Apelação Cível Nº 5003729-38.2021.4.04.9999/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0300384-33.2018.8.24.0124/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: MARIA SIRLEI DOS SANTOS
ADVOGADO: MILTON JOSÉ DALLA VALLE (OAB SC019648)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
O feito foi relatado assim na origem:
RELATÓRIO
Maria Sirlei dos Santos ajuizou a presente ação em face de Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando a concessão/restabelecimento do benefício de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez ou auxílio acidente.
Narrou, em suma, que está acometida de patologias renais, ausência do rim direito e função de somente 41% do rim esquerdo. Informou ter recebido benefício de auxílio-doença de 21/9/2016 a 18/1/2017 (NB n. 604.243.739/2). Sentindo-se incapaz para o trabalho, em 6/10/2017 buscou o INSS novamente a fim de que lhe fosse concedido o benefício de Auxílio-Doença (NB 620.436.205-8), contudo o pedido foi indeferido sob a alegação de que inexistia incapacidade naquele momento.
Por fim, requereu a concessão/restabelecimento do benefício auxílio-doença, aposentadoria por invalidez ou auxílio-acidente, com pagamento das parcelas vencidas e vincendas a partir do indeferimento administrativo do pedido. Pugnou a realização de prova pericial e atribuiu à causa o valor de R$ 15.000,00 (Evento 1).
Deferida JG e nomeado perito para realização do laudo pericial (Evento 3).
Devidamente citada, a autarquia previdenciária ofertou defesa na forma de contestação. Em prejudicial, arguiu a prescrição. No mérito, em síntese, alegou inexistência de incapacidade/redução de capacidade para o trabalho. Requereu a improcedência dos pedidos (Evento 9).
Réplica (Evento 15).
Em saneador, acolhida a prejudicial da prescrição em relação às prestações vencidas e não reclamadas durante o quinquênio que antecedeu a propositura da ação, no caso de procedência do pedido. Também, fixados os pontos controvertidos, apresentados os quesitos do juízo e designada data para realização de perícia integrada (Evento 19).
Laudo pericial escrito anexado ao processo (Evento 52).
Em manifestação, o INSS sustentou que a autora não verte contribuições ao Regime Geral da Previdência de forma adequada, perdendo sua qualidade de segurada. Reiterou a improcedência dos pedidos (Evento 58). Por seu turno, a autora não concordou com o laudo, requereu realização de nova perícia, disse que a incapacidade está instalada há diversos anos. Arguiu que sempre trabalhou na agricultura (Evento 59).
Determinada intimação da autora para comprovar documentalmente sua qualidade de segurada especial (Evento 63).
A autora arguiu que, quando do requerimento administrativo em 06/10/2017- NB 620.436.205-8, ainda estava no período de graça (Evento 70).
O INSS reiterou o indeferimento.
É o relatório.
Sobreveio sentença de procedência da ação, com o seguinte dispositivo:
DISPOSITIVO
Ante o exposto, com base no art. 487, I, do CPC, JULGO PROCEDENTE o pedido deduzido por Maria Sirlei dos Santos em face do INSS para CONCEDER o benefício de auxílio-doença ao autora e, consequentemente CONDENAR o INSS ao pagamento do referido benefício desde a data da realização da perícia judicial, ou seja, 19/7/2019.
Os juros de mora serão aplicados a partir da citação e serão calculados de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o artigo 5º da Lei n. 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei n. 9.494/97 (conforme decisão do STF no RE n. 870.947, j. em 20-9-2017).
No que diz respeito ao índice de correção monetária, conforme decisão do STF no RE n. 870.947, j. em 20-9-2017, a partir de abril de 2006, deve-se aplicar o INPC aos benefícios previdenciários, como é o presente caso, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial (TRF4, AC 5048047-48.2017.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, juntado aos autos em 18/12/2019).
Deixo de condenar o INSS ao pagamento das custas, pois é isento de acordo com o art. 33, §1º, da LC n. 156/97 (Redação dada pela LC 729. de 2018). Honorários advocatícios no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas, conforme Súmulas n. 111 do STJ e 76 do TRF4.
Caso ainda não efetuado, requisitem-se e liberem-se os honorários periciais.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
No caso de apresentação de recurso de apelação, intime-se a parte contrária para apresentar contrarrazãos no prazo de 15 dias. Após, independentemente de despacho, remetam-se os autos ao TRF4 (art. 1.010, § 3º, do CPC).
Sentença não sujeita a reexame necessário, pois de valor inferior a 1.000 (mil) salários mínimos e apurável através de simples cálculos aritméticos (Art. 496, § 3º, I, do CPC).
De acordo com a Orientação da Corregedoria n. 73 de 12 de dezembro de 2019, transitado em julgado, intime-se o INSS para, querendo, no prazo de 30 dias, apresentar os cálculos dos valores pretéritos a fim de possibilitar a execução invertida.
Oportunamente, arquivem-se os autos.
Irresignados, a autora e o INSS apelaram.
A autora sustenta, em síntese, que existia incapacidade na DER, em 06/10/2017, requerendo a retroação da DIB para aquela data.
O INSS alega que inexistia incapacidade na DER e que na DII (data da perícia judicial), a autora não ostentava qualidade de segurada.
Sem contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Incapacidade laboral
A autora, 46 anos de idade, agricultora, objetiva a concessão de benefício por incapacidade em razão de insuficiência renal crônica.
Conforme consulta ao CNIS (Evento 1, DEC6), a autora recebeu benefício por incapacidade de 01/09/2011 a 18/01/2017, NB 6158928244.
Em novo requerimento administrativo, apresentado em 06/10/2017, NB 620.436.205-8, o benefício foi indeferido em razão de parecer contrário da perícia médica (Evento 1, DEC6, Páginas 8 e 9).
A parte autora trouxe aos autos o seguinte documento médico (Evento 1, DEC5):
04/10/2017: Atestado médico afirmando que a autora encontra-se em tratamento médico com insuficiência renal crônica - CID 10 N18, com ausência do rim direito e apenas 41% da função do rim esquerdo, sugerindo o afastamento definitivo das atividades laborais;
A perícia judicial (Evento 51, OUT1), realizada em 19/07/2019, concluiu que a autora apresenta Insuficiência Renal Crônica - CID 10 N18, com incapacidade total e temporária para o labor.
Transcrevo trecho do laudo pericial:
a) Quais são as patologias que acometem a parte autora?
R- Insuficiência Renal Crônica, CID 10 N18.
b) Em caso de incapacidade, é possível definir sua origem?
R- Sim.
c) Em caso de incapacidade, ela é total ou parcial?
R-No momento total.
d) Em caso de incapacidade parcial, ela pode ser definida como leve, moderada ou acentuada?
R- Prejudicada.
e) Em caso de incapacidade, ela é permanente ou temporária? Pode ser revertida com alguma terapêutica empregada pela medicina?
R- Incapacidade temporária, podendo reverte-la desde que volte a ter acompanhamento em clinica especializada que a coloque em condições favoráveis ao desempenho de algumas das funções habituais atinentes a vida laboral de uma agricultura de economia familiar.
f) Em caso de incapacidade, ela estava presente na data do requerimento/cessação do benefício (06/10/2017–fl.22)? É possível definir, com base em dados científicos ou exames objetivos (excluído o mero relato da parte interessada) a data em que a incapacidade se estabeleceu?
R- Prejudicada.
(...)
l) As lesões ou seqüelas são permanentes?
R-Sim.
(...)
DESTARTE, e pelo acima arrazoado, este jurisperito médico após leitura atenta dos autos, anamnese detalhada, exame físico apurado encontra justificativa técnica para indicar o afastamento do trabalho por incapacidade, pelo prazo de quatro (04) meses a partir desta data à parte autora, entendendo que a mesma deverá buscar acompanhamento em clinica especializada para recobrar condição física que a habilite ao desempenho da atividade rural a nível de economia familiar.
Qualidade de segurado e carência
A autora esteve em gozo de benefício por incapacidade até 18/01/2017, NB 6158928244. Assim, é incontroversa a qualidade de segurada na DER, em 06/10/2017, uma vez que encontrava-se no período de graça.
Do marco inicial do benefício
O marco inicial do benefício deve ser fixado de acordo com a data do início da incapacidade, sendo que, no caso de não haver elementos aptos a especificarem aludida data, deve-se utilizar a data da cessação ou indeferimento do benefício na esfera administrativa.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ CONVERSÃO. INVIABILIDADE. INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. TERMO INICIAL. ALTERAÇÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO. RE Nº 870.947/SE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EFEITO SUSPENSIVO. INDEFINIÇÃO. DIFERIMENTO PARA A FASE DE CUMPRIMENTO. TUTELA ANTECIPADA. 1. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; 3) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença). 2. O segurado portador de enfermidade que o incapacita total e temporariamente para a sua atividade habitual, com chance de recuperação e reabilitação para o trabalho, tem direito à concessão do benefício de auxílio-doença. 3. Em relação ao termo inicial, o entendimento que vem sendo adotado é no sentido de que, evidenciado que a incapacidade laboral já estava presente quando da cessação do auxílio-doença na via administrativa, mostra-se correto o estabelecimento do termo inicial do benefício previdenciário em tal data. Hipótese em que deve ser fixada a DIB na data atestada pelo perito judicial como a DII, tendo em vista que ausente a comprovação de permanência da incapacidade entre a DCB e a realização do procedimento cirúrgico. 4. Diferida para a fase de cumprimento de sentença a definição sobre os consectários legais da condenação, cujos critérios de aplicação da correção monetária e juros de mora ainda estão pendentes de definição pelo STF, em face da decisão que atribuiu efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos no RE nº 870.947/SE, devendo, todavia, iniciar-se com a observância das disposições da Lei nº 11.960/09, possibilitando a requisição de pagamento do valor incontroverso. 5. Mantida a antecipação de tutela, pois presentes os requisitos exigidos para o deferimento da tutela de urgência seja na forma do CPC/73 ou no CPC/15. (TRF4 5014634-73.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MARCELO MALUCELLI, juntado aos autos em 02/10/2019) (grifei)
Veja-se que, no caso dos autos, existia incapacidade quando o benefício foi requerido, em 06/10/2017 (DER).
Isso porque fazia-se presente a mesma moléstia que compõe o quadro clínico há muitos anos, não havendo informações de melhora após a cessação administrativa, mas, ao revés, de continuidade dos sintomas que conduzem à inaptidão laboral.
Assim, deve a sentença ser reformada para que o auxílio-doença seja concedido desde a DER, em 06/10/2017.
Honorários recursais
Em face da sucumbência recursal do INSS, majoro, em 10% (dez por cento), o valor dos honorários advocatícios arbitrados na sentença (Código de Processo Civil, artigo 85, § 11).
Prequestionamento
Em arremate, consigno que o enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias Superiores os dispositivos que as fundamentam.
Assim, deixo de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronunciamento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado.
Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão-somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa (artigo 538 do CPC).
Implantação do benefício
A 3ª Seção deste Tribunal firmou o entendimento no sentido de que, esgotadas as instâncias ordinárias, faz-se possível determinar o cumprimento da parcela do julgado relativa à obrigação de fazer, que consiste na implantação do benefício concedido ou restabelecido, para tal fim não havendo necessidade de requerimento do segurado ou dependente ao qual a medida aproveita (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Desembargador Federal Celso Kipper, julgado em 09-08-2007).
Louvando-me no referido precedente e nas disposições do artigo 497 do CPC, determino a implantação do benefício, no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da autora, negar provimento à apelação do INSS e determinar a implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003187159v8 e do código CRC cf7e9707.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5003729-38.2021.4.04.9999/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0300384-33.2018.8.24.0124/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: MARIA SIRLEI DOS SANTOS
ADVOGADO: MILTON JOSÉ DALLA VALLE (OAB SC019648)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. auxílio-doença. requisitos. preenchimento. MARCO INICIAL. DELIMITAÇÃO.
A confirmação da existência de moléstia incapacitante, corroborada pela documentação clínica, associada às condições pessoais da parte autora, se prestam a demonstrar a incapacidade total e temporária para o exercício da atividade profissional, o que enseja a concessão do benefício de auxílio-doença a partir da DER, uma vez que também comprovada a qualidade de segurado e a carência, devendo ser descontadas as parcelas recebidas administrativamente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da autora, negar provimento à apelação do INSS e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de maio de 2022.
Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003187160v4 e do código CRC a1b1f50b.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/05/2022 A 17/05/2022
Apelação Cível Nº 5003729-38.2021.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: MARIA SIRLEI DOS SANTOS
ADVOGADO: MILTON JOSÉ DALLA VALLE (OAB SC019648)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/05/2022, às 00:00, a 17/05/2022, às 16:00, na sequência 1198, disponibilizada no DE de 29/04/2022.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA AUTORA, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 27/05/2022 04:34:17.