Apelação Cível Nº 5002888-76.2023.4.04.7217/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: RICARDO STECANELLA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença, publicada em 23-04-2024, na qual o magistrado a quo julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de auxílio-acidente, condenando a parte autora ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, os quais restaram suspensos em razão do benefício da assistência judiciária gratuita.
Em suas razões, a parte autora sustenta, em síntese, ter restado comprovada a redução permanente de sua capacidade laborativa, em decorrência do acidente de trânsito sofrido no ano de 2013, através da documentação médica acostada aos autos. Dessa forma, requer a reforma da sentença para que seja concedido o benefício de auxílio-acidente a contar da cessação do auxílio-doença (15-08-2013).
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
A controvérsia cinge-se à possibilidade de concessão do benefício de auxílio-acidente.
O benefício de auxílio-acidente é devido ao filiado quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas permanentes que impliquem a redução da capacidade de exercer a sua ocupação habitual.
Sua concessão está disciplinada no art. 86 da Lei nº 8.213/91, que assim dispõe:
Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem seqüelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 1º O auxílio-acidente mensal corresponderá a cinqüenta por cento do salário-de-benefício e será devido, observado o disposto no § 5º, até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou até a data do óbito do segurado. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 2º O auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado, vedada sua acumulação com qualquer aposentadoria. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 3º O recebimento de salário ou concessão de outro benefício, exceto de aposentadoria, observado o disposto no § 5º, não prejudicará a continuidade do recebimento do auxílio-acidente. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
São quatro os requisitos necessários à sua concessão: a) a qualidade de segurado; b) a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza; c) a redução permanente da capacidade de trabalho; d) a demonstração do nexo de causalidade entre o acidente e a redução da capacidade.
Contemplada pelo inciso I do art. 26 da Lei de Benefícios, esta prestação independe de carência.
Inicialmente, cabe averiguar a existência de sequelas - após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza - que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia a parte autora.
A perícia médica judicial, nas ações que envolvem a pretensão de concessão de benefício por incapacidade para o trabalho, exerce importante influência na formação do convencimento do magistrado. Todavia, tal prova não se reveste de valor absoluto, sendo possível afastá-la, fundamentadamente, se uma das partes apresentar elementos probatórios consistentes que conduzam a juízo de convicção diverso da conclusão do perito judicial ou se, apesar da conclusão final deste, a própria perícia trouxer elementos que a contradigam.
No caso concreto, o autor possui 52 anos e narra que desempenhava a atividade profissional de escriturário, quando sofreu acidente de qualquer natureza no ano de 2013, o qual teria reduzido de forma permanente sua capacidade laborativa.
Foi realizada perícia médica judicial, por especialista em ortopedia e traumatologia, em 15-12-2023 (evento 28 - LAUDOPERIC1).
Na ocasião, o perito judicial manifestou-se expressamente no sentido de que o autor não apresenta redução da capacidade laborativa para a atividade habitual.
Analisando o quadro clínico do autor, o expert apresentou a seguinte conclusão:
Formação técnico-profissional: 2o GRAU COMPLETO
Última atividade exercida: SANEAMENTO BÁSICO - ESCRITURÁRIO
Tarefas/funções exigidas para o desempenho da atividade: ESCRITURÁRIO NO SAMAE
Por quanto tempo exerceu a última atividade? 32 ANOS
Até quando exerceu a última atividade? 15/12/2023
Já foi submetido(a) a reabilitação profissional? NÃO
Experiências laborais anteriores: NÃO
Motivo alegado da incapacidade: CONTRATURA DA FÁSCIA PALMAR
Histórico/anamnese: HISTÓRIA DE CONTRATURA DA FÁSCIA PALMAR EM MÃO ESQUERDA HÁ +/- 10 ANOS.
RELATA ACIDENTE DE CARRO EM 2013 COM TRAUMA EM ARCOS COSTAIS À DIREITA E PERNA DIREITA, SEM FRATURAS.
REALIZOU TTO CIRÚRGICO PARA SINOVECTGOMIA EM MÃO ESQUERDA EM 2019 NO 4 RAIO.
HOJE QUEIXA-SE DE CONTRATURA EM 1 RAIO DA MÃO ESQUERDO.
Documentos médicos analisados: EXAMES, LAUDOS, RECEITAS E ATETSADOS - EVENTO 1, 12 E 16.
Exame físico/do estado mental: BEG, LOC
DESTRO
MANUSEIA EXAMES E DOCUMENTOS COM MMSS SEM DIFICULDADES
CICATRIZ EM PALMA DA MÃO ESQUERDA EM 4 RAIO, SEM RETRAÇÕES OU LIMITAÇÕES
PEQUENA CONTRATURA EM 1 RAIO, COM MÍNIMA NODULAÇÕES, SEM CORDAS
ADM POLEGAR LIVRE
FORÇA MUSCULAR GRAU 5
OPENÊNCIA PRESERVADA
NV PRESERVADO
Diagnóstico/CID:
- M72.0 - Fibromatose de fáscia palmar [Dupuytren]
Causa provável do diagnóstico (congênita, degenerativa, hereditária, adquirida, inerente à faixa etária, idiopática, acidentária, etc.): ADQUIRIDA
A doença, moléstia ou lesão decorre do trabalho exercido ou de acidente de trabalho? NÃO
O(a) autor(a) é acometido(a) de alguma das seguintes doenças ou afecções: tuberculose ativa, hanseníase, alienação mental grave, neoplasia maligna, cegueira, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, estado avançado da doença de Paget (oesteíte deformante), S.I.D.A., contaminação por radiação ou hepatopatia grave? NÃO
DID - Data provável de Início da Doença:
O(a) autor(a) realiza e coopera com a efetivação do tratamento adequado ou fornecido pelo SUS para sua patologia? NÃO
Em caso de recebimento prévio de benefício por incapacidade, o tratamento foi mantido durante a vigência do benefício? SIM
Observações sobre o tratamento:
Conclusão: sem incapacidade atual
- Justificativa: NÃO APRESENTA ALTERAÇÕES AO EXAME FÍSICO ORTOPÉDICO QUE CARACTERIZE INCAPACIDADE ATUAL
NÃO APRESENTA ALTERAÇÕES OAS EXAMES DE IMAGEM QUE CARACTERIZE INCAPACIDADE ATUAL
PODE REALIZAR O TTO CONCOMITANTE SUAS ATIVIDADE HABITUAL
NÃO HÁ INDICAÇÃO CIRÚRGICA ATUAL
- Houve incapacidade pretérita em período(s) além daquele(s) em que o(a) examinado(a) já esteve em gozo de benefício previdenciário? NÃO
- Caso não haja incapacidade atual, o(a) examinado(a) apresenta sequela consolidada decorrente de acidente de qualquer natureza? NÃO
- Foram avaliadas outras moléstias indicadas nos autos, mas que não são incapacitantes? NÃO
- Havendo laudo judicial anterior, neste ou em outro processo, pelas mesmas patologias descritas nestes autos, indique, em caso de resultado diverso, os motivos que levaram a tal conclusão, inclusive considerando eventuais tratamentos realizados no período, exames conhecidos posteriormente, fatos ensejadores de agravamento da condição, etc.: NÃO HÁ
- Pode o perito afirmar se os sintomas relatados são incompatíveis ou desproporcionais ao quadro clínico? NÃO
- Outras considerações que o(a) perito(a) considere relevantes para a solução da causa: SEM COMPROVAÇÃO DE INCAPACIDADE ATUAL
SEM SEQUELA DECORRENTE DE ACIDENTE
NÃO HÁ REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORAL ATUAL
Nome perito judicial: CHARLES MARCON CACHOEIRA (CRMSC018884)
Especialidade(s)/área(s) de atuação: Ortopedista
Cumpre ressaltar que o perito judicial é o profissional de confiança do juízo, cujo compromisso é examinar a parte com imparcialidade. Logo, a meu juízo, embora seja certo que o juiz não fica adstrito às conclusões do perito, a prova em sentido contrário ao laudo judicial, para prevalecer, deve ser suficientemente robusta e convincente - o que não ocorreu no presente feito.
O requerente assevera que desenvolveu fibromatose de fáscia palmar, em razão do acidente de trânsito ocorrido em 2013, e que "as patologias estão localizadas em sua mão implicando diretamente na redução da sua mobilidade dificultando no desempenhar de suas atividades cotidianas, pois possui dificuldades ao andar e sente muitas dores na mão ao permanecer por tempo prolongado em determinadas posições ou ainda de se locomover tornando visível redução da mobilidade" (evento 46 - APELAÇÃO1).
No entanto, conforme extrai-se do registro previdenciário, o autor percebeu o benefício de auxílio-doença (NB 31/602.596.528-9) no intervalo de 16-07-2013 a 15-08-2013, em virtude de acidente de trânsito que resultou em trauma da costela direita (evento 16 - LAUDO1).
Não há atestado médico posterior à cessação, referente ao intervalo de aproximadamente 11 anos até o presente momento, indicando redução permanente da capacidade laborativa do autor para o trabalho exercido como escriturário.
De igual modo, inexiste comprovação de eventual nexo de causalidade entre a patologia alegada de fibromatose de fascia palmar e o acidente de trânsito ocorrido no ano de 2013. O autor não acostou aos autos prontuários de atendimento, exames ou documentos médicos emitidos à época.
Os registros médicos indicam, tão somente, que o autor realizou procedimento cirúrgico eletivo no ano de 2019 para corrigir retração do 4º dedo da mão esquerda, sem que reste evidenciada conexão com o evento acidentário (evento 1 - EXMMED5).
Considerando, pois, que não restaram atendidos os requisitos para a concessão do benefício do art. 86 da Lei nº 8.213/91, em virtude da não comprovação da redução permanente da capacidade para o trabalho que exercia e tampouco do nexo causal da patologia identificada com o acidente sofrido em 2013, é indevido o benefício de auxílio-acidente.
Por tais razões, deve ser mantida a sentença de improcedência, despicienda a análise dos demais requisitos.
Considerando que a sentença foi publicada após 18-03-2016, data definida pelo Plenário do STJ para início da vigência do NCPC (Enunciado Administrativo nº 1-STJ), bem como o Enunciado Administrativo n. 7 - STJ (Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC), aplica-se ao caso a sistemática de honorários advocatícios ora vigente.
Desse modo, considerando a manutenção da sentença de primeiro grau e tendo em conta o disposto no § 11 do art. 85 do NCPC, bem como recentes julgados do STF e do STJ acerca da matéria (v.g.ARE971774 AgR, Relator p/ Acórdão: Min. EDSON FACHIN, PrimeiraTurma, DJe 19-10-2016; ARE 964330 AgR, Relator p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, DJe 25-10-2016; AgIntno AREsp 829.107/RJ, Relator p/ Acórdão Ministro MARCO BUZZI, Quarta Turma, DJe 06-02-2017 e AgInt nos EDcl no REsp1357561/MG, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Terceira Turma, DJe 19-04-2017), majoro a verba honorária de 10% para 12% sobre o valor atualizado da causa, restando suspensa a satisfação respectiva por ser a parte beneficiária da AJG.
Por fim, vale dizer que os honorários periciais e custas processuais também devem ficar sob encargo da parte autora, a qual ficou vencida na lide, cuja exigibilidade, porém, resta suspensa em virtude do benefício de AJG.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora.
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Apelação Cível Nº 5002888-76.2023.4.04.7217/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: RICARDO STECANELLA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-ACIDENTE. REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORAL. NEXO DE CAUSALIDADE. NÃO Comprovados. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. MANTIDA.
1. O benefício de auxílio-acidente é devido ao filiado quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas permanentes que impliquem a redução da capacidade de exercer a sua ocupação habitual.
2. São quatro os requisitos necessários à sua concessão: a) a qualidade de segurado; b) a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza; c) a redução permanente da capacidade de trabalho; d) a demonstração do nexo de causalidade entre o acidente e a redução da capacidade.
3. Não comprovada a redução permanente da capacidade laboral da parte autora e tampouco o nexo causal da patologia identificada com o acidente sofrido, conclui-se que não faz jus ao benefício de auxílio-acidente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 20 de junho de 2024.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 13/06/2024 A 20/06/2024
Apelação Cível Nº 5002888-76.2023.4.04.7217/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PROCURADOR(A): RODOLFO MARTINS KRIEGER
APELANTE: RICARDO STECANELLA (AUTOR)
ADVOGADO(A): LUIZ HENRIQUE CALDAS PELEGRINI (OAB SC044950)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/06/2024, às 00:00, a 20/06/2024, às 16:00, na sequência 1175, disponibilizada no DE de 04/06/2024.
Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
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