivo pelo qual faz jus à concessão de aposentadoria por invalidez.
5. Agravo Regimental do INSS desprovido.
(AgRg no AREsp 136.474/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO,
PRIMEIRA TURMA, DJe 29/6/2012)
No mesmo sentido vão as seguintes decisões monocráticas: AREsp 307.725/PR, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Dje 23/04/2013; AREsp 302388/PR Rel. Ministro Castro Meira, Dje 25/03/2013; e AREsp 279.588/MG Rel. Ministro Humberto Martins, Dje 18/02/2013.
Ademais, a questão foi decidida na instância ordinária de acordo com os fatos e provas constantes nos autos, de forma que a alteração das conclusões adotadas, tal como colocado pela autarquia recorrente, demandaria, necessariamente, novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em recurso especial, conforme o óbice previsto na Súmula 7/STJ.
Diante do exposto, nego provimento ao agravo.
Cito sobre o tema, demais precedentes do Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ASPECTOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS DO SEGURADO. VALORAÇÃO DA PROVA COLHIDA NA INSTÂNCIA ORDINÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 07 DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.
I. Conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, "A concessão da aposentadoria por invalidez deve considerar, além dos elementos previstos no art. 42 da Lei nº 8.213/91, os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado, ainda que o laudo pericial apenas tenha concluído pela sua incapacidade parcial para o trabalho. Precedentes. Agravo regimental não provido" (STJ, AgRg no REsp 1338869/DF, Relator Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, DJe de 29/11/2012).
II. Reconhecido, pelo Tribunal de origem, que o recorrido faz jus ao benefício de aposentadoria por invalidez, a mudança de entendimento acerca da questão demandaria incursão no conjunto fático-probatório dos autos, o que é vedado, pelo enunciado da Súmula 07 desta Corte.
III. Consoante a jurisprudência do STJ, "concluindo o juízo de origem, com base no contexto fático-probatório dos autos, que a parte autora faz jus ao benefício, a revisão desse posicionamento encontra óbice no enunciado nº 7 da Súmula n. 7/STJ. (...)" (STJ, AgRg no Ag 1368042/SP, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, DJe de 12/09/2011).
IV. Agravo Regimental improvido.
(AgRg no AREsp 36.281/MS, Rel. Min. ASSUSETE MAGALHÃES, SEXTA TURMA, DJe 1/3/2013)
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO PELA INCAPACIDADE PARCIAL DO SEGURADO. NÃO VINCULAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA SÓCIO-ECONÔMICA, PROFISSIONAL E CULTURAL FAVORÁVEL À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO DO INSS DESPROVIDO.
1. Os pleitos previdenciários possuem relevante valor social de proteção ao Trabalhador Segurado da Previdência Social, devendo ser, portanto, julgados sob tal orientação exegética.
2. Para a concessão de aposentadoria por invalidez devem ser considerados outros aspectos relevantes, além dos elencados no art. 42 da Lei 8.213/91, tais como, a condição sócio-econômica, profissional e cultural do segurado.
3. Embora tenha o laudo pericial concluído pela incapacidade parcial do segurado, o Magistrado não fica vinculado à prova pericial, podendo decidir contrário a ela quando houver nos autos outros elementos que assim o convençam, como no presente caso.
4. Em face das limitações impostas pela moléstia incapacitante, avançada idade e baixo grau de escolaridade, seria utopia defender a inserção do segurado no concorrido mercado de trabalho, para iniciar uma nova atividade profissional, motivo pelo qual faz jus à concessão de aposentadoria por invalidez.
5. Agravo Regimental do INSS desprovido.
(AgRg no AREsp 136.474/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, DJe 29/6/2012)
Penso, ser essa a melhor solução para o caso em apreço, devendo ser reformada a sentença de improcedência da ação. Diante da necessidade de cuidados constantes (com utilização de medicação forte), bem como a dificuldade, ou melhor dizendo, a impossibilidade de recolocação no mercado de trabalho, aliado ao estigma social que a doença acarreta, tenho como perfeitamente caracterizada a incapacidade laborativa.
Nesse sentido já decidi quando do julgamento da Apelação Civil nº 0014757-06.2012.404.9999, publicado no DE 03-07-2013, em que fui relator para acórdão, cuja ementa a seguir transcrevo:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CONCESSÃO. PORTADOR DE HIV. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E PARA A VIDA INDEPENDENTE E ESTADO DE MISERABILIDADE COMPROVADOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA.
1. Ainda que em oposição ao laudo pericial, concede-se o benefício assistencial ao portador de HIV, mesmo sem apresentar sintomas, quando sua recolocação no mercado de trabalho mostrar-se improvável, considerando-se as suas condições pessoais e o estigma social da doença, capaz de diminuir consideravelmente as suas chances de obter ou de manter um emprego formal. 2. Comprovados a incapacidade para o trabalho e para a vida independente e o estado de miserabilidade, é de ser mantida a sentença que concedeu à parte autora o benefício assistencial, desde a data do requerimento administrativo.
No que diz respeito ao requisito da hipossuficiência familiar, o estudo social acostado ao ev. 3 (laudperi19) atesta que a autora reside com seu companheiro e filha menor de idade. A família reside em casa própria, terreno de invasão. A renda familiar provém, unicamente, do trabalho esporádico do companheiro, como auxiliar de obras, sem carteira assinada, com renda aproximada de R$ 700,00 mensais, e do benefício percebido do programa bolsa família no valor de R$ 200,00. Refere a autora dificuldades de inclusão no mercado de trabalho em razão do preconceito que sofre em decorrência do HIV, refere que realiza acompanhamento no posto PAI e que no momento não está fazendo uso de medicação, relata que possui ínguas pelo corpo o que lhe causam desconforto e dor, durante o dia realiza os afazeres da casa e os cuidados da filha.
Assim constou da análise do estudo social, in verbis:
Veridiana vivencia situação de vulnerabilidade por sua trajetória de vida, família é beneficiária de Programa Social Bolsa Família o que auxilia no seu sustento, o pai biológico de sua filha não auxilia financeiramente, renda do núcleo familiar é oriunda do trabalho como servente de Rudimar, o mesmo não possui vínculo empregatício, moradia da família precária mas limpa e organizada, Vitória está inserida na rede municipal de educação, Veridiana relata sofrer preconceito em relação a sua doença o que compromete sua inclusão no mercado de trabalho, não possuem auxílio de demais familiares. Em relação à renda per capta conforme informações da família a mesma é de R$ 300,00.
Assim, e acerca da razoabilidade de considerar o valor numérico conjugado com outros fatores indicativos da situação de risco social, e considerando que o direito ao benefício de prestação continuada não pressupõe a verificação de um estado de miserabilidade extremo - bastando estar demonstrada a insuficiência de meios para o beneficiário, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família -, tenho por configurada a situação de risco social necessária à concessão do benefício.
Diante desse contexto, demonstradas a deficiência e a hipossuficiência familiar, merece reforma a sentença de improcedência da ação, com a condenação do INSS a conceder o benefício assistencial a portador de deficiência, a contar da DER.
Dos consectários
A correção monetária e os juros de mora devem ser adequados aos parâmetros a seguir fixados:
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94;
- INPC de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91.
- IPCA-E a partir de 30/06/2009.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo STF, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Da Verba Honorária
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
Das Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4.º, I, da Lei n.º 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, de acordo com disposto no art. 5°, I, da Lei Estadual nº 14.634/14, que institui a Taxa Única de Serviços Judiciais desse Estado, ressalvando-se que tal isenção não o exime da obrigação de reembolsar eventuais despesas judiciais feitas pela parte vencedora (§ único do art. 5º). Salienta-se, ainda, que nessa taxa única não estão incluídas as despesas processuais mencionadas no § único do art. 2° da referida Lei, tais como remuneração de peritos e assistentes técnicos, despesas de condução de oficiais de justiça, entre outras.
Tal isenção não se aplica quando o INSS é demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula n.º 20 deste regional), devendo ser salientado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, § único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Tutela Específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC/2015, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3.ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício postulado, no prazo de 45 dias.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso, determinando a implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000521766v4 e do código CRC 47877540.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5070592-15.2017.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: VERIDIANA DA SILVA XAVIER
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PORTADOR DE HIV. CONCESSÃO. INCAPACIDADE E HIPOSSUFICIÊNCIA DEMONSTRADAS. CONDIÇÕES PESSOAIS PRESENTES. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA REFORMADA. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Ainda que em oposição ao laudo pericial, concede-se o benefício assistencial ao portador de HIV, mesmo sem apresentar sintomas, quando sua recolocação no mercado de trabalho mostrar-se improvável, considerando-se as suas condições pessoais e o estigma social da doença, capaz de diminuir consideravelmente as suas chances de obter ou de manter um emprego formal.
2. Demonstrada a deficiência e a hipossuficiência do núcleo familiar, merece reforma a sentença de improcedência da ação, com a condenação do INSS a conceder o benefício assistencial a contar da DER.
3. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu dar provimento ao recurso, determinando a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 13 de junho de 2018.
Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000521767v3 e do código CRC 41b469a4.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 13/06/2018
Apelação Cível Nº 5070592-15.2017.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: VERIDIANA DA SILVA XAVIER
ADVOGADO: VINÍCIUS BRAMBILLA FRANCISCO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 13/06/2018, na seqüência 38, disponibilizada no DE de 28/05/2018.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento ao recurso, determinando a implantação do benefício.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 17:46:51.