Apelação Cível Nº 5014448-79.2021.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: ROSELI RUBICK
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença, publicada em 18-06-2021, na qual o magistrado a quo julgou extinto o feito, sem resolução de mérito, uma vez que a parte autora não compareceu às perícias médicas designadas. Condenou a parte autora ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, os quais restaram suspensos em razão do benefício da assistência judiciária gratuita.
Em suas razões, a parte autora alega a ocorrência de cerceamento de defesa. Nesse sentido, afirma que o seu não comparecimento ao ato pericial foi devidamente justificado e se deve ao fato de que o exame seria realizado em comarca diversa, contudo o transporte público não estava sendo ofertado de forma regular em virtude da pandemia de COVID-19. Ademais, informou integrar grupo de risco, de modo que as medidas de isolamento social demandavam maior cautela. Dessa forma, requer a anulação da sentença para haja a reabertura da instrução processual com a realização perícia judicial.
O INSS, por sua vez, requer seja autorizada a cobrança dos valores pagos à parte autora em decorrência da antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada.
Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Trata-se de ação através da qual a parte autora postula a concessão de benefício por incapacidade, em virtude das patologias de que é portadora.
A perícia médica judicial, nas ações que envolvem a pretensão de concessão de benefício por incapacidade para o trabalho - o que se verifica no presente caso -, exerce importante influência na formação do convencimento do magistrado.
Por tal razão, foi designada a realização de perícia médica judicial no dia 27-07-2020 em endereço profissional na cidade de Florianópolis/SC (evento 80 - OUT1; e evento 94 - DEC1).
Em seguida, sobreveio informação da perita judicial de que a parte autora não teria comparecido ao ato designado (evento 108 - DEC1).
Aberto prazo para manifestação da parte autora, o procurador juntou petição argumentando que a ausência na perícia judicial designada ocorreu no contexto da pandemia de COVID-19, bem como expressou o interesse na continuidade da demanda e requereu a redesignação da perícia, conforme segue (evento 111 - CERT1):
[...] requerer a designação de nova data para a pericia face à pandemia pelo COVID-19, que impõe isolamento social, sendo a mesma do grupo de risco e não havendo transporte público, bem como não dispondo de condições financeira para outro meio de transporte, restando a impossibilidade de comparecer ao ato.
A justificativa foi acolhida, tendo sido designada nova data para a realização do exame pericial (evento 114 - DESPADEC1).
Verificada a ausência da parte no dia 18-01-2021 (evento 131 - DEC1), concedeu-se novo prazo para justificativa.
O procurador da parte autora juntou petição argumentando novamente sobre o contexto de pandemia, o quadro clínico suportado pela autora, a impossibilidade de deslocamento a comarca diversa e reiterando o pedido pelo prosseguimento da ação (evento 141 - CERT1).
Apesar de não ter comparecido ao exame pericial, percebe-se que a parte autora justificou sua ausência, bem como demonstrou sua intenção em comprovar o motivo do não comparecimento, visando a designação de nova data para o ato pericial.
Contudo, foi proferida a sentença extinguindo o feito sem resolução de mérito (evento 145 - OUT1). Nos fundamentos, o magistrado pontuou que a parte autora não esteve presente no local e na data designada para a perícia e, por entender que "no mês de janeiro de 2021, apesar da pandemia da COVID19, diversas atividades estão sendo desenvolvidas, inclusive as de transporte urbano, restando possível o deslocamento", deixou de designar nova data.
Merece acolhida a insurgência da parte autora.
Considero que a ausência do segurado à perícia obsta uma apreciação plena da questão de fundo e, por essa razão, impede a apreciação do mérito da causa. Ademais, para que se torne efetivamente implementada a proteção previdenciária, necessária a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Cumpre enfatizar que as ações de natureza previdenciária, na sua grande maioria, são exercitadas por pessoas hipossuficientes - o que poderia, por vezes, justificar o não comparecimento aos atos processuais.
No presente caso, a parte autora apresentou justificativa plausível para o não comparecimento, bem como requereu o prosseguimento da ação, restando configurado o cerceamento de defesa ao concluir o juízo pelo indeferimento da realização de nova prova pericial.
Com efeito, a autora reside em São José/SC, de modo que seria necessário deslocar-se até Florianópolis/SC. A documentação médica acostada aos autos indica que é portadora de embolia e trombose venosas (CID I82), havendo razão portanto para maior atenção à saúde no contexto pandêmico.
Efetivamente, nas ações visando à concessão do benefício por incapacidade, a realização da perícia médica é imprescindível para avaliar se a parte autora está ou não acometida por doença incapacitante ou, mesmo, que acarrete a redução da capacidade laboral.
Ora, se a jurisprudência tem admitido a designação de nova data para a perícia mesmo quando a justificativa apresentada é genérica, com mais razão ainda ela é de ser admitida quando possui fundamento em razão da pandemia de COVID-19. Entendo, desse modo, que, em se tratando de demanda previdenciária, a justificativa apresentada pela autora é suficiente para autorizar a designação de nova perícia médica.
Nesse sentido, a jurisprudência desta Turma:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO POR FALTA DE COMPARECIMENTO DO AUTOR À PERÍCIA MÉDICA. JUSTO MOTIVO. ISOLAMENTO SOCIAL. COVID-19. PANDEMIA. SENTENÇA ANULADA. 1. Em casos de benefício por incapacidade, a realização de prova técnica é indispensável. 2. In casu, reconhecido o justo motivo para o não comparecimento (isolamento social determinado pelas autoridades sanitárias em março de 2020), deve ser anulada a sentença para reabrir a instrução processual, a fim de viabilizar a realização de perícia médica. (TRF4, AC 5002425-04.2021.4.04.9999, NONA TURMA, Relator JAIRO GILBERTO SCHAFER, juntado aos autos em 22/08/2022)
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PERÍCIA MÉDICA. NÃO COMPARECIMENTO. JUSTIFICATIVA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. 1. Nos casos de requerimento de benefício assistencial, o julgador, via de regra, firma sua convicção por meio das perícias técnicas. A ausência da parte autora à perícia obsta uma apreciação plena da questão de fundo e, por esta razão, impede a apreciação do mérito da causa. 2. Tratando-se de pessoa hipossuficiente, que busca benefício de natureza alimentar, diretamente vinculado à preservação de sua dignidade e integridade física, deve ser relativizado o rigor processual. 3. A alegada "ausência de condições financeiras" deve ser admitida como justificativa para o não comparecimento da autora à perícia, que seria realizada em outro município. 4. Impõe-se a anulação da sentença e a reabertura da instrução probatória. (TRF4, AC 5008475-46.2021.4.04.9999, NONA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 22/07/2021)
Desse modo, uma vez configurado o cerceamento de defesa, merece provimento o recurso, devendo ser anulada a sentença e reaberta a instrução com a realização de perícia médica para a qual a autora deverá ser intimada pessoalmente.
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença e determinar a reabertura da instrução processual, nos termos da fundamentação supra, prejudicada a análise da apelação do INSS.
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Apelação Cível Nº 5014448-79.2021.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: ROSELI RUBICK
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. NÃO COMPARECIMENTO NA PERÍCIA. JUSTIFICATIVA. CERCEAMENTO DE DEFESA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
1. Para que se torne efetivamente implementada a proteção previdenciária, necessária a flexibilização dos rígidos institutos processuais, razão pela qual deve ser oportunizada a realização de nova perícia médica, ante a justificada ausência da parte autora nas datas designadas.
2. Anulada a sentença e determinada a reabertura da instrução para a realização da perícia.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença e determinar a reabertura da instrução processual, nos termos da fundamentação supra, prejudicada a análise da apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 08 de fevereiro de 2023.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003671520v3 e do código CRC c08c0f61.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 31/01/2023 A 08/02/2023
Apelação Cível Nº 5014448-79.2021.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: ROSELI RUBICK
ADVOGADO(A): ARI LEITE SILVESTRE (OAB SC023560)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 31/01/2023, às 00:00, a 08/02/2023, às 16:00, na sequência 665, disponibilizada no DE de 19/12/2022.
Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA ANULAR A SENTENÇA E DETERMINAR A REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO SUPRA, PREJUDICADA A ANÁLISE DA APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Juiz Federal JOÃO BATISTA LAZZARI
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 02/03/2023 04:17:02.