Apelação Cível Nº 5053265-57.2017.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: IVAN ASCARI ALBERTON
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pela parte autora em face da sentença, publicada em 19/05/2017 (e.2.88), que julgou improcedente o pedido de benefício por incapacidade.
Sustenta, em síntese, que preenche os requisitos necessários a sua concessão, pois encontra-se total e definitivamente incapacitado para o exercício das atividades habituais. Alega que "desenvolveu doença depressivo-ansiosa que evoluiu de forma crônica e incapacitante. Salienta-se que a enfermidade foi evidenciada após o acometimento clínico de diverticulite complicada com hemorragia e perda de peso, bem como sofre de grave problema cardíaco, devido as CID’s I50 (insuficiência cardíaca), I48 (Flutter' e fibrilação atrial), I10 (Hipertensão essencial - primária), conforme atestados que se encontram anexos aos autos". Porém, afirma que o perito judicial sequer teria mencionado os documentos relativos à patologia cardíaca, limitando-se a declarar que o autor sofre de uma provável CID F33.4. Postula, pois, a reforma da sentença, para que seja concedido o benefício ou o retorno dos autos ao juízo de origem, para que seja realizada nova perícia por especialista (e.2.99).
Embora intimado, o INSS não apresentou contrarrazões.
Subiram os autos a esta Corte.
No evento 8.1, foi determinada a conversão do julgamento em diligência, para a realização de perícia com médico cardiologista.
A perícia cardiológica foi realizada em 09/10/2019 (e.22.13 e e.22.20), tendo as partes se manifestado a respeito do laudo (e.22.14/17).
Retornaram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
A parte autora (motorista de caminhão, ensino fundamental incompleto, atualmente com 69 anos de idade) objetiva o restabelecimento do benefício de auxílio por incapacidade temporária n. 603.527.397-5, desde a DCB (17/02/2014), e a concessão de aposentadoria por incapacidade permanente, decorrente de doenças de natureza psiquiátrica e cardíaca, comprovadas por diversos documentos, dentre os quais destaco:
Processado o feito, sobreveio sentença julgando improcedente a demanda, em face de laudo pericial psiquiátrico (e.2.64/65) que considerou o autor apto ao labor, apesar de portador de "provável CID F33.4" (transtorno depressivo recorrente, atualmente em remissão).
Nesta instância, porém, foi determinada a realização de perícia com especialista em cardiologia.
Na perícia cardiológica, realizada em 09/10/2019 (e.22.13 e e.22.20), o perito constatou que o autor apresenta incapacidade total, permanente e mutiprofissional, em virtude das seguintes patologias: insuficiência cardíaca congestiva (I50), fibrilação arterial (I48), hipertensão arterial (I10), cardiomegalia (I51.7) e depressão (F32).
Disse, outrossim, que a doença cardiológica é antiga, com início há aproximadamene 10 anos, mas que a incapacidade laboral poderia ser comprovada a partir do exame de ecocardiograma realizado em 30/06/2015. Admitiu, no entanto, que "talvez já houvesse incapacidade em janeiro de 2015" do ponto de vista cardiológico. Afirmou, ainda, que, apesar de ter constatado a depressão na data da perícia, há nos autos atestados de psiquiatra do ano de 2014 com o referido diagnóstico.
Por fim, o perito cardiologista foi bastante enfático ao afirmar, diversas vezes, que não há possibilidade de o autor recuperar-se, pois se trata de cardiopatia grave, nem de ser reabilitado para outras atividades.
Pois bem.
Não obstante as considerações esposadas pelo perito psiquiatra, sabe-se que o juízo não está adstrito às conclusões do laudo médico pericial, nos termos do artigo 479 do NCPC (Art. 479. O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito), podendo discordar, fundamentadamente, das conclusões do perito em razão dos demais elementos probatórios coligidos aos autos, inclusive os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado, ainda que o laudo pericial apenas tenha concluído pela sua incapacidade parcial para o trabalho (AgRg no AREsp 35.668/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, DJe 20-02-2015).
Assim, tendo a perícia certificado a existência da patologia alegada pela parte autora, o juízo de incapacidade pode ser determinado, sem sombra de dúvidas, pelas regras da experiência do magistrado, consoante preclara disposição do artigo 375 do NCPC (O juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a estas, o exame pericial.). Destaca-se que tal orientação vem prevalecendo no âmbito do Egrégio STJ ao ratificar, monocraticmente, decisões que levaram em consideração os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado para superar o laudo pericial (v.g. AREsp 1409049, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJ 21-02-2019).
Portanto, ainda que o laudo pericial psiquiátrico realizado tenha concluído pela aptidão laboral da parte autora, a confirmação da existência da moléstia incapacitante referida na exordial (transtorno depressivo), corroborada pela documentação clínica supra, associada às suas condições pessoais - habilitação profissional (motorista de caminhão) e idade atual (69 anos de idade) - demonstra a efetiva incapacidade definitiva para o exercício da atividade profissional, ressaltando-se que, na perícia cardiológica, realizada quatro anos depois da perícia psiquiátrica, o perito constatou que o autor sofria de depressão desde 2014.
No que diz respeito à perícia cardiológica, o perito não deixou dúvidas de que o autor apresenta incapacidade total, permanente e multiprofissional com certeza desde 30/06/2015 e, possivelmente, desde janeiro de 2015.
O INSS alega que, em 30/06/2015 - data do início da incapacidade -, o autor já teria perdido a qualidade de segurado, pois o último benefício por incapacidade percebido cessou em 17/02/2014, só tendo voltado a contribuir em 01/07/2018, consoante CNIS anexado no e.22.22.
No entanto, o autor trouxe aos autos documentos que comprovam a existência de incapacidade laboral por doença psiquiátrica desde a época da cessação do benefício anterior e de incapacidade laboral devido à cardiopatia grave desde janeiro de 2015, pois o exame de ECG realizado em 09/01/2015 (acima anexado) já apontava diversas alterações cardíacas.
Assim sendo, entendo que o autor faz jus ao restabelecimento do AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA desde a DCB (17/02/2014) e à sua conversão em APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE desde a data da perícia cardiológica (09/10/2019).
Não há parcelas prescritas, pois a ação foi ajuizada em 13/03/2014.
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, D DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-102019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Juros moratórios
Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.
A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.
Honorários advocatícios
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas (Súmula 76 do TRF4), considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).
Implantação do benefício
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do NCPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, a contar da publicação do presente acórdão, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Saliente-se, por oportuno, que, na hipótese de a parte autora estar auferindo benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.
Faculta-se, outrossim, à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Conclusão
Reforma-se a sentença, para condenar o INSS ao restabelecimento do AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA desde a DCB (17/02/2014) e à sua conversão em APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE desde a data da perícia cardiológica (09/10/2019).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício.
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Apelação Cível Nº 5053265-57.2017.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: IVAN ASCARI ALBERTON
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. benefício por incapacidade. REQUISITOS PREENCHIDOS. doenças de natureza cardiológica e psiquiátrica.
1. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter definitivo da incapacidade.
2. Hipótese em que restou comprovada a incapacidade laborativa da parte autora desde a cessação do benefício anterior, sendo devido o restabelecimento do AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA desde a DCB (17/02/2014) e a sua conversão em APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE a contar a data da perícia cardiológica (09/10/2019).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de dezembro de 2020.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002219545v3 e do código CRC 8b63f695.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 10/12/2020 A 17/12/2020
Apelação Cível Nº 5053265-57.2017.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: IVAN ASCARI ALBERTON
ADVOGADO: MONICA MORGAN VERONEZI (OAB SC030942)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/12/2020, às 00:00, a 17/12/2020, às 16:00, na sequência 450, disponibilizada no DE de 30/11/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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