Apelação Cível Nº 5023608-02.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: DANIEL NUNES MONTEIRO
ADVOGADO: CLEUMAR MORAES CORREIA (OAB SC042763)
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pelo INSS e pela parte autora em face da sentença, publicada em 09-07-2019, nestes termos (
):III – DISPOSITIVO:
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado por Daniel Nunes Monteiro em face do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, DETERMINAR que o réu implante o benefício de auxíliodoença (ordinário) ao autor, por 12 meses, a contar da data da perícia (8-5-2017); e CONDENAR o réu ao pagamento, retroativo, do valor do benefício concedido/restabelecido desde 29-6-2016, observando os consectários legais dispostos na fundamentação.
Em suas razões recursais a parte autora pugna pela reforma da decisão, requerendo que o benefício de auxílio-doença seja mantido até a plena recuperação do autor, a ser avaliada em nova perícia médica realizada junto à Autarquia, afastando, portanto, a limitação da concessão do benefício pelo prazo determinado de 12 meses a contar 08-05-2017, data da perícia (
).A Autarquia sustenta, em síntese, que a parte autora não preenche os requisitos necessários à prestação previdenciária deferida pelo juízo a quo. Alega, outrossim, que o autor cerece de qualidade de segurado, porquanto não sobreveio aos autos prova capaz de comprovar a situação de desemprego involuntário, elemento necessário à prorrogação do período de graça. Requer, portanto, a reversão da decisão para que seja julgada improcedente a ação (
).Com as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
No caso sub examine, a controvérsia recursal cinge-se à verificação da qualidade de segurado da parte autora e à fixação do termo final do benefício de auxílio-doença, porquanto incontroversa a incapacidade laboral do autor.
A sentença ora recorrida examinou a prorrogação do período de graça nestes termos (
):A CTPS (fls. 81-102) evidencia que a parte autora, a princípio, não perdeu a qualidade de segurado em razão da demissão da empresa Vionee Indústria e Comércio de Calçados e Acessórios Ltda, em 12-2-2015, pois, em tese, aplicável na hipótese a regra do § 2º do art. 15 da Lei n. 8.213/91, que prorroga em mais 12 (doze) meses a qualidade de segurado, dando ao autor o prazo total de 24 (vinte e quatro) meses após a demissão, sendo prescindível, segundo entendimento majoritário, o registro da situação no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
A propósito:
"PREVIDENCIÁRIO. QUALIDADE DE SEGURADO. PRORROGAÇÃO DO PERÍODO DE GRAÇA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE DESEMPREGO PERANTE O ÓRGÃO DO MINISTÉRIO DE TRABALHO OU DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. INSUFICIÊNCIA DE ELEMENTOS PROBATÓRIOS. COMPROVAÇÃO DO DESEMPREGO POR OUTROS MEIOS DE PROVA. POSSIBILIDADE. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. "1. No caso concreto, no que diz respeito à demonstração da qualidade de segurado do recorrente, a Corte de origem, ao se embasar unicamente na ausência de comprovação do desemprego perante o órgão do Ministério de Trabalho ou da Previdência Social, destoou da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, razão pela qual merece prosperar a irresignação. "2. Com efeito, segundo entendimento da Terceira Seção do STJ, a ausência de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social poderá ser suprida quando for comprovada a situação de desemprego por outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal. (AgRg na Pet 8.694/PR, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, julgado em 26.9.2012, DJe 9.10.2012). "3. Recurso Especial provido, determinando o retorno dos autos à origem para que oportunize ao recorrente a produção de provas e, então, julgue a causa como entender de direito" (REsp 1668380/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/06/2017, DJe 20/06/2017).
Tem-se, assim, garantida a manutenção da qualidade de segurado por ao menos 24 (vinte e quatro) meses após a cessação das contribuições. Considerando isso, o prazo legal não decorreu antes do novo pedido de concessão do benefício previdenciário em junho de 2016, pois a qualidade de segurado seria mantida pelo menos até abril/2017. Por consequência, não há falarse na exigência do cumprimento de carência, porque já cumprido à época
(...)
Nas razões recursais, a Autarquia pugna pela reversão da decisão que concedeu auxílio-doença ao autor, alegando que a parte autora não ostentava qualidade de segurado quando do requerimento administrativo (29-06-2016), dado que inexistente nos autos comprovação da situação de desemprego involuntário capaz de ensejar a prorrogação do período de graça em 12 meses.
Pois bem. A qualidade de segurado não se encerra, automaticamente, com a interrupção das contribuições, haja vista que o legislador previu os chamados "períodos de graça", ou seja, formas de manutenção da condição de segurado, independentemente de contribuições (art. 15 da Lei 8.213/91). Nesses lapsos temporais, restam conservados todos os direitos previdenciários dos segurados (art. 15, §3º, da LB).
Por oportuno, transcrevo o referido dispositivo legal, com a redação vigente na época no início da incapacidade laboral:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
No caso sub examine, inexiste registro de desemprego junto ao Ministério do Trabalho e da Previdência Social após o último contrato de trabalho registrado na CTPS da parte autora. Sendo assim, mostra-se imprescindível a comprovação da condição de desemprego do segurado para que lhe seja reconhecida a prorrogação da qualidade de segurado prevista no artigo art. 15, II, § 2º, da Lei 8.213/91, dado que a jurisprudência do STJ entende que "a simples ausência de registro na CTPS não tem o condão de, por si só, comprovar a situação de desemprego, devendo ser cumulada com outros elementos probatórios" (AgRg no AREsp 801.828/PE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 24/11/2015, DJe 02/12/2015).
Desse modo, deve ser anulada a sentença e reaberta a instrução para comprovação da condição de desemprego do autor, mediante realização de prova testemunhal, nos termos da jurisprudência deste Colegiado realizado na forma do art. 942 do NCPC:
PREVIDENCIÁRIO. QUESTÃO DE ORDEM. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. AUSÊNCIA DE ENFRENTAMENTO DA QUALIDADE DE SEGURADO PELA SENTENÇA. MATÉRIA PASSÍVEL DE ANÁLISE PELO TRIBUNAL. SITUAÇÃO DE DESEMPREGO. PERÍODO DE GRAÇA. CONVERSÃO DO JULGAMENTO EM DILIGÊNCIA PARA COLHEITA DE PROVA TESTEMUNHAL. 1. São quatro os requisitos legais para a concessão de benefício previdenciário por incapacidade: (a) qualidade de segurado do requerente (art. 15 da LBPS); (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais prevista no art. 25, I, da Lei 8.213/91 e art. 24, parágrafo único, da LBPS; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência; e (d) caráter permanente da incapacidade (para o caso da aposentadoria por invalidez) ou temporário (para o caso do auxílio-doença). 2. Em se tratando de ação que veicula pretensão de obtenção de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, a circunstância de a sentença não abordar o atendimento do requisito pertinente à qualidade de segurado, fundamentando a improcedência do pedido na ausência de demonstração da incapacidade para o trabalho, não impede que sobre aquela matéria se debruce o Tribunal de Apelação, em obediência à legislação de regência. 3. O INSS não poderia, por absoluta falta de interesse, interpor recurso de sentença que julgou improcedente o pedido somente para questionar a falta da qualidade de segurado, que, no caso concreto, foi, inclusive, objeto da contestação oferecida. 4. Conforme decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, em incidente de uniformização de interpretação de lei federal (Pet 7115/PR, Terceira Seção, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 06-04-2010), o registro da situação de desemprego no Ministério do Trabalho e Previdência Social não deve ser tido como o único meio de prova da condição de desempregado do segurado, para fins de reconhecimento do período de graça previsto no art. 15 da Lei 8.213/91, podendo ser suprido por outras provas, inclusive a testemunhal. 5. Hipótese em que o julgamento da apelação foi convertido em diligência, para oportunizar a oitiva de testemunhas que comprovassem o alegado desemprego da parte autora. (TRF4, AC 5028851-58.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relatora para Acórdão GABRIELA PIETSCH SERAFIN, juntado aos autos em 29/08/2019).
Portanto, em face do preceito contido no artigo 370 do Novo Código de Processo Civil (Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias), mostra-se prematura a solução da controvérsia, devendo ser anulada a sentença e retomada a instrução quanto à qualidade de segurado do autor, posteriormente à situação de desemprego em fevereiro de 2015
Dispositivo
Ante o exposto, voto por, de ofício, anular a sentença, determinando a remessa dos autos ao juízo de origem, a fim de que seja reaberta a fase instrutória para comprovação da eventual condição de desemprego da parte autora no período de fevereiro de 2015 a junho de 2016.
Documento eletrônico assinado por JAIRO GILBERTO SCHAFER, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003386203v18 e do código CRC cfdc7e23.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JAIRO GILBERTO SCHAFER
Data e Hora: 22/8/2022, às 18:13:53
Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 16:34:33.
Apelação Cível Nº 5023608-02.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: DANIEL NUNES MONTEIRO
ADVOGADO: CLEUMAR MORAES CORREIA (OAB SC042763)
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. benefício por incapacidade. comprovação da qualidade de segurado. período de graça. necessidade de comprovação do desemprego. sentença anulada para reabertura da instrução.
Segundo a jurisprudência do Colendo STJ, para fins de comprovação da situação de desemprego o registro perante os órgãos federais competentes pode ser suprido por outras provas, inclusive de natureza testemunhal, não sendo suficiente, todavia, o mero registro na CTPS da data de saída do emprego e a ausência de registros posteriores (Pet 7115/PR, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, 3ª Seção, DJe 06/04/2010). Diante disso, a sentença deve ser anulada para determinar a reabertura da instrução para comprovação do desemprego do autor.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, de ofício, anular a sentença, determinando a remessa dos autos ao juízo de origem, a fim de que seja reaberta a fase instrutória para comprovação da eventual condição de desemprego da parte autora no período de fevereiro de 2015 a junho de 2016, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 19 de agosto de 2022.
Documento eletrônico assinado por JAIRO GILBERTO SCHAFER, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003386204v5 e do código CRC b4aa4d91.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JAIRO GILBERTO SCHAFER
Data e Hora: 22/8/2022, às 18:13:54
Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 16:34:33.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 12/08/2022 A 19/08/2022
Apelação Cível Nº 5023608-02.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Juiz Federal JAIRO GILBERTO SCHAFER
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: DANIEL NUNES MONTEIRO
ADVOGADO: CLEUMAR MORAES CORREIA (OAB SC042763)
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 12/08/2022, às 00:00, a 19/08/2022, às 16:00, na sequência 163, disponibilizada no DE de 02/08/2022.
Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DE OFÍCIO, ANULAR A SENTENÇA, DETERMINANDO A REMESSA DOS AUTOS AO JUÍZO DE ORIGEM, A FIM DE QUE SEJA REABERTA A FASE INSTRUTÓRIA PARA COMPROVAÇÃO DA EVENTUAL CONDIÇÃO DE DESEMPREGO DA PARTE AUTORA NO PERÍODO DE FEVEREIRO DE 2015 A JUNHO DE 2016.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JAIRO GILBERTO SCHAFER
Votante: Juiz Federal JAIRO GILBERTO SCHAFER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 16:34:33.