Apelação Cível Nº 5021614-03.2019.4.04.7100/RS
RELATORA: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
APELANTE: VANDERLEI NASCIMENTO DE OLIVEIRA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em face de sentença de improcedência do pedido de concessão de benefício previdenciário por incapacidade, vez que não demonstrada a inaptidão para o exercício da atividade habitual.
A parte autora recorre afirmando que se encontra impossibilitada de retornar ao trabalho em razão das doenças que lhe acometem. Argumenta que os peritos judiciais não analisaram a documentação médica juntada e que pretendia a produção de prova testemunhal para comprovar suas condições. Requer a concessão de benefício por incapacidade com base nas provas constantes do processo ou a nulidade da sentença e o retorno dos autos ao juízo de origem para reabertura da instrução processual, com a realização de audiência de instrução com oitiva de testemunhas e médico assistente.
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de Admissibilidade
O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.
Mérito
O benefício de auxílio por incapacidade temporária (antigo auxílio-doença) está previsto no art. 59 da Lei 8.213/1991, sendo devido ao segurado que ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
De outro lado, o benefício da aposentadoria por incapacidade permanente (antiga aposentadoria por invalidez), é prevista no art. 42 do mesmo diploma legal, quando o segurado for considerado incapaz de modo permanente para sua atividade habitual e insusceptível de reabilitação para o exercício de outra atividade que lhe garanta a subsistência, sendo pago enquanto permanecer nesta condição.
Pelas disposições contidas nas normas referidas, a diferença entre os dois benefícios diz respeito ao grau de incapacidade laboral do segurado. Quando a incapacidade para as atividades habituais for temporária, o segurado tem direito ao benefício de auxílio por incapacidade temporária; sendo incapaz definitivamente para desenvolver qualquer atividade laborativa que lhe garanta a subsistência, o segurado é considerado inválido e tem direito à aposentadoria por incapacidade permanente.
Para a concessão dos referidos benefícios são exigidas, além da comprovação da incapacidade: (a) a qualidade de segurado quando do início da incapacidade, não podendo esta ser pré-existente à sua filiação ou reingresso, (b) a carência em número de contribuições mensais, na forma do art. 25, I da Lei 8.213/1991, ressalvadas as hipóteses de isenção previstas no art. 26 da mesma norma.
Do Caso Concreto
Não há, nestes autos, discussão acerca da qualidade de segurado ou do cumprimento da carência necessária à concessão do benefício, restringindo-se a lide recursal à existência (ou não) de incapacidade para o trabalho.
Segundo consta, o autor, 57 anos de idade, está vinculado ao RGPS na condição de empregado, atividade declarada de vendedor de calçados. Recebeu auxílio por incapacidade temporária de 22/03/2007 a 05/12/207 (NB 519.948.138-0), por problemas psiquiátricos. Busca, através desta ação, o restabelecimento do benefício.
A sentença reconheceu a existência de coisa julgada parcial formada no processo 5005189-32.2018.4.04.7100, em que julgado improcedente o pedido de restabelecimento do benefício de auxílio-doença cessado em 05/12/2017 (NB 31/519948138-6). Analisou o pedido sob a ótiva no novo requerimento administrativo apresentado em 10/09/2018 (NB 31/624731991-0).
Nas ações que envolvem a pretensão de concessão de benefício por incapacidade, o julgador firma sua convicção, de regra, por meio da prova pericial. Todavia, tal prova não se reveste de valor absoluto, sendo possível afastá-la, fundamentadamente, se uma das partes apresentar elementos probatórios consistentes que conduzam a juízo de convicção diverso da conclusão do perito judicial, ou se, apesar da conclusão final deste, a própria perícia trouxer elementos que a contradigam.
Ainda, a análise da incapacidade do segurado para a percepção de benefício por incapacidade não pode ater-se apenas à enfermidade apontada, devendo levar em consideração todas as circunstâncias pessoais (físicas, psicológicas e sociais) que cercam o ambiente vivenciado pelo requerente do benefício.
No presente caso, foram realizadas duas perícias judiciais. A primeira perícia, em 04/10/2019, concluiu que o segurado encontra-se apto para o trabalho. Do laudo (evento 34, doc. LAUDOPERIC1, processo originário) extrai-se:
Conclusão: sem incapacidade atual
- Justificativa: Transtorno de humor crônico associado a traços caracteriológicos de personalidade. Ao exame do estado mental atual não apresenta alterações incapacitantes. Encontra-se em tratamento psiquiátrico regular em uso contínuo de medicamentos de manutenção.
- Houve incapacidade pretérita em período(s) além daquele(s) em que o(a) autor(a) já esteve em gozo de benefício previdenciário? NÃO
- Caso não haja incapacidade atual, o(a) autor(a) apresenta sequela consolidada decorrente de acidente de qualquer natureza? NÃO
Na segunda perícia, realizada por outro profissional em 02/09/2020, da mesma forma o experto posicionou-se pela ausência de incapacidade do autor:
Conclusão: sem incapacidade atual
- Justificativa: O Exame Pericial Psiquiátrico teve as conclusões baseadas nos seguintes procedimentos: leitura dos autos do processo, anamnese clinica, exame de funções psíquicas e anamnese objetiva, considerando conjuntamente a versão da periciada, os documentos existentes no processo e apresentados no momento do exame, a literatura medica pertinente, o conhecimento técnico e a experiência profissional do perito, em consonância com o Código de Ética Medica e as resoluções 12/2009 do CREMERS e 1851/2008 do CFM.
(...)
No presente caso o perito se identificou como tal, ressaltando suas atribuições periciais e não de médico assistenciais. A parte autora foi informada a natureza e o objetivo da avaliação, assim como a não confidencialidade das informações fornecidas. O exame clínico pericial da parte autora evidenciou a existência de distúrbio em fase sintomatológica estabilizada. Para o verificação de incapacidade atual decorrente deste distúrbio foram considerados todos os elementos técnicos que efetivamente pudessem comprovar, pela análise médico pericial, que as queixas atuais referidas aos distúrbios atestados por seus médicos assistentes, se constituíssem em incapacidade laboral, considerada sua atividade habitual, quesito fundamental para constatação de incapacidade. Esta análise não trouxe a este médico perito, elementos de convicção de que os distúrbios estejam, no seu atual momento evolutivo, causando incapacidade ao trabalho, apresentando-se como patologias de longa evolução, mas que com o tratamento indicado permitem manter atividade laboral, apesar de suas queixas.
Como visto, foi constatado pelos expertos que o autor é portador de transtorno afetivo bipolar e transtornos específicos da personalidade, sendo que disso não resulta impedimento ao exercício das atividades laborativas habituais.
Em suas razões, reporta-se o autor à documentação médica juntada aos autos, defendendo a comprovação da sua inaptidão laboral inclusive com a produção de prova testemunhal.
De fato, constam nos autos atestados de médico assistente, datados de 18/02/2019, 25/03/2019 e 27/08/2020, dizendo da existência de incapacidade total e permanente para o labor.
Entretanto, diante da realização de duas perícias médicas no processo, por profissionais diversos, ambos especialistas em psiquiatria, não vejo como privilegiar, em detrimento das conclusões obtidas pelos expertos da confiança do juízo, as manifestações do médico assistente.
Reitero, os exames periciais foram realizados por médicos especialistas na área da patologia do recorrente, tendo sido suficientemente analisados os exames e a documentação médica apresentada. Os expertos informaram que o quadro clínico da parte autora indica patologias de longa evolução, mas que com o tratamento indicado permitem manter atividade laboral, apesar de suas queixas.
Merece registro, ainda, que apesar do longo tempo de manutenção do benefício previdenciário (2007 a 2017), não houve reavaliação administrativa após o ano de 2008. Ademais, também na demanda anterior não foi constatada incapacidade laborativa.
Por fim, a prova testemunhal não se presta à comprovação da existência de incapacidade laborativa, que deve ser atestada por prova técnica. Nesse sentido colhe-se da jurisprudência:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PERÍCIA. NULIDADE NÃO VERIFICADA. DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. 1. Dentre os elementos necessários à comprovação da incapacidade, com vistas à concessão de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, a prova pericial, embora não tenha valor absoluto, exerce importante influência na formação do convencimento do julgador. Afastá-la, fundamentadamente, seja para deferir, seja para indeferir o benefício previdenciário, exige que as partes tenham produzido provas consistentes que apontem, de forma precisa, para convicção diversa da alcançada pelo expert. 2. Como regra geral, o clínico geral, médico do trabalho ou o especialista em perícias médicas, acha-se profissionalmente habilitado para reconhecer a existência de incapacidade para o trabalho nos casos de ações previdenciárias. 3. A prova testemunhal é desnecessária quando se trata de aferir incapacidade laboral, visto tratar-se de decisão que exige prova técnica. 4. Constatada, pelo perito oficial do juízo, a ausência de doença incapacitante para as atividades laborais realizadas pelo segurado é incabível a concessão dos benefícios de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez (TRF4, AC 0021988-16.2014.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, D.E. 14/04/2016) - grifos acrescidos
Concluindo, não tendo sido produzida pela parte autora prova bastante a desconfigurar a conclusão dos médicos de confiança do juízo, equidistantes dos interesses das partes, deve ser mantida a sentença de improcedência.
Honorários Recursais
Considerando a manutenção da sentença de primeiro grau e tendo em conta o disposto no § 11 do art. 85 do CPC, majoro a verba honorária para 12% do valor atribuído à causa, mantida a suspensão por conta da justiça gratuita deferida.
Prequestionamento
No que concerne ao prequestionamento, tendo sido a matéria analisada, não há qualquer óbice, ao menos por esse ângulo, à interposição de recursos aos tribunais superiores.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora.
Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003582753v21 e do código CRC 016153de.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5021614-03.2019.4.04.7100/RS
RELATORA: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
APELANTE: VANDERLEI NASCIMENTO DE OLIVEIRA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE. PERÍCIA MÉDICA. PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL. DESNECESSIDADE. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. IMPROCEDÊNCIA.
A ausência de comprovação da existência de incapacidade para a atividade habitual impede a concessão do benefício de auxílio por incapacidade temporária ou aposentadoria por invalidez.
Hipótese em que, apesar do longo tempo de manutenção do benefício de auxílio por incapacidade temporária, foram realizadas duas perícias médicas por médicos especialistas e em ambos os laudos foi registrada a aptidão laboral do autor.
Prevalência dos laudos judiciais, em detrimento dos atestados médicos expedidos pelo médico assistente. Descabimento da produção de prova testemunhal, que não se presta à comprovação de incapacidade laborativa.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 18 de novembro de 2022.
Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003582754v5 e do código CRC 2ab93ce6.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/11/2022 A 18/11/2022
Apelação Cível Nº 5021614-03.2019.4.04.7100/RS
RELATORA: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: VANDERLEI NASCIMENTO DE OLIVEIRA (AUTOR)
ADVOGADO(A): KAREN PRISCILLA TAVARES CANCIAN (OAB RS108773)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/11/2022, às 00:00, a 18/11/2022, às 16:00, na sequência 147, disponibilizada no DE de 27/10/2022.
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Juiz Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
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