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PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SEGURADO ESPECIAL. BOIA-FRIA. ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA. INCAPACIDADE LABORAL COMPROVADA. CONDIÇ...

Data da publicação: 04/07/2020, 01:09:56

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SEGURADO ESPECIAL. BOIA-FRIA. ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA. INCAPACIDADE LABORAL COMPROVADA. CONDIÇÕES PESSOAIS. 1. A comprovação do exercício de atividade rural pode ser efetuada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea. Assim, presente início de prova material, complementada por direta prova oral, no período controverso, devida é a admissão da condição da parte autora como segurada especial. 2. Comprovado que o segurado encontra-se total e permanentemente incapacitado para o trabalho, considerando suas condições pessoais, devida é a concessão de aposentadoria por invalidez desde o requerimento administrativo, porquanto comprovada a insuscetibilidade de recuperação já àquela data. (TRF4, APELREEX 5006678-65.2013.4.04.7202, SEXTA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 26/02/2015)


APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5006678-65.2013.404.7202/SC
RELATOR
:
VÂNIA HACK DE ALMEIDA
APELANTE
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO
:
VALDOMIRO VENANCIO PEREIRA
ADVOGADO
:
KATIUSKA RAQUIELY MARTINS DE QUADROS
MPF
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SEGURADO ESPECIAL. BOIA-FRIA. ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA. INCAPACIDADE LABORAL COMPROVADA. CONDIÇÕES PESSOAIS.
1. A comprovação do exercício de atividade rural pode ser efetuada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea. Assim, presente início de prova material, complementada por direta prova oral, no período controverso, devida é a admissão da condição da parte autora como segurada especial.
2. Comprovado que o segurado encontra-se total e permanentemente incapacitado para o trabalho, considerando suas condições pessoais, devida é a concessão de aposentadoria por invalidez desde o requerimento administrativo, porquanto comprovada a insuscetibilidade de recuperação já àquela data.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 25 de fevereiro de 2015.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora


Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7311677v8 e, se solicitado, do código CRC 147643AF.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Vânia Hack de Almeida
Data e Hora: 25/02/2015 16:11




APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5006678-65.2013.404.7202/SC
RELATOR
:
VÂNIA HACK DE ALMEIDA
APELANTE
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO
:
VALDOMIRO VENANCIO PEREIRA
ADVOGADO
:
KATIUSKA RAQUIELY MARTINS DE QUADROS
MPF
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária, objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez/auxílio-doença desde o requerimento administrativo, em 18/09/2008.

A sentença deferiu a antecipação de tutela e julgou procedente a ação, condenando o INSS a conceder o benefício de aposentadoria por invalidez desde a data do requerimento adminsitrativo, em 18/09/2008, com correção monetária pelo INPC e juros de mora de 1% ao mês, sendo que, a partir de 01/07/2009, serão calculados de acordo com o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009. Ainda, isentou a autarquia do pagamento das despesas processuais e fixou honorários advocatícios em R$ 1.000,00 (mil reais) (EVENTO 81).

Apelou o INSS alegando que a parte autora não possui a qualidade de segurado, razão pela qual não faz jus aos benefícios pleiteados na exordial (EVENTO 89).

Apresentadas as contrarrazões no evento 92, subiram os autos.

O Ministério Público Federal, com assento nesta Corte, opinou pelo desprovimento da apelação e da remessa oficial.

É o relatório.
VOTO
Da remessa oficial

Consoante decisão da Corte Especial do STJ (EREsp nº 934642/PR), as sentenças proferidas contra o INSS em matéria previdenciária só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos. Não sendo esse o caso, conheço da remessa oficial.

Fundamentação

A sentença analisou as questões postas em julgamento nos seguintes termos:

"[...] A perícia judicial, representada pelo laudo anexado no evento 62, concluiu que o autor é portador de 'retardo mental, hipertensão e labirintite', que o tornam definitivamente incapaz de exercer qualquer atividade laborativa, não havendo possibilidade de reabilitação.
O perito informou também que o autor apresenta distrofia muscular, depressão, artrose nos joelhos, perda da motricidade e mal estado geral (resposta aos quesitos 05 e 12 do INSS).
[...]
b.3) Qualidade de Segurado e carência
A parte autora alega na inicial que sempre exerceu a atividade de diarista rural/bóia-fria, e que, portanto, detém a qualidade de segurado especial.
Em se tratando de trabalhador rural diarista, chamado 'bóia-fria', os tribunais vinham flexibilizando a exigência da prova material, admitindo até mesmo a prova exclusivamente testemunhal, desde que conclusiva, em face da notória dificuldade de obtenção de documentos. Os diaristas rurais, em virtude das peculiares condições de trabalho e de vida, eram encarados com as especificidades que o caso exige, aplicando-se, inclusive, interpretação 'pro misero' de sua condição laborativa (RESP 200100367518, Paulo Gallotti, STJ - SEXTA TURMA, DJ DATA: 07/10/2002 PG: 00309).
[...]
Ocorre que, recentemente, a Primeira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça entendeu ser imprescindível a apresentação de, no mínimo, um início de prova material pelos trabalhadores rurais que se enquadram nessa categoria e pleiteiam benefício previdenciário, o que altera significativamente a posição até então pacificada:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. COMPROVAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. BOIAFRIA. APRESENTAÇÃO DE PROVA PARA OBTENÇÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. APLICAÇÃO DA SÚM. N. 149/STJ. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. N. 8/2008-STJ).
Aplica-se a Súm. n. 149/STJ aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material para obtenção de benefício previdenciário. A apresentação de prova material de apenas parte do lapso temporal não implica violação da Súm. n. 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por prova testemunhal idônea. A prova exclusivamente testemunhal é insuficiente para comprovação da atividade laborativa do trabalhador rural, sendo indispensável que ela venha corroborada por razoável início de prova material, a teor do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/1991 e do enunciado n. 149 da Súmula do STJ. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.309.694-PR, DJe 11/5/2012; AgRg no AgRg no Ag 1.161.240-SP, DJe 13/6/2012; AgRg no REsp 1.213.305-PR, DJe 8/3/2012; AgRg no REsp 1.326.080-PR, DJe 14/9/2012; AgRg no REsp 1.208.136-GO, DJe 30/5/2012, e AgRg no AREsp 162.768- GO, DJe 21/8/2012. REsp 1.321.493-PR, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012.
O presente caso atende a tal exigência, vez que os documentos apresentados demonstram o exercício da atividade rural, ainda que de forma precária. Dessa forma, em se tratando de trabalhadores bóias-frias, quase sempre contratados informalmente e sem qualquer espécie de registro laboral, admite-se o mínimo de prova material aliado à prova testemunhal, desde que esta seja esclarecedora e conclusiva, de forma a convencer o Juízo acerca da veracidade do que se afirma na inicial.
Sinale-se, todavia, que é preciso estabelecer critérios de análise da prova produzida em tais casos. Neste sentido, a comprovação do exercício da atividade rural passa a depender da coerência entre os depoimentos prestados, servindo como parâmetros a indicação dos proprietários para os quais trabalhou a parte autora, de seu endereço e das atividades exercidas pelos demais membros de sua família. Importam, ainda, o grau de instrução da parte autora e a análise do extrato do CNIS da família.
No caso concreto, para comprovar o fato constitutivo do seu direito, a parte autora juntou os seguintes documentos (evento 1, EXMED4):
a) contrato particular de arrendamento rural, do ano de 1996, no qual o autor e sua esposa, qualificados como agricultores, figuraram como arrendatários de imóvel na Linha Bastistelo (fls. 07/10);
b) notas fiscais de compra de milho, feijão em nome do autor e sua esposa, no ano de 2001, 2002, 2003, 2004, 2005 (fls. 11, 13, 14, 18, 21/24);
c) notas de produtor rural, em nome do autor e sua esposa, referentes aos anos de 1998, 2002, 2003, 2004 (fls. 12, 15, 16, 20);
d) duplicata emitida pela empresa Piazza Central Agrícola em que o autor figura como sacado, referente ao ano de 2005 (fl. 19);
Por sua vez, os depoimentos colhidos em juízo trouxeram as seguintes informações:
Testemunha Avelino Barcelos (evento 79, vídeo2):
Conhece Valdomiro há 10 anos, na colônia. Ele nunca teve terras, trabalhando nas terras de terceiros. O depoente sempre trabalhou na colônia. Valdomiro morava de agregado na colônia, trabalhando por dia e de empreitada, ou quando alguém vinha procurar para trabalhar. Valdomiro trabalhava nas terras de Clovis Galão, na Linha Faxinal, interior de Chapecó. O depoente sempre morou e ainda mora na Linha Alto da Serra, mas sempre ia para Faxinal porque o irmão do depoente morava lá. Por isso conhece bem o Valdomiro. Depois Valdomiro foi morar numa terra do irmão do depoente, na Linha Tope da Serra. Valdomiro não ficou muito tempo lá, mas faz um ano que ele veio para a cidade, porque não podia mais trabalhar. O autor não morou na Linha Alto da Serra. Sabe que Valdomiro trabalhava como diarista, via ele trabalhando nas terras do seu irmão. Faz mais de dois ou três anos que não viu mais Valdomiro trabalhando, porque ele ficou doente. Às perguntas da advogada do autor, respondeu: a Linha Bastistelo fica pertinho, mas nunca viu o autor trabalhando lá. A esposa de Valdomiro sempre cuidava da casa, sempre via ele trabalhando, A patroa não. O irmão do depoente pagava em média quarenta 'pila' por dia. Não sabe informar a quanto tempo Valdomiro está doente.
Testemunha Genir Barcellos (evento 79, vídeo3):
Faz tempo que conhece o autor. Ele morava nas terras de sua propriedade, na Linha Tope da Serra. O depoente é irmão da outra testemunha inquirida Avelino Barcelos. Valdomiro morou nesse local durante uns quatro anos, e faz um ano que ele saiu. Cedeu o lugar só para Valdomiro morar, sem pagar nada, mas ele trabalhava para os vizinhos. Não tinha contrato de arrendamento. Valdomiro trabalhava mais ou menos uma vez por semana. Pagavam em torno de 'quarenta pila ou cinqüenta' por dia. O depoente também trabalhava por dia. De cinco anos para cá Valdomiro sempre foi doente. Ele trabalhava pouco, mas sempre. Conhecia Valdomiro antes dele morar na sua terra, quando ele morava na Colônia Bacia, interior de Chapecó. Algumas vezes ia até lá. Não chegou a ver Valdomiro trabalhando na Colônia Bacia, mas sabia que ele sempre trabalhava por dia. Não conhece ninguém pra quem ele tenha trabalhado. Às perguntas da advogada do autor, respondeu: sabe que Valdomiro trabalhou para Clovis Galon, Vilson Diel, Valdemar da Silva, Alcides Bagio. Acha que Valdomiro tinha oito filhos, quatro morreram.
Testemunha Clovis Galon (evento 79, vídeo4):
Valdomiro morou em torno de 10 anos na sua terra, no Distrito de Sede Figueira, na Linha Cascavel. A Linha Cascavel faz divisa com a Linha Faxinal. Faz em torno de 10 anos que Valdomiro saiu da sua terra, mais ou menos em 2004. Ele morou de 1994 a 2004 mais ou menos. Ele plantava para ele, para tirar o bloco de notas, para que ele tivesse como se aposentar um dia. Ele ia trabalhar na roça por dia para os outros. Ele plantava na terra para o seu sustento e tirava nota para se aposentar. O depoente ajudava Valdomiro e em troca ele cuidava da morada. Valdomiro era agregado e trabalhava fora por dia. O pedaço de terras que Valdomiro plantava era em torno de um alqueire. Toda vida que conheceu Valdomiro ele morou na sua terra. Ele nunca trabalhou na cidade. Depois ele saiu da sua terra e foi para Colônia Bacia, depois foi para Coronel Freitas.
Embora a documentação carreada tenha indicado o exercício de atividade rural pelo autor nos anos de 1996, 2001 a 2005, a partir das declarações prestadas pelas testemunhas inquiridas tenho por inafastável que o autor exerceu atividade rural como diarista durante toda a sua vida. O depoimento da testemunha Clóvis Galon foi esclarecedor, confirmando que o autor trabalhava na agricultura, morando em propriedade de terceiros como 'agregado' e prestando serviços rurais como diarista.
A meu ver, a escassez de documentos no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo se explica pelas próprias condições de vida a que o autor se submete, tornando-se, neste cenário, desproporcional a exigência de documentos mais robustos que indiciem a profissão exercida no período controvertido.
Diante deste quadro, verifica-se que os documentos apresentados pela parte demandante, aliados à prova testemunhal, são suficientes para comprovar o efetivo exercício da atividade rural pela parte autora, com limitações cognitivas e sem nenhum vínculo empregatício cadastrado no CNIS. Nessa altura, entendo adequado pontuar que o próprio INSS afirmou, na contestação, que 'leve retardo mental não tem o efeito de impedir o exercício das atividades do campo, de natureza muito mais braçal do que intelectual'.
Portanto, tenho que restou comprovada a atividade rural do autor computável como carência para concessão do benefício por incapacidade (art. 25, I, da Lei n. 8.213/91).
Estando comprovada a incapacidade laborativa definitiva da parte autora, a sua qualidade de segurado e o cumprimento da carência, a parte autora faz sua à concessão do benefício de aposentadoria por invalidez.
b.4) Doença degenerativa. Data do início do benefício
Na contestação, o INSS afirmou levantou a possibilidade de o retardo mental que acomete o autor ser congênito, tratando-se de doença preexistente à filiação.
Contudo, o perito judicial deixou expresso em seu laudo que a natureza da patologia do autor é degenerativa (resposta ao quesito 6 do INSS), o que é indicativo de que a incapacidade foi se acentuando com o passar do tempo.
Aliado a isso, ao ser inquirido quanto ao termo inicial da incapacidade, o perito afirmou que a incapacidade existe há vários anos - devido ao retardo mental, porém não é possível precisar a data inicial (respostas aos quesitos 3, 5 e 11 do INSS). Afirma que na data do requerimento administrativo (18/09/2008) a situação de incapacidade laboral já se fazia presente (resposta ao quesito i do juízo).
Como não se confirmou a afirmação do INSS acerca da natureza congênita da doença que acomete o autor e tampouco da sua preexistência em relação à filiação ao regime previdenciário, concluo que o termo inicial do benefício deve ser fixado na DER (18/09/2008).
[...]"

O INSS, em sede de apelação, alegou que o autor não ostenta a qualidade de segurado, razão pela qual não faz jus aos benefícios pleiteados na exordial.

Da Qualidade de Segurado e período de carência

O trabalho rural como segurado especial dá-se em regime individual (produtor usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais) ou de economia familiar, este quando o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes (art. 11, VII e § 1º da Lei nº 8.213/91).

Quanto ao início de prova material, necessário a todo reconhecimento de tempo de serviço (§ 3º do art. 56 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149/STJ), por ser apenas inicial, tem sua exigência suprida pela indicação contemporânea em documentos do trabalho exercido, embora não necessariamente ano a ano, mesmo fora do exemplificativo rol legal (art. 106 da Lei nº 8.213/91), ou em nome de integrantes do grupo familiar (Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental -Súmula 73 do TRF 4ª Região).

Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de boia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (patrões, donos de terras arrendadas, integrantes do grupo familiar ou de trabalho rural). Se também ao boia-fria é exigida prova documental do labor rural, o que com isto se admite é mais amplo do que seria exigível de um trabalhador urbano, que rotineiramente registra suas relações de emprego.

Não se exige, então, prova documental plena da atividade rural em relação a todo o período correspondente à carência, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar. No caso, a carência para o gozo do benefício.

Como início de prova material do labor rural juntou a parte autora os seguintes documentos:

a) contrato particular de arrendamento rural, do ano de 1996, no qual o autor e sua esposa, qualificados como agricultores, figuraram como arrendatários de imóvel na Linha Batistelo (evento 1 - doc. 4, fls. 8/10);

b) notas fiscais de produtor rural de 1996 a 2004 (evento 1 - doc. 4, fls. 11/23);

Por ocasião da audiência de instrução, foram ouvidas três testemunhas - Sr. Avelino Barcelos, Sr. Genir Barcellos e Sr. Clovis Galon -, as quais confirmaram o exercício de atividades rurais como diarista pelo demandante na maior parte de sua vida.

Como razões de decidir, cito excerto da sentença a quo, brilhantemente exarada pela Juíza Priscilla Mielke Wickert Piva, da qual compartilho entendimento:

"Embora a documentação carreada tenha indicado o exercício de atividade rural pelo autor nos anos de 1996, 2001 a 2005, a partir das declarações prestadas pelas testemunhas inquiridas tenho por inafastável que o autor exerceu atividade rural como diarista durante toda a sua vida. O depoimento da testemunha Clóvis Galon foi esclarecedor, confirmando que o autor trabalhava na agricultura, morando em propriedade de terceiros como 'agregado' e prestando serviços rurais como diarista.
A meu ver, a escassez de documentos no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo se explica pelas próprias condições de vida a que o autor se submete, tornando-se, neste cenário, desproporcional a exigência de documentos mais robustos que indiciem a profissão exercida no período controvertido.
Diante deste quadro, verifica-se que os documentos apresentados pela parte demandante, aliados à prova testemunhal, são suficientes para comprovar o efetivo exercício da atividade rural pela parte autora, com limitações cognitivas e sem nenhum vínculo empregatício cadastrado no CNIS. Nessa altura, entendo adequado pontuar que o próprio INSS afirmou, na contestação, que 'leve retardo mental não tem o efeito de impedir o exercício das atividades do campo, de natureza muito mais braçal do que intelectual'."

A prova material juntada aos autos foi devidamente corroborada pela prova testemunhal. Assim, presente início de prova material, complementada por direta prova oral, no período controverso, devida é a admissão da condição da parte autora como segurada especial no período equivalente ao da carência.

Desse modo, tenho como comprovados os requisitos qualidade de segurado e carência.

Da incapacidade laboral

Segundo entendimento dominante na jurisprudência pátria, nas ações em que se objetiva a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, ou mesmo nos casos de restauração desses benefícios, o julgador firma seu convencimento com base na prova pericial, não deixando de se ater, entretanto, aos demais elementos de prova.

De fato, a produção probatória tem como destinatário final o juiz da causa. Em prevalecendo o princípio da verdade real, o arcabouço probatório deve possibilitar ao magistrado a formação do seu convencimento acerca da lide proposta.

Isso posto, passo ao exame do laudo pericial acostado no evento 62.

Verifica-se do laudo pericial judicial que a parte autora apresenta retardo mental leve, distrofia muscular, depressão, artrose nos joelhos, perda da motricidade e mal estado geral, o que, segundo o expert - em resposta aos quesitos "11-a" e "11-e" do INSS - a incapacita total e permanentemente para atividades laborativas. Senão, vejamos:

"11. Havendo, na opinião do perito judicial, incapacidade ao trabalho ou para a ocupação habitual, queira responder:

"a. A incapacidade é permanente ou temporária? Total ou parcial? Fundamente.
Resposta: Permanente. Existe incapacidade para qualquer atividade laboral."

"e. De acordo com o estágio atual da ciência médica e a sua experiência pessoal, em quanto tempo espera-se que a parte autora tenha condições de retorno ao trabalho ou para suas ocupações habituais?
Resposta: O autor está incapacitado de maneira permanente."

Deste modo, não há dúvida de que a parte autora se encontra incapacitada para o exercício de atividade laboral, mormente pelas conclusões periciais, as quais atestam que a incapacidade é total e permanente para qualquer atividade.

Diante do conjunto probatório e considerando a atividade laboral exercida pelo autor (agricultor), que exige, na maioria das vezes, esforços físicos constantes, e ponderando, ainda, acerca de suas condições pessoais - idade (61 anos, nascido em 12/04/1953), baixa escolaridade (analfabeto) e pouca qualificação profissional - que inviabilizam, senão impossibilitam a reabilitação para atividade que não exija esforço físico -, tenho que faz jus à aposentadoria por invalidez.

Quanto ao termo inicial, correta a fixação na DER, posto que o perito foi claro em afirmar, em resposta aos quesitos "11-c" e "11-d" do INSS", que o quadro é incapacitante há vários anos, em que pese não seja possível precisar a época exata de início da incapacidade.

Pela fundamentação exposta, tenho que correta a sentença que concedeu o benefício de aposentadoria por invalidez à parte autora desde o requerimento administrativo, em 18/09/2008.

Antecipação de Tutela

Mantenho a tutela antecipada, pois presentes os requisitos do art. 273 do CPC.

Correção Monetária
De início, esclareço que a correção monetária e os juros de mora, sendo consectários da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados até mesmo de ofício. Assim, sequer há que se falar em reformatio in pejus.
As prestações em atraso serão corrigidas, desde o vencimento de cada parcela, ressalvada a prescrição quinquenal, utilizando-se os seguintes indexadores: INPC (março/91 a dezembro/92), IRSM (janeiro/93 a fevereiro/94), URV (março/94 a junho/94), IPC-r (julho/94 a junho/95), INPC (julho/95 a abril/96), IGP-DI, de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei nº 9.711/98 e art. 20, §§ 5º e 6º, da Lei nº 8.880/94) e INPC, a partir de 04/2006 (art. 31 da Lei nº 10.741/03, c/c a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11-08-2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, e REsp. n.º 1.103.122/PR).
Os juros de mora são devidos a contar da citação, à razão de 1% ao mês (Súmula n.º 204 do STJ e Súmula 75 desta Corte) e, desde 01/07/2009 (Lei nº 11.960/2009), passam a ser calculados com base na taxa de juros aplicáveis à caderneta de poupança (RESP 1.270.439).
Não incide a Lei nº 11.960/2009 para correção monetária dos atrasados (correção equivalente à poupança) porque declarada inconstitucional (ADIs 4.357 e 4.425/STF), com efeitos erga omnes e ex tunc - e mesmo eventual modulação não atingirá processos de conhecimento, como é o caso presente.
Destaco ser evidente que, em razão da inconstitucionalidade declarada pelo STF, os índices de remuneração básica aplicados à caderneta de poupança como índice de correção monetária foi erradicado do ordenamento jurídico, não havendo como deixar de observar a decisão da Suprema Corte no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, com efeito erga omnes e eficácia vinculante, independentemente de eventual modulação de efeitos.
A propósito, o próprio Supremo Tribunal Federal já está aplicando o precedente firmado no julgamento da ADI 4.357, como se percebe do seguinte precedente:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO - IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO ÍNDICE OFICIAL DE REMUNERAÇÃO BÁSICA DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO CRITÉRIO DE CORREÇÃO MONETÁRIA DOS DÉBITOS FAZENDÁRIOS SUJEITOS AO REGIME DE EXECUÇÃO INSCRITO NO ART. 100 DA CF/88 - DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL DO § 12 DO ART. 100 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, NA REDAÇÃO DADA PELA EC Nº 62/2009 - DIRETRIZ JURISPRUDENCIAL FIRMADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.
(RE 747727 AgR / SC. Relator(a): Min. CELSO DE MELLO. Julgamento: 06/08/2013. Órgão Julgador: Segunda Turma)
Em relação à medida cautelar relativa à reclamação 16.745/DF, importa consignar, ainda, que ela se deu apenas no sentido de assegurar a continuidade dos pagamentos de precatórios na forma como vinham sendo pagos antes da decisão invocada, o que não obsta que eventualmente se prossiga com a execução das diferenças decorrentes da aplicação correta do índice.
Logo, correta a sentença no ponto.

Honorários

Mantenho os honorários advocatícios.

Custas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p.único, da Lei Complementar Estadual nº156/97), a autarquia responde pela metade do valor.

Prequestionamento

Quanto ao prequestionamento, não há necessidade de o julgador mencionar os dispositivos legais e constitucionais em que fundamenta sua decisão, tampouco os citados pelas partes, pois o enfrentamento da matéria através do julgamento feito pelo Tribunal justifica o conhecimento de eventual recurso pelos Tribunais Superiores (STJ, EREsp n° 155.621-SP, Corte Especial, Rel. Min. Sálvio Figueiredo Teixeira, DJ de 13-09-99).

Dispositivo

ANTE O EXPOSTO, voto por negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial.

É o voto.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora


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Signatário (a): Vânia Hack de Almeida
Data e Hora: 25/02/2015 16:11




EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 25/02/2015
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5006678-65.2013.404.7202/SC
ORIGEM: SC 50066786520134047202
RELATOR
:
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PRESIDENTE
:
Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR
:
Procuradora Regional da República Solange Mendes de Souza
APELANTE
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO
:
VALDOMIRO VENANCIO PEREIRA
ADVOGADO
:
KATIUSKA RAQUIELY MARTINS DE QUADROS
MPF
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 25/02/2015, na seqüência 993, disponibilizada no DE de 10/02/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO
:
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
VOTANTE(S)
:
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
:
Des. Federal ROGERIO FAVRETO
:
Des. Federal CELSO KIPPER
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria


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