Apelação Cível Nº 5003980-07.2018.4.04.7107/RS
RELATOR: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
APELANTE: GUILHERME DA ROCHA VIEIRA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)
ADVOGADO(A): LEDA ARTINI GUJEL (OAB RS080948)
APELANTE: CLARISSE DA ROCHA (AUTOR)
ADVOGADO(A): LEDA ARTINI GUJEL (OAB RS080948)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
RELATÓRIO
Trata-se de recurso em face de sentença prolatada em 14/11/2019 que julgou o pedido de pensão por morte, cujo dispositivo reproduzo a seguir:
Ante o exposto, julgo improcedentes os pedidos declinados na petição inicial, resolvendo o mérito nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil.
Tendo em conta as disposições do art. 85 do Código de Processo Civil e sendo a parte autora sucumbente, a condeno ao pagamento dos honorários advocatícios de sucumbência.
Ainda, considerando o estabelecido no art. 85, §§ 2º; 3º, I e § 4º do Código de Processo Civil, bem como que o proveito econômico desta demanda é inferior a 200 (duzentos) salários-mínimos, montante que se depreende da análise ao valor da causa, arbitro os honorários de sucumbência no percentual de 10% sobre o valor atualizado da causa, a ser apurado quando da liquidação do julgado.
Suspendo, contudo, a exigibilidade dos honorários advocatícios, nos termos do art. 98, § 3º do CPC, face ao benefício da gratuidade de justiça concedida à demandante.
A demandante é isenta do pagamento das custas, tendo em vista o disposto no artigo 4º, inciso II, da Lei nº 9.289/96.
Em suas razões recursais o autor sustentou, em apertada síntese, que restou comprovada a sua dependência econômica em relação ao avô, segurado da Previdência Social. Pugnou pela reforma da sentença pela concessão do benefício.
Oportunizada as contrarrazões, vieram os autos para esta Corte para julgamento.
O Ministério Público opinou pelo desprovimento da apelação.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
A apelação preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Premissas
Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de PENSÃO POR MORTE, prevista no art. 74 da Lei nº 8.213/91, a qual depende do preenchimento dos seguintes requisitos: (a) a ocorrência do evento morte, (b) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus e (c) a condição de dependente de quem objetiva o benefício, os quais passam a ser examinados a seguir.
Como se sabe, a Lei de Benefícios da Previdência Social (LBPS) não relaciona, dentre os beneficiários da Previdência Social na condição de dependentes do segurado, o menor sob guarda, embora o faça com relação ao enteado e ao menor tutelado, nos termos do parágrafo 2º do art. 16, que tem a seguinte redação:
O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.
Por outro lado, o menor que, por determinação judicial, esteja sob a sua guarda e o menor que esteja sob sua tutela e não possua condições suficientes para o próprio sustento e educação teve sua situação alterada pela redação dada pela Lei n.º 9.528/97, a qual excluiu a possibilidade de o menor sob guarda ser equiparado ao filho.
Entretanto, as alterações previdenciárias trazidas por esta lei não tiveram o condão de derrogar o art. 33 do ECA.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA - Lei nº 8.069/90) estabelece, em seu art. 33, §3º, que a guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários. Eis a redação do citado artigo:
Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.
§ 1º A guarda destina-se a regularizar a posse de fato, podendo ser deferida, liminar ou incidentalmente, nos procedimentos de tutela e adoção, exceto no de adoção por estrangeiros.
§ 2º Excepcionalmente, deferir-se-á a guarda, fora dos casos de tutela e adoção, para atender a situações peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsável, podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos determinados.
§ 3º A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários.
§ 4ª Salvo expressa e fundamentada determinação em contrário, da autoridade judiciária competente, ou quando a medida for aplicada em preparação para adoção, o deferimento da guarda de criança ou adolescente a terceiros não impede o exercício do direito de visitas pelos pais, assim como o dever de prestar alimentos, que serão objeto de regulamentação específica, a pedido do interessado ou do Ministério Público.
A Constituição Federal de 1988, por seu turno, consagrou o princípio de proteção especial à criança e ao adolescente, como se vê no art. 227, caput e § 3º, inc. II, os quais transcrevo:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
(...)
§ 3º O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:
(...)
II - garantia de direitos previdenciários e trabalhistas;
Com enfoque na proteção especial da criança e do adolescente (Constituição Federal de 1988, art. 227, caput e § 3º, inc. II), o menor sob guarda pode ser considerado dependente previdenciário do segurado, nos termos do art. 33, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, combinado com o art. 16, §2º, da Lei de Benefícios, desde que comprovada a dependência econômica, conforme dispõe a parte final deste último dispositivo.
No mesmo sentido, é a jurisprudência desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE AVÓ. MENOR SOB GUARDA, AINDA QUE APENAS DE FATO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. COMPROVAÇÃO. EQUIPARAÇÃO A FILHO PARA FINS DE PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA. CABIMENTO. RECURSO REPETITIVO. TEMA 732/STJ. REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO. PRECEDENTES DO STF (TEMA 810 E ADI 4.878) E STJ (TEMA 905). CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. Comprovado que a menor estava sob a guarda do instituidor, sua qualidade de dependente, nestes casos é presumida, nos termos do artigo 16, I, § 4º da Lei nº 8.213/91. É firme o entendimento no sentido de equiparar o menor sob guarda aos filhos, para efeitos de proteção previdenciária, em uma interpretação sistemática do ordenamento jurídico, à luz do contido no artigo 227 da Constituição Federal e no artigo 33, § 3º, da Lei nº 8.069/90 (ECA). A exclusão da equiparação explícita, operada pela Lei nº 9.528/97, não implica em vedação legal. 3. O julgamento do tema 732/STJ, representativo de controvérsia, firmou a tese jurídica de que o menor sob guarda possui direito à concessão do benefício de pensão por morte do seu mantenedor, comprovada sua dependência econômica, nos termos do artigo 33, § 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente, ainda que o óbito do instituidor da pensão seja posterior à vigência da Medida Provisória nº 1.523/96, reeditada e convertida na Lei nº 9.528/97. Funda-se essa conclusão na qualidade de lei especial do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), frente à legislação previdenciária. 4. Improvido o recurso do INSS, resta fixada a verba honorária, em 15% sobre o montante das parcelas vencidas (Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF/4ª Região), consideradas as variáveis dos incisos I a IV do § 2º e o § 11, ambos do artigo 85 do CPC. (TRF4, AC 5004421-03.2022.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 30/11/2022)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO. 1. O menor sob guarda tem direito à concessão do benefício de pensão por morte do seu mantenedor, comprovada a sua dependência econômica, nos termos do artigo 33, § 3º do ECA, ainda que o óbito do instituidor da pensão seja posterior à vigência da MP nº 1.523/1996, reeditada e convertida na Lei nº 9.528/1997. 2. Comprovando a prova dos autos a dependência econômica da parte autora com o instituidor da pensão, que detinha sua guarda judicial, deve ser confirmada a sentença que determinou a concessão da pensão por morte ao requerente. (TRF4, AC 5009891-49.2021.4.04.9999, NONA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 28/11/2022)
Além disso, a teor do no art. 1.696 do Código Civil Brasileiro, "o direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros".
Exame do caso concreto
Na presente ação, Guilherme da Rocha Vieira, representado por seu genitor Leandro Correa Vieira postula a concessão do benefício de pensão por morte NB 179.945.068-3, DER 27/10/2017, do avô paterno, Sr. Antonio Morais Vieira, ocorrido em 28/11/2013.
Destarte, tenho que a questão foi devidamente analisada na sentença, cujos fundamentos acolho como razões de decidir (evento 105, SENT1):
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O falecimento do segurado instituidor do benefício ocorreu em 28/11/2013 e foi comprovado através da certidão de óbito acostada aos autos (evento 1, procadm4, fl. 15), sendo verificado, do mesmo modo, que se trata de avô paterno do ora requerente.
A condição de segurado do falecido é incontroversa, já que, ao tempo do óbito, percebia o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez (32/530.536.595-0), consoante se denota do INFBEN (evento 1, procadm5, fl. 02).
A discussão se concentra, pois, na qualidade de dependente da parte autora que afirma que era dependente do extinto e de sua esposa, na condição de menor sob guarda, no período de 24/03/2007 a 06/09/2017, ou seja, da data em que assinado termo judicial de guarda até o óbito de sua avó paterna Catarina Correa do Nascimento (evento1, procadm4, fls. 9 e 17).
Inicialmente, registro que a matéria foi apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça, na sessão do dia 11/10/2017, Tema 732 dos recursos representativos de controvérsia (REsp 1411258), sendo fixada a seguinte tese: O menor sob guarda tem direito à concessão do benefício de pensão por morte do seu mantenedor, comprovada sua dependência econômica, nos termos do art. 33, § 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente, ainda que o óbito do instituidor da pensão seja posterior à vigência da Medida Provisória 1.523/96, reeditada e convertida na Lei 9.528/97. Funda-se essa conclusão na qualidade de lei especial do Estatuto da Criança e do Adolescente (8.069/90), frente à legislação previdenciária.
No mesmo sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO. LEI Nº 9.528/97. TEMA 732 DO STJ. 1. Os requisitos para a obtenção do benefício de pensão por morte estão elencados na legislação previdenciária vigente à data do óbito, cabendo a parte interessada preenchê-los. No caso, a parte deve comprovar: (a) ocorrência do evento morte; (b) a qualidade de segurado do de cujus e (c) a condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. A Lei nº 9.528/97 não revogou expressamente o § 3º do art. 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente, lei especial em relação à legislação previdenciária, o qual confere ao menor sob guarda a condição de dependente para todos os efeitos, inclusive previdenciários, exigindo-se tão somente a demonstração de sua dependência econômica. Aplicação do decidido no Tema nº 732 do STJ. (TRF4, AG 5032632-15.2018.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, juntado aos autos em 26/11/2018). Grifei.
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA. CONCESSÃO. DEPENDÊNCIA. DEMONSTRAÇÃO. TUTELA ESPECÍFICA. 1. É sabido que há divergência doutrinária e jurisprudencial acerca da questão da guarda e seus reflexos no âmbito do direito previdenciário, ante a aparente antinomia entre o art. 16, §2º, da Lei nº 8.213/91 e o art. 33, § 3º, da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente). 2. A redação determinada pela Lei n. 9.528/97 ao § 2.º do art. 16 da Lei n. 8.213/91 não derrogou o art. 33 da Lei n. 8.069/90 (ECA). A ampla garantia de proteção à criança e ao adolescente disposta no art. 227 do texto constitucional não distingue entre o tutelado e o menor sob guarda. Permanece, pois, como dependente a criança e o adolescente sob guarda judicial, inclusive para fins previdenciários. II. Preenchidos os requisitos contidos no art. 74 da Lei 8.213/91, com a comprovação da dependência econômica dos requerentes em relação à falecida avó, é de ser concedido o benefício de pensão por morte. 3. É possível conceder a pensão por morte ao menor sob guarda, ante a vênia do art. 33, da Lei 8.069/90, bem como porque a ampla garantia de proteção à criança e ao adolescente prevista no art. 227, da Constituição da República não permite a distinção entre o tutelado e o menor sob guarda. Para tanto, porém, aquele último deve comprovar a dependência econômica em relação ao segurado instituidor, porquanto a Lei nº 9.528/1997 teve o condão de, tão somente, deixar de considerá-la presumida, o que restou demonstrado no caso em apreço. (TRF4, AC 5069712-23.2017.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 11/09/2018). Grifei.
Assim, tenho que o menor sob guarda deve comprovar a dependência econômica e, o fazendo, concorre em igualdade de condições com os beneficiários descritos no inciso I do art. 16.
No caso dos autos, para a comprovação de que vivia sob a guarda do falecido e dependia financeiramente do avô, a parte autora apresentou os seguintes documentos:
a) termo de compromisso de guarda de menor assinado em 24/03/2007 por Catarina Correa do Nascimento no bojo de processo de homologação de acordo, onde constam como guadiões legais os avós paternos (evento1, procadm4, fls. 17);
b) declaração da Escola Municipal de Ensino Fundamental Cinquentenário, assinada em 21/03/2018, de que o demandante, aluno do 6º ano do ensino fundamental, residia com seus avós, Antonio Moraes Vieira e Catarina Correa do Nascimento, até o falecimento deles, os quais eram responsáveis pelo acompanhamento escolar da criança (evento1, Decl6);
c) declaração, assinada em 21/03/2018, pelo representante do estabelecimento comercial denominado Fashion Kids que Catarina Correa do Nascimento e Antonio Moraes Vieira efetuaram diversas compras na referida loja para o autor (evento1, Decl7);
d) documento de autodeclaração para o Educacenso, datado de maio de 2015, assinado por Catarina C. Nascimento, declarando a cor/raça do autor (evento1, Decl8).
Realizada audiência, foram ouvidos a genitora do menor e duas testemunhas.
A mãe do autor esclareceu a guarda do menor foi dada aos avós paternos dele, porque na época ela e o pai da criança não tinham renda e, portanto, não podiam sustentá-la. Apesar de formalizado acordo transferindo a guarda do menor, todos os cinco residiam juntos na mesma casa de propriedade de Antonio e Catarina. O casal, pai do autor, também era sustentado por Antonio e Catarina. Relata que em 2010 começou a trabalhar, mas continuaram todos residindo com os avós do menino. Afirma que se separou de Leandro, pai do autor, no ano de 2012, quando mudou-se da casa de Antonio e Catarina. O autor ficou com os avós porque eles tinham a guarda legal do menino. Disse que o pai do autor está preso desde 2018 e nunca trabalhou. O pai do demandante residiu com ele até ser preso. Após o falecimento dos avós do autor, a genitora já estava em busca da guarda dele e, com a prisão de Leandro, a criança foi morar com ela. No período após o óbito de Catarina até a prisão de Leandro, o autor estava residindo com o pai e ambos sobreviviam de "rolos" de Leandro. Falou que a esposa atual de Leandro trabalha e ajudava a manter o núcleo todo. Leandro já está há sete anos com a nova esposa, chamada Tatiana. Disse que trabalha há nove anos na mesma empresa. Catarina nunca aceitou que a depoente contribuísse para os gastos da casa. Os avós do autor eram aposentados e eram proprietários de uma lancheria. Acredita que a sra. Catarina recebeu a pensão por morte em razão do falecimento do sr. Antonio. Disse que as testemunhas são colegas de trabalho (evento 98, VIDEO2).
A testemunha Daiane Dutra afirmou que é colega de trabalho da mãe do autor, Clarisse. Disse que já trabalhava na Bigfer quando Clarisse foi contratada. Afirmou que, na época de sua contratação, Clarisse era casada e morava com o companheiro e com os pais dele. Clarisse tem um novo companheiro há seis anos. Relatou que conhece o autor e que ele continuou morando com os avós paternos mesmo depois da separação dos seus pais e da mudança de residência de sua mãe. Disse que o menor permaneceu com os avós e com o pai porque naquela época Clarisse ainda não tinha condições de criá-lo. Além disso, a avó do menor tinha a guarda dele desde que a criança nasceu. Guilherme permaneceu com a avó até o óbito dela. Depois disso, morou um tempo com o pai e, após, veio residir com a mãe. Afirmou que o pai do autor nunca trabalhou e também era sustentado por seus genitores. Acredita que após o falecimento da avó, pai e filho sobreviveram com a pensão deixada por ela. Disse que os avós do autor eram aposentados e tinham uma lancheria.Acredita que a avó do autor, chamada Catarina, faleceu há uns dois anos, ou seja, em 2017. Disse que a guarda de Guilherme foi dada aos seus avós porque os pais da criança não tinham condições econômicas para criá-lo, de qualquer forma, todos moravam juntos na mesma casa. O menor nunca se separou dos seus pais. Conheceu os avós do menor porque foi algumas vezes na lancheria deles (evento98, VIDEO3.
A testemunha Luiz Roberto Weber afirmou que foi colega de trabalho da mãe do autor na empresa Bigfer. Disse que trabalhou na Bigfer por onze anos e meio, tendo rescindido seu contrato em setembro de 2018. Sabe que Clarisse foi companheira de Leandro e que eles estão separados há tempos. Conhece o menor desde que ele era pequeno, sendo que ele foi criado pelos avós. Disse que era cliente da lancheria de propriedade de Antonio e Catarina, local onde conheceu Guilherme e Leandro. Não tinha intimidade com Leandro. Via o Guilherme na lancheria. Não sabia o endereço residencial da família. Acredita que Leandro não trabalhava. Via Leandro jogando sinuca em um bar perto da lancheria. Conheceu Clarisse depois de ter conhecido Guilherme, quando ela foi contratada pela Bigfer. Clarisse levava Guilherme na escolinha da Bigfer - para crianças até seis anos. Não sabe se o menor residia com Clarisse na época em que ele frequentava a escolinha da empresa. Afirmou que não sabia que Leandro está preso. Antes de Clarisse começar a trabalhar, todos moravam com Antonio e Catarina, responsáveis pelo sustento dos cinco integrantes da família. Depois que Clarisse começou a trabalhar o depoente não sabe dizer com quem Guilherme residia. Quando via Guilherme na lancheria, o menor deveria ter cerca de três ou quatro anos de idade. Clarisse tem um novo companheiro.
Pois bem.
Assim, embora o autor vivesse com os avós, Antonio e Catarina, até o óbito deles, é possível constatar que seus pais, em todo o período, mantiveram-se presentes (Leandro sempre residiu no mesmo imóvel e Clarisse residiu com todos até 2012) e, apesar do auxílio financeiro prestado pelos avós, essa responsabilidade em relação aos cuidados com o menor era legalmente dos genitores. Veja-se que a testemunha Luiz Roberto Weber relata, inclusive, que Clarisse levava Guilherme para a escolinha da empresa Bigfer, na qual começou a trabalhar ainda em fevereiro de 2010, quando os avós do menor eram vivos. Grifo meu
Observo, neste contexto, que a determinação judicial de guarda aos avós - dada em sede de homologação de acordo - não decorreu da ausência de possibilidade dos genitores em criar o requerente, mas sim de uma conveniência entre as partes envolvidas na criação do menor, já que ambos os genitores não laboravam na época em que o menor nasceu. Ressalto que, eventual acordo de guarda do menor, com vistas unicamente ao sustento da criança não pode se impor ao Estado, a despeito da responsabilidade dos genitores por uma escolha de não laborar - caso do pai do autor, Leandro - ou pelo fato dos avós terem rendimento maior - caso da mãe do autor, Clarisse.
A responsabilidade pelo sustento do menor é de seus genitores, os quais são jovens e, ausente qualquer informação médica neste sentido, são saudáveis e capazes de prover seu próprio sustento e de seu filho.
Aliás, a mãe do menor, conforme referido, trabalha na empresa Bigfer desde fevereiro de 2010 - ou seja, antes do óbito de Antonio ou Catarina - e aufere rendimentos na ordem de R$ 1.550,00 a R$ 1.800,00 por mês. Após o óbito dos avós do autor e do encarceramento de Leandro, Clarisse, inclusive, assumiu totalmente os cuidados e a responsabilidade por suprir a subsistência do filho. Grifo meu.
De qualquer sorte, ainda que questionável a guarda conferida no caso, não se pode olvidar que após o óbito de Antonio, foi deferido benefício de pensão por morte à Catarina, sua esposa, de modo que, considerando-se que o menor estaria residindo com os avós no período de novembro de 2013 a outubro de 2017 - entre o óbito de Antonio e Catarina -, os valores reverteram em proveito da criança. Não seria razoável deferir-se ao menor novo benefício, quando sua guardiã legal Catarina, já auferiu os rendimentos, em sua totalidade, ao tempo em que tais valores eram necessários para auxiliar no sustento de Guilherme.
De outro lado, após a morte da avó, ainda que o pai do autor não tenha registro de nenhum labor, sua genitora estava devidamente empregada e, portanto, tinha condições econômicas para sustentar a criança, bem como responsabilidade legal de fazê-lo, não sendo devido nenhum benefício após 06/09/2017, óbito de Catarina.
Concluo, assim, estar ausente a condição de dependente previdenciário do autor após 06/09/2017 e, em momento anterior, quando poderia se cogitar de eventual dependência, não ser devido o pagamento em duplicidade da pensão, já que o benefício foi inteiramente pago à avó do menor, sendo presumível que tenha revertido em favor da criança também, eis que moravam todos juntos.
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Com efeito, as provas produzidas não tiveram a faculdade de comprovar a dependência econômica da parte autora em relação ao falecido avô. Ademais, com bem pontuado na sentença, no período em que requer o benefício, a sua vó titulou pensão por morte pelo óbito de Antônio, e, por via de consequência, o autor igualmente se beneficiou.
Oportuno trazer à baila excerto do parecer ministerial, que concluiu na mesma linha (evento 4):
De qualquer sorte, ainda que questionável a guarda conferida no caso, não se pode olvidar que após o óbito de Antonio, foi deferido benefício de pensão por morte à Catarina, sua esposa, de modo que, considerando-se que o menor estaria residindo com os avós no período de novembro de 2013 a outubro de 2017 - entre o óbito de Antonio e Catarina -, os valores reverteram em proveito da criança.
Nessa senda, considerando, então, que o benefício de pensão deve ser visto como uma prestação que se destina à recomposição de rendas familiares efetivamente diminuídas pela morte de um de seus membros, e que tal situação - por qualquer ângulo que se analise - não foi comprovada na hipótese dos autos, à medida que se impõe é que se mantenha hígida a sentença vergastada.
Honorários advocatícios
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, este regramento é aplicável quanto à sucumbência.
No tocante ao cabimento da majoração da verba honorária, conforme previsão do §11 do art. 85 do CPC/2015, assim decidiu a Segunda Seção do STJ, no julgamento do AgInt nos EREsp nº 1.539.725-DF (DJe de 19-10-2017):
É devida a majoração da verba honorária sucumbencial, na forma do art. 85, §11, do CPC/2015, quando estiverem presentes os seguintes requisitos, simultaneamente:
a) vigência do CPC/2015 quando da publicação da decisão recorrida, ou seja, ela deve ter sido publicada a partir de 18/03/2016;
b) não conhecimento integralmente ou desprovimento do recurso, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente;
c) existência de condenação da parte recorrente ao pagamento de honorários desde a origem no feito em que interposto o recurso.
No caso concreto, estão preenchidos todos os requisitos acima elencados, sendo devida, portanto, a majoração da verba honorária.
Assim, impõe-se a majoração dos honorários advocatícios em 50%; no entanto, suspensa a exigibilidade, eis que litiga sob o pálio da AJG.
Conclusão
Nego provimento à apelação do autor, pois não comprovada a qualidade de dependente do falecido.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora.
Documento eletrônico assinado por HERMES SIEDLER DA CONCEICAO JUNIOR, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003703951v14 e do código CRC 21c4691d.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): HERMES SIEDLER DA CONCEICAO JUNIOR
Data e Hora: 22/2/2023, às 19:40:24
Conferência de autenticidade emitida em 02/03/2023 04:01:06.
Apelação Cível Nº 5003980-07.2018.4.04.7107/RS
RELATOR: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
APELANTE: GUILHERME DA ROCHA VIEIRA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)
ADVOGADO(A): LEDA ARTINI GUJEL (OAB RS080948)
APELANTE: CLARISSE DA ROCHA (AUTOR)
ADVOGADO(A): LEDA ARTINI GUJEL (OAB RS080948)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA de avô. LEI Nº 9.528/97. TEMA 732 DO STJ. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA Não comprovada.
1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.
2. A Lei nº 9.528/97 não revogou expressamente o § 3º do art. 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual confere ao menor sob guarda a condição de dependente para todos os efeitos, inclusive previdenciários, exigindo-se tão somente a demonstração de sua dependência econômica.
3. O menor sob guarda tem direito à concessão do benefício de pensão por morte do seu mantenedor, comprovada sua dependência econômica, nos termos do art. 33, § 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente, ainda que o óbito do instituidor da pensão seja posterior à vigência da Medida Provisória 1.523/96, reeditada e convertida na Lei 9.528/97. Funda-se essa conclusão na qualidade de lei especial do Estatuto da Criança e do Adolescente (8.069/90), frente à legislação previdenciária. Tema 732 do STJ.
4. Na hipótese, não restou comprovada a dependência econômica do menor em relação ao falecido avô.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de fevereiro de 2023.
Documento eletrônico assinado por HERMES SIEDLER DA CONCEICAO JUNIOR, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003703952v3 e do código CRC 071c0915.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): HERMES SIEDLER DA CONCEICAO JUNIOR
Data e Hora: 22/2/2023, às 19:40:24
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/02/2023 A 17/02/2023
Apelação Cível Nº 5003980-07.2018.4.04.7107/RS
RELATOR: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PRESIDENTE: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: GUILHERME DA ROCHA VIEIRA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)
ADVOGADO(A): LEDA ARTINI GUJEL (OAB RS080948)
APELANTE: CLARISSE DA ROCHA (AUTOR)
ADVOGADO(A): LEDA ARTINI GUJEL (OAB RS080948)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
Votante: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
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