Apelação Cível Nº 5000337-66.2022.4.04.7215/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5000337-66.2022.4.04.7215/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: SALVADOR TABORDA VENANCIO (AUTOR)
ADVOGADO: LUCAS BUDKEWITZ (OAB SC049602)
ADVOGADO: MARIUZE BUDKEVICZ (OAB SC019544)
INTERESSADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (INTERESSADO)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face de sentença que dispôs (evento 35 do processo de origem):
Ante o exposto, rejeito a(s) preliminar(es), resolvo o mérito da demanda (CPC, art. 487, inc. I) e JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial, nos termos da fundamentação, para:
I) CONCEDER a antecipação de tutela de urgência e DETERMINAR ao INSS restabeleça o Benefício de Prestação Continuada à Pessoa Idosa da parte autora (NB 88/529.558.269-4) desde 01/12/2020 (DCB);
II) DECLARAR que a parte autora não está obrigada a restituir os valores que recebeu entre 01/08/2015 e 31/10/2020, no montante de R$ 65.394,16 (sessenta e cinco mil trezentos e noventa e quatro reais e dezesseis centavos), atualizado até 05/12/2020.;
III) CONDENAR o INSS ao pagamento das parcelas atrasadas, acrescidas de correção monetária e juros de mora [...]
[...]
O apelante alegou não ser devido o restabelecimento do benefício assistencial.
Argumentou que "não está preenchido o requisito legal da miserabilidade, tendo em vista que a renda familiar per capita é superior a 1/4 do salário mínimo".
Sustentou, ainda, o "dever de restituição dos valores recebidos indevidamente" (evento 46 do processo de origem).
Foram apresentadas contrarrazões.
O Ministério Público Federal, em seu parecer, manifestou-se pelo desprovimento da apelação (evento 4).
É o relatório.
VOTO
Benefício assistencial
Nos termos do artigo 20 da Lei nº 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS), "o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família".
Relativamente à análise do requisito socioeconômico, há que se considerar que o Supremo Tribunal Federal (RE 567985/MT) declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º do artigo 20 da Lei nº 8.742/1993, relativizando o critério objetivo definido naquele dispositivo, devendo a insuficiência financeira das famílias ser aferida individualmente, conforme as peculiaridades de cada caso.
Caso dos autos
O benefício assistencial foi deferido na esfera administrativa (NB 88/529.558.269-4; DIB: 25/03/2008; evento 1, PROCADM6, fl. 13, do processo de origem).
Em procedimento de revisão do benefício, o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS concluiu haver "superação de renda" (evento 1, PROCADM6, fl. 30, do processo de origem).
A cessação do benefício ocorreu em 01/12/2020 (evento 1, DECL8, do processo de origem).
Para a instrução dos autos judiciais, foi realizada perícia socioeconômica.
A sentença dispôs:
Salvador Taborda Venancio ajuizou ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS por meio da qual objetiva, inclusive em antecipação de tutela: (a) restabelecimento de Benefício de Prestação Continuada à Pessoa Idosa (NB 88/529.558.269-4) desde 01/12/2020 (DCB); (b) declaração de inexistência do débito relativo aos valores recebidos indevidamente, no montante de R$ 65.394,16 (sessenta e cinco mil trezentos e noventa e quatro reais e dezesseis centavos); e (c) condenação da parte ré ao pagamento das parcelas vencidas e vincendas, atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora.
[...]
[...] de acordo com o julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal - STF no Recurso Extraordinário n. 580.963/PR (Rel. Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013), na sistemática da repercussão geral (Tema 312), "deve ser excluído do cálculo da renda familiar per capita o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima" [...] e "deve ser desconsiderado o benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade" (TRF4, AG 5005102-02.2019.4.04.0000, Turma Regional Suplementar do PR, Relator Luiz Fernando Wowk Penteado, juntado aos autos em 26/06/2019).
Recentemente, o TRF4 reafirmou sua jurisprudência no sentido de que, "no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima, ou de benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade. Ressalto que tal pessoa, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerada na composição familiar, para efeito do cálculo da renda per capita" (AG 5036078-21.2021.4.04.0000, Turma Regional Suplementar do PR, Relatora Cláudia Cristina Cristofani, juntado aos autos em 08/12/2021).
[...]
No caso em exame, de acordo com as informações constantes do processo administrativo (evento 1, PROCADM6) e do Laudo de Perícia Social elaborado na esfera judicial (evento 24, LAUDO1), o grupo familiar da parte autora é formado por 04 (quatro) integrantes nos dias atuais: Salvador Taborda Venâncio (autor), Zulmira Aparecida Alves (companheira), Altamir Venâncio (filho) e Gabriel Venâncio (neto).
Apesar de constar no Laudo de Perícia Social que a renda do grupo familiar é de R$ 1.212,00 (um mil duzentos e doze reais), consta do processo administrativo que Zulmira é titular de aposentadoria por incapacidade permanente (NB 32/626.480.740-4) desde 23/01/2019, cuja renda mensal, em 13/09/2020, era de R$ 1.434,34 (um mil quatrocentos e trinta e quatro reais e trinta e quatro centavos).
Entretanto, de acordo com o entendimento firmado pelo STF na resolução do Tema n. 312 da Repercussão Geral, deve-se excluir do valor bruto da renda mensal familiar - R$ 1.434,34 - o equivalente a um salário mínimo vigente à época em que o BPC foi suspenso/cancelado - R$ 1.100,00 - o que leva à conclusão de que a renda computável para fins de análise do requisito econômico - R$ 134,34 - é, efetivamente, inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo, restando atendido o requisito previsto no § 3º do art. 20 da LOAS.
O requisito etário também está preenchido [...].
[...]
Postas essas considerações, estando preenchidos os requisitos legais, a parte autora faz jus ao restabelecimento do Benefício de Prestação Continuada à Pessoa Idosa (NB 88/529.558.269-4) desde 01/12/2020 (DCB).
Em consequência, considerando que a suspensão/cancelamento do BPC foi indevida, é procedente, também, o pedido de declaração de inexigibilidade dos valores que a parte autora recebeu entre 01/08/2015 e 31/10/2020, no montante de R$ 65.394,16 (sessenta e cinco mil trezentos e noventa e quatro reais e dezesseis centavos), atualizado até 05/12/2020.
[...]
Ante o exposto, rejeito a(s) preliminar(es), resolvo o mérito da demanda (CPC, art. 487, inc. I) e JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial, nos termos da fundamentação, para:
I) CONCEDER a antecipação de tutela de urgência e DETERMINAR ao INSS restabeleça o Benefício de Prestação Continuada à Pessoa Idosa da parte autora (NB 88/529.558.269-4) desde 01/12/2020 (DCB);
II) DECLARAR que a parte autora não está obrigada a restituir os valores que recebeu entre 01/08/2015 e 31/10/2020, no montante de R$ 65.394,16 (sessenta e cinco mil trezentos e noventa e quatro reais e dezesseis centavos), atualizado até 05/12/2020.;
III) CONDENAR o INSS ao pagamento das parcelas atrasadas, acrescidas de correção monetária e juros de mora, conforme os critérios supraexpostos, respeitada a regra da prescrição quinquenal, por meio de requisição de pagamento (RPV ou Precatório), nos termos da fundamentação. As parcelas devidas entre o trânsito em julgado e a DIP deverão ser pagas por meio de complemento positivo, na via administrativa; e
IV) CONDENAR o INSS ao pagamento do valor correspondente aos honorários periciais, já fixados quando da designação da perícia, nos termos do § 1º do art. 32 da Resolução n. 305/2014 do Conselho da Justiça Federal - CJF.
[...]
Análise
Conforme a sentença ressaltou, deve ser excluído do cálculo da renda familiar o valor de 1 salário mínimo da aposentadoria recebida pela companheira do autor, por se tratar de benefício decorrente de incapacidade.
Assim, da renda da companheira do autor (R$ 1.434,34 em 2020; evento 1, PROCADM6, fl. 20, do processo de origem), não deve ser computada a quantia de R$ 1.045,00 (valor de 1 salário mínimo em 2020).
Tem-se, como renda disponível para a subsistência dos outros 3 integrantes do grupo familiar, quantia equivalente, em 2020, a R$ 389,34.
Nestes termos, a renda per capita, para fins de concessão de benefício assistencial, equivale a R$ 129,78, valor inferior a 1/4 de 1 salário mínimo em 2020 (R$ 261,25).
Além disso, deve ser levado em consideração que, conforme apurado pelo estudo social (evento 24 do processo de origem):
- o autor é idoso (conta 82 anos) e apresenta problemas de saúde;
- "Altamir, filho do casal", "apresenta deficiência mental" e necessita de "supervisão constante"; pode-se concluir que suas necessidades especiais geram gastos adicionais;
- o autor e sua companheira necessitam sustentar o "neto Gabriel", que se encontra em idade escolar e não recebe pensão alimentícia;
- a cessação do benefício assistencial "agravou as dificuldades financeiras vivenciadas pela família".
Diante de tais circunstâncias, constata-se que a continuidade do recebimento do benefício assistencial é necessária para evitar que o autor se encontre em situação de risco social.
Assim, conforme a sentença dispôs, é devido o restabelecimento do benefício assistencial desde a cessação de seu pagamento (em 01/12/2020).
Considerando que não houve período de recebimento indevido do benefício, não há falar em devolução de valores.
Honorários recursais
Considerando a sucumbência recursal do apelante, majoro, em 10% (dez por cento), o valor dos honorários advocatícios arbitrados na sentença (Código de Processo Civil, artigo 85, § 11).
Prequestionamento
Frisa-se, quanto ao prequestionamento, que não se faz necessária a menção analítica, no julgado, acerca de cada um dos dispositivos legais invocados pelas partes em suas razões de insurgência.
O que importa é que, fundamentadamente, não tenha sido acolhida a pretensão de reforma da decisão no tocante às questões de fundo, nos termos do artigo 1.025 do Código de Processo Civil.
Restabelecimento do benefício
O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, em cumprimento à determinação da sentença, comprovou o restabelecimento do benefício (evento 45 do processo de origem).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5000337-66.2022.4.04.7215/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5000337-66.2022.4.04.7215/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: SALVADOR TABORDA VENANCIO (AUTOR)
ADVOGADO: LUCAS BUDKEWITZ (OAB SC049602)
ADVOGADO: MARIUZE BUDKEVICZ (OAB SC019544)
INTERESSADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (INTERESSADO)
EMENTA
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. RESTABELECIMENTO.
1. Nos termos do artigo 20 da Lei nº 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS), "o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família".
2. A continuidade do recebimento do benefício assistencial é necessária para evitar que o autor se encontre em situação de risco social.
3. É devido o restabelecimento do benefício desde a cessação de seu pagamento.
4. Considerando que não houve período de recebimento indevido do benefício, não há falar em devolução de valores.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 21 de outubro de 2022.
Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003507683v5 e do código CRC 41cc08f9.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 14/10/2022 A 21/10/2022
Apelação Cível Nº 5000337-66.2022.4.04.7215/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: SALVADOR TABORDA VENANCIO (AUTOR)
ADVOGADO: LUCAS BUDKEWITZ (OAB SC049602)
ADVOGADO: MARIUZE BUDKEVICZ (OAB SC019544)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 14/10/2022, às 00:00, a 21/10/2022, às 16:00, na sequência 1295, disponibilizada no DE de 04/10/2022.
Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Juiz Federal JOÃO BATISTA LAZZARI
Votante: Juiz Federal JAIRO GILBERTO SCHAFER
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
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