
Apelação Cível Nº 5020228-68.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: OSMAR LUIZ ALBANI
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto pela parte autora (apelação 103) contra sentença, publicada em 10/01/2019, que julgou parcialmente procedente o pedido formulado na inicial, nos seguintes termos (sent 97):
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado por Osmar Luiz Albani, com fundamento no art. 487, inc. I, do Código de Processo Civil, tão somente para RECONHECER os períodos de atividade especial de 1.1.1991 a 30.11.1995; 1.2.1996 a 31.5.1999; 1.9.1999 a 20.5.2004 e 1.11.2004 a 16.12.2014, determinando a averbação pelo INSS. Considerando que houve sucumbência recíproca, cada parte deverá arcar com metade das custas processuais, observadas a isenção legal e a gratuidade da justiça (art. 98, §3º do CPC). Condeno ambas as partes, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa (art. 85, §4º, inciso III do NCPC), observado-se, em relação à parte autora o disposto no art. 98, §3º do NCPC. P. R. I. Sentença não sujeita à remessa necessária, uma vez que, por óbvio, os valores não ultrapassarão o montante previsto no artigo 496 do NCPC.
O autor requer seja convertido o julgamento em diligência para comprovação de permanência do autor em labor especial após a DER e posterior majoração do tempo de serviço com a concessão do beneficio e procedência total da demanda.
É o relatório.
VOTO
A questão a ser examinada no presente recurso limita-se ao pedido de reafirmação da DER.
Com efeito, Faltando ao autor curto período de contribuição previdenciária para atingir a carência exigida à percepção do benefício de aposentadoria almejado, torna-se, ainda que de ofício, necessária a análise acerca da possibilidade de reafirmação da DER, a fim de complemento contributivo (TRF 4ª Região, APELREEX nº 0009099-64.2013.404.9999, Relator Juiz Federal Luiz Antonio Bonat, 5ª Turma, D.E. 26/02/2016).
A Terceira Seção desta Corte, no julgamento realizado nos autos do processo nº 5007975-25.2013.4.04.7003, realizado na forma do artigo 947, § 3º, do NCPC - Incidente de Assunção de Competência -, concluiu pela possibilidade de reafirmação da DER, prevista pela IN nº 77/2015 do INSS (redação mantida pela subsequente IN nº 85, de 18/02/2016), também em sede judicial, nas hipóteses em que o segurado implementa todas as condições para a concessão do benefício após a conclusão do processo administrativo, inclusive quanto ao labor prestado pela parte autora após o ajuizamento da ação, para fins de concessão de benefício previdenciário, desde que observado o contraditório, e tendo como limite a data do julgamento da apelação ou remessa necessária no segundo grau de jurisdição:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE ATIVIDADE COMUM. CONVERSÃO EM ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. 1. Recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, no RESP nº 1.310.034-PR, representativo de controvérsia, consagrou que após a Lei nº 9.032/95 somente se admite aposentadoria especial para quem exerceu todo o tempo de serviço em condições especiais. Inviável, assim, diante dessa nova orientação jurisprudencial, a conversão do tempo de serviço comum em especial. 2. Afasta-se, nos termos da decisão do STJ, a conversão dos períodos de atividade comum em especial anteriores a 29/04/1995. 3. A 3ª Seção desta Corte tem admitido a reafirmação da DER, prevista pela Instrução Normativa nº 77/2015 do INSS e ratificada pela IN nº 85, de 18/02/2016, também em sede judicial, nas hipóteses em que o segurado implementa todas as condições para a concessão do benefício após a conclusão do processo administrativo, admitindo-se cômputo do tempo de contribuição inclusive quanto ao período posterior ao ajuizamento da ação. Precedente desta Turma. (TRF4, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5007975-25.2013.404.7003, 3ª SEÇÃO, Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, POR UNANIMIDADE, j. 06-04-2017).
Tal orientação foi sufragada pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema nº 995, realizado em 23/10/2019, ocasião em que a Primeira Seção concluiu pela possibilidade de reafirmação da DER, com o cômputo do tempo de contribuição posterior ao ajuizamento da ação até o momento do implemento dos requisitos necessários à obtenção do benefício visado, tendo como limite a data do julgamento exarado em segundo grau de jurisdição (ProAfR no REsp nº 1727063/SP Relator Ministro Mauro Campbell Marques).
A regra consubstanciada no caput do art. 435 do CPC dispõe que É lícito às partes, em qualquer tempo, juntar aos autos documentos novos, quando destinados a fazer prova de fatos ocorridos depois dos articulados ou para contrapô-los aos que foram produzidos nos autos.
Foram juntados aos autos PPPs nos eventos 11 e 12, tendo o INSS vista dos documentos e apresentado a petição do evento 15,
O autor conta com tempo de serviço/contribuição posterior à DER (08/05/15), conforme consulta ao extrato do CNIS, onde há registro do recolhimento de contribuições previdenciárias da seguinte forma:
A - 17/12/2014 a 04/11/2015: Cerâmica Gasparrini Giroletti Ltda.
B - 08/04/2016 a 05/01/2017: Cooperativa Agrária Xanxerê
C - 08/05/17 a 07/2020: Cristina Angela Colpani Eireli.
Consoante dispõe o art. 29-A da Lei nº 8.213/91, as informações constantes no CNIS sobre os vínculos e as remunerações dos segurados poderão ser utilizadas para fins de cálculo do salário de benefício, comprovação de filiação ao Regime Geral da Previdência, tempo de contribuição e relação de emprego (destaquei). E, complementa o art. 248 da Instrução Normativa nº 77/2015 do INSS, As informações constantes no CNIS serão observadas para fins do reconhecimento do direito à aposentadoria especial, nos termos do art. 19 e § 3º do art. 68, ambos do RPS.
Relativamente aos períodos acima foram juntados os formulários PPP dos eventos 11 e 12 que indicam as seguintes situações:
PERÍODO | FUNÇÃO | AGENTE NOCIVO | PROVAS/ENQUADRAMENTO |
A - 17/12/2014 a 04/11/2015: Cerâmica Gasparrini Giroletti Ltda. | operador de máquinas, na produção de tijolos e lajotas | ruído de 91 dB | EVENTO 12, PPP 2, com indicação de responsabilidade técnica. |
B - 08/04/2016 a 31/10/16: Cooperativa Agrária Xanxerê | ajudante de produção | frio de 10 graus Celsius e umidade. | evento 12, PPP 1, com indicação de responsabilidade técnica. |
C - 08/05/17 a 07/2020: Cristina Angela Colpani Eireli. | auxiliar de produção | hidrocarbonetos (estireno, tolueno, trimetil benzeno, xileno), formaldeído e ruído de 91,1 dB (A). | evento 12, PPP 3, com indicação de responsabilidade técnica. |
Enquadramento legal: Ruído: Item 1.1.6 do Decreto 53.831/64; Anexo I, do Decreto 83.080/79; item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto 2.172/97; item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto 3048/99. Umidade: item 1.1.3 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64 até 05/03/1997; a partir de então, Anexo nº 10 da NR15 e Súmula 198 do extinto TFR; Frio: item 1.1.2 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64 e do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 até 05/03/1997; a partir de então, Súmula 198 do extinto TFR; formol: Anexo nº 11 da NR nº 15 do MTB; hidrocarbonetos: código 1.2.11 do quadro anexo ao Decreto nº 53.831/64; código 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79; códigos 1.0.19 dos Anexos IV dos Decretos nºs 2.172/97 e 3.048/99 e Anexo nº 13 da NR nº 15
a) Ruído: O ruído superou o limite de tolerância noso períodos A e C (85 dB (A).
b) Umidade/frio: O labor também deve ser reconhecido como especial em virtude da exposição da parte autora, de forma habitual e permanente, aos agentes físicos umidade e frio no período B.
Relativamente ao frio e à umidade, não contemplados no elenco dos Decretos nºs 2.172/97 e 3.048/99 como agentes nocivos a ensejar a concessão de aposentadoria especial, o enquadramento da atividade dar-se-á pela verificação da especialidade no caso concreto, através de perícia técnica confirmatória da condição insalutífera, por força da Súmula nº 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos.
A documentação da empresa, no período B, aponta exposição a tais agentes.
Quanto ao agente nocivo frio, caracterizada a submissão da autora a temperaturas consideradas insalubres, por adentrar em câmaras frias. Cabe registrar que a própria NR15 - Anexo 9, do INSS, prevê a insalubridade das atividades ou operações executadas no interior de câmaras frigoríficas ou em locais que apresentem condições similares, que exponham os trabalhadores ao frio, sem a proteção adequada.
Acerca da celeuma, esta Corte pacificou a orientação de que 'a exposição a frio, com temperaturas inferiores a 12ºC, enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial (APELREEX nº 0000977-33.2011.404.9999, Relator Celso Kipper, Sexta Turma, D.E. 13/05/2011). Isso porque, 'Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida. (...) Não havendo mais a previsão do frio como agente nocivo nos Decretos 2.172/97 e 3.048/99, o reconhecimento da especialidade das atividades desempenhadas pelo autor deve ter por base a previsão da Súmula 198 do TFR' (APELREEX nº 5000856-70.2010.404.7212, Relator Juiz Federal Paulo Paim da Silva, Sexta Turma, D.E. 22/05/2014).
No que diz respeito à continuidade, a permanência, em relação ao agente físico frio, deve ser considerada em razão da constante entrada e saída do empregado da câmara fria durante a jornada de trabalho e não como a permanência do segurado na câmara frigorífica. De fato, 'considera-se habitual e permanente a exposição ao agente nocivo frio nas atividades em que o segurado trabalha entrando e saindo de câmaras frias, não sendo razoável exigir que a atividade seja desempenhada integralmente em temperaturas abaixo de 12ºC' (TRF4, APELREEX nº 2000.72.05.002294-0, Turma Suplementar, Relator p/ Acórdão Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 29/08/2008).
Aliás, sobre a habitualidade e a permanência na sujeição aos agentes agressivos, esta Corte, ao julgar os EINF nº 0010314-72.2009.404.7200 (Relator Des. Federal Celso Kipper, Terceira Seção, D.E. 07/11/2011), decidiu que Para caracterização da especialidade não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada. De fato, Os requisitos da habitualidade e da permanência devem ser entendidos como não-eventualidade e efetividade da função insalutífera, continuidade e não-interrupção da exposição ao agente nocivo. A intermitência refere-se ao exercício da atividade em local insalubre de modo descontínuo, ou seja, somente em determinadas ocasiões. Se o trabalhador desempenha diuturnamente suas funções em locais insalubres, mesmo que apenas em metade de sua jornada de trabalho, tem direito ao cômputo do tempo de serviço especial, porque estava exposto ao agente agressivo de modo constante, efetivo, habitual e permanente (TRF/4, AC nº 2000.04.01.073799-6/PR, 6ª Turma, Relator Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, DJU 09/05/2001). Deve-se lembrar, ademais, que o Decreto nº 4.882/03 alterou o Decreto nº 3.048/99, o qual, para a aposentadoria especial, em seu art. 65, passou a considerar trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais, aquele cuja exposição ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, o que ocorre no caso vertente.
c) Formol - Houve exposição nociva no período C. Quanto ao agente químico, algumas considerações devem ser tecidas. Alinho-me ao entendimento de que a aplicação da NR-15 para além do campo do Direito do Trabalho, alcançando as causas previdenciárias, ocorreu a partir da Medida Provisória 1.729, publicada em 03.12.1998 e convertida na Lei 9.732, quando a redação do artigo 58, § 1º, da Lei 8.213/1991 passou a incluir a expressão "nos termos da legislação trabalhista". (A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo. § 1º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista).
É justamente a partir deste marco temporal (03/12/1998) que as disposições trabalhistas concernentes à caracterização de atividades ou operações insalubres (NR-15) - com os respectivos conceitos de "limites de tolerância", "concentração", "natureza" e "tempo de exposição ao agente" passam a influir na caracterização da natureza de uma dada atividade (se especial ou comum).
Com relação ao agente químico formol, porém, admite-se o cômputo diferenciado do tempo de serviço, independentemente da concentração do agente químico. Isso porque o Ministério do Trabalho e Emprego editou a Portaria Interministerial nº 9, de 7 de outubro de 2014, publicando a Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos, sendo que no Grupo 1 - Agentes confirmados como carcinogênicos para humanos, encontra-se listado o formaldeído (registro CAS 000050-00-0).
O Decreto nº 3.048/99 traz a seguinte disposição:
§ 4º Os agentes reconhecidamente cancerígenos para humanos, listados pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, serão avaliados em conformidade com o disposto nos § 2º e § 3º deste artigo e no caput do art. 64 e, caso sejam adotadas as medidas de controle previstas na legislação trabalhista que eliminem a nocividade, será descaracterizada a efetiva exposição.
Destarte, deve ser reconhecida a especialidade do interregno independentemente de os níveis de concentração ultrapassarem, ou não, os limites postos pela NR 15, tendo em vista que o formaldeído se trata de substância reconhecidamente cancerígena e sua avaliação é qualitativa. Em caso análogo, já decidiu esta Corte que, Uma vez verificado por meio de laudo (evento 78, LAU1) que o autor esteve exposto a agentes nocivos (formol, metanol, ácido clorídrico, ácido sulfúrico, nítrico e ácido peracético), com o potencial de causar queimaduras, câncer, irritação à pele, aos olhos (inclusive perda de visão), aos aparelhos respiratório e digestivo, afetar o sistema nervoso central e o fígado (...) restou comprovado o tempo laborado como especial para fins previdenciários. (APELREEX 5020639-34.2012.404.7000, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Juiz Federal Paulo Paim da Silva, juntado aos autos em 30/05/2014).
d) hidrocarbonetos aromáticos: Houve exposição, ainda, a hidrocarbonetos aromáticos no período C. Quanto aos agentes químicos descritos no Anexo 13 da NR 15 é suficiente a avaliação qualitativa de risco, sem que se cogite de limite de tolerância, independentemente da época da prestação do serviço, se anterior ou posterior a 02/12/1998, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial. Ao contrário do que ocorre com alguns agentes agressivos, como, v.g., o ruído, calor, frio ou eletricidade, que exigem sujeição a determinados patamares para que reste configurada a nocividade do labor, no caso dos tóxicos orgânicos e inorgânicos, a exposição habitual, rotineira, a tais fatores insalutíferos é suficiente para tornar o trabalhador vulnerável a doenças ou acidentes (APELREEX nº 2002.70.05.008838-4, Relator Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior, Quinta Turma, D.E. 10/05/2010; EINF nº 5000295-67.2010.404.7108, Relator p/ Acórdão Desembargador Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, Terceira Seção, julgado em 11.12.2014). Nos períodos apontados, a exposição ao agente nocivo caracteriza especialidade independente do nível de exposição sofrida pelo segurado, portanto.
EPI: O Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, deixou assentado que O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial (ARE nº 664.335, Tribunal Pleno, Relator Ministro Luiz Fux, DJE 12/02/2015).
Especificamente sobre o agente físico ruído, o citado precedente estabelece que, nas hipóteses de submissão a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracterizaria o tempo de serviço especial para aposentadoria. Ainda que haja informação inserta no formulário PPP, de que o empregado utilizou EPI e os efeitos nocivos da atividade foram neutralizados, em se tratando do agente físico ruído, não há falar em descaracterização da especialidade do labor. Isso porque há conclusão na medicina do trabalho de que a exposição a níveis elevados de ruído não causa danos apenas à audição, de sorte que protetores auriculares não são capazes de neutralizar os riscos à saúde do trabalhador. Os ruídos ambientais não são absorvidos apenas pelos ouvidos e suas estruturas condutivas, mas também pela estrutura óssea da cabeça, sendo que o protetor auricular reduz apenas a transmissão aérea e não a óssea, daí que a exposição, durante grande parte do tempo de serviço do segurado produz efeitos nocivos a longo prazo, como zumbidos e distúrbios do sono.
Quanto aos demais (formaldeído, hidrocarbonetos aromáticos, umidade e frio), destaque-se que o simples fornecimento do EPI pelo empregador não exclui a hipótese de exposição do trabalhador aos agentes nocivos à saúde. É preciso que, no caso concreto, estejam demonstradas a existência de controle e periodicidade do fornecimento dos equipamentos, a sua real eficácia na neutralização da insalubridade ou, ainda, que o respectivo uso era, de fato, obrigatório e continuamente fiscalizado pelo empregador. Tal interpretação, aliás, encontra respaldo no próprio regramento administrativo do INSS, conforme se infere da leitura do art. 279, § 6º, da IN nº 77/2015, mantida, neste item, pela subsequente IN nº 85/2016.
No que diz respeito à prova da eficácia dos EPIs/EPCs, a Terceira Seção desta Corte, na sessão de julgamento realizada em 22/11/2017, nos autos do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 5054341-77.2016.4.04.0000 (Tema nº 15), decidiu por estabelecer a tese jurídica de que a mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário (Relator para acórdão Des. Federal Jorge Antonio Maurique, por maioria). Restou assentada no aresto, ainda, a orientação no sentido de que a simples declaração unilateral do empregador, no Perfil Profissiográfico Previdenciário, de fornecimento de equipamentos de proteção individual, isoladamente, não tem o condão de comprovar a efetiva neutralização do agente nocivo. Deve ser propiciado ao segurado a possibilidade de discutir o afastamento da especialidade por conta do uso do EPI, como garantia do direito constitucional à participação do contraditório.
Na situação em apreço, não restou demonstrado que a nocividade tenha sido neutralizada pelo uso de EPI eficazes, tendo em vista que não restou demonstrado o cumprimento das diretrizes da NR 6:
6.6.1 Cabe ao empregador quanto ao EPI:
a) adquirir o adequado ao risco de cada atividade;
b) exigir seu uso;
c) fornecer ao trabalhador somente o aprovado pelo órgão nacional competente em matéria de segurança e saúde no trabalho;
d) orientar e treinar o trabalhador sobre o uso adequado, guarda e conservação;
e) substituir imediatamente, quando danificado ou extraviado;
f) responsabilizar-se pela higienização e manutenção periódica; e,
g) comunicar ao MTE qualquer irregularidade observada.
h) registrar o seu fornecimento ao trabalhador, podendo ser adotados livros, fichas ou sistema eletrônico. (Inserida pela Portaria SIT/DSST 107/2009).
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora nos períodos 17/12/2014 a 04/11/2015, 08/04/2016 a 31/10/16 e 08/05/17 a 07/2020, conforme a legislação aplicável à espécie. Não consta na documentação apresentada indicação de exposição nociva no período 01/11/2016 a 05/01/2017, razão pela qual será computado como tempo comum.
Na hipótese, a sentença reconheceu como especiais os seguintes períodos: 1.1.1991 a 30.11.1995; 1.2.1996 a 31.5.1999; 1.9.1999 a 20.5.2004 e 1.11.2004 a 16.12.2014, num total de 23 anos, 01 mês e 06 dias.
O autor integralizou o seguinte tempo, nos termos da sentença:
Diante disso, deve-se reconhecer como especiais os períodos de 1.1.1991 a 30.11.1995; 1.2.1996 a 31.5.1999; 1.9.1999 a 20.5.2004 e 1.11.2004 a 16.12.2014, o que representa 9 anos, 2 meses e 26 dias a mais do que considerou o INSS, mediante aplicação do fator 1,4. Somando o lapso acima ao período reconhecido na via administrativa (22 anos, 4 meses e 6 dias – fl. 107), tem-se o total de 31 anos, 7 meses e 2 dias, tempo insuficiente para a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição integral, conforme art. 53 da Lei n. 8.213/91.
A tais períodos, devem ser somados os seguintes, reconhecidos no presente acórdão
Nº | Nome / Anotações | Início | Fim | Fator | Tempo | |
1 | - | 17/12/2014 | 07/12/2015 | 1.40 Especial | 1 anos, 4 meses e 11 dias | |
2 | - | 08/04/2016 | 31/10/2016 | 1.40 Especial | 0 anos, 9 meses e 14 dias | |
3 | - | 01/11/2016 | 05/01/2017 | 1.00 | 0 anos, 2 meses e 5 dias | |
4 | - | 08/05/2017 | 20/02/2018 | 1.40 Especial | 1 anos, 1 meses e 6 dias |
Logo, é possível que se compute o tempo especial subsequente ao protocolo do pedido de concessão do benefício (DER 16/12/14), até o momento em que a parte autora implementou 35 anos de trabalho, além da carência mínima requerida, ocorrido em 20/02/2018, data em que fica reafirmada a DER, e tem ela direito à concessão da aposentadoria integral por tempo de contribuição. Destaco ainda que, na mesma data, computados os períodos especiais posteriores à DER, preenchia a parte autora os requisitos necessários à implementação da aposentadoria especial, porquanto contava com mais de 25 anos de atividade especial.
Implantação do benefício
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício mais vantajoso ao segurado, nos termos do art. 497 do CPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, a contar da publicação do presente acórdão, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Com efeito, a teor da regra inserta no art. 122 da Lei nº 8.213/91, o segurado tem direito à implantação do benefício mais vantajoso, pouco importando o decesso remuneratório ocorrido em data posterior ao implemento das condições legais, conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, no julgamento do RE nº 630.501/RS (Relatora Ministra Ellen Gracie, Plenário, DJE 26/08/2013). É que O segurado do regime geral de previdência social tem direito adquirido a benefício calculado de modo mais vantajoso, sob a vigência da mesma lei, consideradas todas as datas em que o direito poderia ter sido exercido, desde quando preenchidos os requisitos para a aposentadoria. (...) O Tribunal garantiu a possibilidade de os segurados verem seus benefícios deferidos ou revisados de modo que correspondessem à maior Renda Mensal Inicial - RMI, consideradas as diversas datas em que o direito poderia ter sido exercido, caso tivessem requerido o benefício em algum momento anterior, desde quando possível a aposentadoria proporcional. Destacou que os efeitos financeiros contariam do desligamento do emprego ou da data de entrada do requerimento, respeitadas a decadência do direito à revisão e a prescrição quanto às prestações vencidas. (Tema nº 334 do STF). Na esteira deste entendimento, restou assentado neste Regional que, Comprovado o tempo de serviço/contribuição suficiente e implementada a carência mínima, é devida a aposentadoria por tempo de contribuição integral na data do requerimento administrativo, ou, ainda, aposentadoria especial, devendo a Autarquia realizar os cálculos e implantar o benefício que resultar mais vantajoso, a contar da data do requerimento administrativo, nos termos do art. 54 c/c art. 49, II, da Lei n. 8.213/91. (TRF4, APELREEX 5003161-80.2012.404.7107, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 19/12/2014).
Idêntica orientação foi adotada administrativamente pelo INSS, sendo que, segundo o art. 688 da IN/INSS nº 77/2015, Quando, por ocasião da decisão, for identificado que estão satisfeitos os requisitos para mais de um tipo de benefício, cabe ao INSS oferecer ao segurado o direito de opção, mediante a apresentação dos demonstrativos financeiros de cada um deles.
Saliente-se, por oportuno, que, na hipótese de a parte autora estar auferindo benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.
Faculta-se, outrossim, à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Dos consectários
Sendo a DER reafirmada posterior ao ajuizamento da ação (11/07/16) há reflexos nos consectários.
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, D DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-102019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Juros moratórios
Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.
A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.
No caso dos autos, constituindo-se o direito da parte autora (20/02/2018) à concessão do benefício em momento posterior ao ajuizamento da ação (11/07/16), deve ser observado o decidido pelo STJ, no julgamento dos embargos de declaração opostos aos REsps nºs 1.727.063/SP e 1.727.064/SP (Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgados em 19/05/2020, DJe 21/05/2020), no sentido de que os juros de mora incidirão sobre o montante das parcelas vencidas e não pagas a contar do prazo de 45 dias para a implantação do benefício, em caso de descumprimento pelo INSS da obrigação que lhe foi imposta. Com efeito, quanto à mora, é sabido que a execução contra o INSS possui dois tipos de obrigações: a primeira consiste na implantação do benefício, a segunda, no pagamento de parcelas vencidas a serem liquidadas e quitadas pela via do precatório ou do RPV. No caso de o INSS não efetivar a implantação do benefício, primeira obrigação oriunda de sua condenação, no prazo razoável de até quarenta e cinco dias, surgirão, a partir daí, parcelas vencidas oriundas de sua mora. Nessa hipótese deve haver a fixação dos juros, embutidos no requisitório de pequeno valor.
Honorários Advocatícios
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do CPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Invertidos os ônus sucumbenciais e à vista do assentado pelo STJ, no julgamento dos embargos de declaração opostos aos REsps nºs 1.727.063/SP e 1.727.064/SP (Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgados em 19/05/2020, DJe 21/05/2020), os honorários advocatícios, devidos pelo INSS, devem ser fixados em 10% sobre o montante das parcelas vencidas a contar da DER reafirmada e até a data do acordão, nos termos da Súmula nº 76 do TRF/4, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).
Conclusão
- Sentença reformada para condenar o INSS a implantar em favor da parte autora o benefício mais vantajoso (aposentadoria por tempo de contribuição ou aposentadoria especial), mediante cômputo de tempo de serviço especial posterior à DER e ao ajuizamento da ação, com a reafirmação da DER para 20/08/2018, a partir de quando são devidos os valores, acrescidos de correção monetária e juros de mora, , além de honorários advocatícios, de acordo com o julgamento proferido pelo STJ, nos embargos de declaração opostos aos REsps nºs 1.727.063/SP e 1.727.064/SP (Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgados em 19/05/2020, DJe 21/05/2020)
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício mais vantajoso ao segurado na DER reafirmada.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002032761v21 e do código CRC 69016914.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
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Apelação Cível Nº 5020228-68.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: OSMAR LUIZ ALBANI
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA por tempo de contribuição e aposentadoria especial. REAFIRMAÇÃO DA DER. melhor benefício.
1. É possível a reafirmação da DER, em sede judicial, nas hipóteses em que o segurado implementa todas as condições para a concessão do benefício após a conclusão do processo administrativo, admitindo-se cômputo do tempo de contribuição, inclusive quanto ao período posterior ao ajuizamento da ação, tendo como limite a data do julgamento da apelação ou remessa necessária no segundo grau de jurisdição, desde que observado o contraditório.
2. Preenchendo a parte autora os requisitos para a obtenção de mais de um benefício, deve ser assegurada a concessão do mais vantajoso, nos termos da decisão proferida pelo STF no RE 630.501.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao apelo da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício mais vantajoso ao segurado na DER reafirmada, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de dezembro de 2020.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002032762v6 e do código CRC 0694935a.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 10/12/2020 A 17/12/2020
Apelação Cível Nº 5020228-68.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: OSMAR LUIZ ALBANI
ADVOGADO: MÔNICA DA SILVA ULIANA (OAB SC010613)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/12/2020, às 00:00, a 17/12/2020, às 16:00, na sequência 345, disponibilizada no DE de 30/11/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO AO SEGURADO NA DER REAFIRMADA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 26/12/2020 08:02:08.