Apelação/Remessa Necessária Nº 5025408-65.2019.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO ALEXANDRE BONES
ADVOGADO: RODRIGO KOWALSKI (OAB RS083517)
RELATÓRIO
Trata-se de remessa oficial e apelação do INSS em face de sentença prolatada em 12/03/2019 na vigência do NCPC que julgou procedente o pedido de benefício assistencial, cujo dispositivo reproduzo a seguir:
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido ajuizado por ANTÔNIO ALEXANDRE BONES, qualificado na inicial, contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, também identificado, condenando o INSS a conceder o benefício assistencial de prestação continuada, desde o requerimento administrativo.
Outrossim, em razão da sucumbência, condeno o demandado ao pagamento das custas e emolumentos, por metade, e das despesas processuais, bem como ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador do autor, que vão fixados em 10% sobre o valor da condenação (parcelas vencidas), excluídas as parcelas vincendas, consoante preconizado pela Súmula nº 111 do STJ.
Ainda, condeno o réu a ressarcir os honorários periciais suportados pela Justiça Federal, nos termos do artigo 6º da Resolução nº 541/2007-CJF e do artigo 32 da Resolução nº 305/2014-CJF.
Sentença sujeita ao reexame necessário. ..
Inconformado, o INSS requereu, preliminarmente a suspensão dos efeitos da antecipação de tutela.
No mérito, sustentou, em síntese, que o perito judicial constatou que a parte autora está com incapacidade parcial.
Alegou que não restou comprovada a vulnerabilidade socioeconômica da parte autora, pois que a renda do núcleo familiar é superior ao estabelecido legalmente.
Asseverou que qualquer decisão que seja fundamentada na inconstitucionalidade do § 3° do artigo 20 da Lei 8.742/93, ou que adote critério diverso do ali previsto para aferição da condição de miserabilidade estará fadada à reforma, pois a decisão do STF tem eficácia erga omnes e efeito vinculante.
Requereu a reforma da sentença.
Apresentada as contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
A apelação preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Remessa Oficial
A Turma tem decidido reiteradamente que "não está sujeita à remessa necessária a sentença proferida na vigência do CPC de 2015 quando é certo que a condenação, ainda que acrescida de correção monetária e juros, não excederá 1.000 (mil) salários mínimos" (5033464-24.2018.404.9999 - ARTUR CÉSAR DE SOUZA).
Embora a sentença não contenha condenação líquida, é bem evidente que os atrasados compreendem parcelas vencidas, cuja soma não ultrapassa o teto de mil salários mínimos previsto no inciso I do § 3º do artigo 496 do CPC.
Não conheço da remessa oficial.
Preliminar - antecipação de tutela
O INSS requereu que fosse suspenso os efeitos da antecipação de tutela. A análise do pedido decorre do julgamento do mérito, examinado a seguir.
Benefício de prestação continuada ao idoso e ao deficiente (LOAS)
A Constituição Federal de 1988 dispôs em seu artigo 203:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A regulamentação desse dispositivo constitucional veio com a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, denominada Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), que, em seu artigo 20, passou a especificar as condições para a concessão do benefício, no valor de um salário mínimo mensal, à pessoa com deficiência e ao idoso com 70 anos ou mais comprovadamente carentes.
Após as alterações promovidas pelas Leis nº 9.720, de 30 de novembro de 1998, e nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), relativas à redução do critério etário para 67 e 65 anos, respectivamente, sobrevieram as Leis nº 12.435, de 06 de julho de 2011, e nº 12.470, de 31 de agosto de 2011, as quais conferiram ao aludido artigo 20, da LOAS, a seguinte redação, ora em vigor:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
Portanto, o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos:
1.a) idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor do Estatuto do Idoso) ou
1.b) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, conforme redação original do artigo 20, da LOAS, e, após as alterações da Lei nº 12.470, de 31-10-2011, tratar-se de pessoa com impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas);
2) Situação de risco social (ausência de meios para, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família).
Requisito etário
Tratando-se de benefício requerido na vigência do Estatuto do Idoso, é considerada idosa a pessoa com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. O requisito é objetivo, ou seja, comprovado o atributo etário, a análise do requisito incapacitante é desnecessária, bastando apenas verificar a situação de vulnerabilidade socioeconômica a que submetido o idoso.
Condição de deficiente
Mister salientar, por oportuno, que a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei 8.742/93, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica jurisprudência do STJ (v.g. STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01-07-2002) e desta Corte (v.g. AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19-04-2006).
Desse modo, a incapacidade para a vida independente:
a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou seja incapaz de se locomover;
b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene pessoal e vestir-se sozinho;
c) não impõe a incapacidade de se expressar ou se comunicar; e
d) não pressupõe dependência total de terceiros.
Situação de risco social
Tendo em vista a inconstitucionalidade dos artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e do artigo 34, § único, da Lei 10.741/2003, reconhecida no julgamento dos REs 567985 e 580963 em 18.04.2013, a miserabilidade para fins de benefício assistencial deve ser verificada em cada caso concreto.
Nesse sentido, os cuidados necessários com a parte autora, em decorrência de sua deficiência, incapacidade ou avançada idade, que acarretarem gastos - notadamente com medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, entre outros -, configuram despesas a ser consideradas na análise da condição de risco social da família do demandante (TRF4, APELREEX 5002022-24.2011.404.7012, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 27/06/2013).
A jurisprudência desta Corte Regional, bem como do Superior Tribunal de Justiça, é pacífica no sentido de que qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso de 65 anos ou mais (salvo quando recebido por força de deficiência, quando então o requisito etário é afastado) deve ser excluído da apuração da renda familiar, bem como essa renda mínima não é o único critério a balizar a concessão do benefício, devendo ser examinado juntamente com outros meios de aferição do estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo do autor e de sua família (Pet n.º 7203/PE - 3ª Seção - Unânime - Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura - DJe 11-10-2011; TRF4 - AC n.º 0019220-88.2012.404.9999 - 6ª T. - unânime - Rel. Des. Celso Kipper - D.E. 22-03-2013; REsp n.º 1112557/MG - 3ª Seção - unânime - Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho - DJe 20-11-2009).
Também, o fato de a parte autora ser beneficiária e perceber renda proveniente do Programa Bolsa Família, não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social (TRF4, APELREEX 2009.71.99.006237-1, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 07/10/2014).
Logo, em linhas gerais, para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, a situação de risco social a que se encontra exposta a pessoa idosa ou portadora de deficiência e sua família deve ser analisada em cada caso concreto (TRF4, EINF 0016689-58.2014.404.9999, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 29/05/2015).
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
No caso em tela, decidiu o juiz singular pela procedência do pedido inicial. Nesse diapasão, nenhum reparo há a considerar na sentença recorrida. Para evitar tautologia, transcrevo excerto dos fundamentos, fazendo-os parte integrante de minhas razões de decidir (evento 3, SENT26, p.1):
(...)
O laudo médico pericial (fls. 204/208) demonstra que o autor é acometido por deformidades congênitas que o tornam incapaz de exercer atividade laboral.
Quanto ao requisito econômico da renda per capita do grupo familiar do autor, entendo que também tenha sido preenchido pelo constante no estudo social (fls. 62/63 e 185/188).
Inicialmente, cumpre referir não desconheço que a lei, ao instituir o critério objetivo da renda per capita do conjunto familiar do postulante, o fez com o intuito de criar uma presunção absoluta da carência econômica, de forma que com o preenchimento de tal requisito não se poderia afastar a condição de necessitado que objetiva a Lei.
Todavia, não há impedimento para que se conclua pela existência de condição de miserabilidade da pessoa por outros meios, mediante análise detida dos demais elementos que compõe a sua realidade sociológica.
E diante disso, a prova - em especial o estudo social realizado nos autos - é suficiente a amparar a pretensão do demandante, ou melhor dizendo, a prova se basta a amparar a pretensão do autor.
O estudo social foi conclusivo no sentido de afirmar a vulnerabilidade social do autor.
(...)
Não pode ser perdido de vista que o benefício em questão, por possuir caráter alimentar, ou de subsistência, exige, para seu deferimento, que o beneficiário esteja em condições de miserabilidade, algo que se verificou no caso concreto.
Destarte, preenchidos os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada, a procedência do pedido é medida impositiva.
(...)
Destarte, não subsiste a insurgência do INSS em relação a incapacidade ser temporária.
Ademais, há que se considerar que a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei 8.742/93, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica jurisprudência do STJ (v.g. STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01-07-2002) e desta Corte (v.g. AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19-04-2006).
Outrossim, à análise da incapacidade para a vida independente não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou seja incapaz de se locomover; não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene pessoal e vestir-se sozinho; não impõe a incapacidade de se expressar ou se comunicar e não pressupõe dependência total de terceiros.
Realizada perícia médica em 27/04/2017, cujo laudo reproduzo excertos (evento 3, LAUDOPERIC22, p.2);
A parte autora é portadora de alguma doença/lesão, sequela, deficiência física ou mental? Se afirmativo, especificar esta(s) afecção(ões) codificando - as pelo CID 10 e a origem das mesmas (degenerativa, inerente á faixa etária do(a) periciando(a), hereditária, congênita, adquirida ou outra causa).
R: Sim, relatou o autor apresentar desde o nascimento deformidades físicas em todos os membros, principalmente em ambas as mãos e punhos, impossibilitando de realizar atividades profissionais, solicitando auxilio da Previdência Social. Relata ter sequelas de paralisia infantil.
Em conclusão, com a anamnese, análise dos atestados médicos apresentados e exame físico funcional de membro superior esquerdo e membro inferior esquerdo, comprova-se que o autor apresenta patologias osteoarticulares que estão produzindo incapacidade laboral parcial e definitiva, com difícil enquadramento profissional devido sequelas congênitas.
Inicio da incapacidade: Desde a infância, devido sequela de paralisia infantil. Grifos meus
Nessa quadra, sopesando que se trata de pessoa com 44 anos de idade, baixa instrução, nunca ter trabalhado formalmente devido à deficiência física; hipótese que ganha força diante da declaração do perito: observou-se que o autor entrou no consultório médico deambulando com certa dificuldade, lentamente, mancando com ambas as pernas direita, sentando com dificuldade na cadeira do consultório, permitido concluir que satisfeito o requisito incapacidade.
No tocante ao requisito econômico, importa referir que a situação de vulnerabilidade social é aferida não apenas com base na renda familiar, que não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Deverá ser analisado o contexto socioeconômico em que o autor se encontra inserido.
Nessa esteira, foi realizado estudo socioeconômico em 21/11/2016, cujo laudo transcrevo excertos (evento 3, LAUDOPERIC20):
O grupo familiar é composto por 6 (seis) pessoas, os pais do Sr. Antônio, um de seus irmãos e duas sobrinhas, a sua mãe, a Sra. Lurdes, de 57(cinquenta e sete) anos de idade, seu pai, o Sr. Ataíde, de 64 (sessenta e quatro) anos de idade, o Sr. Ataíde Júnior, de 21 (vinte um ano) de idade, as crianças Emely, de 10 (dez) anos de idade, Claudia, de 4 (quatro) anos de idade. A Sra. Lurdes relata que ela e seu esposo são natural de Campo Novo, casados há 43 (quarenta e três) anos de idade, tiveram 6 (seis) filhos, segundo relato da mesma, seu filho, o Sr. Antônio nasceu com deformidade no membro superior e inferior esquerdo, não tendo condições de trabalhar, o mesmo recebe beneficio há 4 (quatro) anos, a Sra. Lurdes relata que sobrevivem com o salário do esposo, o Sr. Ataíde, que o mesmo recebe pelos serviços prestados na granja do Sr. Roni, onde a família reside, que é no valor de R$ 1000,00 e do Beneficio Assistencial do Sr. Antônio que é no valor de R$ 882,00.
A renda do grupo familiar individualizado por membro é no total de R$ é R$ 313,00, estando incluído o Benefício do Sr. Antônio.
O Sr. Antônio relata que quase não compram roupas, quanto à conta de energia elétrica a família não tem gastos com água, energia elétrica é descontado R$ 200,00, do salário, no supermercado gastam com alimentação por més o valor de R$ 1.000,00,_com medicação R$ 200,00, pois a Sra. Lurdes a mãe do Sr. Antônio é depressiva e faz uso de medicação continua, família não recebe auxilio assistencial do município, algumas medicações pegam no posto de saúde e outras tem que comprar. A renda bruta do grupo familiar é de R$ 1.882,00, as condições materiais nas quais vive a família do autor, em relação aos gastos, de R$ 1.200,00, e a_ renda mensal auferida, percebe-se que sobra para as demais despesas o valor de R$ 682,00...
A família reside em uma casa cedida pelo patrão, o Sr. Roni, na granja onde o Sr. Ataide presta serviços, plantando, a casa é de alvenaria, 6 (seis) cômodos divididos em cozinha, sala, três quartos e um banheiro, área coberta na frente da casa. A Casa estava em más condições de higiene no dia da visita possui pouca mobília, em condições de habitabilidade...
A família do Sr. Antônio não tem condições de garantir os mínimos sociais para sua sobrevivência. Portanto, sua vida atual conte›‹tualiza a violação cotidiana de seus direitos sociais...
PARECER Considerando o acima exposto, constatou-se que o Sr. Antônio encontra-se em situação de vulnerabilidade social e hipossuficiência socioeconômica.
Deflui do laudo que a renda da família é proveniente do trabalho do genitor em torno de R$ 1.000,00, insuficiente à manutenção do grupo familiar composto pelos pais e irmãos. O benefício assistencial atualmente titulado pelo autor - concedido administrativamente - não pode ser considerado para fins de cálculo de renda per capita.
Ora, face as considerações aduzidas, observada a razoabilidade ao considerar o valor numérico conjugado com outros fatores indicativos da situação de risco social, e considerando ainda que o direito ao benefício de prestação continuada não pressupõe a verificação de um estado de miserabilidade extremo - bastando estar demonstrada a insuficiência de meios para o beneficiário, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família -, tenho que o quadro de vulnerabilidade socioeconômica remonta à época que houve a negativa do INSS ao requerimento do benefício, pois que em consulta ao CNIS e Plenus verifica-se que tanto o pai, quanto a mãe não apresentavam registros formais de trabalho e ou benefício à época.
Termo inicial
O marco inicial do benefício é da data do requerimento administrativo em 24/09/2003 (evento 3, ANEXOSPET4, p.7).
Considerando a DER ocorreu em 24/09/003, e a interrupção do prazo prescricional no período de 17/01/2008 a 25/11/2014 quando da tramitação de ação tombada sob o n° 0000065-75.2008.12.0043, na Comarca de São Gabriel do Oeste/MS, extinta sem resolução de mérito, transitada em julgado (evento 3, ANEXOSPET4, p.10), e a distribuição deste feito em 04/12/2014 (evento 3, INIC2), tenho que não há parcelas atingidas pela prescrição.
Correção monetária
A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91, na redação da Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei n.º 10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).
A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, que fora prevista na Lei 11.960/2009, que introduziu o art. 1º-F na Lei 9.494/97, foi afastada pelo STF no julgamento do tema 810, através do RE 870947, com repercussão geral, o que restou confirmado, no julgamento de embargos de declaração por aquela Corte, sem qualquer modulação de efeitos. O precedente do STF é aplicável desde logo, uma vez que, nos termos da decisão do Relator, a pendência do julgamento dos embargos de declaração é que motivava a suspensão nacional dos processos.
No julgamento do tema 905, através do REsp 1.495146, e interpretando o julgamento do STF, o STJ definiu quais os índices que se aplicariam em substituição à TR, concluindo que aos benefícios assistenciais deveria ser utilizado IPCA-E, conforme decidiu a Suprema Corte, no recurso representativo da controvérsia e que, aos previdenciários, voltaria a ser aplicável o INPC, uma vez que a inconstitucionalidade reconhecida restabeleceu a validade e os efeitos da legislação anterior, que determinava a adoção deste último índice, nos termos acima indicados.
Ainda que o STJ não tenha levantado a suspensão dos efeitos da tese que firmou no julgamento do Tema 905, nada obsta à utilização dos respectivos argumentos, por esta Turma, como razões de decidir, uma vez que bem explicitam os critérios atualizatórios, a partir da natureza dos benefícios – assistencial ou previdenciária.
A conjugação dos precedentes dos tribunais superiores resulta, assim, na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação muito próxima no período de julho de 2009 (data em que começou a vigorar a TR) e até setembro de 2019, quando julgados os embargos de declaração no RE 870947 pelo STF (IPCA-E: 76,77%; INPC 75,11), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.
Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRg no AgRg no Ag 1211604/SP).
Honorários advocatícios
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, este regramento é aplicável quanto à sucumbência.
No tocante ao cabimento da majoração da verba honorária, conforme previsão do §11 do art. 85 do CPC/2015, assim decidiu a Segunda Seção do STJ, no julgamento do AgInt nos EREsp nº 1.539.725-DF (DJe de 19-10-2017):
É devida a majoração da verba honorária sucumbencial, na forma do art. 85, §11, do CPC/2015, quando estiverem presentes os seguintes requisitos, simultaneamente:
a) vigência do CPC/2015 quando da publicação da decisão recorrida, ou seja, ela deve ter sido publicada a partir de 18/03/2016;
b) não conhecimento integralmente ou desprovimento do recurso, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente;
c) existência de condenação da parte recorrente ao pagamento de honorários desde a origem no feito em que interposto o recurso.
No caso concreto, estão preenchidos todos os requisitos acima elencados, sendo devida, portanto, a majoração da verba honorária.
Assim, impõe-se a majoração dos honorários advocatícios em 50% sobre o percentual anteriormente fixado.
Antecipação de tutela
Uma vez confirmado o direito ao benefício, resta mantida a antecipação dos efeitos da tutela, concedida no juízo de origem.
Nego provimento à apelação no ponto
Conclusão
Não conheço da remessa oficial.
Negar provimento à apelação.
Impõe-se a majoração dos honorários advocatícios em 50% sobre o percentual anteriormente fixado.
Consectários adequados à orientação do STF no RE 870947.
Mantida a antecipação de tutela.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa oficial, negar provimento à apelação, mantida a antecipação de tutela.
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5025408-65.2019.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO ALEXANDRE BONES
ADVOGADO: RODRIGO KOWALSKI (OAB RS083517)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. VIABILIDADE. BOLSA FAMÍLIA. CONSECTÁRIOS.
1. Comprovados os requisitos da deficiência para o labor e hipossuficiência econômica do grupo familiar, cabível a concessão do benefício assistencial.
2. O valor recebido a título de bolsa Família como renda da família, o qual, além de ser ínfimo, constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social.
3. A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, prevista na Lei 11.960/2009, foi afastada pelo STF no julgamento do Tema 810, através do RE 870947, com repercussão geral, o que restou confirmado, no julgamento de embargos de declaração por aquela Corte, sem qualquer modulação de efeitos.
4. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E.
5. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, negar provimento à apelação, mantida a antecipação de tutela, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 18 de março de 2020.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 11/03/2020 A 18/03/2020
Apelação/Remessa Necessária Nº 5025408-65.2019.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR(A): JOSE OSMAR PUMES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO ALEXANDRE BONES
ADVOGADO: RODRIGO KOWALSKI (OAB RS083517)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 11/03/2020, às 00:00, a 18/03/2020, às 14:00, na sequência 824, disponibilizada no DE de 02/03/2020.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, MANTIDA A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 04:40:34.