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PREVIDENCIÁRIO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. NIVOLUMABE. LINFOMA DE HODGIKIN. INEFICÁCIA DA POLÍTICA PÚBLICA. EFICÁCIA E ADEQUAÇÃO DO MED...

Data da publicação: 28/10/2021, 11:01:39

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. NIVOLUMABE. LINFOMA DE HODGIKIN. INEFICÁCIA DA POLÍTICA PÚBLICA. EFICÁCIA E ADEQUAÇÃO DO MEDICAMENTO. CONCESSÃO JUDICIAL DO FÁRMACO POSTULADO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Tratando-se de adoção de uma política pública de saúde, caberá aos profissionais de saúde, dentro de suas melhores convicções profissionais, tomarem as decisões que espelhem os interesses de toda a Sociedade. Isso importa, necessariamente, na eleição de prioridades, na análise de custo-benefício, na ponderação dos objetivos alcançáveis pelo tratamento, para que possa o sistema de saúde dar atendimento ao maior número de pacientes, e com a melhor eficiência possível frente as limitações orçamentárias. 2. Estabelecida a política pública de disponibilização de medicamentos, há que se lhe dar credibilidade, não podendo ser afastada, via de regra, com base em opinião isolada de um determinado médico, mesmo que perito nomeado pelo juiz. 3. Não há qualquer razoabilidade em se admitir a opinião isolada de um único médico, contra o conjunto de informações que subsidiaram a decisão pública. Não bastará a mera opinião, baseada em considerações pessoais, sem que se aponte, com suficiente e racional fundamentação, o erro da política pública. 4. Procurando racionalizar as decisões judiciais, é que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da STA 175, expressamente reconheceu e definiu alguns parâmetros para solução judicial dos casos que envolvem direito à saúde, bem como a demonstração de evidências científicas para justificar o pedido. 5. Não havendo evidências suficientes que demonstrem erro do Poder Público na não inclusão do medicamento postulado entre aqueles de fornecimento geral e universal à população, indevida sua dispensação pela via judicial. 6. A superioridade diminuta de um medicamento, sem dados concretos acerca dessa superioridade, sem que seja possível dimensionar o aumento da sobrevida global do paciente, não indica dado relevante para demonstrar que os medicamentos fornecidos pelo SUS são menos eficientes que a medicação solicitada pela parte. 7. Assim, não se evidenciando estudos conclusivos sobre a superioridade da medicação, não se comprova erro da não inclusão do medicamento no fornecimento universal pelo SUS. (TRF4 5002744-31.2020.4.04.7016, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 21/10/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5002744-31.2020.4.04.7016/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

APELANTE: ESTADO DO PARANÁ (RÉU)

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: JOAO GUSTAVO GIORDANI NOGUEIRA (AUTOR)

ADVOGADO: JAKELINE FERNANDES STEFANELLO (OAB PR039995)

RELATÓRIO

Trata-se de apelações do Estado do Paraná e da União contra sentença que julgou procedente o pedido, nos seguintes termos (evento 104 do originário):

(...)

Ante o exposto, julgo procedentes os pedidos, resolvendo o processo com apreciação de seu mérito, na forma do inciso I do artigo 487 do CPC, para o fim de condenar os réus, em caráter solidário, a fornecerem ao autor a medicação NIVOLUMABE 240 MG, na seguinte posologia, conforme prescrição de seu médico assistente: aplicar 240 mg EV a cada 15 dias enquanto houver resposta.

O provimento somente poderá ser executado após o trânsito em julgado em razão da decisão proferida no AG 5054723-31.2020.4.04.0000/PR.

Caberá ao Estado a obrigação de adquirir e fornecer o medicamento à requerente no total necessário, cabendo à União o reembolso dos custos, na forma pro rata.

Estabeleço as seguintes obrigações que devem ser observadas pelo beneficiário para recebimento do medicamento deferido nesta decisão:

a) a receita médica deve ser renovada para cada retirada do medicamento;

b) comunicação imediata (dentro do prazo de 48 horas) ao órgão estadual de saúde que disponibilizou o medicamento e a este juízo acerca da ocorrência de suspensão/interrupção do tratamento ou de morte da paciente;

c) acondicionamento do medicamento recebido de acordo com as informações e especificações do laboratório fabricante;

d) devolução, no prazo de 48 horas, ao órgão estadual de saúde que disponibilizou o medicamento excedente ou não utilizado, a contar da interrupção/suspensão do tratamento ou da morte;

e) devolução, no prazo de 48 horas, do medicamento não utilizado por inadequação.

Registro que o recebimento de medicamento no caso de descontinuidade do uso poderá implicar descumprimento de ordem judicial e eventualmente prática do crime de apropriação indébita.

As partes são isentas do pagamento de custas processuais.

O entendimento jurisprudencial consolidado no âmbito do TRF 4ª Região é no sentido de que as causas relacionadas à garantia do direito à saúde, cujo valor material é inestimável, aplicável, para definição do valor dos honorários advocatícios sucumbenciais, a apreciação equitativa do Juízo (artigo 85, §8º, do CPC).

Assim, na hipótese sub judice, levando em consideração o zelo profissional da advogada da parte autora, o lugar da prestação do serviço, a natureza e a importância da lide, bem como o trabalho realizado pela advogada e o tempo exigido para o seu serviço, arbitro os honorários advocatícios sucumbenciais em R$ 3.000,00 (três mil reais), pro rata entre os entes federados réus na ação, devidamente atualizados na forma do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960/2009, da data da prolação desta sentença até o efetivo pagamento.

(...)

Apela o Estado do Paraná sustentando que não há comprovação da eficácia do medicamento postulado. Aduz que sendo possível o uso de linhas de tratamento disponíveis pelo SUS e dado o altíssimo custo do tratamento, se faz necessária a reforma da decisão recorrida. Subsidiariamente, requer que a responsabilidade pelo fornecimento do medicamento seja atribuída integralmente à União, assim como a exclusão ou redução dos honorários advocatícios.

Apela a União. Preliminarmente, suscita a incompetência da Justiça Federal, assim como sustenta não ser obrigatória sua inclusão na lide. Quanto ao mérito, enfatiza não haver comprovação da imprescindibilidade do tratamento com Nivolumabe, não tendo sido demonstrado ganho de sobrevida. Aduz ser necessária a realização de perícia judicial e ressalta o alto custo do medicamento.

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

Peço dia para julgamento.

VOTO

Legitimidade Passiva e Competência

O Supremo Tribunal Federal, em julgamento em 05.03.2015, sob a sistemática da repercussão geral (Tema 793), assim decidiu:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. Decisão: O Tribunal, por unanimidade, reputou constitucional a questão. O Tribunal, por unanimidade, reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada. No mérito, por maioria, reafirmou a jurisprudência dominante sobre a matéria, vencidos os Ministros Teori Zavascki, Roberto Barroso e Marco Aurélio. Não se manifestou a Ministra Cármen Lúcia. (Repercussão Geral no Recurso Extraordinário 855.178, Plenário, Relator Ministro Luiz Fux, j. 05/03/2015, sem o grifo no original)

Outrossim, em Plenário, o STF, em 22.05.2019, fixou a seguinte tese de repercussão geral ao julgar os embargos de declaração opostos nesse mesmo recurso (RE 855.178, Tema 793):

Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde e, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.

O acórdão, publicado em 16.04.2020 assim dispôs:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. DESENVOLVIMENTO DO PROCEDENTE. POSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE DE SOLIDÁRIA NAS DEMANDAS PRESTACIONAIS NA ÁREA DA SAÚDE. DESPROVIMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. 1. É da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. 2. A fim de otimizar a compensação entre os entes federados, compete à autoridade judicial, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, direcionar, caso a caso, o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. 3. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União. Precedente específico: RE 657.718, Rel. Min. Alexandre de Moraes. 4. Embargos de declaração desprovidos.
(RE 855178 ED, Relator Min. LUIZ FUX, Relator p/ Acórdão: Min. EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 23/05/2019)

O voto proferido pelo Ministro Relator Luiz Edson Fachin estabeleceu que:

Se a pretensão veicular pedido de tratamento, procedimento, material ou medicamento não incluído nas políticas públicas em todas as suas hipóteses a União necessariamente comporá o polo passivo, considerando que o Ministério da Saúde detém competência para incorporação, exclusão ou alteração de novos medicamentos, produtos, procedimentos, bem como constituição ou alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica, de modo que recai sobre ela o dever de indicar o motivo ou as razões da não padronização e eventualmente iniciar o procedimento de análise de inclusão nos termos da respectiva fundamentação.

De outro lado, é pacífico o entendimento de que "a existência de precedente firmado pelo Tribunal Pleno desta Corte autoriza o julgamento imediato de causas que versem sobre a mesma matéria, independentemente da publicação ou do trânsito em julgado do paradigma" (RE 993773 AgR-ED RS, rel. Ministro DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, DJe 29-08-2017).

Assim, diante da solidariedade entre os entes reafirmada pelo Supremo, deve-se reconhecer a legitimidade passiva da União em ações de saúde quando for a responsável financeira para arcar com o seu custeio (tratamentos oncológicos e de alto custo) e quando se tratar de medicamento não incluído nas políticas públicas (item v da conclusão do voto do Min. Fachin), nos termos do que decidido pelo STF no RE 855.178. Portanto, a competência para julgamento do feito é da Justiça Federal.

Não há outra forma de o juiz cumprir a decisão do STF ("compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro"), neste caso concreto, sem incluir a União.

Mérito

Considerações Gerais

O direito fundamental à saúde é assegurado nos arts. 6º e 196 da Constituição Federal e compreende a assistência farmacêutica (art. 6º, inc. I, alínea d, da Lei n.º 8.080/90), cuja finalidade é garantir a todos o acesso aos medicamentos necessários para a promoção e tratamento da saúde.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da STA 175, expressamente reconheceu e definiu alguns parâmetros para solução judicial dos casos que envolvem direito à saúde, bem como a demonstração de evidências científicas para justificar o pedido. Assim, devem ser considerados, entre outros, os seguintes fatores:

a) a inexistência de tratamento/procedimento ou medicamento similar/genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem êxito pelo postulante ou sua inadequação devido a peculiaridades do paciente;

b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a doença que acomete o paciente;

c) a aprovação do medicamento pela ANVISA;

d) a não configuração de tratamento experimental.

De fato, tratando-se de adoção de uma política pública de saúde, caberá aos profissionais de saúde, dentro de suas melhores convicções profissionais, tomarem as decisões que espelhem os interesses de toda a sociedade. Isso importa, necessariamente, na eleição de prioridades, na análise de custo benefício, ponderação dos objetivos alcançáveis pelo tratamento, etc, tudo para que possa o sistema de saúde dar atendimento ao maior número de pacientes, e com a melhor eficiência possível frente às limitações orçamentárias. Desnecessário lembrar que a população, por vezes, carece de tratamentos e medicamentos, e mesmo de atendimento profissional, por questões de falta de recursos, mesmo para alguns tratamentos comprovadamente eficientes ou de urgência.

Estabelecida a política pública de disponibilização de medicamentos, há que se lhe dar credibilidade, pelo menos até que seja seriamente desafiada em sua correção. Isso não apenas porque se presume sua seriedade, mas também porque se presume tenha o Estado consultado profissionais qualificados para definir a dispensação de remédios. E ainda, fundamentalmente, por se admitir, de modo razoável, que o conjunto/reunião dos profissionais que subsidiaram as políticas públicas substancializa um espectro maior e mais variado de opiniões, cuja soma fornece densidade mais robusta que opiniões isoladas de médicos, muitas vezes pressionados pelos casos à frente.

Aqui, uma primeira importante perspectiva: a política de dispensação de medicamentos não pode ser afastada, via de regra, com base em opinião isolada de um determinado médico, mesmo que perito nomeado pelo juiz. Não há qualquer razoabilidade em se admitir a opinião isolada de um único médico contra o conjunto de informações que subsidiaram a decisão pública. Não bastará a mera opinião, baseada em considerações pessoais, sem que se aponte, com suficiente e racional fundamentação, o erro da política pública.

A crítica, para ser válida e aceitável, deverá ser manifestada em artigos, estudos ou qualquer dado público que confronte as razões que informam a decisão do sistema público em não ofertar, de forma geral e universal, determinado medicamento. Nesse sentido, aliás, não se tem até aqui comprovado que tenha a política pública de dispensação de medicamentos deixado de fora, por longo tempo, algum fármaco de efetiva eficácia para doenças raras. Muito pelo contrário: passado recente envolvendo a Fosfoetanolamina, cujo fornecimento generalizado foi autorizado pelo Poder Judiciário, demonstrou que a negativa do Estado no fornecimento desse preparado químico não tinha por base um erro da política de dispensação de remédios.

Nesse particular, observe-se que a problemática de medicamentos não se limita à questão orçamentária. Igualmente importante é saber sobre a necessidade, ou não, de determinado medicamento e sobre sua eficácia. Da análise do, por vezes, pouco benefício esperado frente a situações irreversíveis do curso da vida. Haveria, ainda, problemas periféricos, de certo conhecimento público, do induzimento do fornecimento de determinados medicamentos, ganhos diretos e indiretos relacionados a prescrições médicas, interesses da poderosa indústria farmacêutica, etc. Por outro lado, o fenômeno da judicialização da saúde tem criado um sistema de saúde lateral ao Sistema Único de Saúde, sendo os dois sistemas custeados pelo orçamento público, o que evidencia que a questão fundamental não é orçamentária.

Tão importante quanto às questões acima, é preciso compreender que medicamentos que não ultrapassaram todas as fases de teste são, em princípio, medicamentos ainda não definitivamente testados, tanto na comprovação de sua eficácia, quanto na averiguação das questões ligadas a riscos remanescentes de sua administração. Daí porque não servem, em geral, para serem incorporados definitivamente no fornecimento pelo sistema de saúde. A aprovação de medicamentos em testes na fase III deve ser seguida de esforços da pesquisa médica e, principalmente, dos grandes fabricantes para fornecimento dos estudos finais e definitivos sobre o fármaco. Do contrário, e especialmente no Brasil, a população estará sujeita a ser a base de testes da indústria farmacêutica, incorrendo-se nos riscos aí envolvidos, e mediante financiamento público.

Por outro lado, imaginar que o Juiz tenha condições de decidir o fornecimento de medicamentos, com base na voz de seu perito, é presumir racionalidade onde não há.

Primeiro porque o médico perito, não raras vezes, não terá maior conhecimento do que os profissionais que informam a política pública de medicamentos e, assim, na grande maioria das vezes, não indicará onde está o erro por determinado medicamento não estar na lista dos disponibilizados. Nessas circunstâncias, o perito oferta ao Juiz mera opinião pessoal e não uma análise científica da possibilidade de determinado medicamente vir a ter efeito no paciente. Muitos peritos sequer mencionam experiências pessoais ou novos estudos onde teriam prescrito determinado medicamento, o que mostra a natureza meramente opinativa de seus pareceres.

Segundo porque no processo judicial, não se tendo conhecimento técnico, o Juiz tenderá a fornecer o medicamento, não porque está convencido de que há um erro por parte do Estado, mas porque não desejará assumir o ônus moral de não ter deferido determinando medicamento. A decisão do juiz, nessas circunstâncias, visa ao conforto emocional do magistrado e não se baseia em dados científicos e argumentos racionais. Apontados fossem argumentos reais, a conclusão a se extrair da decisão seria o amplo e geral fornecimento do medicamento a toda a população necessitada, independentemente do seu custo.

Sobre o ônus moral de decisões dessa natureza, importante observar que a decisão de não fornecer o medicamento já foi tomada pelo Estado. E ela é válida enquanto política universal destinada a atender a toda população. Portanto, a decisão do Juiz, a se estabelecer, é outra. Ou seja, diz respeito a verificar se foram, ou não, fornecidos dados suficientes para comprovar que, no caso concreto, a política pública está equivocada ou é insuficiente.

Caso concreto

Cabe ressaltar que este Relator já analisou os agravos de instrumento 5054723-31.2020.4.04.0000 e 5000343-24.2021.4.04.0000, apresentados pelo Estado do Paraná e pela União, julgado por este Colegiado de forma unânime. Assim, transcrevo a fundamentação neles apresentada, pois trata-se da mesma parte autora e o mesmo medicamento:

(...)

No caso a prescrição médica que embasou o pedido de substituição do medicamento postulado assim relata (ev. 43, doc. 2, da origem):

Diante da falha do medicamento anterior, o Juízo a quo determinou a realização de Nota Técnica que assim descreveu (ev. 52):

...

Nesse contexto, o Juízo deferiu a liminar, assim considerando:

Estabelecidas essas premissas, passo ao caso concreto.

Os documentos que instruem a petição inicial demonstram que a parte autora é portadora da enfermidade que alega (E1, doc. 1, fls. 24-44).

O seu médico assistente considera indispensável o tratamento com o medicamento NIVOLUMABE diante da falha do medicamento anterior (E43, doc. 2). Verifica-se que o autor está em tratamento na UOPECCAN - Hospital do Câncer de Cascavel, instituição cadastrada como CACON. O relatório médico refere que o paciente já foi submetido a 4 linhas de tratamento disponíveis no SUS, iniciando a 5ª linha e ainda assim com progressão da doença, razão pela qual se justifica, neste momento, o tratamento com a patologia postulada.

Consta na nota técnica E-NATJUS (E52) que o fármaco possui registro na Anvisa e que há evidências científicas sobre seu impacto na saúde dos pacientes, não configurando-se, portanto, tratamento experimental. O parecer conclui favoravelmente ao fornecimento ao autor da droga postulada (NIVOLUMABE).

(...)

Consta ainda da nota técnica precisamente que "os pacientes refratários a várias linhas de tratamento eventualmente podem apresentar resposta com tratamento imunoterápicos, como Nivolumabe, que está liberado e aprovado no Brasil para várias indicações, entre elas o tratamento de Linfoma de Hodgkin recidivado. Os benefícios esperados são taxas de resposta em torno de 30-50% com ganho de sobrevida global".

Presente, desse modo, a probabilidade do direito.

Constato também que a parte autora é hipossuficiente considerando que é beneficiário de auxílio-doença com renda mínima (E1, doc. 1, fl. 24) e o preço comercial do medicamento supera R$ 10.000,00 (E43, doc. 7).

Dessa forma, deve ser deferido o fornecimento do medicamento NIVOLUMABE 240MG, na posologia de aplicação EV de 240mg a cada 15 dias, por tempo indeterminado e enquanto houver resposta, conforme prescrição de seu médico assistente.

Diante do exposto, defiro o pedido de tutela de urgência antecipada para o fim de determinar aos réus que forneçam à parte autora a medicação NIVOLUMABE 240MG, na posologia de aplicação EV de 240mg a cada 15 dias, por tempo indeterminado e enquanto houver resposta, conforme prescrição de seu médico assistente, no prazo de 20 (vinte) dias, sob pena de bloqueio de valores e de incidência de multa no valor de R$ 100,00 (cem reais) por dia de atraso não justificado.

Entretanto, o que se vê é que a Nota Técnica é absolutamente vaga aos descrever as evidências científicas, limitando-se a afirmar que "os pacientes refratários a varias linhas de tratamento eventualmente podem apresentar resposta com tratamentos imunoterápicos, como o nivolumabe".

Os dados apontados pelo NATJUS não permitem uma real dimensão da suposta efetividade e superioridade da droga demandada como quinta linha de tratamento no caso.

A indicação genérica de que eventualmente pode ser obtida resposta é insuficiente.

Nesse contexto, diante da fragilidade das evidências científicas até então apontadas pelo NATJUS acerca da imprescindibilidade do medicamento no caso concreto e da sua real superioridade frente aos medicamentos oferecidos pelo SUS, não vejo a verossimilhança do direito alegado.

De outro lado, quanto ao medicamento NIVOLUMABE para tratamento de linfoma de Hodgkin e especialmente tendo em vista o sistema de precedentes previsto no CPC, ressalto que nos autos da AC 5036975-69.2019.4.04.7000 (por unanimidade, julgada em 03.12.2019), melhor instruída, tive a oportunidade de detalhar a análise quanto às evidências científicas do medicamento tendo em vista a perícia realizada, que transcrevo, como fundamentação, a análise que proferi na oportunidade:

Foi realizada perícia nos autos (ev. 34 da origem), que fez os seguintes apontamentos sobre as evidências científicas do Nivolumabe para linfoma de hodgkin:

...

A conclusão do perito, embora descreva que a medicação pode ser eficaz em aumento de sobrevida afirma expressamente que "não há como afirmar que a medicação seja absolutamente indispensável para a autora. A literatura médica ainda informa fases iniciais de estudo, com ganho na taxa de resposta, mas ainda sem avaliação de ganho de sobrevida" (quesito "d").

Em outro ponto diz o perito que "Não há como confirmar ganho de sobrevida. Os estudos internacionais ainda não atingiram esta resposta." (quesito "e").

Transcrevo ainda, os seguintes trechos da perícia:

Este é o caso dos autos em que não se evidencia estudos conclusivos sobre a superioridade da medicação, não se comprovando erro da não inclusão do medicamento no fornecimento universal pelo SUS.

Os dados apontados pela Nota Técnica não permitem uma real dimensão da suposta efetividade e superioridade da droga demandada.

Entendo que a superioridade diminuta de um medicamento, frente ao placebo, sem dados concretos acerca dessa superioridade, sem que seja possível dimensionar o aumento da sobrevida global da paciente, não indica dado relevante para demonstrar que os medicamentos fornecidos pelo SUS são menos eficientes que a medicação solicitada pela parte.

Nesse contexto, diante da fragilidade das evidências científicas até então apontadas pela perícia acerca da imprescindibilidade do medicamento e da sua real superioridade frente aos medicamentos oferecidos pelo SUS, não vejo a verossimilhança do direito alegado.

(...)

Assim, merecem provimento os apelos para que seja julgado improcedente o pedido inicial.

Inverto os ônus sucumbenciais, condenando a parte autora ao pagamento de honorários no valor de R$ 3.000,00 rateados por ente federado réu, cuja exigibilidade resta suspensa, no caso de ser beneficiário da justiça gratuita.

Prequestionamento

Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do CPC.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento aos apelos do Estado do Paraná e da União e à remessa oficial.



Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002850145v8 e do código CRC d21ff5e8.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 21/10/2021, às 9:34:1


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5002744-31.2020.4.04.7016/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

APELANTE: ESTADO DO PARANÁ (RÉU)

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: JOAO GUSTAVO GIORDANI NOGUEIRA (AUTOR)

ADVOGADO: JAKELINE FERNANDES STEFANELLO (OAB PR039995)

EMENTA

previdenciário. direito à saúde. fornecimento de MEDICAMENTO. NIVOLUMABE. LINFOMA DE HODGIKIN. inEFICÁCIA da política pública. EFICÁCIA E ADEQUAÇÃO do medicamento. concessão judicial do fármaco postulado. IMPOSSIBILIDADE.

1. Tratando-se de adoção de uma política pública de saúde, caberá aos profissionais de saúde, dentro de suas melhores convicções profissionais, tomarem as decisões que espelhem os interesses de toda a Sociedade. Isso importa, necessariamente, na eleição de prioridades, na análise de custo-benefício, na ponderação dos objetivos alcançáveis pelo tratamento, para que possa o sistema de saúde dar atendimento ao maior número de pacientes, e com a melhor eficiência possível frente as limitações orçamentárias.

2. Estabelecida a política pública de disponibilização de medicamentos, há que se lhe dar credibilidade, não podendo ser afastada, via de regra, com base em opinião isolada de um determinado médico, mesmo que perito nomeado pelo juiz.

3. Não há qualquer razoabilidade em se admitir a opinião isolada de um único médico, contra o conjunto de informações que subsidiaram a decisão pública. Não bastará a mera opinião, baseada em considerações pessoais, sem que se aponte, com suficiente e racional fundamentação, o erro da política pública.

4. Procurando racionalizar as decisões judiciais, é que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da STA 175, expressamente reconheceu e definiu alguns parâmetros para solução judicial dos casos que envolvem direito à saúde, bem como a demonstração de evidências científicas para justificar o pedido.

5. Não havendo evidências suficientes que demonstrem erro do Poder Público na não inclusão do medicamento postulado entre aqueles de fornecimento geral e universal à população, indevida sua dispensação pela via judicial.

6. A superioridade diminuta de um medicamento, sem dados concretos acerca dessa superioridade, sem que seja possível dimensionar o aumento da sobrevida global do paciente, não indica dado relevante para demonstrar que os medicamentos fornecidos pelo SUS são menos eficientes que a medicação solicitada pela parte.

7. Assim, não se evidenciando estudos conclusivos sobre a superioridade da medicação, não se comprova erro da não inclusão do medicamento no fornecimento universal pelo SUS.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento aos apelos do Estado do Paraná e da União e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 19 de outubro de 2021.



Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002850146v3 e do código CRC 1ccaee4a.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 21/10/2021, às 9:34:1


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Conferência de autenticidade emitida em 28/10/2021 08:01:37.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 11/10/2021 A 19/10/2021

Apelação/Remessa Necessária Nº 5002744-31.2020.4.04.7016/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM

APELANTE: ESTADO DO PARANÁ (RÉU)

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: JOAO GUSTAVO GIORDANI NOGUEIRA (AUTOR)

ADVOGADO: JAKELINE FERNANDES STEFANELLO (OAB PR039995)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 11/10/2021, às 00:00, a 19/10/2021, às 16:00, na sequência 879, disponibilizada no DE de 30/09/2021.

Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AOS APELOS DO ESTADO DO PARANÁ E DA UNIÃO E À REMESSA OFICIAL.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA

Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

SUZANA ROESSING

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 28/10/2021 08:01:37.

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