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BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. CONDIÇÃO SOCIOECONÔMICA. MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO DE REQUISITOS. BENEFÍ...

Data da publicação: 07/07/2020, 15:35:05

EMENTA: BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. CONDIÇÃO SOCIOECONÔMICA. MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO DE REQUISITOS. BENEFÍCIO DE RENDA MÍNIMA. EXCLUSÃO. PRESCRIÇÃO. INTERDITADO. IRRETROATIVIDADE DA LEI. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. 1. O direito ao benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, e nos arts. 20 e 21 da Lei 8.742/93 (LOAS) pressupõe o preenchimento de dois requisitos: a) condição de pessoa com deficiência ou idosa e b) situação de risco social, ou seja, de miserabilidade ou de desamparo. 2. Reconhecida a inconstitucionalidade do critério econômico objetivo em regime de repercussão geral, bem como a possibilidade de admissão de outros meios de prova para verificação da hipossuficiência familiar, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, aferir o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família. 3. Deve ser excluído do cômputo da renda familiar o benefício previdenciário de renda mínima (valor de um salário mínimo) percebido por idoso e o benefício assistencial recebido por outro membro da família de qualquer idade. Aplicação analógica do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso). 4. Preenchidos os requisitos, é de ser restabelecido o benefício assistencial desde a cessação administrativa. 5. A Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), que teve por finalidade a ampla inclusão dos deficientes, não pode ser interpretada de forma restritiva, levando à maior vulnerabilidade justamente dos indivíduos que visa a proteger. Verificado que o autor, com retardo mental, não possui discernimento para os atos da vida civil, ele não pode ser penalizado pela fluência do prazo prescricional, sobretudo, quando a deficiência iniciou antes da alteração legislativa. Princípio da irretroatividade. 6. Correção monetária pelo INPC de abril de 2006 a junho de 2009, e, a partir de então, desde cada vencimento, pelo IPCA-E. 7. Juros de mora simples de um por cento (1%) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009, e, a partir de tal data, conforme o art. 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art.1º-F da Lei 9.494/1997. (TRF4, AC 5010231-95.2018.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relatora LUCIANE MERLIN CLÈVE KRAVETZ, juntado aos autos em 02/08/2018)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5010231-95.2018.4.04.9999/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELANTE: CLEONICE DE MATOS (Cônjuge, pai, mãe, tutor, curador ou herdeiro necessário)

APELANTE: CLAUDIO DE MATOS (Civilmente Incapaz - Art. 110, 8.213/91)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de ação ordinária em face do INSS em que o autor, interditado, representado nos autos pela mãe e curadora (termo de curatela, evento 4, AnexosPet4, p. 2), requer a concessão de benefício assistencial por ter deficiência (retardo mental) e encontrar-se em situação de vulnerabilidade social.

O magistrado de origem, da Comarca de Camaquã/RS, proferiu sentença em 19/10/2017, confirmando a antecipação de tutela concedida no curso do processo e julgando parcialmente procedente os pedidos, para conceder o benefício assistencial ao autor desde 27/10/2010 (cinco anos antes do ajuizamento da presente ação, observando-se a prescrição quinquenal) e para condenar o INSS ao pagamento das prestações vencidas, corrigidas monetariamente pelo IGP-M até junho de 2009, pela poupança até 25/03/2015 e, posteriormente, pelo IPCA-E, além de juros de mora de 6% ao ano. Foi determinada à autarquia a suspensão dos descontos que vinham sendo efetuados no benefício do autor implantado por força de antecipação de tutela e a devolução de tais valores, bem como o pagamento de honorários advocatícios de 10% do valor da condenação. O R. Juízo referiu que não era caso de reexame necessário, porquanto o valor da condenação não ultrapassaria o limite legal (evento 4, Sent22).

O autor apelou, sustentando que requereu o restabelecimento do benefício desde a cessação administrativa, em 09/2007. Aduz que é interditado, sendo absolutamente incapaz, de modo que contra ele não corre a prescrição. Requer que sejam pagas as parcelas do benefício assistencial desde a data da suspensão (evento 4, Apelação23).

O INSS também apelou, alegando que a mãe do autor recebe benefício previdenciário no valor de um salário mínimo, de forma que a renda per capita ultrapassa o limite legal. Assevera que o demandante tem três irmãos que laboram e que poderiam auxiliar no seu sustento. Pede a reforma da sentença (evento 4, Apelação 24).

O Ministério Público opinou pelo provimento do apelo do autor e pelo desprovimento da apelação do INSS (evento 17, Parecer1).

Com contrarrazões (evento 4, Contraz26 e 27), os autos vieram conclusos para julgamento.

VOTO

Trata-se de apelação do autor e do INSS.

CPC/2015

Conforme o art. 14 do CPC/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Logo, serão examinados segundo as normas do CPC/2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.

Tendo em vista que a sentença em comento foi publicada depois desta data, o recurso será analisado em conformidade com o CPC/2015.

Da controvérsia dos autos

A controvérsia recursal envolve a comprovação da miserabilidade familiar e, subsidiariamente, a prescrição.

Benefício assistencial

O direito ao benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, e nos arts. 20 e 21 da Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS) pressupõe o preenchimento de dois requisitos: a) condição de pessoa com deficiência ou idosa (com mais de 65 anos) e b) situação de risco social, ou seja, de miserabilidade ou de desamparo.

O referido art. 20 da LOAS, com as modificações introduzidas pelas Leis 12.435 e 12.470, ambas de 2011, e pela Lei 13.146, de 2015, detalha os critérios para concessão do benefício:

Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.

§ 2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

§ 3o Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.

§ 4o O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória.

§ 5o A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada.

§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS

§ 7o Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura.

§ 8o A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido.

§ 9o Os rendimentos decorrentes de estágio supervisionado e de aprendizagem não serão computados para os fins de cálculo da renda familiar per capita a que se refere o § 3o deste artigo.

§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.

§ 11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento.

A Lei nº 10.741/2003 - Estatuto do Idoso, por sua vez, em complemento à LOAS, dispõe:

Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social - Loas.

Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas.

Em relação à criança com deficiência, deve ser analisado o impacto da incapacidade na limitação do desempenho de atividades e na restrição da participação social, compatível com a sua idade.

Conceito de família

A partir da alteração promovida pela Lei n. 12.435/2011 na Lei Orgânica da Assistência Social, o conceito de família compreende: o requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.

Quanto aos filhos maiores de idade e capazes, importante refletir sobre a responsabilidade que estes têm com os membros idosos da família. Uma vez que o benefício em questão, tratado no art. 203, V, da Constituição Federal, garante um salário mínimo mensal à pessoa deficiente ou idosa que comprove não possuir meios de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua família, não seria razoável excluir a renda de filho maior e capaz que aufere rendimentos, uma vez que este tem responsabilidade para com seus genitores idosos.

Por outro lado, considerar aqueles filhos maiores e capazes que não auferem renda para fins de grupo familiar seria beneficiá-los com uma proteção destinada ao idoso, ou seja, estariam contribuindo para a implementação dos requisitos do benefício (cálculo da renda per capita) sem contribuir para o amparo de seus ascendentes. Logo, tem-se que devem ser computados no cálculo da renda per capita tão somente os filhos que possuem renda.

Condição socioeconômica

Em relação ao critério econômico, o art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993, estabelecia que era hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo.

No entanto, ao julgar o REsp 1.112.557 representativo de controvérsia, o Superior Tribunal de Justiça relativizou o critério econômico previsto na legislação, admitindo a aferição da miserabilidade por outros meios de prova que não a renda per capita, consagrando os princípios da dignidade da pessoa humana e do livre convencimento do juiz:

RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

(...) 4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente o cidadão social e economicamente vulnerável.

5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.

6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.

7. Recurso Especial provido.

(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)

Nesse sentido, tenho adotado posição de flexibilizar os critérios de reconhecimento da miserabilidade, merecendo apenas adequação de fundamento frente à deliberação do Supremo Tribunal Federal, que, por maioria, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993 - LOAS, assim como do art. 34 da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso.

Com efeito, reconhecida a inconstitucionalidade do critério econômico objetivo em regime de repercussão geral, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, aferir o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família.

Mais recentemente, a Lei 13.146/2015 introduziu o § 11 no referido artigo 20 da LOAS, o qual dispõe que para concessão do benefício assistencial poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento.

Caso concreto

A parte autora, nascida em 15/03/1966 (certidão de nascimento, evento 4, AnexosPet4, p. 6), aos 41 anos de idade requereu administrativamente o benefício assistencial em 30/05/2007, o qual foi deferido, sendo implantado e mantido ativo até 09/2007, quando apuradas irregularidades na concessão, visto que a renda per capita familiar ultrapassava 1/4 do salário mínimo (evento 4, AnexosPet4, p. 65). Nesta ação, ajuizada em 27/10/2015, o autor requer o restabelecimento do benefício desde a cessação administrativa.

No curso do processo, foi concedida a antecipação de tutela (evento 4, Despadec14). A autarquia implantou o benefício, porém, passou a efetuar descontos no montante pago, conforme noticiou a parte autora (evento 4, Pet16), sob o argumento que tais descontos visavam a ressarcir os valores indevidamente pagos ao autor a título de benefício de prestação continuada no período prévio (evento 4, Pet20). O demandante requereu, por fim, que tais descontos fossem cessados e devolvidos os valores já debitados.

Importa referir que não houve controvérsia sobre os impedimentos de longo prazo, uma vez que o autor é interditado por sentença transitada em julgado em março de 2008, tendo por curadora a mãe, Cleonice de Matos (evento 4, AnexosPet4, p. 2). Atestado médico colacionado aos autos aponta que o requerente apresenta retardo mental moderado (CID F71), déficit intelectual, histórico de convulsões desde a infância, desorientação no tempo e surto psicótico (evento 4, AnexosPet4, p. 76).

Logo, o ponto controvertido é a situação socioeconômica.

Condição socioeconômica

O estudo socioeconômico, realizado em agosto de 2016, apontou que o autor, Claudio (50 anos), vivia com a mãe, Cleonice (74 anos), em residência de alvenaria, com dois quartos, sala, cozinha e banheiro, guarnecida com mobiliário simples, no térreo de um sobrado, situado em um beco em bairro vulnerável, no município de Camaquã/RS.

A assistente social afirmou que a mãe do autor é pessoa idosa e adoentada, que percebe aposentadoria no valor de um salário mínimo, aplicando R$ 400,00 em alimentação, R$ 144,00 em água e R$ 130,00 em energia elétrica. Referiu que o autor faz uso de medicamentos de uso controlado, nem sempre encontrados na rede pública de saúde. Mencionou que o requerente tem três irmãos, casados, que vivem com as suas famílias e que não auxiliam no seu sustento.

A assistente relatou que o demandante é interditado judicialmente, portador de transtorno psíquico desde a infância, não tendo condições de viver sozinho e necessitando de cuidados diários em tempo integral, em decorrência do estágio da doença. O parecer foi favorável à concessão do benefício, diante da situação de miserabilidade e de vulnerabilidade social da família e da incapacidade do autor (evento 4, LaudPeri9).

Tenho que o benefício previdenciário recebido pela mãe do demandante não deve ser considerado no cômputo de renda familiar, porquanto trata-se de benefício de renda mínima.

O Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003), em seu art. 34, dispõe que o benefício assistencial concedido a qualquer membro da família idoso não será computado pra fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS. Da leitura do dispositivo, conclui-se que o objetivo do legislador foi preservar a renda mínima recebida pelo idoso (no montante de um salário mínimo), excluindo-a do cálculo da renda per capita familiar. Como a intenção primordial foi assegurar a dignidade do idoso, por analogia, tal regra deve ser estendida aos demais benefícios de renda mínima, sejam eles de natureza assistencial ou previdenciária, percebidos pelo idoso, assim como pelas pessoas com deficiência integrantes da família.

Nesse sentido foi a decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 580.963/PR, com repercussão geral reconhecida, declarando a inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003, sem pronúncia de nulidade, verbis:

Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.

(...) 4. A inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. O Estatuto do Idoso dispõe, no art. 34, parágrafo único, que o benefício assistencial já concedido a qualquer membro da família não será computado para fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS. Não exclusão dos benefícios assistenciais recebidos por deficientes e de previdenciários, no valor de até um salário mínimo, percebido por idosos. Inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo. Omissão parcial inconstitucional.

5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003.

6. Recurso extraordinário a que se nega provimento.

(RE 580963, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-225 DIVULG 13-11-2013 PUBLIC 14-11-2013)

O STJ também julgou a questão pela sistemática dos recursos repetitivos, decisão com trânsito em julgado em 16/12/2015, firmando o entendimento de que deve ser excluído do cômputo da renda familiar para concessão de LOAS o benefício previdenciário de um salário mínimo recebido por idoso:

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA. AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA. IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.

1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.

2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.

3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.

(REsp 1355052/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2015, DJe 05/11/2015)

Portanto, no cálculo da renda familiar para concessão do benefício assistencial deve ser excluído:

a) o benefício de renda mínima, previdenciário ou assistencial, recebido por idoso com mais de 65 anos;

b) o valor de um salário mínimo de benefício previdenciário de montante superior recebido por idoso com mais de 65 anos; e

c) o benefício assistencial recebido por pessoa com deficiência de qualquer idade.

Considerando que a situação de vulnerabilidade social da família se estende de longa data, uma vez que o benefício fora concedido e cancelado em 2007, quando o núcleo familiar era formado pelo autor e pela genitora, incapacitada à época e beneficiária de auxílio-doença no valor de um salário mínimo, situação socioeconômica semelhante à apurada no laudo pericial produzido nestes autos, tenho que o autor faz jus ao restabelecimento do benefício assistencial desde o cancelamento administrativo, em 09/2007.

Negado provimento ao apelo do INSS e provido o apelo do autor.

Prescrição quinquenal

O autor sustenta, em suas razões de apelação, que contra ele não corre a prescrição, uma vez que é portador de retardo mental, sendo interditado judicialmente e absolutamente incapaz.

Conforme já referido, o autor tem retardo mental moderado (CID F71) desde a infância, estando interditado por sentença judicial transitada em julgado em março de 2008 (evento 4, AnexosPet4, p. 2).

Com a edição da Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) foi revogado o art. 3º do Código Civil, que assim definia a incapacidade absoluta:

"Art. 3º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:

I - os menores de dezesseis anos;

II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos;

III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade."

Pela nova legislação, aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade, são relativamente incapazes, nos termos do art. 4º, III, do Código Civil, de forma que contra eles passa a correr o prazo prescricional estabelecido no art. 198, I, do referido diploma.

Embora cabível a discussão sobre a constitucionalidade da nova disciplina legal da prescrição das pessoas portadoras de deficiência mental, passo ao largo dessa discussão nesse caso, para evitar a competência da Corte Especial, o que tornaria mais demorado o trâmite do processo.

No caso, considerando que a enfermidade que acomete o autor teve início antes da vigência da referida alteração legal, tenho que deve ser aplicado o princípio da irretroatividade, exposto nos art. 5º, inciso XXXVI, da CF/88 e art. 6º, da LINDB, com o que a Lei n. 13.146, de 06/07/2015, somente poderia ter aplicação a partir de sua vigência. E, considerado o prazo quinquenal de prescrição aplicável à hipótese dos autos, nenhuma parcela estaria prescrita antes de 06/07/2020.

Nesse sentido, há precedente recente desta Corte:

  1. PENSÃO POR MORTE. ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. PRESCRIÇÃO. NÃO INCIDENTE. CONSECTÁRIOS LEGAIS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS. 1. Não corre a prescrição em desfavor dos deficientes, considerados absolutamente incapazes, pois não se há de interpretar as disposições da Lei nº 13.146/2015, norma protetiva, em desfavor dos indivíduos que se busca amparar, ainda mais quando a deficiência se instaurou antes da referida alteração legal, como no caso, incidente, ainda, o princípio da irretroatividade. 2. Nos termos do julgamento do RE nº 870.947/SE (Tema 810), pelo STF, em 20/09/2017, a correção monetária dos débitos da Fazenda Pública se dá através do IPCA-e. Os juros moratórios devem atender a disciplina da Lei nº 11.960/09, contados a partir da citação. (TRF4, AC 5000910-53.2017.4.04.7127, QUINTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, juntado aos autos em 11/05/2018)

Portanto, provido o apelo do autor, para que seja restabelecido o benefício assistencial desde a cessação administrativa, em 09/2007, não havendo que se falar em prescrição.

Reitere-se que devem ser cessados os descontos efetuados no benefício e devolvidos os valores já descontados.

Correção monetária

A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação, e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:

- IGP-DI de maio de 1996 a março de 2006 (art. 10 da Lei 9.711/1998, combinado com os §§ 5º e 6º do art. 20 da Lei 8.880/1994);

- INPC de abril de 2006 a junho de 2009 (art. 31 da Lei 10.741/2003, combinado com a Lei 11.430/2006, conversão da MP 316/2006, que acrescentou o art. 41-A à L 8.213/1991; STJ, REsp 1.103.122/PR);

- IPCA-E (a partir de 30 de junho de 2009, conforme RE870.947, j. 20/09/2017).

Juros de mora

Aplicam-se juros de mora simples de um por cento (1%) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.

A partir de 30/06/2009, os juros incidem, de uma só vez, de acordo com os índices aplicados à caderneta de poupança, conforme o art. 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei n.º 9.494/1997.

Em face do intrínseco efeito expansivo de decisões desta natureza, deve a eficácia do julgamento proferido pelo STF incidir no presente caso, não se cogitando de reformatio in pejus contra a Fazenda Pública, conforme precedentes do Superior Tribunal de Justiça (AgInt no REsp 1577634/RS, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, DJe de 30/05/2016; AgInt no REsp 1364982/MG, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª Turma, DJe de 02/03/2017).

Adequados, de ofício, os consectários legais, conforme entendimento do STF.

Honorários advocatícios

Uma vez que a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC) e que o apelo do INSS foi desprovido, aplica-se a majoração prevista no art. 85, §11, desse diploma, observados os ditames dos §§ 2º a 6º quanto aos critérios e limites estabelecidos.

Assim, majoro a verba honorária para 15% (quinze por cento) sobre as parcelas vencidas até a data da sentença.

Conclusão

Provido o apelo do autor, para determinar o restabelecimento do benefício assistencial desde a cessação administrativa (em 09/2007), não havendo prescrição. Negado provimento ao apelo do INSS. Adequados, de ofício, os consectários legais e majorada a verba honorária para 15% das prestações vencidas até a data da sentença.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação do autor e negar provimento à apelação do INSS, adequando, de ofício, os consectários legais.



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5010231-95.2018.4.04.9999
40000565275.V4


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5010231-95.2018.4.04.9999/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

APELANTE: CLEONICE DE MATOS (Cônjuge, pai, mãe, tutor, curador ou herdeiro necessário)

APELANTE: CLAUDIO DE MATOS (Civilmente Incapaz - Art. 110, 8.213/91)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. restabelecimento de benefício. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. CONDIÇÃO SOCIOECONÔMICA. MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO DE REQUISITOS. BENEFÍCIO DE RENDA MÍNIMA. EXCLUSÃO. PRESCRIÇÃO. interditado. irretroatividade da lei. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.

1. O direito ao benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, e nos arts. 20 e 21 da Lei 8.742/93 (LOAS) pressupõe o preenchimento de dois requisitos: a) condição de pessoa com deficiência ou idosa e b) situação de risco social, ou seja, de miserabilidade ou de desamparo.

2. Reconhecida a inconstitucionalidade do critério econômico objetivo em regime de repercussão geral, bem como a possibilidade de admissão de outros meios de prova para verificação da hipossuficiência familiar, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, aferir o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família.

3. Deve ser excluído do cômputo da renda familiar o benefício previdenciário de renda mínima (valor de um salário mínimo) percebido por idoso e o benefício assistencial recebido por outro membro da família de qualquer idade. Aplicação analógica do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso).

4. Preenchidos os requisitos, é de ser restabelecido o benefício assistencial desde a cessação administrativa.

5. A Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), que teve por finalidade a ampla inclusão dos deficientes, não pode ser interpretada de forma restritiva, levando à maior vulnerabilidade justamente dos indivíduos que visa a proteger. Verificado que o autor, com retardo mental, não possui discernimento para os atos da vida civil, ele não pode ser penalizado pela fluência do prazo prescricional, sobretudo, quando a deficiência iniciou antes da alteração legislativa. Princípio da irretroatividade.

6. Correção monetária pelo INPC de abril de 2006 a junho de 2009, e, a partir de então, desde cada vencimento, pelo IPCA-E.

7. Juros de mora simples de um por cento (1%) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009, e, a partir de tal data, conforme o art. 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art.1º-F da Lei 9.494/1997.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do autor e negar provimento à apelação do INSS, adequando, de ofício, os consectários legais, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 31 de julho de 2018.



Documento eletrônico assinado por LUCIANE MERLIN CLÈVE KRAVETZ, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000565276v3 e do código CRC 78de7ec3.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 2/8/2018, às 13:41:6


5010231-95.2018.4.04.9999
40000565276 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 12:35:04.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 31/07/2018

Apelação Cível Nº 5010231-95.2018.4.04.9999/RS

RELATORA: Juíza Federal LUCIANE MERLIN CLÈVE KRAVETZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: CLAUDIO DE MATOS (Civilmente Incapaz - Art. 110, 8.213/91)

ADVOGADO: LUANA DA SILVA TEIXEIRA XAVIER

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELANTE: CLEONICE DE MATOS (Cônjuge, pai, mãe, tutor, curador ou herdeiro necessário)

ADVOGADO: LUANA DA SILVA TEIXEIRA XAVIER

APELADO: OS MESMOS

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 31/07/2018, na seqüência 449, disponibilizada no DE de 13/07/2018.

Certifico que a 5ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª Turma , por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do autor e negar provimento à apelação do INSS, adequando, de ofício, os consectários legais.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal LUCIANE MERLIN CLÈVE KRAVETZ

Votante: Juíza Federal LUCIANE MERLIN CLÈVE KRAVETZ

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 12:35:04.

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