D.E. Publicado em 17/04/2015 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0018580-17.2014.404.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | ANA MAESTRO BOTTENE |
ADVOGADO | : | Daniela Regina Riboli |
: | Adao Ivanor do Prado | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. EXISTÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. NÃO COMPROVADA ATIVIDADE RURAL POR TODO PERÍODO DE CARÊNCIA.
1. Atingida a idade mínima exigida e comprovado o exercício da atividade rural em regime de economia familiar pelo período exigido em lei, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal consistente, o segurado faz jus à aposentadoria rural por idade.
2. Embora presente início de prova material, os testemunhos não foram aptos a comprovar o labor rural da autora em regime de economia familiar, visto que apresentaram contradições.
3. O fato de eventualmente um dos membros do respectivo núcleo possuir renda própria não descaracteriza por si só a condição de segurado especial dos outros membros do núcleo familiar. Entretanto, no caso dos autos, não foi comprovado o labor rurícola em regime de economia familiar, visto que não foi demonstrada a indispensabilidade do trabalho rural da autora para sua subsistência e de sua família.
4. Uma vez que não restou comprovada a condição de segurada especial da autora no período equivalente à carência, a parte autora não faz jus ao benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao apelo da autora, nos termos da fundamentação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 30 de março de 2015.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7339843v7 e, se solicitado, do código CRC 25B6BC73. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0018580-17.2014.404.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | ANA MAESTRO BOTTENE |
ADVOGADO | : | Daniela Regina Riboli |
: | Adao Ivanor do Prado | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária proposta por ANA MAESTRO BOTTENE contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, postulando o reconhecimento e averbação do período de 13/06/1997 a 12/06/2013 como tempo de trabalho rural em regime de economia familiar e a concessão de aposentadoria rural por idade, desde a data do requerimento administrativo, formulado em 14/02/2013 (fl. 13).
O juízo a quo proferiu sentença, julgando improcedente o pedido, sob argumento de que as provas juntadas aos autos são insuficientes para comprovar o labor rural da autora e que a prova testemunhal não é segura quanto à atividade desenvolvida pela requerente no período que pretende ver reconhecido. Condenou a requerente ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios em favor do procurador da parte adversa, arbitrados em R$ 900,00. A exigibilidade do pagamento das despesas processuais ficou suspensa, na forma do artigo 12 da Lei nº 1.060/50 (fls. 125/127).
A autora apelou, sustentando que foi juntada prova documental aos autos contemporânea ao período informado. Afirmou que as testemunhas comprovaram o exercício de labor rural pela recorrente e que o fato de uma das testemunhas não ter confirmado seu labor rural, não exclui o depoimento das demais. Alegou que trabalha nas terras do cunhado de forma individual e seu marido a ajuda nas horas vagas o que lhe daria direito ao benefício, mesmo com o labor urbano de seu marido (fls. 129/136).
Sem as contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A APOSENTADORIA RURAL POR IDADE
A apreciação de pedido de concessão de aposentadoria por idade, no caso do trabalhador rural qualificado como segurado especial (inciso VII do artigo 11 da Lei n.º 8.213/91), deve ser feita à luz do disposto nos artigos 48, §§1º e 2º, 25, II, 26, III e 39, I, da Lei n.º 8.213/91. Assim, necessária a comprovação do implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinqüenta e cinco anos para a mulher), e do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, sendo dispensável o recolhimento de contribuições.
O artigo 143 da Lei n.º 8.213/91, tratando genericamente do trabalhador rural que passou a ser enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social (na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do Art. 11), assegurou-lhe o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de sua vigência, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência exigida. Complementando o artigo 143 na disciplina da transição de regimes, o artigo 142 da Lei n.º 8.213/91 estabeleceu que para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial deve obedecer a uma tabela que prevê prazos menores no período de 1991 a 2010.
Quanto ao ano a ser utilizado para verificação do tempo de atividade rural necessário à obtenção do benefício, nos termos da tabela prevista no artigo 142 da Lei n.º 8.213/91, como regra deverá ser aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício, sendo irrelevante, neste caso, que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5º, XXXVI, e Lei de Benefícios, art. 102, §1º).
Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima mas não tenha o tempo de atividade rural exigido pela lei, observada a tabela do artigo 142 da Lei n.º 8.213/91. Neste caso, a verificação do tempo de atividade rural necessário ao deferimento do benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, devendo ser verificado o implemento do requisito "tempo equivalente à carência" progressivamente, nos anos subseqüentes ao implemento do requisito etário, de acordo com a tabela do mencionado artigo 142 da Lei de Benefícios. Assim, se ao completar a idade no ano de 2006 o segurado precisava de 150 meses de tempo/carência e, nessa data, ainda lhe faltavam 12 meses, deve-se posicioná-lo na tabela a partir do ano em que completaria os 150 meses, ou seja, 2007. Neste ano, a carência será de 156 meses (6 meses além do período inicial), de forma que o segurado poderá implementar os requisitos em 2008.
Deve ser observado que nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-08-1994, data da publicação da Medida Provisória n.º 598, que alterou o art. 143 da Lei de Benefícios, (posteriormente convertida na Lei n.º 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei n.º 8.213/91.
A disposição contida no art. 143 da Lei n.º 8.213, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, desde que implementados os requisitos, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, mas caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STJ, REsp n.º 544.327-SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, unânime, DJ de 17-11-2003; STJ, REsp. n.º 338.435-SP, Rel. Ministro Vicente Leal, Sexta Turma, unânime, DJ de 28-10-2002; STJ, REsp n.º 225.719-SP, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, unânime, DJ de 29-05-2000).
Como regra geral, a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (art. 55, §3º, da Lei n.º 8.213/91; Recurso Especial Repetitivo n.º 1.133.863/RN, Rel. Des. convocado Celso Limongi, 3ª Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).
A relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural no período controvertido, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar, em conformidade com o teor da Súmula n.º 73 deste Tribunal Regional Federal: Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental. (DJU, Seção 2, de 02/02/2006, p. 524).
Não constituem início de prova material as declarações emitidas por sindicato de trabalhadores rurais quando, sem a devida homologação do INSS (art. 106, inc. III, da Lei nº 8.213/91), sejam extemporâneas em relação aos fatos declarados, hipótese em que equivalem a meros testemunhos reduzidos a termo. Neste sentido: EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 1.010.725/MS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 6/11/2012, DJe 19/11/2012; AgRg no REsp 1291466/MG, Rel. Ministro NEWTON TRISOTTO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SC), QUINTA TURMA, julgado em 18/11/2014, DJe 24/11/2014; AR 3.202/CE, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/4/2008, DJe 6/8/2008.
O início de prova material, de outro lado, não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados. A prova testemunhal, desde que robusta, é apta a comprovar os claros não cobertos pela prova documental (STJ, AgRg no REsp 1.217.944/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, julgado em 25/10/2011, DJe 11/11/2011).
Quanto à idade mínima para exercício de atividade laborativa, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais consolidou o entendimento no sentido de que A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários. (Súmula n.º 05, DJ 25/09/2003, p. 493). Assim, e considerando também os precedentes da Corte Superior, prevalece o entendimento de que as normas que proíbem o trabalho do menor foram criadas para protegê-lo e não para prejudicá-lo. Logo, admissível o cômputo de labor rural já a partir dos 12 anos de idade.
Nos casos dos trabalhadores rurais conhecidos como boias-frias, diaristas ou volantes especificamente, considerando a informalidade com que é exercida a profissão no meio rural, que dificulta a comprovação documental da atividade, o entendimento pacífico desta Corte é no sentido de que a exigência de início de prova material deve ser abrandada.
Em recente julgado, o Superior Tribunal de Justiça, em regime de recurso especial repetitivo, assentou definitivamente que a prova exclusivamente testemunhal é insuficiente para comprovação da atividade laborativa do trabalhador rural, inclusive para os trabalhadores do tipo boia-fria:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
(Superior Tribunal de Justiça. REsp 1321493/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012)
Evidentemente que a qualidade da prova material exigida, neste caso, é ainda menor, mas não se pode dispensá-la.
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do art. 11, VII, da Lei n.º 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural. Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei n.º 1166, de 15/04/71.
Início de prova material em nome de ente familiar, que exerce atividade urbana, não impede que reste configurada a condição de trabalhador rural em regime de economia familiar do requerente. Nesse sentido é a decisão do STJ no RESP n.º 1.304.479, que assentou: a legislação previdenciária estabeleceu a possibilidade de um dos membros do grupo familiar exercer atividade estranha ao regime de subsistência, sem afetar a natureza do trabalho dos demais integrantes.
A propósito, com o advento da Lei n.º 11.718/08, que alterou diversos dispositivos da Lei n.º 8.213/91, isso ficou mais claro, haja vista o que estabelecem o art. 11, §§9º e 10º, I, "a", da Lei n.º 8.213/91. A Instrução Normativa INSS/PRES 45, 06/08/10, em seu art. 7º, §5º, é clara:
Art. 7º É segurado na categoria de segurado especial, conforme o inciso VII do art. 9º do RPS, a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
I - produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
a) agropecuária em área contínua ou não de até quatro módulos fiscais, observado o disposto no § 17 deste artigo; e
b) de seringueiro ou extrativista vegetal na coleta e extração, de modo sustentável, de recursos naturais renováveis, e faça dessas atividades o principal meio de vida;
II - pescador artesanal ou a este assemelhado, que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida, observado o disposto no inciso IX do § 1º deste artigo; e
III - cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de dezesseis anos de idade ou a este equiparado do segurado de que tratam os incisos I e II deste artigo que, comprovadamente, tenham participação ativa nas atividades rurais do grupo familiar.
...§ 5º Não é segurado especial o membro de grupo familiar (somente ele) que possuir outra fonte de rendimento, exceto se decorrente de:
I ..."
O trabalhador rural que atua como boia-fria, diarista ou volante, deve ser equiparado, para os fins da aposentadoria rural por idade, ao segurado especial, aplicando-se-lhe, em consequência, o disposto no art. 39, I, da Lei 8.213/91, sem as limitações temporais previstas no art. 143 da mesma lei. Com efeito, não há o que justifique tratamento diferenciado, especialmente se considerada a maior vulnerabilidade social a que está sujeito o trabalhador rural sem vínculo empregatício e desprovido dos meios para, por conta própria, retirar seu sustento e de sua família do trabalho na terra.
Registro, que, em se tratando de aposentadoria por idade rural do segurado especial, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei n.º 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições. Quanto à Carteira de Identificação e Contribuição, prevista no art. 106 da Lei n.º 8.213/91 como necessária à comprovação do exercício de atividade rural a partir de 16/04/94, trata-se de documento voltado principalmente à esfera administrativa, sendo instrumento que visa a facilitar futura concessão de benefício ou reconhecimento de tempo de serviço e cuja expedição, via de regra, dá-se após a comprovação junto à Seguradora das alegadas atividades agrícolas. Uma vez expedida, é instrumento hábil, por si só, àquela comprovação. Todavia, a inexistência do referido documento não obsta a demonstrar sua condição de segurado especial por outros meios, mormente no âmbito judicial.
DO CASO CONCRETO
No caso em exame, para fazer prova do exercício de atividade rural, foram acostados aos autos os seguintes documentos:
a) notas fiscais de produtor rural em nome de Dejaniro Bottene, cunhado da autora, e Olga Pertussatte Bottene, datadas de 1998, 1999, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004 (fls. 37/47);
b) notas fiscais de produtor rural em nome da autora, datadas de 2006, 2008, 2009, 2010, 2011, 2013 (fls. 48, 51/57, 59/60);
c) contribuição confederativa- comprovantes de atividade de trabalhador rural em nome da autora, datados de 2006, 2007 e 2009 (fls. 61);
As notas fiscais em nome de Dejaniro Bottene e Olga Pertussatte Bottene não podem ser utilizadas para fins de comprovação do labor rural da autora, visto que é inverossímil que possuindo casa na cidade e sendo seu marido servidor público do município de Seberi, fatos declarados pela requerente em sua entrevista rural (fl. 79/80), a autora residisse com o irmão de seu marido.
Os demais documentos juntados aos autos podem ser utilizados como início razoável de prova material.
Contudo, observa-se a primeira contradição entre as alegações da autora e os documentos juntados aos autos. Na entrevista rural (fls. 79/80) a demandante afirma "que não vende a produção uma vez que é pouca e que planta apenas para o gasto", mas as notas fiscais apontam comercialização de grande quantidade de produtos agrícolas. Constam dos autos notas referentes à venda de 3.536 kg de soja em 2008 (fl.51), 3.247 kg de soja em 2009 (fl. 53), 10.855 kg de milho em 2010 (fl. 54), 5.754 kg de milho em 2011 (fl. 56) e 2.699 kg de trigo em 2012 (fl. 57). Esse fato demonstra a possibilidade das notas emitidas em nome da requerente não serem referentes a seu labor rural.
Ademais, na audiência de instrução e julgamento, realizada em 29/08/2013, apareceram mais contradições entre as alegações da requerente e os depoimentos tomados. Foram ouvidas as testemunhas Leonardo Tomczak, Gabriel Tomczak, e Adolfo Outeiro (fls. 99/101). A prova testemunhal, não foi apta a comprovar o labor rural da autora.
As testemunhas afirmaram que após o casamento da autora, o esposo comprou uma casa no município de Seberi, visto que ele já era funcionário da Prefeitura. Relataram também, que por aproximadamente dois anos a autora teve uma lancheria em seu nome. Duas testemunhas, Leonardo Romczak e Adolfo Monteiro, disseram que após fechar a lancheria, a requerente foi morar no interior na propriedade do cunhado, local onde exerceria labor rural. Entretanto, a testemunha Gabriel Tomczak disse que a autora "vai nas terras de Dezaniro mais para desestressar e aproveita ir ver a sobrinha que mora na comunidade de Lageado Poncio"(fl. 100).
Outra contradição dos depoimentos refere-se aos produtos produzidos pela autora. A testemunha Adolfo Outeiro disse que a requerente plantava miudezas nas terras do cunhado, fato que não condiz com o volume de produção verificado nas notas fiscais trazidas aos autos.
A testemunha Leonardo Tomczak também apresentou uma contradição em seu depoimento. Disse que "as principais culturas produzidas são a mandioca e batata e coisas para consumo" (fl. 99) fato que também não condiz com as notas fiscais dos autos, visto que a quantidade produzida não pressupõe consumo e tampouco foram juntadas notas fiscais em nome da autora referentes produção de batata ou mandioca.
Quanto ao fato da autora ter aberto uma lancheria em seu nome, a qual, conforme documentos juntados aos autos (fls. 62/63) permaneceu em atividade nos anos de 1996 e 1997, este fato por si só não impediria a concessão do benefício, visto que conforme o art. 143 da Lei n° 8.213/91 e jurisprudência do STJ, o exercício da atividade rural pode ser descontínuo e o trabalho urbano intercalado ou concomitante ao trabalho campesino, não retira a condição de segurado especial. Contudo, diante das contradições apontadas entre as alegações da autora e a prova documental, assim como entre os depoimentos colhidos na justificação administrativa, não há como reconhecer períodos de labor rural nem em regime de economia familiar, nem individualmente.
Quanto ao fato do marido da autora ter exercido labor urbano, de fato, por si só não descaracterizaria a condição de segurada especial da demandante. Como visto, comprovado o desempenho de atividade rural, o fato de eventualmente um dos membros do respectivo núcleo possuir renda própria não afeta a situação dos demais.
No entanto, a autora não comprovou que exercesse labor rural de forma indispensável para a subsistência do grupo familiar, visto que foi referido pela testemunha Gabriel Tomczak que o labor rural era exercido mais a título de lazer.
Nesse sentido bem assentou o juízo a quo ao prolatar a sentença, na parte que a seguir reproduzo:
Na hipótese, as provas juntadas como início de prova material, são insuficientes para emprestarem verossimilhança as alegações da autora acerca da atividade rural exercida.
Note-se, que vieram aos autos documentos em nome da autora, somente a partir do ano de 2006. Sequer há nos autos documentos em nome do esposo.
Some-se, ainda, que ainda quando ouvida na esfera administrativa confirmou que o esposo sempre trabalhou na Prefeitura Municipal de Seberi, já estando aposentado desde o ano de 2012.
Nesse ponto, causa estranheza o mencionado na inicial de que exercia atividade na agricultura, em regime de economia familiar, juntamente com o esposo.
Salve melhor juízo, as alegações de que exerceu as atividades rural juntamente com o cunhado, não ultrapassam o campo da retórica. Ademais o documento de fl. 72 demonstra que está aposentado desde 2001.
De outra parte, o documento de fl. 62 comprova que teve empresa registrada até o ano de 1997, com inclusive recolhimentos na qualidade de contribuinte individual, não havendo nada que apresente credibilidade de que era para o trabalho dos filhos.
Por outro lado, a testemunha Gabriel Tomczak (fl.100), referiu que o esposo da autora trabalha atualmente como motorista, diverso do mencionado pela autora em seu depoimento na esfera administrativa.
Além disso, registre-se, que nem mesmo a prova testemunhal é segura quanto a atividade desenvolvida pela autora durante o período que pretende ver reconhecido.
Observa-se, que mesmo que afirmem que a autora exerceu a atividade rural, os depoimentos são imprecisos quanto aos períodos.
Assim, embora a autora tenha atingido a idade mínima necessária à concessão do benefício pleiteado em 2011 não comprovou a atividade rural, em regime de economia familiar, ou como trabalhadora rural individual, ou como boia-fria, pelo período de carência exigido, e nem mesmo que tenha retornado ao desempenho de atividade rural em período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, que se mostre significativo, ou seja, de no mínimo 1/3 do total da carência necessária.
CONCLUSÃO
A sentença resta mantida integralmente.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo da autora, nos termos da fundamentação.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7339842v5 e, se solicitado, do código CRC 9ADF2256. | |
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Signatário (a): | Taís Schilling Ferraz |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 30/03/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0018580-17.2014.404.9999/RS
ORIGEM: RS 00013942120138210133
RELATOR | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dr. Fábio Bento Alves |
APELANTE | : | ANA MAESTRO BOTTENE |
ADVOGADO | : | Daniela Regina Riboli |
: | Adao Ivanor do Prado | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 30/03/2015, na seqüência 443, disponibilizada no DE de 17/03/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO DA AUTORA, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
VOTANTE(S) | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON | |
: | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
Lídice Peña Thomaz
Diretora de Secretaria
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Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
Data e Hora: | 31/03/2015 13:02 |