Experimente agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESSUPOSTOS. CAMPANHA DE VACINAÇÃO. INFLUENZA (h1n1). REAÇÃO ADVERSA. SÍNDROME DE...

Data da publicação: 07/07/2020, 05:42:31

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESSUPOSTOS. CAMPANHA DE VACINAÇÃO. INFLUENZA (h1n1). REAÇÃO ADVERSA. SÍNDROME DE ADEM. NEXO CAUSAL NÃO COMPROVADO. 1. Seguindo a linha de sua antecessora, a atual Constituição Federal estabeleceu como baliza principiológica a responsabilidade objetiva do Estado, adotando a teoria do risco administrativo. Consequência da opção do constituinte é que, de regra, os pressupostos da responsabilidade civil do Estado são três: a) uma ação ou omissão humana; b) um dano injusto ou antijurídico sofrido por terceiro; c) o nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano experimentado por terceiro. 2. Em se tratando de comportamento omissivo, a jurisprudência vinha entendendo que a responsabilidade do Estado deveria ter enfoque diferenciado quando o dano fosse diretamente atribuído a agente público (responsabilidade objetiva) ou a terceiro ou mesmo decorrente de evento natural (responsabilidade subjetiva). Contudo, o tema foi objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal em regime de recurso repetitivo no Recurso Extraordinário nº 841.526, definindo-se que "a responsabilidade civil do Estado por omissão também está fundamentada no artigo 37, §6º, da Constituição Federal, ou seja, configurado o nexo de causalidade entre o dano sofrido pelo particular e a omissão do Poder Público em impedir a sua ocorrência - quando tinha a obrigação legal específica de fazê-lo - surge a obrigação de indenizar, independentemente de prova da culpa na conduta administrativa (...)". 3. Não comprovado que a doença alegada pela parte autora decorreu da vacinação contra o vírus influenza (H1N1), afasta-se o nexo causal entre a administração da vacina e o surgimento da patologia. (TRF4, AC 5004114-35.2017.4.04.7118, TERCEIRA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 20/05/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5004114-35.2017.4.04.7118/RS

RELATORA: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

APELANTE: DIRCE INES SCHMIDT (AUTOR)

ADVOGADO: BRUNO DORNELLES DOS SANTOS (OAB RS072853)

APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de ação ajuizada por Dirce Inês Schmidt em face da União, na qual a autora requereu a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais e materiais ao argumento de que, em 13-5-2017, recebeu a vacina contra o vírus influenza (H1N1) e, após realizá-la, passou a sentir fortes náuseas e dores de cabeça, sendo internada e diagnosticada com síndrome de ADEM. Disse que desenvolveu a síndrome por causa da vacina e que nunca lhe informaram dos riscos concernentes à vacinação. Alegou que seu sistema neurológico foi afetado, perdendo os movimentos corporais e sendo-lhe ceifada a possibilidade de exercer qualquer atividade laborativa. Alegou que atualmente recebe auxílio-doença e que seu companheiro não pode buscar trabalho, pois tem de prestar-lhe cuidados permanentes. Ao final, disse que as sequelas físicas e emocionais decorrentes da vacina serão para toda a sua vida, razão pela qual merece ser indenizada pelos danos morais (no valor de 500 salários-mínimos) e materiais (na forma de pensionamento vitalício) sofridos.

Processado o feito, sobreveio sentença que julgou improcedentes os pedidos e condenou a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários periciais e advocatícios, estes últimos fixados em 10% do valor da causa. A exigibilidade das verbas de sucumbência foi suspensa em razão da gratuidade de justiça.

Irresignada, a autora apelou. Em suas razões recursais, recapitulou os fatos que deram ensejo à propositura da demanda e afirmou que a sentença merece reforma porque juntou aos autos atestados médicos que comprovam que desenvolveu a síndrome de Adem logo depois da vacinação, sendo que tal síndrome consta descrito na bula da vacina. Nesse sentido, destacou que a proximidade entre a data da vacinação e a da internação hospitalar é indiciária de que a síndrome decorreu de reação pós-vacinal, destacando que "Por mais que o médico radiologista que efetuou os exames tenha diagnosticado esclerose múltipla", ele não é especialista na área, e outro profissional da medicina, especialista em doenças do sistema nervoso, atestou a síndrome de ADEM. Asseverou que se de um lado a perícia médica concluiu que não há certeza absoluta de que a autora sofre de tal síndrome por reação pós-vacinal, por outro lado

(...) analisando o caso em concreto, junto com toda a prova produzida nos autos, somado a realidade dos fatos de que a parte autora foi fazer a vacina e em menos de 2 meses já estava vegetando em uma cama, e como o diagnóstico de médicos especialistas que inclusiva já trataram casos de ADEM, resta límpido a doença que acomete a parte autora e ainda sua origem pós vacinal.

Teceu considerações sobre artigos científicos e, na sequência, salientou que a perícia foi feita dois anos após a vacinação, ao passo que o médico especialista Nério Dutra Azambuja Júnior, que acompanhou a apelante, afirmou "com toda a certeza do mundo" que o caso se trata de síndrome de ADEM e que toda a bibliografia científica converge nesse sentido. De resto, mencionou que o próprio julgador admitiu a possibilidade de que há entre 50% e 60% de chances de que o doença da autora se trate de reação pós-vacinal. Ao final, colacionou precedentes e requereu o provimento da apelação a fim de que a sentença seja reformada, com o julgamento de procedência do pedido e a inversão dos ônus da sucumbência.

Com contrarrazões, foi feita a remessa eletrônica dos autos a este Tribunal.

É o relatório.

VOTO

Responsabilidade Civil do Estado

A responsabilidade civil do Estado está prevista no § 6º do artigo 37 da Constituição Federal:

Art. 37. (...)

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Seguindo a linha de sua antecessora, a atual Constituição Federal estabeleceu como baliza principiológica a responsabilidade objetiva do Estado, adotando a teoria do risco administrativo. Consequência da opção do constituinte é que, de regra, os pressupostos da responsabilidade civil do Estado são três: a) uma ação ou omissão humana; b) um dano injusto ou antijurídico sofrido por terceiro; c) o nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano experimentado por terceiro.

Em se tratando de comportamento omissivo, a jurisprudência vinha entendendo que a responsabilidade do Estado deveria ter enfoque diferenciado quando o dano fosse diretamente atribuído a agente público (responsabilidade objetiva) ou a terceiro ou mesmo decorrente de evento natural (responsabilidade subjetiva).

Contudo, o tema foi objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal em regime de recurso repetitivo no Recurso Extraordinário nº 841.526, definindo-se que "a responsabilidade civil do Estado por omissão também está fundamentada no artigo 37, §6º, da Constituição Federal, ou seja, configurado o nexo de causalidade entre o dano sofrido pelo particular e a omissão do Poder Público em impedir a sua ocorrência - quando tinha a obrigação legal específica de fazê-lo - surge a obrigação de indenizar, independentemente de prova da culpa na conduta administrativa (...)". O julgamento foi assim ementado:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR MORTE DE DETENTO. ARTIGOS 5º, XLIX, E 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

1. A responsabilidade civil estatal, segundo a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, § 6º, subsume-se à teoria do risco administrativo, tanto para as condutas estatais comissivas quanto paras as omissivas, posto rejeitada a teoria do risco integral.

2. A omissão do Estado reclama nexo de causalidade em relação ao dano sofrido pela vítima nos casos em que o Poder Público ostenta o dever legal e a efetiva possibilidade de agir para impedir o resultado danoso.

3. É dever do Estado e direito subjetivo do preso que a execução da pena se dê de forma humanizada, garantindo-se os direitos fundamentais do detento, e o de ter preservada a sua incolumidade física e moral (artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal).

4. O dever constitucional de proteção ao detento somente se considera violado quando possível a atuação estatal no sentido de garantir os seus direitos fundamentais, pressuposto inafastável para a configuração da responsabilidade civil objetiva estatal, na forma do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal.

5. Ad impossibilia nemo tenetur, por isso que nos casos em que não é possível ao Estado agir para evitar a morte do detento (que ocorreria mesmo que o preso estivesse em liberdade), rompe-se o nexo de causalidade, afastando-se a responsabilidade do Poder Público, sob pena de adotar-se contra legem e a opinio doctorum a teoria do risco integral, ao arrepio do texto constitucional.

6. A morte do detento pode ocorrer por várias causas, como, v. g. , homicídio, suicídio, acidente ou morte natural, sendo que nem sempre será possível ao Estado evitá-la, por mais que adote as precauções exigíveis.

7. A responsabilidade civil estatal resta conjurada nas hipóteses em que o Poder Público comprova causa impeditiva da sua atuação protetiva do detento, rompendo o nexo de causalidade da sua omissão com o resultado danoso.

8. Repercussão geral constitucional que assenta a tese de que: em caso de inobservância do seu dever específico de proteção previsto no artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal, o Estado é responsável pela morte do detento.

9. In casu, o tribunal a quo assentou que inocorreu a comprovação do suicídio do detento, nem outra causa capaz de romper o nexo de causalidade da sua omissão com o óbito ocorrido, restando escorreita a decisão impositiva de responsabilidade civil estatal.

10. Recurso extraordinário DESPROVIDO. (STF, RE 841.526/RS, Plenário, rel. Ministro Luiz Fux, DJe 1º-8-2016)

A União, por intermédio do Ministério da Saúde, atua na coordenação do Programa Nacional de Imunizações. Ao estabelecer a obrigatoriedade de vacinação, a União assume a responsabilidade pelos danos decorrentes de previsíveis reações adversas, ainda que em ínfima parcela dos vacinados, afastada a configuração de caso fortuito.

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. PRESCRIÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL DA UNIÃO. POLÍTICA DE SAÚDE DE IMUNIZAÇÃO. REAÇÃO ADVERSA A VACINA. ENCEFALOPATIA CRÔNICA. DANOS MORAIS. PENSIONAMENTO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. 1 e 2. Omissis. 3. A União, por intermédio do Ministério da Saúde, atua na coordenação do Programa Nacional de Imunizações. Com efeito, ao estabelecer a obrigatoriedade de vacinação, assume a responsabilidade pelos danos decorrentes de previsíveis reações adversas, ainda que em ínfima parcela dos vacinados, afastada a configuração de caso fortuito. 4. Evidenciada a existência de nexo causal entre o fato lesivo e os danos ocasionados ao autor, é inafastável o seu direito à reparação por dano moral, porquanto inquestionável que os transtornos, a dor e o abalo psíquico suportados transcendem o que é tolerável na vida cotidiana. Embora a vacinação constitua medida de saúde pública para promover o bem da coletividade, erradicando doenças graves que causam grande mortalidade, a Administração não pode se furtar a oferecer amparo àqueles que, por exceção, vierem a desenvolver efeitos colaterais da vacina ministrada. 5. Em tendo sido comprovado que o autor possui deformidade aparente e permanente (sequelas definitivas, sem possibilidade de reversão), é cabível a cumulação de indenização por danos estético e moral. 6. Em virtude de incapacidade permanente para o trabalho (invalidez), o autor dependerá de assistência de terceiro, durante toda a sua vida, motivo pelo qual faz jus à pensão mensal para custear as despesas com sua manutenção e tratamento. (TRF4 5006057-72.2016.4.04.7102, 4ª Turma, rel.ª Des.ª Federal Vivian Josete Pantaleão Caminha, juntado aos autos em 17-12-2019)

Caso Concreto

A apelante recebeu a vacina contra o vírus influenza (H1N1) em 13-5-2017, durante campanha de vacinação (evento 27, OUT3). Sua tese de que a síndrome de ADEM decorreu de ração pós-vacinal sustenta-se em atestados médicos e na oitiva de testemunhas.

Laides Ross, testemunha não compromissada, disse que, alguns dias após a recorrente tomar a vacina, ela começou a apresentar os sintomas. Questionada pelo juiz de primeiro grau, a testemunha confirmou que a demandante teve melhoras e pioras contínuas (evento 97, VIDEO3).

Valdir Egon Schimidt, esposo da recorrente e ouvido como informante, disse que, alguns dias depois da vacina, a apelante teve uma reação muito forte e que o pico da doença foi quando ela esteve internada. Valdir confirmou que Dirce havia feito a vacina em anos anteriores (evento 97, VIDEO4).

O médico Nério Dutra Azambuja Júnior, que acompanhou a demandante, afirmou que o caso da apelante se trata da síndrome de ADEM. Alegou que o exame de ressonância revela tal síndrome, e não esclerose múltipla. Referiu que a síndrome de ADEM dá mais confusão mental, quadro de agitação, alteração da marcha de forma mais aguda, o que teria ocorrido com a paciente (evento 97, VIDEO2).

Para solucionar a controvérsia, o juízo singular determinou a realização de perícia. O exame técnico, ao contrário do sustentado pela parte autora, não confirmou que o caso se trata da síndrome de ADEM. Observe-se trechos do laudo pericial, com os destaques feitos pelo julgador (evento 58, LAUDO1):

QUESITOS DA PARTE AUTORA

...

3) Há possibilidade de a síndrome de Adem da parte autora ter sido adquirida pela autora em decorrência de vacinação?

Tendo em vista que não há nenhum marcador sorológico específico que faça diagnóstico da doença e, devido às semelhanças radiológicas e clínicas entre doença de ADEM e esclerose múltipla, não é possível afirmar com absoluta certeza de que se trata de um caso de síndrome de ADEM pós vacinal. (grifei)

...

QUESITOS DO JUÍZO

a) A autora Dirce Ines Schmidt é portadora da Síndrome de ADEM? Se positivo, indicar os sinais e/ou sintomas apresentados pela autora que permitem tal conclusão.

Com base nos sinais e sintomas, exame neurológico, exame de imagem e relação temporal com realização de vacina da gripe, inicialmente o diagnóstico de ADEM foi realizado corretamente baseado na literatura médico-científica. No entanto, é necessário controle de exame de imagem e sintomas clínicos para posteriormente diferenciar tal patologia de esclerose múltipla, pois não há nenhum biomarcador laboratorial específico para o diagnóstico de ADEM. Fatores que devem ser avaliados durante o seguimento são o possível desaparecimento de lesões previamente documentadas e ausência de novas lesões assintomáticas na Ressonância, já que ambas apontam para o diagnóstico de ADEM. No entanto, nenhum dos fatores acima é patognomônico ou exclusivo de ADEM ou Esclerose múltipla, sendo o adequado acompanhamento do caso com avaliação clínica e exame de imagem crucial para definir o diagnóstico.

Outro trecho de relevância destacado pela sentença é a informação complementar prestada pela perita após a realização, pela autora, de nova ressonância magnética. Assim se manifestou a experta (evento 112):

A história clínica inicial da autora sugere diagnóstico de ADEM (ENCEFALOMIELITE AGUDA DISSEMINADA). O novo exame de imagem do encéfalo não evidenciou novas lesões cerebrais, somente sequelares, e o laudo descrito pelo médico radiologista sugere esclerose múltipla. Conforme já descrito nas respostas da perícia médica, reafirmo, baseado na literatura médico científica: “Tendo em vista que não há nenhum marcador sorológico específico que faça diagnóstico da doença e, devido às semelhanças radiológicas e clínicas entre ADEM (encefalomielite aguda disseminada) e esclerose múltipla, não é possível afirmar com absoluta certeza de que se trata de um caso de síndrome de ADEM pós vacinal”.

Como se vê, a perícia não afirmou com absoluta certeza que os problemas de saúde apresentados pela autora decorrem de síndrome de ADEM pós-vacinal.

Ouvida em juízo, a perita esclareceu que, no caso de a paciente ainda apresentar sintomas, provavelmente não se trata de síndrome de ADEM (evento 143, VIDEO2). Essa afirmação há de se ter tomada em consideração à luz do que disseram as testemunhas Laides Ross e Valdir Egon Schimidt: ambas informaram que a apelante atualmente apresenta sintomas, alternando entre melhoras e pioras contínuas, o que reforça a conclusão da perícia de que não se trata de síndrome de ADEM, e sim de esclerose múltipla, como sugere o laudo da última ressonância magnética (evento 99, OUT2).

A manutenção do benefício previdenciário de auxílio-doença nos interregnos de 23-7-2017 a 4-9-2018 e de 5-9-2018 a 7-1-2019 é um indicativo de que não houve melhora do quadro de saúde da apelante (evento 73, INF1).

De resto, o juiz singular bem pontuou que se nem mesmo a síndrome de ADEM foi confirmada no caso, muito menos que ela decorreu da vacinação. Nesse particular convém transcrever a sentença recorrida:

Mesmo que se confirmasse a existência da síndrome de ADEM, no caso concreto, observo que não há comprovação incontestável ou minimamente segura da ligação entre a vacina aplicada e os problemas de saúde que acometeram a autora, não se podendo assegurar que a vacina contra a gripe tenha sido a causa direta e imediata das enfermidades da demandante. E, nesta parte, não há divergência entre a perita e o médico Nério Dutra Azambuja Júnior.

Gizo que os atestados citados pela parte autora às fls. 05/06 das razões finais (E147 - MEMORIAIS1) não são suficientes para comprovar a relação da vacina com os sintomas desenvolvidos pela demandante, sobretudo frente à perícia judicial e ao depoimento do próprio médico assistente (E97 - VIDEO2).

Consta da perícia médica:

(...)

3) Há possibilidade de a síndrome de Adem da parte autora ter sido adquirida pela autora em decorrência de vacinação?

Tendo em vista que não há nenhum marcador sorológico específico que faça diagnostico da doença e, devido às semelhanças radiológicas e clinicas entre doença de ADEM e esclerose múltipla, não é possível afirmar com absoluta certeza de que se trata de um caso de síndrome de ADEM pós vacinal

(e) Pode-se, com base em estudos científicos prévios e em antecedentes assim diagnosticados, afirmar que a Síndrome de ADEM está dentre os efeitos colaterais prováveis e diretos da vacina contra o vírus influenza (H1N1)? Pode tal doença ter outras origens ou causas além daquela apontada pela autora no presente processo (vacinação contra o vírus influenza –H1N1? No caso específico da autora, pode-se, com segurança e responsabilidade médico-científicas, afirmar, de pronto e peremptoriamente, que a causa da patologia da autora foi a vacinação contra o vírus influenza H1N1?Indique as fontes das respostas.

Sim, segundo diversas referências científicas ADEM é precedida por vacinação em cerca de 5-19% dos casos (Acute disseminated encephalomyelitis: current controversies in diagnosis and outcome, Diederik L. H. Koelman• Farrah J. Mateen) sendo mais comum após vacina do sarampo, caxumba , rubéola, e mais raramente associada com poliomielite , raiva, tétano , hepatite B e influenza. Inclusive o efeito adverso ADEM está relatado na bula da vacina influenza. (https://br.gsk.com/media/594398/l1110_fluarixetra_inj_gds02ipi06sh.pdf).

Também já relatado na literatura, ADEM desencadeado por processos infecciosos. No entanto,conforme descrevem alguns artigos científicos, tendo em vista a raridade da ocorrência da doença de ADEM secundária à vacinação e o risco de morte decorrente de uma infecção associada com o vírus Influenza, o benefício da vacinação supera o risco de desenvolver a doença. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=10.1097%2FEDE.0000000000000210

Tendo em vista que não há nenhum marcador sorológico específico que faça diagnostico da doença e, devido às semelhanças radiológicas e clínicas entre doença de ADEM e esclerose múltipla, não é possível afirmar com absoluta certeza de que se trata de um caso de síndrome de ADEM pós vacinal.

Outrossim, o médico que diagnosticou a demandante com ADEM, ouvido em Juízo (E97 - VIDEO2), deixou claro que não tem como confirmar que foi a vacina que causou a doença. Referida testemunha disse que a síndrome de ADEM é "uma coisa pessoal da gente", uma reação do organismo; que, além da vacina, podem causar ADEM, também, uma diarreia, um quadro viral, uma tosse; que a síndrome não tem relação com a qualidade da vacina; que, no caso especial da autora, poderá ter sido de um quadro viral que ela teve, mas também poderá ter sido da vacina; que tem pouco mais de 50 e 60% de chances de ter sido a vacina que desencadeou a doença.

(...)

Como se observa, a prova pericial não concluiu que a parte apelante sofre de síndrome de ADEN nem que esta, acaso de fato acometa a recorrente, tenha surgido como reação adversa à aplicação da vacina pela rede pública de saúde.

Uma vez que não demonstrado que a atuação estatal (disponibilização da vacina e respectiva aplicação) foi a causa suficiente ao desenvolvimento da patologia alegada pela apelante, deve ser afastado o dever de indenizar por ausência de nexo de causalidade entre o fato e o evento danoso.

No mesmo sentido:

ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE ATO DA ADMINISTRAÇÃO E PREJUÍZO NO QUADRO DE SAÚDE DA PARTE AUTORA. NÃO DEMONSTRADO. IMPOSSÍVEL AFIRMAR QUE A VACINAÇÃO RECEBIDA É CAUSA DOS SINTOMAS DE ENCEFALOMIELITE DESMIELINIZANTE AGUDA (ADEM). DANOS MORAIS E MATERIAIS. INEXISTÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR. PENSIONAMENTO. INDEVIDO. - Omissis. - Na hipótese em comento, impossível concluir existente nexo causal entre ato comissivo ou omissivo estatal e os problemas de saúde vivenciados pelo demandante, pois não há como afirmar de modo seguro que ele foi vacinado na rede pública de saúde - destacando-se o fato de que não pertencia a grupo de risco para H1N1-, tampouco que a vacinação seja a causa direta e imediata dos danos em questão, como apontado na prova pericial. - Apelação improvida. (TRF4, AC 5013025-08.2013.4.04.7205, 3ª Turma, rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, juntado aos autos em 9-12-2016)

DIREITO ADMINISTRATIVO. DANO MORAL. VACINAÇÃO. FEBRE AMARELA. NEXO CAUSAL. INEXISTÊNCIA. São três os elementos reconhecidamente essenciais na definição da responsabilidade civil - a ilegalidade, o dano e o nexo de causalidade entre um e outro. Não é possível estabelecer-se relação causal entre a vacina contra a febre amarela e a condição médica do autor, não havendo elementos mínimos que possam trazer algum grau de probabilidade sobre ser a patologia, no caso concreto, uma decorrência da vacina recebida. (TRF4, AC 5058991-76.2017.4.04.7100, 4ª Turma, rel.ª Des.ª Federal Vivian Josete Pantaleão Caminha, juntado aos autos em 20-12-2019)

Mantida a sentença de improcedência, fixa-se os honorários em grau de recurso.

Honorários Advocatícios

Tratando-se de sentença publicada já na vigência do novo Código de Processo Civil, aplicável o disposto em seu artigo 85 quanto à fixação da verba honorária.

Considerando a improcedência do pedido, as custas e os honorários ficam a cargo da parte autora, os quais vão mantidos em 10% do valor da causa, devidamente atualizado, nos termos do inciso III do § 4º do artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015.

Ainda, levando em conta o trabalho adicional do procurador na fase recursal, a verba honorária fica majorada em 2%, forte no § 11 do artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015.

Fica suspensa a exigibilidade dos valores enquanto mantida a situação de insuficiência de recursos que ensejou a concessão da gratuidade da justiça, conforme o § 3º do artigo 98 do novo Código de Processo Civil.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por VÂNIA HACK DE ALMEIDA, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001744434v25 e do código CRC c7278d1a.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Data e Hora: 20/5/2020, às 12:7:12


5004114-35.2017.4.04.7118
40001744434.V25


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:42:30.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5004114-35.2017.4.04.7118/RS

RELATORA: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

APELANTE: DIRCE INES SCHMIDT (AUTOR)

ADVOGADO: BRUNO DORNELLES DOS SANTOS (OAB RS072853)

APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

EMENTA

DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESSUPOSTOS. CAMPANHA DE VACINAÇÃO. INFLUENZA (h1n1). REAÇÃO ADVERSA. SÍNDROME DE ADEM. NEXO CAUSAL NÃO COMPROVADO.

1. Seguindo a linha de sua antecessora, a atual Constituição Federal estabeleceu como baliza principiológica a responsabilidade objetiva do Estado, adotando a teoria do risco administrativo. Consequência da opção do constituinte é que, de regra, os pressupostos da responsabilidade civil do Estado são três: a) uma ação ou omissão humana; b) um dano injusto ou antijurídico sofrido por terceiro; c) o nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano experimentado por terceiro.

2. Em se tratando de comportamento omissivo, a jurisprudência vinha entendendo que a responsabilidade do Estado deveria ter enfoque diferenciado quando o dano fosse diretamente atribuído a agente público (responsabilidade objetiva) ou a terceiro ou mesmo decorrente de evento natural (responsabilidade subjetiva). Contudo, o tema foi objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal em regime de recurso repetitivo no Recurso Extraordinário nº 841.526, definindo-se que "a responsabilidade civil do Estado por omissão também está fundamentada no artigo 37, §6º, da Constituição Federal, ou seja, configurado o nexo de causalidade entre o dano sofrido pelo particular e a omissão do Poder Público em impedir a sua ocorrência - quando tinha a obrigação legal específica de fazê-lo - surge a obrigação de indenizar, independentemente de prova da culpa na conduta administrativa (...)".

3. Não comprovado que a doença alegada pela parte autora decorreu da vacinação contra o vírus influenza (H1N1), afasta-se o nexo causal entre a administração da vacina e o surgimento da patologia.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 19 de maio de 2020.



Documento eletrônico assinado por VÂNIA HACK DE ALMEIDA, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001744435v3 e do código CRC 642dd312.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Data e Hora: 20/5/2020, às 12:7:12


5004114-35.2017.4.04.7118
40001744435 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:42:30.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 11/05/2020 A 19/05/2020

Apelação Cível Nº 5004114-35.2017.4.04.7118/RS

RELATORA: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

PRESIDENTE: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

PROCURADOR(A): JOSE OSMAR PUMES

APELANTE: DIRCE INES SCHMIDT (AUTOR)

ADVOGADO: BRUNO DORNELLES DOS SANTOS (OAB RS072853)

APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 11/05/2020, às 00:00, a 19/05/2020, às 14:00, na sequência 669, disponibilizada no DE de 29/04/2020.

Certifico que a 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 3ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

Votante: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER

Votante: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO

MÁRCIA CRISTINA ABBUD

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:42:30.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Experimente agora