Apelação Cível Nº 5010897-91.2021.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: ALESSANDRA DOS ANJOS BUENO
ADVOGADO: JUAREZ MACHADO DE FARIAS (OAB RS042009)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de ação ajuizada por Alessandra dos Anjos Bueno, nascida em 11-6-2012, representado por sua mãe, Sra Ana Amélia Cardoso dos Anjos, em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando a concessão do benefício Assistencial na condição de deficiente.
Foi prolatada sentença em 23-2-2016 que julgou o pedido, conforme dispositivo:
Em face do exposto, com base no artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado por ALESSANDRA DOS ANJOS BUENOS, neste ato representada por sua genitora Ana Amélia Cardoso dos Anjos contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL- INSS. Condeno a parte autora, sucumbente, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$800,00 nos termos do artigo 20, § 4°, do CPC, suspensa a exigibilidade porquanto lhe concedo o amparo da AJG.
Inconformada, recorreu, em apertada síntese, alegando que possui incapacidade, devendo ser sopesado que se trata de criança com deficiência, quando então deve ser analisado o impacto da incapacidade na limitação do desempenho de atividades e na restrição da participação social, compatível com a sua idade. Asseverou que a vulnerabilidade socioeconômica a que esta exposta restou comprovada. Requereu a reforma da sentença pela concessão do benefício desde o requerimento administrativo.
Oportunizada as contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso.
Em 5-10-2016 a Juíza Federal Convocada Ana Paula de Bortoli converteu o julgamento em diligência [a fim de que seja produzida perícia médica e socioeconômica]
Foram apresentados os laudos como determinado.
Os autos retornaram para esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
A apelação preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Benefício de prestação continuada ao idoso e ao deficiente (LOAS)
A Constituição Federal de 1988 dispôs em seu artigo 203:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A regulamentação desse dispositivo constitucional veio com a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, denominada Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), que, em seu artigo 20, passou a especificar as condições para a concessão do benefício, no valor de um salário mínimo mensal, à pessoa com deficiência e ao idoso com 70 anos ou mais comprovadamente carentes.
Após as alterações promovidas pelas Leis nº 9.720, de 30 de novembro de 1998, e nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), relativas à redução do critério etário para 67 e 65 anos, respectivamente, sobrevieram as Leis nº 12.435, de 06 de julho de 2011, e nº 12.470, de 31 de agosto de 2011, as quais conferiram ao aludido artigo 20, da LOAS, a seguinte redação, ora em vigor:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a gar antia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
(...)
Portanto, o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos:
1.a) idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor do Estatuto do Idoso) ou
1.b) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, conforme redação original do artigo 20, da LOAS, e, após as alterações da Lei nº 12.470, de 31-10-2011, tratar-se de pessoa com impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas);
2) Situação de risco social (ausência de meios para, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família).
Requisito etário
Tratando-se de benefício requerido na vigência do Estatuto do Idoso, é considerada idosa a pessoa com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. O requisito é objetivo, ou seja, comprovado o atributo etário, a análise do requisito incapacitante é desnecessária, bastando apenas verificar a situação de vulnerabilidade socioeconômica a que submetido o idoso.
Condição de deficiente
Mister salientar, por oportuno, que a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei 8.742/93, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica jurisprudência do STJ (v.g. STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01-07-2002) e desta Corte (v.g. AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19-04-2006).
Desse modo, a incapacidade para a vida independente:
a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou seja incapaz de se locomover;
b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene pessoal e vestir-se sozinho;
c) não impõe a incapacidade de se expressar ou se comunicar; e
d) não pressupõe dependência total de terceiros.
Situação de risco social
Tendo em vista a inconstitucionalidade dos artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e do artigo 34, § único, da Lei 10.741/2003, reconhecida no julgamento dos REs 567985 e 580963 em 18.04.2013, a miserabilidade para fins de benefício assistencial deve ser verificada em cada caso concreto.
Nesse sentido, os cuidados necessários com a parte autora, em decorrência de sua deficiência, incapacidade ou avançada idade, que acarretarem gastos - notadamente com medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, entre outros -, configuram despesas a ser consideradas na análise da condição de risco social da família do demandante (TRF4, APELREEX 5002022-24.2011.404.7012, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 27/06/2013).
A jurisprudência desta Corte Regional, bem como do Superior Tribunal de Justiça, é pacífica no sentido de que qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso de 65 anos ou mais (salvo quando recebido por força de deficiência, quando então o requisito etário é afastado) deve ser excluído da apuração da renda familiar, bem como essa renda mínima não é o único critério a balizar a concessão do benefício, devendo ser examinado juntamente com outros meios de aferição do estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo do autor e de sua família (Pet n.º 7203/PE - 3ª Seção - Unânime - Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura - DJe 11-10-2011; TRF4 - AC n.º 0019220-88.2012.404.9999 - 6ª T. - unânime - Rel. Des. Celso Kipper - D.E. 22-03-2013; REsp n.º 1112557/MG - 3ª Seção - unânime - Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho - DJe 20-11-2009).
Também, o fato de a parte autora ser beneficiária e perceber renda proveniente do Programa Bolsa Família, não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social (TRF4, APELREEX 2009.71.99.006237-1, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 07/10/2014).
Logo, em linhas gerais, para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, a situação de risco social a que se encontra exposta a pessoa idosa ou portadora de deficiência e sua família deve ser analisada em cada caso concreto (TRF4, EINF 0016689-58.2014.404.9999, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 29/05/2015).
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
No presente caso, esta ação foi distribuída em 27-8-2013. Quando do requerimento administrativo do benefício assistencial em 22-5-2013 (evento 5, INIC1, p 13), a autora Alessandra dos Anjos Bueno, nascida em 11-8-2012 (evento 5, INIC1, p 6) contava com 11 meses de idade.
Com efeito, o juiz singular entendeu pela improcedência do pedido, observando [Verifico, portanto, que a autora, mesmo acometida de paralisia no membro superior direito, não possui doença incapacitante]
Esta Corte determinou a realização de nova perícia médica e estudo socioeconômico.
Em 18-12-2018 foi realizado laudo médico que concluiu pela inexistência de incapacidade, como segue excerto (evento 5, REC11, p 11)
Nome: Alessandra dos Anjos Bueno Data de nascimento: 11/06/2012 — 6 anos Sexo: feminino Escolaridade: pré-escola
PATOLOGIA CID 10 Lesão plexo braquial S14.3
]Realiza sessões de fisioterapia
Atestado médico datado de 13/08/2012 CREMERS n° ilegível - CID 10 portadora de paralisia obstétrica MSD, tipo proximal. Está indicada fisioterapia intensiva e permanente. Atestado médico datado de 26/03/2013 CREMERS n° 17373 - CID 10 M75.1 Visualizado os documentos médicos acostados pela parte autora no processo.
CONCLUSÃO Considerando a análise documental e exame fisico da parte autora em Ato Pericial, concluo que não há como classificar em deficiência nos termos do Decreto 6.214/2007, Art. 4 0, § 10. (redação dada pelo decreto n° 7.617, de 2011). Não há incapacidade para as atividades da vida diária
Sem embargo, em que pese a conclusão do perito do Juízo, há que se ponderar que a incapacidade para vida independente, referida na Lei nº 8.742/93, não deve ser interpretada de forma restritiva, inflexível.
Destarte, em relação à concessão de benefício assistencial à criança com deficiência, a jurisprudência posiciona-se no sentido de que deve ser analisada, não há que se cogitar capacidade para o trabalho, tão somente [a limitação que a incapacidade causa no desempenho de atividades e na restrição da participação social, compatível com a sua idade]:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INCAPACIDADE. CRIANÇA. CRITÉRIO ECONÔMICO. O benefício assistencial é devido à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Por se tratar de criança, por óbvio, não há que se falar em capacidade para o trabalho. Em relação à criança com deficiência, deve ser analisado o impacto da incapacidade na limitação do desempenho de atividades e na restrição da participação social, compatível com a sua idade. Em relação ao pressuposto econômico, o art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993 - LOAS estabelecia que seria considerada hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo. Entretanto, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993, assim como do art. 34 da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso, permitindo que o requisito econômico, para fins de concessão do benefício assistencial, seja aferido caso a caso. Comprovado o preenchimento dos requisitos legais, é devida a concessão do benefício assistencial, desde a DER. (TRF4, AC 0001380- 89.2017.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, D.E. 23/05/2017) (grifado).
Nessa quadra, imperioso analisar concomitantemente a alegada vulnerabilidade socioeconômica da autora. Na hipótese, foi elaborado, em 19-6-2017 estudo social, como segue (evento 5, REC9, p 28):
Aproveitamos para cumprimenta-lo e objetivando cumprir determinação de vossa excelência passamos a apresentar o estudo social na residência da menor Alessandra dos Anjos Buenc de 05 anos.
No momento da visita a menor estava na creche "Meu Lar" conversamos com sua mãe a senhora Ana Amélia Cardoso dos Anjos que esta provisoriamente morando em novo endereço Rua 15 de novembro n° 396 — Piratini-RS, disse que se mudou provisoriamente para cuidar ama senhora chamada Maria e que a mesma acabou falecendo e pretende em breve mudar-se para sua casa novamente.
Dona Ana Amélia é casada com o senhor Alexandre Bueno que diarista, a família não tem renda fixa já que seu marido recebe só o dia que trabalha e ela esta desempregada, a única renda certa é do Programa Bolsa família no valor de R$ 77,00. A casa em que a família mora é bem simples e foi doada pela prefeitura municipal, os moveis são poucos e bem simples.
A menor Alessandra nasceu com "síndrome do manguito rotador" (Cid m 75.1) "Inflamação aguda ou crônica acometendo tendões da bainha dos rotadora, especialmente por compressão da bursa e do tendão supra-espinhal entre a grande tuberosidade do úmero e a porção anterior a inferior do acrômio e ligamento acrômio-clavicular, durante a elevação do braço". precisa de cuidados especiais e sua mãe é quem se encarrega dessa tarefa, já que seu pai precisa trabalhar para poder cumprir com suas despesas que são muitas,como não tem trabalho fixo algumas vezes falta dinheiro para as despesas básicas, devidos aos gastos principalmente com tratamentos de saúde de sua filha.
A pretensão da família é receber o BPC (Beneficio de Prestação Continuada), para ajudar a custear seu tratamento, como fisioterapia e natação que a menina precisa fazer, esse beneficio é pago pelo governo federal e assegurado por lei a pessoa que comprove a sua deficiência. Outrossim, a Constituição da Republica Federativa do Brasil, Capitulo II, dos Direitos Sociais, artigo 7°, inciso IV, define o salário mínimo como aquele capaz de atender as necessidades vitais básicas do trabalhador e sua família como "moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, reajustado periodicamente, de modo a preservar o poder aquisitivo, vedada a sua vinculação para qualquer fim" portanto consideramos o beneficio caso concedido a menina contribuirá para as necessidades básicas da mesma
Se não bastasse as necessidades básicas dessa criança, totalmente dependente dos pais,e que caso não faça a fisioterapia e a natação poderá ficar com sequelas irreversíveis e não conseguira trabalhar para manter seu próprio sustento e essa renda do beneficio mesmo que por um período ajudaria nas necessidades essas como alimento , vestuário, consultas , fisioterapia, natação e medicação.
PARECER SOCIAL: Considerando da referida família e devido as condições de saúde e financeiras que através de atestados médicos ela necessita de cuidados especiais. caso não faça o tratamento poderá ficar dependente de seus pais ou de alguém que possa cuidar e por suas condições financeiras contar com a renda de seus pais, pois os mesmos vivem com dificuldades sugerimos que seja concedido o BPC mesmo que por um tempo ate a mesma fazer o tratamento e então assim fazer nova avaliação.
Tenho que restaram evidenciadas barreiras, que podem obstruir a participação plena e efetiva da autora na sociedade em igualdade de condições com as demais.
Diante deste quadro, forçoso concluir que o requisito incapacidade exigido para a concessão do benefício de prestação continuada. estava presente quando do requerimento administrativo, bem como na atualidade, pelos impedimentos ressalvados anteriormente.
No que se refere às condições socioeconômicas de sobejo restaram comprovadas, eis que como diarista, o genitor não consegue suprir as necessidades do grupo familiar.
Ademais, o fato da genitora da autora ser beneficiária e perceber renda proveniente do Programa Bolsa Família, não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social (TRF4, APELREEX 2009.71.99.006237-1, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 07/10/2014).
Considerando que o direito ao benefício de prestação continuada não pressupõe a verificação de um estado de miserabilidade extremo - bastando estar demonstrada a insuficiência de meios para o beneficiário, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, tenho por configurada a situação de risco social necessária à concessão do benefício.
Assim, preenchidos os requisitos imprescindíveis à concessão do benefício, deve ser reformada a sentença para conceder a ALESSANDRA DOS ANJOS BUENO o benefício de prestação continuada ao deficiente.
Termo inicial
Presentes a condição de deficiente e a situação de risco social no caso em concreto têm direito a parte autora à concessão do benefício assistencial de prestação continuada desde a data do requerimento administrativo em 22-5-2013 (evento 5, INIC1, p 13)
Não há que se falar em prescrição de parcelas, eis que trata-se menor absolutamente incapaz, nascida em 11-8-2012 (evento 5, INIC1, p 6) contra o qual não corre prescrição.
Como a parte autora logrou êxito na integralidade do pedido, invertem-se os ônus da sucumbência, nos termos do art. 86, parágrafo único, do novo Código de Processo Civil (CPC), para condenar a requerida ao pagamento de custas e honorários advocatícios, como segue.
Correção monetária e juros de mora
A correção monetária incide a contar do vencimento de cada prestação e é calculada pelos seguintes índices oficiais: [a] IGP-DI de 5-1996 a 3-2006, de acordo com o artigo 10 da Lei n. 9.711/1998 combinado com os §§ 5º e 6º do artigo 20 da Lei n. 8.880/1994; e, [b] INPC a partir de 4-2006, de acordo com a Lei n. 11.430/2006, que foi precedida pela MP n. 316/2006, que acrescentou o artigo 41-A à Lei n. 8.213/1991 (o artigo 31 da Lei n. 10.741/2003 determina a aplicação do índice de reajustamento do RGPS às parcelas pagas em atraso).
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo naquele julgamento. No recurso paradigma foi determinada a utilização do IPCA-E, como já o havia sido para o período subsequente à inscrição do precatório (ADI n. 4.357 e ADI n. 4.425).
O Superior Tribunal de Justiça (REsp 149146) - a partir da decisão do STF e levando em conta que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial) - distinguiu os créditos de natureza previdenciária para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a eles, o INPC, que era o índice que os reajustava à edição da Lei n. 11.960/2009.
É importante registrar que os índices em questão (INPC e IPCA-E) tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde 7-2009 até 9-2017 (mês do julgamento do RE n. 870.947): 64,23% contra 63,63%. Assim, a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação, a partir de 4-2006, do INPC aos benefícios previdenciários e o IPCA-E aos de natureza assistencial.
Os juros de mora devem incidir a partir da citação. Até 29-6-2009 à taxa de 1% ao mês (artigo 3º do Decreto-Lei n. 2.322/1987), aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar (Súmula n. 75 do Tribunal).
A partir de então, deve haver incidência dos juros até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, de acordo com o artigo 1º-F, da Lei n. 9.494/1997, com a redação que lhe foi conferida pela Lei n. 11.960/2009. Eles devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez".
Honorários advocatícios
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data do presente julgado, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Cumprimento imediato do julgado (tutela específica)
A renda mensal do benefício, em face da ausência de efeito suspensivo de qualquer outro recurso, deve ser implementada em 45 dias a partir da intimação. A parte interessada deverá indicar, em 10 dias, o eventual desinteresse no cumprimento do acórdão.
Custas e despesas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS).
Conclusão
Dado provimento à apelação da parte autora, adequando consectários à orientação do STF no RE 870947, determinando o cumprimento imediato do acórdão.
Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data do presente julgado, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação e determinar o imediato cumprimento do acórdão.
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Apelação Cível Nº 5010897-91.2021.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: ALESSANDRA DOS ANJOS BUENO
ADVOGADO: JUAREZ MACHADO DE FARIAS (OAB RS042009)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. VIABILIDADE. CRIANÇA. BOLSA FAMÍLIA. CONSECTÁRIOS.
1. O benefício assistencial é devido à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Em relação à criança com deficiência, deve ser analisado o impacto da incapacidade na limitação do desempenho de atividades e na restrição da participação social, compatível com a sua idade.
3. O valor recebido a título de Bolsa Família como renda da família, o qual, além de ser ínfimo, constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social.
4. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, determinando, no recurso paradigma, a adoção do IPCA-E para o cálculo da correção monetária.
5. Considerando que o recurso que originou o precedente do STF tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza administrativa, o Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC.
6. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação e determinar o imediato cumprimento do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de julho de 2021.
Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002660695v3 e do código CRC f3551ca0.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 07/07/2021
Apelação Cível Nº 5010897-91.2021.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): MARCUS VINICIUS AGUIAR MACEDO
APELANTE: ALESSANDRA DOS ANJOS BUENO
ADVOGADO: JUAREZ MACHADO DE FARIAS (OAB RS042009)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 07/07/2021, na sequência 1179, disponibilizada no DE de 28/06/2021.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E DETERMINAR O IMEDIATO CUMPRIMENTO DO ACÓRDÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
Conferência de autenticidade emitida em 20/07/2021 04:01:09.