Agravo de Instrumento Nº 5050020-91.2019.4.04.0000/PR
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
AGRAVANTE: SILVIO EDUARDO BOMBARDI
ADVOGADO: TIAGO VIEIRA SILVA (DPU)
AGRAVANTE: MARIA JOSE DE MOURA
ADVOGADO: TIAGO VIEIRA SILVA (DPU)
AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
AGRAVADO: CAIXA SEGURADORA S/A
AGRAVADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão (evento 444), em cumprimento de sentença, que indeferiu parcialmente o pedido dos Executados para que os valores bloqueados via BACENJUD fossem liberados.
Em breve síntese, alegam os Agravantes que os valores bloqueados são inferiores a 40 salários-mínimos e, por isso, são impenhoráveis.
Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos conclusos.
É o relatório.
VOTO
Manifestou-se o juízo a quo no seguinte sentido:
"Defiro o pedido de desbloqueio da conta 0118271-4 de titularidade de Daniel Leite Filho junto ao Banco Bradesco (R$1.228,48 ev. 424 EXTR_BANC2), por tratar-se de conta para recebimento de benefício previdenciário.
Da mesma forma, defiro o pedido de desbloqueio da conta corrente 023.00001617-7 de titularidade de Maria José de Moura junto à Caixa Econômica Federal(ev. 427 CARTA3), pelo mesmo motivo supra - conta para recebimento de benefício previdenciário.
Intime-se a Caixa Seguradora.
Efetive-se o desbloqueio, independentemente de preclusão. Verificada impossibilidade de cumprimento pelo sistema Bacenjud, expeça-se ofício para integral cumprimento.
Indefiro, por ora, o pedido de desbloqueio em relação às demais contas informadas pelos executados, considerando a existência de inquérito policial para apuração de possível fraude em cessões de crédito securitário (ev.39 PET294 e OFICIO_C296), a saber :
- 013/00096853-7 (conta poupança CEF) de titularidade de Maria José Moura (ev. 427 EXTR_BANC2);
- 10.285-7 (conta corrente para negociação de dívida Bradesco) de titularidade de Maria José Moura (ev. 427 EXTR_BANC2);
- 1679/27344-9 (conta poupança) da titularidade de Silvio Eduardo Bombardi (ev. 442 EXTR_BANC2).
Nesse sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. BACENJUD. BLOQUEIO. SALÁRIO. IMPENHORABILIDADE. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, devem ser desbloqueados os valores atingidos via sistema Bacenjud que comprovadamente decorrem da última remuneração percebida pelo executado, já que impenhoráveis nos termos do inciso IV do art. 833 do Código de Processo Civil, devendo ser mantido o bloqueio sobre a sobras.
ATIVOS FINANCEIROS. BACENJUD. BLOQUEIO. 40 SALÁRIOS MÍNIMOS. IMPENHORABILIDADE. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é impenhorável a quantia de até quarenta salários mínimos poupada, ainda que mantida em conta corrente, salvo se demonstrado abuso, má-fé ou fraude praticadas pela parte executada. (TRF4, AG 5012549-12.2017.404.0000, SEGUNDA TURMA, Rel. Des. Federal RÔMULO PIZZOLATTI, juntado aos autos em 13/07/2017)
Intimem-se".
Assiste razão aos Agravantes.
Acerca de bens impenhoráveis, prevê o Código de Processo Civil:
"Art. 833. São impenhoráveis:
I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução;
II - os móveis, os pertences e as utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou os que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida;
III - os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor;
IV - os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º ;
V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício da profissão do executado;
VI - o seguro de vida;
VII - os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas;
VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;
IX - os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social;
X - a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos;
XI - os recursos públicos do fundo partidário recebidos por partido político, nos termos da lei;
XII - os créditos oriundos de alienação de unidades imobiliárias, sob regime de incorporação imobiliária, vinculados à execução da obra.
§ 1º A impenhorabilidade não é oponível à execução de dívida relativa ao próprio bem, inclusive àquela contraída para sua aquisição.
§ 2º O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8º , e no art. 529, § 3º .
§ 3º Incluem-se na impenhorabilidade prevista no inciso V do caput os equipamentos, os implementos e as máquinas agrícolas pertencentes a pessoa física ou a empresa individual produtora rural, exceto quando tais bens tenham sido objeto de financiamento e estejam vinculados em garantia a negócio jurídico ou quando respondam por dívida de natureza alimentar, trabalhista ou previdenciária".
Assim, há presunção, decorrente de disposição legal expressa, no sentido de que os valores relativos a salários e proventos e a reserva de montante de até 40 salários mínimos em conta poupança se destinam ao provimento da subsistência pessoal e familiar, detendo caráter alimentar e sendo, por isso, impenhoráveis.
A impenhorabilidade da quantia de até quarenta salários mínimos poupada alcança não somente as aplicações em caderneta de poupança, mas também as mantidas em conta-corrente, guardadas em papel moeda ou em fundo de investimentos, ressalvado eventual abuso, má-fé ou fraude, a ser verificado de acordo com as circunstâncias do caso concreto. Nesse sentido, já decidiu a Segunda Seção do STJ no julgamento do REsp. n.º 1.230.060/PR, aos 13/08/2014, DJe 29/08/2014. Mais recentemente, no mesmo sentido: REsp. n.º 1.675.902/RS, Rel. Ministra Assusete Magalhães, 29/06/2017; REsp. n.º 1.650.495/PR, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, 16/06/2017; RMS 52238/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, T3, DJe de 08/02/2017; AgRg no REsp. 156.614-5/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, T2, DJe de 18/12/2015.
Não é outro o posicionamento que vem sendo adotado por esta Corte, a teor da Súmula 108 deste Tribunal:
"É impenhorável a quantia depositada até quarenta salários mínimos em caderneta de poupança (art. 833, X, NCPC), bem como a mantida em papel moeda, conta-corrente ou aplicada em CDB, RDB ou em fundo de investimentos, desde que seja a única reserva monetária, e ressalvado eventual abuso, má-fé, ou fraude".
Ainda, penso que deva ser empregada com temperamento a tese de que montante recebido a título de salário/proventos e não utilizado antes do recebimento de nova remuneração perde automaticamente o caráter alimentar. É que não se pode deixar de levar em conta a circunstância de que muitas pessoas, inclusive em virtude da própria natureza da atividade profissional exercida, auferirem rendimentos de valor e periodicidade incertos, tornando necessária a formação de uma reserva que lhe permita sobreviver a instabilidades por período talvez maior do que o vigente até a próxima remuneração.
Não bastasse, a necessidade de manutenção de uma reserva destinada à fazer frente às necessidades básicas pessoais e da família se mostra ainda mais compreensível diante do contexto sócio-econômico pelo qual vem atravessando o país.
A propósito:
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. CABIMENTO. EXCEPCIONALIDADE. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. DECADÊNCIA. ATO JUDICIAL. TERMO INICIAL. CIÊNCIA DO INTERESSADO. VALOR EM CONTA CORRENTE. LIMITE. 40 SALÁRIOS MÍNIMOS. POUPANÇA. DIGNIDADE. SUSTENTO. IMPENHORABILIDADE. VIOLAÇÃO DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO.
(...)
4. Exceto se comprovada a ocorrência de abuso, má-fé ou fraude e ainda que os valores constantes em conta corrente percam a natureza salarial após o recebimento do salário ou vencimento seguinte, a quantia poupada pelo devedor, no patamar de até 40 (quarenta) salários mínimos, é impenhorável.
5. Referidos valores podem estar depositados em cadernetas de poupança, contas-correntes, fundos de investimento ou até em espécie, mantendo, em qualquer desses casos, a característica da impenhorabilidade.
6. Recurso ordinário parcialmente provido. Ordem concedida em parte.
(RMS 52.238/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/12/2016, DJe 08/02/2017)
Além disso, importa registrar o fato da dívida exequenda não consistir em prestação alimentícia e, portanto, não se enquadrar na hipótese excepcional prevista pelo § 2º, do art. 833, do CPC.
Assim, em se tratando de montante inferior a 40 salários mínimos, a impenhorabilidade é garantia que decorre da lei, não restando evidenciado, até o momento, motivo que justificasse o seu afastamento no caso concreto.
Por fim, a simples existência de inquérito policial não autoriza a flexibilização das regras de impenhorabilidade do art. 833 do CPC.
Ante o exposto, voto por dar provimento ao agravo de instrumento.
Documento eletrônico assinado por CARLA EVELISE JUSTINO HENDGES, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002073122v8 e do código CRC 1f9674df.Informações adicionais da assinatura:
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Agravo de Instrumento Nº 5050020-91.2019.4.04.0000/PR
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
AGRAVANTE: SILVIO EDUARDO BOMBARDI
ADVOGADO: TIAGO VIEIRA SILVA (DPU)
AGRAVANTE: MARIA JOSE DE MOURA
ADVOGADO: TIAGO VIEIRA SILVA (DPU)
AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
AGRAVADO: CAIXA SEGURADORA S/A
AGRAVADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF
EMENTA
DIREITO BANCÁRIO. PROCESSO CIVIL. cumprimento de sentença. PENHORA. BACENJUD. RESERVAS INFERIORES A 40 SALÁRIOS. IMPENHORABILIDADE.
1) Há presunção, decorrente de disposição legal expressa, no sentido de que os valores relativos a salários e proventos e a reserva de montante de até 40 salários mínimos em conta poupança se destinam ao provimento da subsistência pessoal e familiar, detendo caráter alimentar e sendo, por isso, impenhoráveis.
2) A impenhorabilidade da quantia de até quarenta salários mínimos poupada alcança não somente as aplicações em caderneta de poupança, mas, também, as mantidas em conta-corrente, guardadas em papel moeda ou em fundo de investimentos, ressalvado eventual abuso, má-fé ou fraude.
3) A súmula 108 deste TRF deve ser interpretada teleologicamente, a fim de que se considere que a segunda reserva surge quando os valores depositados em uma ou mais contas ultrapasse 40 salários.
4) A simples existência de inquérito policial não autoriza a flexibilização das regras de impenhorabilidade do art. 833 do CPC.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de outubro de 2020.
Documento eletrônico assinado por CARLA EVELISE JUSTINO HENDGES, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002073123v3 e do código CRC 0fa70730.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 09/10/2020 A 20/10/2020
Agravo de Instrumento Nº 5050020-91.2019.4.04.0000/PR
RELATORA: Juíza Federal CARLA EVELISE JUSTINO HENDGES
PRESIDENTE: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS
AGRAVANTE: SILVIO EDUARDO BOMBARDI
ADVOGADO: TIAGO VIEIRA SILVA (DPU)
AGRAVANTE: MARIA JOSE DE MOURA
ADVOGADO: TIAGO VIEIRA SILVA (DPU)
AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
AGRAVADO: CAIXA SEGURADORA S/A
AGRAVADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 09/10/2020, às 00:00, a 20/10/2020, às 14:00, na sequência 619, disponibilizada no DE de 30/09/2020.
Certifico que a 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal CARLA EVELISE JUSTINO HENDGES
Votante: Juíza Federal CARLA EVELISE JUSTINO HENDGES
Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
MARILIA FERREIRA LEUSIN
Secretária
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