Apelação Cível Nº 5004846-98.2020.4.04.9999/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0301995-61.2015.8.24.0080/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: REMILDE APARECIDA ROSA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pela parte autora em face da sentença, publicada em 30-10-2019 (e. 95.1), que julgou parcialmente procedente a demanda, concedendo-lhe auxílio por incapacidade temporária desde 20-02-2019 (data da perícia) e determinou a imediata implantação do benefício.
Sustenta, em síntese, que a incapacidade laborativa já estava presente antes da perícia (e. 100.1). Assim, requer a retroação do termo inicial para 25-05-2015 (DER do NB 31/610.633.770-9) ou para meados de 2018, em conformidade com a consideração do perito.
Embora intimado, o INSS não apresentou contrarrazões.
O INSS juntou petição (e. 104.1) e documentação comprovando a implantação do benefício (e. 104.2).
Vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
A sentença ora recorrida examinou a demanda nestes termos (e. 93.1):
[...]
Do que consta dos autos, a parte autora conta atualmente com 50 anos de idade, é empregada doméstica e possui o ensino fundamental incompleto. No caso em análise, o laudo pericial concluiu que a autora apresenta sintomas intensos de ansiedade, patologia que acarreta incapacidade laboral total e temporária. Segundo o perito, a incapacidade se verifica desde meados de 2018, de acordo com os documentos e exame clínico realizado (fls. 145-155). A prova pericial, portanto, confirmou a alegação da parte autora, atestando a existência de doença psiquiátrica incapacitante. Portanto, plenamente caracterizados os requisitos necessários para a concessão do benefício de auxílio-doença à parte autora. Ressalto não ser o caso de aposentadoria por invalidez, vez que não se trata de incapacidade total para o trabalho. Quanto à data inicial do benefício de auxílio-doença, considerando que a perícia médica não pôde estipular com precisão o início da incapacidade, a data da perícia deve ser tomada como termo inicial para concessão do benefício (20.2.2019). Outrossim, preenchidos os requisitos do art. 300 do Código de Processo Civil, quais sejam, a probabilidade do direito, evidenciada pelo laudo pericial, e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, consubstanciado no prejuízo à subsistência da parte autora, é de se deferir o benefício em sede de tutela de urgência independentemente de requerimento expresso.
Assim já decidiu o TRF:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. TUTELA DE URGÊNCIA. DE OFÍCIO. AUXÍLIO DOENÇA. PODER GERAL DE CAUTELA. PARCELAS VENCIDAS. RPV OU PRECATÓRIO. 1. Ante a presença de prova consistente, com elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, é de ser concedida medida antecipatória, restabelecendo-se o auxílio-doença. 2. Constatada a manifesta ilegalidade do ato administrativo que cancelou o benefício, é recomendável, sob pena de ineficácia de eventual sentença de procedência, o deferimento da tutela de ofício, tendo em conta a inexistência de vedação ao exercício do poder geral de cautela do juiz, sobretudo se considerada a gravidade e especificidade do caso concreto. 3. Em relação às parcelas pretéritas, inclusive as que se venceram após a perícia médica, devem ser pagas mediante precatório ou RPV após o trânsito em julgado, não podendo ser pagas via antecipação de tutela. (TRF4, AG 5051330-06.2017.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relatora MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO, juntado aos autos em 06/02/2018)
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado por Remilde Aparecida Rosa, com fundamento no art. 487, inc. I, Código de Processo Civil, para:
a) CONCEDER a tutela de urgência e DETERMINAR que o INSS implemente o benefício de auxílio-doença em favor da parte autora, no prazo de 10 (dez) dias; e
b) CONDENAR o INSS ao pagamento, de uma só vez, das parcelas vencidas a contar da data de 20.2.2019, devendo ser mantido o benefício pelo tempo necessário à recuperação da capacidade laboral da autora.
As parcelas devem ser pagas de uma única vez. Ainda, sobre os valores incidem: a) correção monetária pelo IGP-DI de 05/96 a 03/2006, e pelo INPC a partir de 04/2006 (STF, RE 870.947/SE (Tema 810); STJ, REsp 1.495.146-MG (Tema 905)); b) juros de mora segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 com redação alterada pela Lei n. 11.960/2009.
Condeno a autarquia sucumbente ao pagamento das custas processuais, ressalvada isenção legal.
Condeno o INSS, ainda, ao pagamento dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor das prestações vencidas, nos termos do art. 85, §3º, inciso I do CPC e Súmula 111 do STJ.
Sentença não sujeita à remessa necessária, uma vez que, por óbvio, os valores não ultrapassarão o montante previsto no artigo 496, §3º, I do CPC.
[...]
Tendo em vista que a incapacidade laborativa total e temporária da autora (faxineira/doméstica, ensino fundamental incompleto e 52 anos de idade atualmente) em decorrência de problemas psiquiátricos (depressão ansiosa) restou devidamente comprovada pela perícia judicial (e. 77.1), a controvérsia recursal no caso sub examine cinge-se à retroação do termo inicial do auxílio por incapacidade temporária concedido à parte autora na origem.
No que pertine ao termo inicial do benefício por incapacidade, cumpre salientar que não é possível confundir a data do diagnóstico com a data do início da incapacidade.
Com efeito, a data da perícia é uma ficção que recorre à variável menos provável. O momento da perícia é o momento do diagnóstico e, dificilmente, exceto uma infeliz coincidência, a data da instalação da doença e provável incapacitação. Quando se recorre às ficções, por que não é possível precisar a data da incapacidade a partir de elementos outros, sobretudo os clínicos-médicos, é preciso levar em conta em mínimo de realidade, e esta indica a relativa improvabilidade do marco aleatório. O histórico médico e outros elementos contidos nos autos, inclusa a DER e as regras da experiência sobre a evolução no tempo de doenças, devem se sobrepor às ficções, notadamente aquelas que se estabelecem in malan parte, consoante inúmeros julgados deste Colegiado:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORAL TEMPORÁRIA. TERMO INICIAL. [...] 2. Tendo o conjunto probatório apontado a existência de incapacidade laboral desde a época da cessação administrativa do auxílio-doença, o benefício é devido desde então. (TRF4, AC 5007386-55.2017.4.04.7209, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 06/09/2019)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORAL. TERMO INICIAL. [....] 2. Tendo o conjunto probatório apontado a existência de incapacidade laboral desde a época do requerimento administrativo, o benefício de auxílio-doença é devido desde então, devendo ser convertido em aposentadoria por invalidez a partir da perícia médica judicial, que atestou a incapacidade definitiva da parte autora para o trabalho como caldeireiro. (TRF4 5068030-33.2017.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 08/02/2018)
No caso em apreço, a sentença fixou o termo inicial em 20-02-2019 (data da perícia), ao pasos que na perícia judicial, quando inquirido acerca da provável DII, o expert respondeu "meados de 2018". Contudo, diante da imprecisão científica da perícia, devem ser valorados os indícios trazidos na documentação clínica, sobretudo quando se trata de doença de difícil diagnóstico, como a depressão.
Assim, tendo a parte autora demonstrado que o quadro mórbido já estava presente desde 25-05-2015 (DER do NB 31/610.633.770-9, e. 8.2, p. 1), cf. documentação clínica acostada (e. 1.8), é devido o benefício desde então, descontados todos os valores já adimplidos pelo INSS por força de antecipação de tutela.
Portanto, a parcial reforma da sentença é a medida que se impõe.
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, D DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-102019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Juros moratórios
Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.
A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.
Honorários advocatícios recursais
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Deixo de aplicar a regra do art. 85, §11, do NCPC. Isso porque os honorários advocatícios recursais previstos pela nova sistemática do § 11 do artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015 decorrem não apenas do trabalho adicional posterior à sentença, mas, igualmente, da própria sucumbência da parte em seu pleito recursal. Com efeito, a majoração da verba honorária é estabelecida no intuito de desestimular a interposição de recurso manifestamente improcedente interposto pela parte sucumbente na ação.
Logo, no caso, não tendo havido recurso da parte sucumbente, o percentual da verba honorária deve ser mantida no patamar estipulado pelo juízo de origem, consoante precedente deste Colegiado:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. TERMO FINAL. HONORÁRIOS RECURSAIS. [...] 2. Não tendo havido recurso da parte sucumbente, incabível a majoração dos honorários advocatícios prevista no art. 85, §11, do CPC. (TRF4, AC 5026720-13.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 11/10/2019)
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).
Da antecipação de tutela
Pelos fundamentos anteriormente elencados, é de ser mantida a antecipação da tutela deferida, uma vez presentes os requisitos da verossimilhança do direito e o risco de dano irreparável ou de difícil reparação, bem como o caráter alimentar do benefício, porquanto relacionado diretamente com a subsistência, propósito maior dos proventos pagos pela Previdência Social.
Conclusão
Reforma-se a sentença parcialmente para retroagir o termo inicial do auxílio por incapacidade temporária para 25-05-2015 (DER do NB 31/610.633.770-9), descontados todos os valores já adimplidos pelo INSS por força de antecipação de tutela.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora.
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Apelação Cível Nº 5004846-98.2020.4.04.9999/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0301995-61.2015.8.24.0080/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: REMILDE APARECIDA ROSA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. benefício por incapacidade. auxílio por incapacidade temporária. TERMO INICIAL DA INCAPACIDADE. RETROAÇÃO. POSSIBILIDADE.
1. Descabe fixar o termo inicial de benefício por incapacidade em data diversa do indeferimento quando existem elementos probatórios a demonstrar a existência do quadro mórbido após a indevida negativa da prestação previdenciária pelo INSS.
2. Hipótese em que restou comprovada a incapacidade laborativa desde a DER (25-05-2015), sendo devido o benefício desde tal data, descontados todos os valores já adimplidos pelo INSS por força de antecipação de tutela.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 30 de agosto de 2021.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 23/08/2021 A 30/08/2021
Apelação Cível Nº 5004846-98.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: REMILDE APARECIDA ROSA
ADVOGADO: GISLAINE MARIA BIONDO (OAB SC026237)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 23/08/2021, às 00:00, a 30/08/2021, às 16:00, na sequência 344, disponibilizada no DE de 12/08/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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