Apelação Cível Nº 5005260-28.2022.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: CLEDIR DE FATIMA SANTINON
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Cledir de Fátima Santinon interpôs apelação em face de sentença, deferindo a tutela de urgência e, com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgou parcialmente procedente o pedido, para declarar que a parte autora faz jus à concessão do benefício de auxílio-doença, a contar da competência referente ao mês de fevereiro de 2020, e condenar a demandada ao pagamento à autora da renda mensal nos termos do art. 61 da Lei nº 8.213/91, no período antes referido, vedado o pagamento em duplicidade de parcelas já recebidas a mesmo título. Sobre as parcelas vencidas deverá incidir o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). Os juros de mora devem corresponder ao índice aplicado à caderneta de poupança, a partir da citação. Em razão da sucumbência recíproca, arcará a requerente com o pagamento de 10% das custas processuais e de honorários advocatícios ao procurador da parte contrária, fixados em 10% do valor da condenação. Suspendo a exigibilidade da condenação em face da concessão do benefício da gratuidade judiciária anteriormente deferida. A requerida é isenta do pagamento da Taxa Única de Serviços Judiciais, nos termos do inciso I do art. 5º da Lei nº 14.634/2015 (
).Sustentou, inicialmente, que está comprovado pelo laudo pericial e demais documentos médicos que a incapacidade permanecia na época da cessação administrativa, em 27.09.2019, pelo que o benefício é devido desde então. Aduziu que, considerando que vinha recebendo auxílio-doença administrativamente até 27.09.2019 em função de doenças ortopédicas, incapacitantes até hoje segundo o laudo pericial, é evidente que a incapacidade jamais cessou, conforme atestado emitido pelo mesmo médico em 19.06.2019 (
).Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
VOTO
Benefício por incapacidade
Cumpre, de início, rememorar o tratamento legal conferido aos benefícios de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez.
O art. 59 da Lei n.º 8.213 (Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS) estabelece que o auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido em lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos. Por sua vez, o art. 42 da Lei nº 8.213 estatui que a aposentadoria por invalidez será concedida ao segurado que, tendo cumprido a carência, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência. O art. 25 desse diploma legal esclarece, a seu turno, que a carência exigida para a concessão de ambos os benefícios é de 12 (doze) meses, salvo nos casos em que é expressamente dispensada (art. 26, II).
Em resumo, portanto, a concessão dos benefícios depende de três requisitos: (a) a qualidade de segurado do requerente à época do início da incapacidade (artigo 15 da LBPS); (b) o cumprimento da carência de 12 contribuições mensais, exceto nas hipóteses em que expressamente dispensada por lei; (c) o advento, posterior ao ingresso no RGPS, de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência do segurado.
Note-se que a concessão do auxílio-doença não exige que o segurado esteja incapacitado para toda e qualquer atividade laboral; basta que esteja incapacitado para a sua atividade habitual. É dizer: a incapacidade pode ser total ou parcial. Além disso, pode ser temporária ou permanente. Nisso, precisamente, é que se diferencia da aposentadoria por invalidez, que deve ser concedida apenas quando constatada a incapacidade total e permanente do segurado. Sobre o tema, confira-se a lição doutrinária de Daniel Machado da Rocha e de José Paulo Baltazar Júnior:
A diferença, comparativamente à aposentadoria por invalidez, repousa na circunstância de que para a obtenção de auxílio-doença basta a incapacidade para o trabalho ou atividade habitual do segurado, enquanto para a aposentadoria por invalidez exige-se a incapacidade total, para qualquer atividade que garanta a subsistência. Tanto é assim que, exercendo o segurado mais de uma atividade e ficando incapacitado para apenas uma delas, o auxílio-doença será concedido em relação à atividade para a qual o segurado estiver incapacitado, considerando-se para efeito de carência somente as contribuições relativas a essa atividade (RPS, art. 71, § 1º) (in ROCHA, Daniel Machado da. BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 15. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Atlas, 2017).
De qualquer sorte, o caráter da incapacidade (total ou parcial) deve ser avaliado não apenas por um critério médico, mas conforme um juízo global que considere as condições pessoais da parte autora - em especial, a idade, a escolaridade e a qualificação profissional - a fim de se aferir, concretamente, a sua possibilidade de reinserção no mercado de trabalho.
Cumpre demarcar, ainda, a fungibilidade entre as ações previdenciárias, tendo em vista o caráter eminentemente protetivo e de elevado alcance social da lei previdenciária. De fato, a adoção de soluções processuais adequadas à relação jurídica previdenciária constitui uma imposição do princípio do devido processo legal, a ensejar uma leitura distinta do princípio dispositivo e da adstrição do juiz ao pedido (SAVARIS, José Antônio. Direito processual previdenciário. 6 ed., rev. atual. e ampl. Curitiba: Alteridade Editora, 2016, p. 67). Por isso, aliás, o STJ sedimentou o entendimento de que "não constitui julgamento extra ou ultra petita a decisão que, verificando não estarem atendidos os pressupostos para concessão do benefício requerido na inicial, concede benefício diverso cujos requisitos tenham sido cumpridos pelo segurado" (AgRG no AG 1232820/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, j. 26/10/20, DJe 22/11/2010).
Caso concreto
Discute-se acerca da data inicial do benefício.
Termo inicial do benefício
Sobre o termo inicial do benefício, é devido (I) desde a data do requerimento administrativo ou (II) a partir da data em que cessar o auxílio-doença (art. 43, caput, e § 1.º, da Lei 8.213). Para tanto, a prova pericial há de ser conclusiva sobre a existência da incapacidade desde tal época.
Se, porém, (III) o laudo não demonstrar existir a incapacidade desde então ou se (IV) não houver prévio requerimento administrativo, o termo inicial do benefício é a data da perícia judicial.
Analisando-se atentamente os termos do laudo pericial (
, fls. 224/228), no cotejo com as demais provas carreadas aos autos, pode-se concluir que a autora apresenta quadro compatível com o diagnóstico de dor lombar baixa, outros transtornos de discos intervertebrais e espondilolistese.O perito destacou que, conforme exame pericial atual, a autora apresenta incapacidade laborativa para qualquer atividade, de forma temporária. Possui alterações e limitações ao exame físico atual e aos documentos médicos e não tem condições de retornar ao trabalho, por enquanto.
Entendeu o médico que deverá manter-se afastada, por determinado período para reavaliação, tratamento e acompanhamento com médico assistente. O tratamento poderá compreender medicações e outras terapêuticas, a ser combinado com médico assistente.
Assinalou o expert que, considerando quadro atual, a idade (42 anos) e grau de instrução da autora (5ª série do ensino fundamental) possível o afastamento temporário do mercado de trabalho pelo período de 90 dias para tratamento e posterior reavaliação, sendo que comprova incapacidade total, temporária e multiprofissional, desde fevereiro de 2020, conforme documentos médicos da época descritos e juntados aos autos.
Quanto à data de início da incapacidade, analisando os exames, atestados e dôssie médico do INSS (
), está claro que a autora usufruiu de benefício previdenciário de auxílio-doença no período de 27/05/2019 a 27/09/2019.Saliente-se que, no exame realizado em 25/09/2019 (
), referiu o perito do INSS que a autora estava em bom estado geral deambulação sem nenhuma dificuldade ou claudicação sobrepeso mãos grossas e ásperas sem contraturas musculares ou sinais de radiculopatias, concluindo pela inexistência de incapacidade laborativa. O mesmo ocorreu no exame realizado em 18/11/2019.Assim, não existem provas da continuidade da incapacidade laboral após 27/09/2019. Logo, a data de início da incapacidade para o trabalho é aquela fixada pelo perito judicial, ou seja, fevereiro de 2020, nos exatos termos como determinado pela sentença.
Desse modo, improvida a apelação da autora.
Honorários advocatícios
Incumbe ao réu o pagamento de honorários advocatícios ao procurador da parte autora.
Registre-se que o ônus da sucumbência havia sido imposto ao réu na sentença recorrida e a apelação foi interposta pelo autor. Logo, não tem aplicação a majoração em grau de recurso prevista no §11 do art. 85 do CPC, cuja finalidade é inibir o exercício abusivo do direito de recorrer.
Prequestionamento
O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias Superiores os dispositivos que as fundamentam. Assim, deixo de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronunciamento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003202773v17 e do código CRC 367e5cf3.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5005260-28.2022.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: CLEDIR DE FATIMA SANTINON
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. AUXÍLIO-DOENÇA. DATA DE INÍCIO DA INCAPACIDADE. DATA FIXADA PELO PERITO JUDICIAL. HONORÁRIOS
1. O direito à aposentadoria por invalidez e ao auxílio-doença pressupõe a presença de três requisitos: (1) qualidade de segurado ao tempo de início da incapacidade, (2) carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo as hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei nº 8.213, que dispensam o prazo de carência, e (3) requisito específico, relacionado à existência de incapacidade impeditiva para o labor habitual em momento posterior ao ingresso no RGPS, aceitando-se, contudo, a derivada de doença anterior, desde que agravada após o ingresso no RGPS, nos termos do art. 42, §2º, e art. 59, parágrafo único, ambos da Lei nº 8.213.
2. Na medida em que a patologia apresentada ocasiona incapacidade temporária, é devida a concessão do benefício de auxílio-doença, desde a data fixada pelo perito judicial.
3. Registre-se que o ônus da sucumbência havia sido imposto ao réu na sentença recorrida e a apelação foi interposta pelo autor. Logo, não tem aplicação a majoração em grau de recurso prevista no §11 do art. 85 do CPC, cuja finalidade é inibir o exercício abusivo do direito de recorrer.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de maio de 2022.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003202774v8 e do código CRC ff5f1395.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 17/05/2022 A 24/05/2022
Apelação Cível Nº 5005260-28.2022.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
PROCURADOR(A): CÍCERO AUGUSTO PUJOL CORRÊA
APELANTE: CLEDIR DE FATIMA SANTINON
ADVOGADO: JONES IZOLAN TRETER (OAB RS057993)
ADVOGADO: SINARA LAZZAROTO (OAB RS060734)
ADVOGADO: DAIANA IZOLAN TRETER FERRAZ (OAB RS104240)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/05/2022, às 00:00, a 24/05/2022, às 16:00, na sequência 443, disponibilizada no DE de 06/05/2022.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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