D.E. Publicado em 05/05/2016 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007787-82.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Juiz Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | VITOR ANDRADE DA SILVA |
ADVOGADO | : | Jose Carlos Alves Ferreira e Silva |
: | Alessandra Dorta de Oliveira |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONVERSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL EM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. TRABALHADOR RURAL VOLANTE/BOIA FRIA. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. INCAPACIDADE LABORAL INCONTROVERSA.
Tendo em vista que o conjunto probatório demonstrou o exercício de atividade rural e, por conseguinte, a qualidade de segurado especial e que a incapacidade é incontroversa, deve ser convertido o benefício assistencial em aposentadoria por invalidez.
O Supremo Tribunal Federal reconheceu repercussão geral à questão da constitucionalidade do uso da TR e dos juros da caderneta de poupança para o cálculo da correção monetária e dos ônus de mora nas dívidas da Fazenda Pública, e vem determinando, por meio de sucessivas reclamações, e até que sobrevenha decisão específica, a manutenção da aplicação da Lei 11.960/2009 para este fim, ressalvando apenas os débitos já inscritos em precatório, cuja atualização deverá observar o decidido nas ADIs 4.357 e 4.425 e respectiva modulação de efeitos. A fim de guardar coerência com as recentes decisões, deverão ser adotados, por ora, os critérios de atualização e de juros estabelecidos no 1º-F da Lei 9.494/97, na redação da lei 11.960/2009, sem prejuízo de que se observe, quando da liquidação, o que vier a ser decidido pelo STF com efeitos expansivos.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e à remessa oficial, e determinar o imediato cumprimento do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de abril de 2016.
Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior
Relator
Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8191059v11 e, se solicitado, do código CRC E409F8D5. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Hermes Siedler da Conceição Júnior |
Data e Hora: | 28/04/2016 16:19 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007787-82.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Juiz Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | VITOR ANDRADE DA SILVA |
ADVOGADO | : | Jose Carlos Alves Ferreira e Silva |
: | Alessandra Dorta de Oliveira |
RELATÓRIO
Vitor Andrade da Silva ajuizou ação ordinária em face do INSS, visando à conversão do benefício assistencial de que é titular em aposentadoria por invalidez, tendo em vista que, antes de se tornar incapaz para o trabalho, possuía a qualidade de segurado especial, exercendo atividade rural na condição de volante/bóia fria. Sobrevindo a incapacidade, fazia jus ao auxílio-doença, o qual deveria ter sido, posteriormente, convertido em aposentadoria por invalidez. A autarquia, contudo, equivocadamente, concedeu-lhe benefício assistencial. A ação foi julgada procedente, nos termos do dispositivo a seguir transcrito:
"Diante de tudo o que fora exposto, com fundamento no art. 269, inciso I do CPC, JULGO PROCEDENTE a pretensão exposta por VITOR ANDRADE DA SILVA contra INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, nestes autos sob nº 2197-81.2011 para CONDENAR a autarquia requerida a converter o LOAS em aposentadoria por invalidez àquele, devendo complementar o pagamento das verbas não pagas no benefício assistencial, respeitado o prazo de prescrição.
Quanto à correção monetária de débitos previdenciários, aplica-se o INPC, por força do que dispõe o art. 41-A da Lei 8.213/91.
Apenas os juros moratórios deverão ser calculados na forma do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/2009, ou seja, juros aplicados à caderneta de poupança.
Condeno, ainda, a autarquia ré ao pagamento dos honorários advocatícios eu fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas, não devendo incidir sobre as prestações vincendas, o que faço com fundamento no parágrafo 4º do artigo 20 do CPC e súmula 111 do STJ: 'Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre prestações vincendas.'.
Defiro ao requerente o benefício da justiça gratuita como pleiteado na inicial, condeno, deveras, o Requerido ao recolhimento das custas processuais e taxa judiciária, o que faço seguindo orientação da Súmula 178 do STJ, assim redigida: 'O INSS não goza de isenção do pagamento de custas e emolumentos, nas ações acidentárias e de benefícios propostos na Justiça Estadual'.
No caso em foco, a apuração do montante devido depende de mero cálculo aritmético, não se reputando ilíquida a sentença e, portanto, não incidindo a regra do reexame necessário."
O INSS apelou alegando, em síntese, não ter sido comprovada a condição de segurado especial. Sustenta que as certidões em que consta a qualificação como agricultor são muito antigas, datando de 1972 e 1973. Quanto às certidões mais recentes, destaca que não fazem referência à profissão do autor e, além disso, dão conta de nascimentos ocorridos em hospital na cidade. Acresce que a prova oral é frágil, mencionando genericamente o labor rural, "nada sabendo especificar quanto ao período de carência, por exemplo se trabalhava, onde, com quem, como ia etc. limitando-se todos a afirmar apenas que ele trabalhava antes de fazer a cirurgia." Sustenta que a sentença está sujeita ao reexame necessário.
Apresentadas contrarrazões, vieram os autos conclusos.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão-somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.
Remessa Oficial
Em relação à remessa oficial, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial (EREsp 934642/PR, Rel. Min. Ari Pargendler, julgado em 30-06-2009), prestigiou a corrente jurisprudencial que sustenta ser inaplicável a exceção contida no § 2.º, primeira parte, do art. 475 do CPC aos recursos dirigidos contra sentenças (a) ilíquidas, (b) relativas a relações litigiosas sem natureza econômica, (c) declaratórias e (d) constitutivas/desconstitutivas insuscetíveis de produzir condenação certa ou de definir objeto litigioso de valor certo (v.g., REsp. 651.929/RS).
Assim, em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso dos autos, dou por interposta a remessa oficial.
Incapacidade para o trabalho
A incapacidade laboral da parte autora foi reconhecida pelo próprio INSS (fl. 54), não sendo objeto de discussão no presente feito.
Condição de segurado especial
A controvérsia cinge-se à condição de segurado especial do autor, que a autarquia alega não ter restado comprovada.
Não há, outrossim, requisito etário a ser preenchido, vez que o autor busca conversão do benefício assistencial em aposentadoria por invalidez.
Assim, devem ser analisadas as provas produzidas a fim de se verificar se o autor exercia atividade rural à época anterior ao requerimento administrativo (17/12/2001).
Saliento que o exercício de atividade rural deve ser comprovado mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ. Trata-se de exigência que vale tanto para o trabalho exercido em regime de economia familiar quanto para o trabalho exercido individualmente.
O rol de documentos do art. 106 da LBPS não é exaustivo, de forma que documentos outros, além dos ali relacionados, podem constituir início de prova material, que não deve ser compreendido como prova plena, senão como um sinal deixado no tempo acerca de fatos acontecidos no passado e que agora se pretendem demonstrar, com a necessária complementação por prova oral.
Não há necessidade de que o início de prova material abarque todo o período de trabalho rural, desde que todo o contexto probatório permita a formação de juízo seguro de convicção: está pacificado nos Tribunais que não é exigível a comprovação documental, ano a ano, do período pretendido (TRF4, EINF 0016396-93.2011.404.9999, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 16/04/2013)
Análise do conjunto probatório
Conforme se extrai da análise dos autos, a parte autora, nascida em 20/08/50, requereu o benefício na via administrativa em 17/12/2001. Como anteriormente mencionado, o benefício postulado é aposentadoria por invalidez, o que dispensa o requisito da idade mínima.
Para comprovar o exercício de atividade rural trouxe aos autos os seguintes documentos:
a) certidão de casamento, realizado em 1972, em que o autor é qualificado como lavrador (fl. 13);
b) certidão de nascimento do filho Wanderley Andrade da Silva, ocorrido em 1973, constando a qualificação do autor como lavrador (fl. 14);
c) declaração sobre a composição do grupo e renda familiar do idoso e da pessoa com deficiência, constante do processo administrativo, em que consta que os filhos Marinez Andrade da Silva e Márcio Andrade da Silva eram "boias frias" (fl. 18);
d) certidão de nascimento da filha Marinez Andrade da Silva, ocorrido em 1979 (fl. 24);
e) cópia da conta de luz referente ao mês de outubro de 2001, constando o endereço do autor como sendo "Rua Principal - Setor São Paulo/PR" (fl. 25);
f) certidão de nascimento do filho Márcio Andrade da Silva, ocorrido em 1983 (fl. 26).
O autor logrou produzir o necessário início de prova material do exercício do trabalho na agricultura. Com efeito, as certidões de casamento (1972) e de nascimento do filho Wanderley (1973), embora anteriores à DER (17/12/2001), contém a qualificação do autor como lavrador. Além disso, a fatura de luz referente ao mês de outubro de 2001 dá conta de que o autor residia no bairro Seção São Paulo, o qual pertence à zona rural do Município de Uraí/PR. Ainda, do processo administrativo de concessão do benefício assistencial, consta que os filhos do autor, Marinez e Márcio, residiam com os pais e eram "boias frias" no ano de 2001. Esta última circunstância indica a vocação agrícola da família.
Deve-se destacar, ainda, que é exigido tão-somente início de prova material e para tanto são suficientes os documentos juntados. Não se pode olvidar, ainda, que o caso em tela trata da figura do trabalhador volante/boia-fria, que na maioria dos casos possui pouca documentação, devendo-se observar, ademais, o princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III).
Por outro lado, na audiência realizada em 14/03/2013, foi tomado o depoimento pessoal do autor e foram ouvidas três testemunhas.
Depoimento pessoal do autor Vitor Andrade da Silva
Perguntado, respondeu que desde os dez ou doze anos de idade até o ano de 2001, trabalhou como bóia-fria, na lavoura, em atividades que consistiam no corte de arroz, carpa de feijão, colheita de feijão ("arrancar feijão"), carpa de algodão, colheita de algodão, colheita de café e carpa de soja. Citou Shiguero Nakamura, Dr. Miguel, Eduardo Nakamura, Paulo Koga, Yamashiro como proprietários de terras para os quais prestou serviço. Trabalhou até 2001, quando adoeceu. Deslocava-se para o trabalho de camionete ou carreta, sendo que os patrões o buscavam na Seção São Paulo. Nunca trabalhou na cidade. Antes de 2001, ficava sem trabalhar apenas quando não havia serviço. Morou fora do Município de Uraí/PR apenas antes dos sete anos de idade.
Questionado sobre se teria trabalhado juntamente com alguma das testemunhas arroladas, citou a testemunha Carlos Batista, com quem trabalhou "no Shiguero e no Eduardo". Destacou que não trabalhavam sempre juntos. Isso ocorria em certas ocasiões. Em 2001, teve "problema na cabeça", sofreu intervenção cirúrgica e não pôde continuar trabalhando. Perguntado pelo procurador do INSS, respondeu que requereu o benefício através da "assistência social", sem advogado. Que, no ano 2000, chegou a trabalhar adoentado [inaudível], mencionando algumas ocasiões em que foi internado em hospital. Na época em que parou de exercer sua atividade, trabalhava com Shiguero e Dr. Miguel. Sua esposa trabalhava, ajudando na carpa de algodão. A esposa também adoeceu na mesma época em que o autor e não trabalha mais.
Testemunha Carlos Batista
Conhece o autor há aproximadamente vinte anos. Antes de adoecer, o autor trabalhava na roça para Shiguero Nakamura, Eduardo Nakamura, Seidi.
A testemunha trabalhava com máquinas agrícolas (trator, por exemplo). Chegou a trabalhar com o autor na propriedade de Shiguero Nakamura.
À época em que o autor adoeceu, estava trabalhando no sítio de Shiguero.
Onde houvesse serviço, o autor trabalhava.
Não sabe informar se o autor trabalhou na cidade.
A esposa do autor também trabalhava na roça.
Testemunha Francisco Carlos Ferracin
Conhecido do autor. Moram "no mesmo patrimônio".
Conhece o autor há vinte anos (ou mais). O autor trabalhava como volante/diarista.
Citou Shiguero, Eduardo, João Yamashiro, Dr. Miguel como proprietários de terras para os quais o autor prestava serviço.
A testemunha trabalhava com terra arrendada.
Não tem certeza se o autor trabalhou para ele ( testemunha), mas acredita que o tenha feito, pois há muita gente trabalhando na lavoura de algodão. Sabe que o autor trabalhou para as pessoas que mencionou porque moravam perto.
O autor parou de trabalhar há dez ou onze anos.
Não lembra quando o autor adoeceu. Não sabe informar se o mesmo trabalhou na cidade, mas acredita que não.
Testemunha Shiguero Nakamura
Conhece o autor desde a década de 1960.
O autor sempre trabalhou apenas na roça, tendo chegado a trabalhar para o depoente. Isso ocorria quase todo ano, na colheita do café e na carpa da soja, por safra.
Não sabe exatamente a última vez em que o autor prestou-lhe serviços.
Não lembra quanto tempo antes de adoecer o autor trabalhou.
Do conteúdo dos depoimentos testemunhais, depreende-se que restou corroborado o início de prova material, de modo que está comprovado o exercício do labor rural na condição de trabalhador volante, "bóia fria". Anoto que os depoimentos, ao contrário do alegado pela autarquia, mostraram-se coerentes.
Sinale-se que alguma imprecisão em relação às datas ou a pequenos detalhes nos depoimentos das testemunhas não compromete os testemunhos, porquanto se trata de fatos distantes no tempo.
Saliento, em atenção ao alegado pela autarquia, que o fato de os filhos do autor terem nascido em hospital localizado na zona urbana em hipótese alguma sinaliza que o mesmo (autor) não exercia trabalho rural. Ora, nada impede que moradoras da zona rural busquem assistência hospitalar para dar à luz. É recomendável que o façam, vez que, em princípio, há maior segurança no parto hospitalar. Se a esposa do autor conseguiu realizar seus partos em hospital - e hospitais costumam ser localizados em zona urbana - tal circunstância não pode ser apontada como impeditiva de obtenção de direito por parte do trabalhador rural. A alegação, portanto, não prospera.
Apreciando caso assemelhado, a Quinta Turma deste Regional assim decidiu:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL, COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL. CONVERSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL EM APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. 1. Procede o pedido de aposentadoria rural por idade quando atendidos os requisitos previstos nos artigos 11, VII, 48, § 1º e 142, da Lei nº 8.213/1991. 2. Comprovado o implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinqüenta e cinco anos para a mulher), e o exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, ainda que a comprovação seja feita de forma descontínua, é devida a conversão do benefício assistencial de titularidade do autor em aposentadoria rural por idade, desde a data do pedido administrativo 3. Considera-se comprovado o exercício de atividade rural havendo início de prova material complementada por prova testemunhal idônea, sendo dispensável o recolhimento de contribuições para fins de concessão do benefício. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5017976-34.2015.404.9999, 5ª TURMA, Des. Federal ROGERIO FAVRETO, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 02/09/2015) (grifos nossos)
Do voto condutor, destaco os seguintes excertos:
(...)
No presente caso, observo que a parte autora preencheu o requisito etário, 60 (sessenta) anos, em 02/11/2002, porquanto nascida em 02/11/1942 (Evento 1, OUT3, Página 1). O requerimento administrativo foi efetuado em 29/10/2007 (Evento 1, OUT10, Página 1). Dessa forma, a parte autora deve comprovar o exercício de atividade rural no período de 126 meses imediatamente anteriores ao implemento do requisito etário ou 156 meses imediatamente anteriores ao requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável.
Para fazer prova do exercício de atividade rural, a parte autora instruiu sua peça inicial com os seguintes documentos:
- certidão de casamento do autor, celebrado no ano de 1978, onde consta sua profissão como agricultor (Evento 1, OUT4, Página 1);
- declarações dos Srs. Teodoro Alves Moreira e Isaltino Felix, atestando que conhecem o autor e que este exerceu atividades como trabalhador rural, boia-fria, safrista e diarista para diversos proprietários rurais no interior do município Chopinzinho (Evento 1, OUT9, Página 2/3);
- estudo social elaborado pelo Município de Chopinzinho declarando que o autor reside em terras de terceiros, que é sustentado pelos filhos por se encontrar doente, sem condições de trabalhar (Evento 1, OUT7, Página 1);
Por ocasião da audiência de instrução, em 02/12/2014 (Evento 45, TERMOAUD1, Página 1/5), foram inquiridas as testemunhas Elio Schalm, Teodoro Alves Moreira e Isaltino Felix, as quais confirmaram o exercício de atividades rurais pelo demandante.
(...)
No caso, os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material. A prova testemunhal, por sua vez, é precisa e convincente do labor rural pela parte autora no período de carência legalmente exigido.
Saliente-se que, no caso de trabalhador rural boia-fria, a exigência de início de prova material deve ser abrandada, considerada a informalidade com que é exercida a atividade, o que dificulta a sua comprovação documental. No entanto, tal prova não pode ser de todo dispensada, na medida em que o Superior Tribunal de Justiça reafirmou, em sede de recurso especial repetitivo e tratando especificamente desta modalidade de trabalho rural, a aplicação da Súmula n.º 149 daquela Corte segundo a qual "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário" (REsp 1.321.493/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012).
No caso, os documentos juntados aos autos, com certa flexibilização, constituem início de prova material. Deve ser levado em conta que o trabalhador rural boia-fria ainda está à margem da formalidade, sendo muitas vezes contratado por terceiros e colocado para trabalhar em estabelecimentos rurais cujos proprietários nem sequer são identificados no momento em que aquele é arregimentado. Assim, torna-se difícil a tarefa de obter registros documentais acerca das atividades campesinas exercidas por tal trabalhador.
(...)
Embora o precedente citado refira-se à conversão de benefício assistencial em benefício diverso do ora postulado, aplica-se ao caso sob apreciação o entendimento acerca da comprovação do exercício do labor rural.
Destaque-se, ainda, que é dever da autarquia conceder o melhor benefício a que o segurado tenha direito, ainda que, para alcançar essa finalidade, tenha de orientar, sugerir ou solicitar os documentos necessários.
Como se vê, dos documentos acostados aos autos, bem como pelo teor da prova testemunhal, restou comprovado o exercício de atividade rural pela parte autora, tendo direito a mesma à conversão do benefício assistencial em aposentadoria por invalidez, a contar da data do requerimento administrativo (17/12/2001)
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64);
- OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei nº 2.284/86);
- BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89);
- INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91);
- IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92);
- URV (03 a06/94, Lei nº 8.880/94);
- IPC-r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94);
- INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95);
- IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91).
- TR (a partir de 30/06/2009, conforme art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009).
O Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, declarou a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009, afastando a utilização da TR como fator de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, relativamente ao período entre a respectiva inscrição em precatório e o efetivo pagamento.
Em consequência dessa decisão, e tendo presente a sua ratio, a 3ª Seção desta Corte vinha adotando, para fins de atualização dos débitos judiciais da Fazenda Pública, a sistemática anterior à Lei nº 11.960/2009, o que significava, nos termos da legislação então vigente, apurar-se a correção monetária segundo a variação do INPC, salvo no período subsequente à inscrição em precatório, quando se determinava a utilização do IPCA-E.
Entretanto, a questão da constitucionalidade do uso da TR como índice de atualização das condenações judiciais da Fazenda Pública, no período antes da inscrição do débito em precatório, teve sua repercussão geral reconhecida no RE 870.947, e aguarda pronunciamento de mérito do STF. A relevância e a transcendência da matéria foram reconhecidas especialmente em razão das interpretações que vinham ocorrendo nas demais instâncias quanto à abrangência do julgamento nas ADIs 4.357 e 4.425.
Recentemente, em sucessivas reclamações, a Suprema Corte vem afirmando que no julgamento das ADIs em referência a questão constitucional decidida restringiu-se à inaplicabilidade da TR ao período de tramitação dos precatórios, de forma que a decisão de inconstitucionalidade por arrastamento foi limitada à pertinência lógica entre o art. 100, § 12, da CRFB e o artigo 1º-F da Lei 9.494/97, na redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009. Em consequência, as reclamações vêm sendo acolhidas, assegurando-se que, ao menos até que sobrevenha decisão específica do STF, seja aplicada a legislação em referência na atualização das condenações impostas à Fazenda Pública, salvo após inscrição em precatório. Os pronunciamentos sinalizam, inclusive, para eventual modulação de efeitos, acaso sobrevenha decisão mais ampla quanto à inconstitucionalidade do uso da TR para correção dos débitos judiciais da Fazenda Pública (Rcl 19.050, Rel. Min. Roberto Barroso; Rcl 21.147, Rel. Min. Cármen Lúcia; Rcl 19.095, Rel. Min. Gilmar Mendes).
Em tais condições, com o objetivo de guardar coerência com os mais recentes posicionamentos do STF sobre o tema, e para prevenir a necessidade de futuro sobrestamento dos feitos apenas em razão dos consectários, a melhor solução a ser adotada, por ora, é orientar para aplicação do critério de atualização estabelecido no art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação da Lei n. 11.960/2009.
Este entendimento não obsta a que o juízo de execução observe, quando da liquidação e atualização das condenações impostas ao INSS, o que vier a ser decidido pelo STF em regime de repercussão geral, bem como eventual regramento de transição que sobrevenha em sede de modulação de efeitos.
Deve ser dado provimento à remessa oficial e à apelação para que seja aplicada a Lei nº 11.960/2009.
Juros de mora
Até 29-06-2009 os juros de mora, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Quanto ao ponto, esta Corte já vinha entendendo que no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 não houvera pronunciamento de inconstitucionalidade sobre o critério de incidência dos juros de mora previsto na legislação em referência.
Esta interpretação foi, agora, chancelada, pois no exame do recurso extraordinário 870.947, o STF reconheceu repercussão geral não apenas à questão constitucional pertinente ao regime de atualização monetária das condenações judiciais da Fazenda Pública, mas também à controvérsia pertinente aos juros de mora incidentes.
Em tendo havido a citação já sob a vigência das novas normas, inaplicáveis as disposições do Decreto-lei 2.322/87, incidindo apenas os juros da caderneta de poupança, sem capitalização.
A sentença está de acordo com os parâmetros acima referidos, pelo que deve ser confirmada no tópico.
Honorários advocatícios
Os honorários advocatícios, em 10% sobre as parcelas vencidas até a data da sentença, foram fixados de acordo com o entendimento desta Corte.
Custas processuais
O INSS responde pelo pagamento das custas processuais quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 desta Corte).
Cumprimento imediato do julgado (tutela específica)
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007), determino o cumprimento imediato do acórdão, a ser efetivado em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Prequestionamento
Para fins de possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores dou por prequestionadas as matérias constitucionais e legais alegadas em recurso pelas partes, nos termos das razões de decidir já externadas no voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou tidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do declinado.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação e à remessa oficial, e determinar o imediato cumprimento do acórdão.
Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior
Relator
Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8191058v10 e, se solicitado, do código CRC A4D40CB3. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/04/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007787-82.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00021978120118160175
RELATOR | : | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Sérgio Arenhardt |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | VITOR ANDRADE DA SILVA |
ADVOGADO | : | Jose Carlos Alves Ferreira e Silva |
: | Alessandra Dorta de Oliveira |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/04/2016, na seqüência 315, disponibilizada no DE de 12/04/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL, E DETERMINAR O IMEDIATO CUMPRIMENTO DO ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR |
: | Juiz Federal PAULO PAIM DA SILVA | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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