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DIREITO PREVIDENCIÁRIO. DIREITO CONSTITUCIONAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SEGURADO ESPECIAL. FATO GERADOR ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO DE 88. VIGÊNCIA DA CON...

Data da publicação: 07/07/2020, 05:41:25

EMENTA: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. DIREITO CONSTITUCIONAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SEGURADO ESPECIAL. FATO GERADOR ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO DE 88. VIGÊNCIA DA CONSTITUIÇÃO DE 1967. PRINCÍPIO DA IGUALDADE. 1. O princípio da igualdade já estava presente na Constituição de 1967 para justificar o exame da constitucionalidade da legislação ordinária. Comando legal vigente à época e que trazia distinção não isonômica entre o trabalho de um casal para o qual se presume dependência econômica, valorando mais o trabalho de um em detrimento do outro. 2. Era e ainda é inconstitucional a exclusão de uma faixa de trabalhadores rurais do alcance da proteção previdenciária sem um fator diferencial de proteção social que justifique a medida. 3. Jurisprudência consolidada de que a Constituição anterior também agasalhava o princípio da igualdade, proibindo, expressamente, qualquer distinção em razão do sexo, não havendo motivo para se exigir apenas do cônjuge varão, para concessão de pensão por morte, a comprovação da condição de invalidez (Embargos Infringentes Nº 5048740-38.2013.404.7100, 3ª Seção, Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, por maioria, juntado aos autos em 08/10/2015). 4. Apelação parcialmente provida para anular a sentença de primeiro grau e determinar a reabertura da instrução para aferição da condição de segurado especial do apelante. (TRF4, AC 5002702-84.2017.4.04.7113, SEXTA TURMA, Relator para Acórdão JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 10/03/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5002702-84.2017.4.04.7113/RS

RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

APELANTE: MARIA PAGLIARINI (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

ADVOGADO: LIANDRA FRACALOSSI

ADVOGADO: Eduardo Machado Mildner

ADVOGADO: VALQUIRIA PETER BACELLAR

ADVOGADO: RENATO VON MUHLEN

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

INTERESSADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Na petição inicial a autora alegou que trabalhou na agricultura, em regime de economia familiar, junto com o marido e os filhos até 1983, quando se tornou totalmente inapta para os atos da vida civil em função de complicações neurológicas decorrentes de uma cirurgia. Bem mais recentemente (2014) houve pedido de concessão de aposentadoria por invalidez, que o INSS indeferiu, gerando esta demanda.

Tanto a prova pericial quanto a testemunhal foram expressamente indeferidas (EVENTO 34), pois não havia contestação acerca da incapacidade e do exercício da atividade. Por fim, partiu-se do pressuposto da inexistência de controvérsia sobre o fato de ela não ter sido “arrimo de família ou chefe da unidade familiar, sequer havendo alegação em contrário”. Com base nele a pretensão foi rejeitada, pois a legislação vigente à época do fato gerador permitia que o benefício fosse pago apenas ao arrimo.

A autora apelou sustentando a nulidade do ato judicial, pois “[tal] prova seria fundamental para fins de demonstrar que tanto marido e mulher poderiam ser considerados ‘chefes ou arrimos de família’, e que ambos os cônjuges pudessem desenvolver o trabalho rural sem qualquer distinção quanto à direção da vida do casal, trabalhando em igualdade de condições para o sustento da família”. Quanto à questão de fundo, as normas anteriores que previam ser o benefício devido apenas ao arrimo de família não foram recepcionadas pela Constituição, que instituiu a igualdade entre os cônjuges.

Houve contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

Há dois precedentes recentes da Turma, que se aplicam diretamente à causa e resolvem a controvérsia: 5000060-20.2017.4.04.7120 - ARTUR CÉSAR DE SOUZA e 5028652-36.2018.4.04.9999 - JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA.

Por meio primeiro foi declarado que "[a] autora não satisfez, à época da moléstia incapacitante, requisito básico para a concessão de aposentadoria por invalidez, pois não ostentava a condição de chefe ou arrimo de família, exigida pelo Decreto nº 83.080/79". Como consequência, "[para] se reconhecer a qualidade de segurado especial da Previdência é imprescindível a comprovação do exercício habitual nas lides rurais quando entrou em vigor a Lei nº 8.213/91, que deixou de considerar como segurado especial somente o chefe ou arrimo de família".

A Constituição, como qualquer outra norma, tem vigência para o futuro, salvo disposição expressa em contrário. Então, é indiferente o fato da não recepção da legislação vigente na data da sua promulgação.

O precedente remanescente trata de questão ainda mais específica (grifo):

2. A legislação vigente à época do óbito, ocorrido em 1987, era a LC 11/71 e o Decreto 83.080/79, os quais dispunham que a pensão por morte era devida aos dependentes do trabalhador rural chefe ou arrimo de família, listando como dependentes, entre outros, a esposa, o marido inválido, a companheira mantida há mais de cinco anos, os filhos menores de 18 anos ou inválidos e as filhas solteiras menores de 21 anos ou inválidas. 3. É inconstitucional, mesmo antes da Constituição de 1988, a exigência de invalidez para o dependente do sexo masculino. Precedente da 3ª Seção. Todavia, a necessidade de que o de cujus fosse chefe de família era exigida dos dois sexos, não havendo inconstitucionalidade.

Tendo em vista estas condicionantes, a sentença deve ser confirmada por seus próprios fundamentos. Está prejudicada a alegação de nulidade pelo cerceamento da produção da prova oral, pois ela diria respeito a fato irrelevante para a resolução da lide.

A apelante foi condenada no pagamento de honorários advocatícios na sentença e foi integralmente vencida na apelação. Neste caso, incide o § 11 do artigo 85 do CPC (O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento).

O percentual da condenação em honorários arbitrado na origem é aumentado em 50%, mantida a suspensão decorrente da gratuidade.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000935828v36 e do código CRC a172c6cc.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 26/9/2019, às 14:32:31


5002702-84.2017.4.04.7113
40000935828.V36


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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, Gabinete do Des. Federal João Batista Pinto Silveira - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51)3213-3191 - www.trf4.jus.br - Email: gbatista@trf4.jus.br

Apelação Cível Nº 5002702-84.2017.4.04.7113/RS

RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

APELANTE: MARIA PAGLIARINI (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

VOTO-VISTA

Cuida-se de apelação em que a parte autora alega cerceamento de defesa e requer a anulação da sentença pelos seguintes motivos:

Na fase de instrução do processo (EVENTO 32 – PET1), requereu a Recorrente a produção das provas necessárias para a comprovação dos períodos laborados na atividade na agricultura, em regime de economia familiar, através da designação de data para a realização de audiência para a oitiva de testemunhas para a ratificação dos documentos juntados aos autos. Tal prova seria fundamental para fins de demonstrar que tanto marido e mulher poderiam ser considerados “chefes ou arrimos de família”, e que ambos os cônjuges pudessem desenvolver o trabalho rural sem qualquer distinção quanto à direção da vida do casal, trabalhando em igualdade de condições para o sustento da família. Entretanto, o Juízo a quo indeferiu a realização da prova testemunhal, por entender desnecessárias (EVENTO 34). Requer, portanto, como forma de garantir a aplicação do princípio constitucional da AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO, art. 5º, LV da CF, a anulação da sentença proferida, a fim de permitir ao Recorrente produzir a prova necessária sobre a verdade alegada na inicial.

Em caso de não ser anulada a sentença, requer seja deferida aposentadoria por invalidez pois: " Além disso, considera-se ainda, a hipótese de que poderiam os dois, marido e mulher serem chefes ou arrimos de família, e que ambos os cônjuges pudessem desenvolver o trabalho rural sem qualquer distinção quanto à direção da vida do casal, e não havendo nada que afaste a presunção, é possível inferir-se que ambos, marido e mulher, trabalhavam em igualdade de condições para o sustento da família.".

Hoje resta pacificado a partir de precedente da 3ª Seção desta Corte, Embargos Infringentes nº 5048740-38.2013.404.7100 que também a Constituição de 1967 abrigava o princípio da igualdade proibindo, expressamente, qualquer distinção em razão do sexo:

EMBARGOS INFRINGENTES. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. ISONOMIA ENTRE OS CÔNJUGES. DISTINÇÃO ENTRE PENSIONISTAS CONFORME O SEXO. INVIABILIDADE. Considerando que a Constituição anterior também agasalhava o princípio da igualdade, proibindo, expressamente, qualquer distinção em razão do sexo, não há motivo para se exigir apenas do cônjuge varão, para concessão de pensão por morte, a comprovação da condição de invalidez. (TRF4, EMBARGOS INFRINGENTES Nº 5048740-38.2013.404.7100, 3ª SEÇÃO, Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, POR MAIORIA, VENCIDA A RELATORA, JUNTADO AOS AUTOS EM 08/10/2015).

Prevaleceu, naquela oportunidade voto divergente do Des. Paulo Afonso Brum Vaz que, por sua vez invocou razões do voto divergente da Turma da lavra do Des. Fed. Luiz Carlos de Castro Lugon, que pela riqueza de elementos informativos que serviram lastro, penso eu, para revisitarmos e revisarmos a tese de que apenas o chefe ou arrimo de família faria jus à proteção previdenciária antes da nova Constituição, transcrevo no ponto em que interessa à solução proposta:

Ouso divergir do entendimento esposado pelo e. Relator no caso dos autos.

A questão controvertida diz com a concessão de pensão por morte em decorrência do falecimento da esposa do autor, ocorrido em 22/09/1988. Afirma o eminente Relator que, segundo o que estatui o art. 5º, inciso I, da Constituição Federal de 1988, bem como o que estabelece o inciso V do art. 201 do mesmo Diploma, passou a entender o Supremo Tribunal Federal que, desde o advento da Constituição vigente, não haveria justificativa para a discriminação entre homens e mulheres, pois não recepcionada a parte discriminatória da legislação anterior. Como, no caso dos autos, o óbito da esposa do autor ocorreu antes do advento da Constituição de 1988, e não comprovada a condição de dependente do autor à data do falecimento (não se tratava de marido inválido), não mereceria reforma a sentença de improcedência.

Concessa venia, pretendo que outra solução seja emprestada ao caso, à luz dos princípios que norteiam o Direito Previdenciário, essencialmente o princípio da igualdade, já presente na Constituição de 1967, vigente ao tempo do óbito da esposa do autor, em seu Capítulo IV, que trata 'Dos Direitos e Garantias Individuais' (art. 150, §1º- 'Todos são iguais perante a lei, sem distinção, de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas. O preconceito de raça será punido pela lei.'). Com a Emenda Constitucional nº 1, de 1969, o princípio da igualdade permaneceu presente, no artigo 153, § 1º ('Todos são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas. Será punido pela lei o preconceito de raça'). Finalmente, com o advento da Constituição de 1988, homens e mulheres definitivamente adquirem a igualdade, conforme estabelece o artigo 5º:

'Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição.'

Observa-se que, até 1934, as Constituições somente afirmavam, de forma genérica, o princípio da igualdade de todos perante a lei, sem, contudo, citar expressamente a proibição da discriminação em função do sexo. É possível afirmar que, somente a partir da Constituição de 1967, começou a firmar-se a igualdade jurídica entre homens e mulheres, a qual consolidou-se na Carta de 1988, que igualou, definitivamente, homens e mulheres em direitos e obrigações (artigos 183, §1º; 189, parágrafo único; 201, inciso V; 226, §5º; 7º, inciso XVIII). Acerca do princípio da igualdade, leciona JOSÉ AFONSO DA SILVA (Curso de Direito Constitucional Positivo, Malheiros Editores, SP, 1994, p. 195-196):

'A afirmação do art. 1º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão cunhou o princípio de que os homens nascem e permanecem 'iguais em direito'. Mas aí firmara a igualdade jurídica e formal no plano político, de caráter puramente negativo, visando a abolir os privilégios, isenções pessoais e regalias de classe. Esse tipo de igualdade gerou as desigualdades econômicas, porque fundada 'numa visão individualista do homem, membro de uma sociedade liberal relativamente homogênea'.

Nossas constituições, desde o Império, inscreveram o princípio da 'igualdade', como 'igualdade perante a lei', enunciado que, na sua literalidade, se confunde com a mera 'isonomia formal', no sentido de que a lei e sua aplicação trata a todos igualmente, sem levar em conta as distinções de grupos. A compreensão do dispositivo vigente, nos termos do art. 5º, 'caput', não deve ser assim tão estreita. O intérprete há que aferi-lo com outras normas constitucionais, conforme apontamos supra e, especialmente, com as exigências da justiça social, objetivo da ordem econômica e da ordem social. Considerá-lo-emos como isonomia formal para diferençá-lo da 'isonomia material', traduzido no art. 7º, XXX e XXXI, que já indicamos no nº 1 supra.

A Constituição procura aproximar os dois tipos de isonomia, na medida em que não se limitara ao simples enunciado da igualdade perante a lei; menciona também igualdade entre homens e mulheres e acrescenta vedações a distinção de qualquer natureza e qualquer forma de discriminação. (...)'

(...)

A garantia de um direito social previsto na Constituição Federal de 1988 é evidentemente mais contundente que a simples alegação de que 'tempus regis actum' como argumento para se excluir do direito ao benefício previdenciário a pensão por morte rural pelo falecimento da companheira em data anterior à vigência da Carta Magna, ou ocorrido entre a data do início da vigência desta e a data da vigência da Lei nº 8.213/91.

Quando se fala em evolução histórica da legislação do trabalhador rural, o retrocesso das regras e a supressão de garantias constitucionais passam a ser inaceitáveis. No caso de admitir-se isso estar-se-á instituindo uma verdadeira exclusão de uma faixa de trabalhadores rurais do alcance da Previdência Social.

Assim como é evidente a não recepção de normas ordinárias pela Constituição Federal, no que diz respeito à exclusão ao direito de pensão por morte ao trabalhador rural pelo falecimento de sua companheira em data anterior à vigência da Constituição Federal de 1988, ou em período compreendido entre a data do início da vigência desta e a data da vigência da Lei nº 8.213/91.

Logo, a questão da concessão da pensão por morte ao trabalhador rural, pelo óbito de sua companheira, tido categoricamente como 'excluído' do direito de pensão por uma regra objetiva, é um debate a ser levantado, pois, após a vigência da Constituição Federal de 1988, a igualdade entre homens e mulher foi estabelecida o que impede a utilização de conceitos como 'a necessidade de ser chefe de família' para justificar o direito ou não da concessão da pensão por morte, sendo necessária a discussão face à escassa doutrina a respeito do tema.

Mesmo estando consubstanciado na Constituição Federal, a dificuldade é fazer com que o princípio da igualdade e da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais sejam aplicados efetivamente, haja vista a evidente desvantagem para aqueles que necessitaram do benefício previdenciário da pensão por morte em data anterior à vigência da nova ordem constitucional.

Frise-se que a Primeira Turma Recursal da Seção Judiciária do Rio Grande do Sul já proferiu julgamento no sentido de reconhecer o direito à pensão por morte e enfatizando que 'basta voltar os olhos para o inciso V, do art. 201, que garante pensão por morte do segurado, homem ou mulher, cônjuge ou companheiro e dependentes. Não tenho dúvidas sobre a natureza auto-aplicável do dispositivo, o que justifica a concessão do benefício de pensão por morte'.

Convém citar trecho da obra de Fernando Barcellos de Almeida, que disserta:

'Mas temos também de reconhecer que, lamentavelmente, ainda nos dias de hoje, na prática, os homens não nascem livres e iguais. Prevalece na realidade social a lei da antinomia por nascimento, pela qual todo ser humano nasce desigual, de acordo com o padrão econômico, social, psicológico, lingüístico, jurídico, profissional, sanitário, educacional e material vigente no ambiente de seu nascimento, e tende a manter esse padrão pelo resto de sua vida, como afirma Jaime Maria Mathieu, em El estado comunitário, Ediciones La Bastilha, Buenos Aires, 2a edição, 1973, pág. 8.'

E Celso Antonio Bandeira de Mello dizendo que 'é agredida a igualdade quando o fator diferencial adotado para qualificar os atingidos pela regra não guarda relação de pertinência lógica com a inclusão ou exclusão no benefício deferido ou com a inserção ou arrendamento do gravame imposto.'

(...)

(http://www.verboski.adv.br/material/artigos02.pdf)

Assim, a discriminação que o art. 10, I, da CLPS/84 fazia ao cônjuge varão, exigindo a presença do requisito invalidez para que fosse considerado dependente da mulher para fins de concessão de pensão por morte há de ser apreciada à luz da norma constitucional. Ora, se tal exigência não era feita à viúva, cuja dependência econômica é presumida, ao viúvo não pode ser imposta, em respeito ao princípio da igualdade, já previsto, inclusive, na Carta anterior.

A qualidade de segurada da 'de cujus' é incontroversa nos autos, tanto que a autarquia pagava a pensão por morte aos dois filhos do casal, até completarem a maioridade. Sendo presumida a condição de dependente do cônjuge, nos termos da fundamentação acima, é de ser deferido ao autor o benefício de pensão por morte.

(...)

Dos fundamentos se extrai que o princípio da igualdade já estava presente na Constituição de 1967, vigente ao tempo do óbito da esposa do autor, em seu Capítulo IV, que trata 'Dos Direitos e Garantias Individuais' (art. 150, §1º- 'Todos são iguais perante a lei, sem distinção, de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas. O preconceito de raça será punido pela lei.'). (grifo meu) Com a Emenda Constitucional nº 1, de 1969, o princípio da igualdade permaneceu presente, no artigo 153, § 1º ('Todos são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas. Será punido pela lei o preconceito de raça'). Finalmente, com o advento da Constituição de 1988, homens e mulheres definitivamente adquirem a igualdade, conforme estabelece o artigo 5º:

'Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição.'

Fato é que uma norma infraconstitucional pode ferir princípio constitucional de igualdade quando cria distinção pela especial qualificação de um trabalho que pode ser exercido sob as mesmas condições, pela simples qualificação de uma condição pessoal de quem o exerce.

O que nos informa a disposição legal de que apenas o chefe ou arrimo de família tem direito à proteção previdenciária?

Embora não afronte diretamente comando constitucional no que pertine diretamente à distinção de sexo, atinge a igualdade de distinção de trabalhos, pois nos informa que apenas aquele que mais trabalhar para prover o sustento da família, ou aquele cujo fruto do trabalho gerar mais rendimentos ou for preponderante no sustento do grupo familiar terá proteção social.

Verifica-se do comando uma distinção não isonômica entre o trabalho de um casal para o qual se presume dependência econômica, valorando mais o trabalho de um em detrimento do outro.

Promove-se inconstitucionalmente a exclusão de uma faixa de trabalhadores rurais do alcance da proteção previdenciária.

E, novamente me permito transcrever trecho do voto do eminente Des. Fed. Luiz Carlos de Castro Lugon citando Celso Antonio Bandeira de Mello dizendo que 'é agredida a igualdade quando o fator diferencial adotado para qualificar os atingidos pela regra não guarda relação de pertinência lógica com a inclusão ou exclusão no benefício deferido ou com a inserção ou arrendamento do gravame imposto.' (grifo meu)

A única pertinência lógica que se poderia extrair para a distinção seria de que em um casal sempre o trabalho de um será preponderante ou mais qualificado a ponto de gerar o fator diferencial de proteção social, o que, salvo melhor juízo, encerra afronta ao princípio constitucional de isonomia.

Desta forma, acolho a preliminar de cerceamento de defesa para anular a sentença para que seja produzida a prova testemunhal necessária à demonstração da condição de segurada especial.

Frente ao exposto, voto por acolher a preliminar de cerceamento de defesa e anular a sentença para que seja reaberta a instrução probatória.



Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001460609v13 e do código CRC bed2d466.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5002702-84.2017.4.04.7113/RS

RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

APELANTE: MARIA PAGLIARINI (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

ADVOGADO: LIANDRA FRACALOSSI (OAB RS071325)

ADVOGADO: Eduardo Machado Mildner (OAB RS081302)

ADVOGADO: VALQUIRIA PETER BACELLAR (OAB RS105793)

ADVOGADO: RENATO VON MUHLEN

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

DIREITO previdenciário. DIREITO CONSTITUCIONAL. aposentadoria por invalidez. segurado especial. FATO GERADOR ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO DE 88. VIGÊNCIA DA CONSTITUIÇÃO DE 1967. PRINCÍPIO DA IGUALDADE.

1. O princípio da igualdade já estava presente na Constituição de 1967 para justificar o exame da constitucionalidade da legislação ordinária. Comando legal vigente à época e que trazia distinção não isonômica entre o trabalho de um casal para o qual se presume dependência econômica, valorando mais o trabalho de um em detrimento do outro.

2. Era e ainda é inconstitucional a exclusão de uma faixa de trabalhadores rurais do alcance da proteção previdenciária sem um fator diferencial de proteção social que justifique a medida.

3. Jurisprudência consolidada de que a Constituição anterior também agasalhava o princípio da igualdade, proibindo, expressamente, qualquer distinção em razão do sexo, não havendo motivo para se exigir apenas do cônjuge varão, para concessão de pensão por morte, a comprovação da condição de invalidez (Embargos Infringentes Nº 5048740-38.2013.404.7100, 3ª Seção, Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, por maioria, juntado aos autos em 08/10/2015).

4. Apelação parcialmente provida para anular a sentença de primeiro grau e determinar a reabertura da instrução para aferição da condição de segurado especial do apelante.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por maioria, vencido o relator, bem como a Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ, acolher a preliminar de cerceamento de defesa e anular a sentença para que seja reaberta a instrução probatória, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 04 de março de 2020.



Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator do Acórdão, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001660080v5 e do código CRC 276f3546.Informações adicionais da assinatura:
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Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 25/09/2019

Apelação Cível Nº 5002702-84.2017.4.04.7113/RS

RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

PROCURADOR(A): FLÁVIO AUGUSTO DE ANDRADE STRAPASON

SUSTENTAÇÃO ORAL: LIANDRA FRACALOSSI por MARIA PAGLIARINI

APELANTE: MARIA PAGLIARINI (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

ADVOGADO: LIANDRA FRACALOSSI (OAB RS071325)

ADVOGADO: Eduardo Machado Mildner (OAB RS081302)

ADVOGADO: VALQUIRIA PETER BACELLAR (OAB RS105793)

ADVOGADO: RENATO VON MUHLEN

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 25/09/2019, na sequência 213, disponibilizada no DE de 10/09/2019.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

APÓS O VOTO DO JUIZ FEDERAL JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER NO SENTIDO DE NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, PEDIU VISTA O DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA. AGUARDA A JUÍZA FEDERAL TAIS SCHILLING FERRAZ.

Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

Pedido Vista: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária

MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES

Pedido de Vista em 25/09/2019 11:21:42 - GAB. 61 (Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA) - Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA.



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:41:25.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 04/12/2019

Apelação Cível Nº 5002702-84.2017.4.04.7113/RS

RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

PROCURADOR(A): RODOLFO MARTINS KRIEGER

APELANTE: MARIA PAGLIARINI (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

ADVOGADO: LIANDRA FRACALOSSI (OAB RS071325)

ADVOGADO: Eduardo Machado Mildner (OAB RS081302)

ADVOGADO: VALQUIRIA PETER BACELLAR (OAB RS105793)

ADVOGADO: RENATO VON MUHLEN

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 04/12/2019, às 10:00, na sequência 287, disponibilizada no DE de 18/11/2019.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

APÓS O VOTO-VISTA DIVERGENTE DO DES. FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA NO SENTIDO DE ACOLHER A PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA E ANULAR A SENTENÇA PARA QUE SEJA REABERTA A INSTRUÇÃO PROBATÓRIA, E O VOTO DA JUÍZA FEDERAL TAÍS SCHILLING FERRAZ ACOMPANHANDO O RELATOR, FOI SOBRESTADO O JULGAMENTO NOS TERMOS DO ART. 942 DO CPC, PARA QUE TENHA PROSSEGUIMENTO NA SESSÃO DE 04-3-2020.

VOTANTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária

MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES

Acompanha o(a) Relator(a) em 02/12/2019 15:51:12 - GAB. 62 (Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ) - Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ.

Acompanho o Relator



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:41:25.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 04/03/2020

Apelação Cível Nº 5002702-84.2017.4.04.7113/RS

RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

PROCURADOR(A): CÍCERO AUGUSTO PUJOL CORRÊA

SUSTENTAÇÃO ORAL PRESENCIAL: RENATO VON MUHLEN por MARIA PAGLIARINI

APELANTE: MARIA PAGLIARINI (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

ADVOGADO: LIANDRA FRACALOSSI (OAB RS071325)

ADVOGADO: Eduardo Machado Mildner (OAB RS081302)

ADVOGADO: VALQUIRIA PETER BACELLAR (OAB RS105793)

ADVOGADO: RENATO VON MUHLEN

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 04/03/2020, na sequência 300, disponibilizada no DE de 17/02/2020.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS OS VOTOS DOS DES. FEDERAIS PAULO AFONSO BRUM VAZ E OSNI CARDOSO FILHO ACOMPANHANDO A DIVERGÊNCIA, A 6ª TURMA DECIDIU, POR MAIORIA, VENCIDO O RELATOR, BEM COMO A JUÍZA FEDERAL TAIS SCHILLING FERRAZ, ACOLHER A PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA E ANULAR A SENTENÇA PARA QUE SEJA REABERTA A INSTRUÇÃO PROBATÓRIA, NOS TERMOS DO VOTO DO DES. FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, QUE LAVRARÁ O ACÓRDÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária

MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES

Acompanha a Divergência em 27/02/2020 15:54:40 - GAB. 53 (Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO) - Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO.

Acompanha a Divergência em 04/03/2020 11:26:49 - GAB. 91 (Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ) - Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ.

Com a vênia do eminente Relator, acompanho a divergência, nos termos da fundamentação que adotei ao julgar a AC n. 5002784.86.2015.404.7210/SC, j. em 03-10-2018:

"No que tange à possibilidade de reconhecimento da qualidade de segurada da trabalhadora rural casada no regime anterior à vigência da Constituição Federal de 1988, embora a solução alvitrada pelo eminente Relatora esteja amparada em precedentes desta Corte, julgando casos de pedido de pensão por morte pelo marido em decorrência do óbito da esposa (v.g. APELREEX 0000152-84.2014.404.9999, Sexta Turma, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 21/05/2014; AC 0023600-86.2014.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora Desa. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, D.E. 02/12/2015; AC 0018200-91.2014.4.04.9999, TRS-SC, de minha Relatoria, D.E. 15/08/2017; AC nº 5060902-59.2017.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 26/02/2018; APELREEX nº 0016038-26.2014.4.04.9999, TRS-SC, Relator Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE, D.E. 25/04/2018), e inexista decisão do STF proferida em sede de repercussão geral, é forçoso reconhecer que os sucessivos precedentes do Supremo Tribunal Federal autorizam a revisão da jurisprudência sobre as pensões requestadas pelos cônjuges varões em decorrência do óbito das esposas ocorridos antes da Constituição Federal de 1988.

Pois bem. Conforme ressaltei na sessão de 03-05-2018, nos autos da AC nº 5006573-71.2016.4.04.7206, após superar a preliminar de coisa julgada, a jurisprudência mais recente do e. Supremo Tribunal Federal em casos similares ao presente (v.g. RE 880521 AgR, Relator Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 08/03/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-054 DIVULG 22-03-2016 PUBLIC 28-03-2016), é uníssona no sentido de que "o óbito da segurada em data anterior ao advento da Constituição Federal de 1988 não afasta o direito à pensão por morte ao seu cônjuge varão. Nesse sentido: RE 439.484-AgR, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, DJe de 5/5/2014; RE 535.156-AgR, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, DJe de 11/4/2011".

Com efeito, no voto proferido no RE 880521, o Ministro Teori Zavascki consignou que o fato de o óbito da segurada ter ocorrido antes do advento da Constituição Federal de 1988 "não é hábil a infirmar o direito do agravado à pensão por morte, independentemente da comprovação de invalidez. É que a Carta Magna de 1967, na redação da EC 1/1969, vigente na data do óbito, já preceituava que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de sexo (…) ” (art. 153, § 1º), o que evidencia que, já à época da instituição da pensão, afigurava-se inconstitucional a exigência, veiculada no art. 11, I, da Lei 3.807/1960 e no art. 12, I, do Decreto 83.080/79, de comprovação da condição de invalidez do cônjuge varão para que fosse considerado dependente da segurada".

Portanto, na linha do atual entendimento do STF, é possível a concessão, ao cônjuge varão, de pensão por morte de segurada, inclusive a trabalhadora rural, falecida não só no período entre a promulgação da Constituição Federal (05-10-1988) e a vigência da Lei 8.213/91 (05-04-1991), pela aplicação imediata do art. 201, inciso V, da Constituição Federal, que equiparou homens e mulheres para efeito de pensão por morte ("Os óbitos de segurados ocorridos entre o advento da Constituição de 1988 e a Lei 8.213/91 regem-se, direta e imediatamente, pelo disposto no artigo 201, inciso V, da Constituição Federal, que, sem recepcionar a parte discriminatória da legislação anterior, equiparou homens e mulheres para efeito de pensão por morte" - RE 607.907-AgR, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, DJe de 1/8/2011), mas, também, de segurada falecida anteriormente à promulgação da Constituição Federal de 1988.

Em outras palavras, é possível, mesmo na vigência do regime do FUNRURAL (instituído pela LC 11/71 e complementado pela LC 16/73) e do Regulamento dos Benefícios da Previdência Social (Decreto 83.080/79), reconhecer-se a qualidade de segurada da trabalhadora rural ainda que seja casada e que seu marido não seja inválido.

Com efeito, embora a legislação referida previsse (art. 275, "b", do Decreto 83.087/79) que o trabalhador rural beneficiário da Previdência Social Rural era "o produtor, proprietário ou não, que, sem empregado, exerce atividade rural, individualmente ou em regime de economia familiar, assim entendido o trabalho dos membros da família, indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mútua dependência e colaboração" e que a aposentadoria por velhice seria devida apenas ao chefe ou arrimo da unidade familiar (definido como "o cônjuge do sexo masculino, ainda que casado apenas segundo o rito religioso, sobre o qual recai a responsabilidade econômica pela unidade familiar" ou "o cônjuge do sexo feminino, nas mesmas condições da letra "a", quando dirige e administra os bens do casal nos termos do art. 251 do Código Civil, desde que o outro cônjuge não receba aposentadoria por velhice ou invalidez"), tais regras não se coadunam com o princípio da isonomia disposto no art. 201, inciso V, da Constituição Federal de 1988, que equiparou homens e mulheres para efeito de pensão por morte.

A propósito disso, transcrevo trecho do voto do Des. Federal João Batista Pinto Silveira na AC n. 5001165-28.2017.4.04.9999/PR (Sexta Turma, julgado em 14/03/2018, juntado aos autos em 02/04/2018):

"O argumento de que, após o advento da Constituição Federal de 1988, pelo seu art. 201, V, ficou assegurada a igualdade de direitos aos homens e mulheres, fazendo-se imperioso estender ao cônjuge varão o benefício previdenciário que era concedido apenas à mulher, tem sido rejeitado tanto no caso dos trabalhadores rurais, quando a falecida não ostentava a qualidade de chefe ou arrimo de família, como na hipótese dos trabalhadores urbanos, quando não comprovada a invalidez do marido ou companheiro, pois este não deteria a qualidade de dependente. Destaca-se, para tanto, que o dispositivo constitucional é claro ao assegurar "pensão por morte de segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiros e dependentes, obedecido o disposto no § 5º e no art. 202". In casu, tendo o óbito ocorrido após a promulgação da CF/88, mas anteriormente à edição da Lei nº 8.213/91, o referido inciso do art. 201 não teria aplicação, por faltar à de cujus a condição de segurada.

Contudo, decisões mais recentes do Supremo Tribunal Federal vêm entendendo que a Súmula 340 do STJ (A lei aplicável à concessão de pensão previdenciária por morte é aquela vigente na data do óbito do segurado) deve ser aplicada à luz do disposto na Constituição Federal, ou seja, no que for compatível com a nova ordem estabelecida pela Constituição.

Nesse sentido, citam-se os seguintes arestos do STF:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CÔNJUGE VARÃO. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA ISONOMIA. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme em reconhecer que o cônjuge varão tem direito ao recebimento da pensão por morte, embora o falecimento da segurada tenha ocorrido antes da edição da Lei 8.213/1991. Precedentes. 2. Agravo regimental desprovido. (RE 400973 AgR, Rel.: Min. AYRES BRITTO, Segunda Turma, julg. em 17.05.2011, DJe 14.09.2011)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADORA RURAL. A EXIGÊNCIA DO REQUISITO DE INVALIDEZ PARA A CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE AO CÔNJUGE VARÃO AFRONTA O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA ISONOMIA. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. (AI 561788 AgR, Rel.: Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julg. em 22.02.2011, DJe 22.03.2011)

AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA. PENSÃO POR MORTE. CÔNJUGE VARÃO. ÓBITO ANTERIOR AO ADVENTO DA LEI 8.213/91. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. INCIDÊNCIA DA REDAÇÃO ORIGINAL DO ART. 201, V, DA CONSTITUIÇÃO. AUTOAPLICABILIDADE. ART. 195, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO. EXIGÊNCIA DE FONTE DE CUSTEIO. DESNECESSIDADE. Agravo regimental a que se nega provimento. (RE 352744 AgR, Rel.: Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julg. 01.03.2011, DJe 18.04.2011)

Antes de seguir no raciocínio acerca do cabimento da possibilidade de reconhecimento da qualidade de segurada especial à trabalhadora rural entre a promulgação da Constituição Federal de 1988 e a vigência da Lei 8.213/91, e, por consequência, do direito de seu marido à percepção de pensão por morte quando o óbito ocorreu entre 05.10.1988 e 05.04.1991, impõe-se fazer algumas reflexões.

De início, deve-se observar que, para a interpretação das normas constitucionais, não se deve perder de vista os princípios específicos de interpretação constitucional, dentre os quais se encontra o da máxima efetividade da norma, que nada mais é do que lhe conferir a maior aplicabilidade possível. Tal princípio está intimamente ligado ao princípio da força normativa da Constituição, indissociável dos aspectos históricos considerados para sua edição, como também da realidade social que visou proteger, no intuito de alcançar uma maior otimização dos preceitos constitucionais. Não se deve esquecer, ainda, que o princípio da unidade da Constituição impõe que as normas nela existentes sejam consideradas como integrantes de um único e harmonioso sistema.

Assim, não vejo como sustentar, diante de disposição constitucional trazida no art. 5º, I, que define que "homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição", bem como do §1º deste mesmo artigo, que nos informa que "As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata", que não restaria suprimida parte da disposição constante do Decreto 83.080/79, no ponto em que contém restrição incompatível com os comandos constitucionais.

Essa restrição deriva da previsão, pela norma infraconstitucional, de que apenas o chefe ou arrimo de família é segurado previdenciário e, portanto, não podem os demais membros do núcleo familiar ser considerados como tal, inclusive para fins de implementação de benefício de pensão por morte.

Ora, diante das notórias mudanças operadas na realidade sócio-cultural do país, especialmente entre a população campesina, o art. 201, V, da Constituição Federal, estabeleceu presunção de existência de mútua dependência entre os cônjuges, reconhecendo reconhece tanto o direito da mulher à pensão pelo falecimento do homem, quanto o direito do homem à pensão pelo falecimento da mulher.

Para melhor definirmos quais os efeitos possíveis do comando do disposto no art. 201, V, da CF/88, sem perder de vista a necessária integração harmoniosa do sistema que compõe (art. 5º, I, da CF/88), impõe-se definir de que espécie de norma estamos tratando e suas eficácias possíveis.

Mesmo que entendamos que o art. 201, V, da Constituição não tenha eficácia plena, tem-se que o dispositivo tampouco se insere na posição de norma de eficácia contida. Trata-se, na verdade, de norma de eficácia limitada por princípio constitutivo de espécie impositiva, ou seja, exige apenas do legislador a edição de lei integradora de sua eficácia. Além disso, creio que existe outro fundamento a ensejar o direito à pensão para o cônjuge ou companheiro da segurada do sexo feminino no período que medeia a Constituição Federal e a edição da lei integradora (Lei 8.213/91), justamente em razão da adequada classificação da presente norma constitucional.

A previsão do artigo ora em análise, tem sido tratada, não raras vezes, como norma de eficácia contida, o que, s.m.j., não reflete o espírito norteador da disposição constitucional, porquanto a norma de eficácia contida, como já referido, pressupõe a necessidade de atuação legislativa restritiva por conta da competência discricionária do Poder Público.

Tais normas apresentam uma cláusula de redutibilidade, permitindo que leis ordinárias componham seu significado. Contudo, as normas de eficácia contida têm aplicabilidade direta e imediata, apenas podendo sofrer restrição infraconstitucional. Em suma, a norma de eficácia contida, enquanto não restringida, produz os mesmos efeitos da norma de eficácia plena. É autoaplicável, autoexecutável ou bastante em si.

Cito como exemplo de norma de eficácia contida o disposto no inciso XIII do art. 5º da CF, que dispõe: "é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer". Diante desse preceito, ninguém teria dúvida em afirmar que a qualquer um seria permitido trabalhar em qualquer atividade, independentemente de regulamentação, até que lei ordinária impusesse o atendimento de qualificação nela descrita, restringindo, assim, o livre exercício da profissão. Até que lei adviesse restringindo e condicionando o atuar a certos requisitos, a prática da atividade seria legítima e a norma eficaz. Por certo que esta norma é bastante em si, tanto em relação às atividades para as quais ainda não se criou legislação restritiva, como para aquelas atividades para as quais a regulamentação ordinária já se encontra em vigor e não conflita com a Constituição.

No exemplo citado não se põe em dúvida a conotação de norma de eficácia contida, na medida em que haverá a possibilidade de restrição legislativa.

A contrario sensu, o art. 201, V, da CF/88 não parece admitir qualquer comando de intervenção restritiva, via legislação infraconstitucional. Entendo que a determinação constante de seu caput, no sentido de que "A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:...." configura comando integrativo.

Assim, estaríamos, na realidade, diante de norma de eficácia limitada, na medida em que esta possui duas aptidões, uma que diz respeito à possibilidade de aplicação mediante regulamentação infraconstitucional (eficácia positiva) e outra de eficácia "negativa", que nada mais é do que a aptidão para invalidar qualquer disposição infraconstitucional contrária ou conflitante com seu comando imperativo (exigência, pela legislação em vigor, da invalidez do cônjuge varão, no caso da segurada urbana, ou da condição de chefe ou arrimo de família, no caso dos trabalhadores rurais).

As normas de eficácia limitada positiva dependeriam de lei infraconstitucional apenas para regulamentá-las. Isso não significa que no momento em que são publicadas não possuam eficácia jurídica, mas apenas não possuiriam efetividade ou eficácia social e portanto não produziriam "todos" os seus efeitos. Tratamos de verdadeira eficácia diferida.

Embora tais normas não nasçam prontas para serem aplicadas, produzem efeitos normativos, vinculando o legislador aos seus comandos e penalizando os efeitos de quaisquer leis que as desrespeitem, por óbvio, quando existirem.

No caso concreto, quando da promulgação da Constituição Federal de 1988, estava em vigor legislação infraconstitucional dispondo acerca da possibilidade de concessão de pensão por morte "aos dependentes do segurado", limitando tal condição, no caso dos trabalhadores rurais, ao chefe ou arrimo de família, e, portanto, em flagrante desrespeito ao comando constitucional, que prevê a plena igualdade de direitos entre homens ou mulheres, sejam eles chefes do núcleo familiar ou não.

Neste caso, não se cuida de inexistência de legislação infraconstitucional a regular a matéria, mas apenas de, com base na segunda aptidão das normas de eficácia limitada (eficácia negativa), retirarmos do mundo jurídico parte do texto que exige a prova de que o instituidor da pensão, seja homem ou mulher, fosse chefe ou arrimo de família para fins de concessão de pensão por morte a seu cônjuge ou companheiro.

Nada existisse acerca da regulação para a concessão de pensão por morte, para homens e mulheres, aí sim, poderia se argumentar a necessidade de criação de norma infraconstitucional para produzir efeitos já a partir da Constituição.

Mesmo que se entenda que a Constituição Federal não consagra a presunção de dependência mútua entre os cônjuges, não há como negar que a norma prevista no art. 201, V, da CF/88, ao menos, elide a presunção que dá base à Lei complementar nº 11/71 e ao Decreto nº 83.080/79, de que sempre e necessariamente um dos cônjuges será o responsável pela manutenção do outro. No mínimo, o dispositivo constitucional citado, assegura ao viúvo a possibilidade de produção de prova da dependência econômica mútua para obtenção do benefício.

Uma vez constatada a existência de incompatibilidade do texto legal anterior com a Constituição, dá-se o fenômeno da não-recepção, prevalecendo, no ponto, o disposto na Constituição Federal. É o que ocorre, no caso, no tocante à disposição que condiciona o direito ao benefício de pensão por morte à hipótese de falecimento do chefe ou arrimo de família. Como já referido, tal restrição contraria o dispositivo constitucional (art. 201, V da CF) que estabelece a presunção de dependência mútua entre esposo e esposa e que, com base nesta premissa, assegura o direito de qualquer dos cônjuges ao recebimento de pensão por morte em razão do falecimento do outro.

E, justamente, por reconhecer a incompatibilidade da exigência legal, que prevê a comprovação de que o(a) falecido(a) era chefe ou arrimo de família, é que entendo possível a concessão de benefício de pensão ao viúvo de trabalhadora rural, desde que comprovado o exercício de atividade rural pela falecida, independentemente da prova de sua condição de chefe ou arrimo de família.

Veja-se que não se trata aqui de aplicação de lei posterior (Lei nº 8.213/91) a fato ocorrido anteriormente (datado de julho de 1990), mas de aplicação da lei vigente à data do falecimento da segurada, conformada com as disposições constitucionais atinentes à matéria.

Com efeito, a possibilidade de concessão de pensão ao viúvo da segurada falecida mesmo não sendo esta chefe ou arrimo de família não decorre da aplicação direta do direito assegurado em tese no art. 201, V da Constituição Federal, mas sim, mas da não-recepção da exigência posta na legislação anterior, mais especificamente, no parágrafo único do art. 298 do Decreto nº 83.080/79.

Diante disso, revejo meu posicionamento anterior, para entender ser devido o benefício de pensão por morte ao marido de segurada rural falecida entre a promulgação da CF/88 e a vigência da Lei 8.213/91, mesmo quando ela não detinha a condição de chefe ou arrimo de família.

Basta, portanto, a comprovação de que a falecida exercia atividade na condição de segurada especial na data do óbito para que o viúvo faça jus à pensão por morte, na qualidade de dependente e isso se verifica do conjunto probatório, desenvolvendo atividade rural em conjunto com seu esposo.

O entendimento antes defendido, segundo a qual o art. 201, V da Constituição Federal é norma de eficácia limitada, dependendo a extensão da pensão ao viúvo de regulamentação por lei específica, tem por fundamento entendimento manifestado no Plenário do STF, que, por analogia, aplica-se à espécie ora em apreço.

Peço vênia para transcrever excerto da sentença da lavra do MM. Juiz Federal Moacir Camargo Baggio, proferida nos autos 2006.71.16.002199-1 (0002199-28.2006.404.7116, conforme numeração atribuída nesta Corte após a interposição de apelo), que bem examina a matéria, à luz da decisão proferida no RE 204.193/RS, que analisa a questão sob a ótica da previdência urbana (segundo a qual, na vigência da CLPS/84, somente o marido inválido seria dependente previdenciário para fins de pensionamento) e que pode ser aplicada à questão posta nos presentes autos:

"(...)

Pois bem, analisando o teor daquela decisão verifico que, ainda que na ocasião tenha sido vencedor o voto do relator, Ministro Carlos Velloso, que efetivamente manifestou posicionamento no sentido de que "(...) a extensão automática da pensão ao viúvo, em decorrência do falecimento de esposa-segurada, assim considerado aquele dependente desta, exige lei específica, tendo em vista as disposições inscritas no art. 195, caput, e seu § 5º, e art. 201, V, da Constituição Federal", não houve propriamente expressa concordância dos Ministros com o fundamento utilizado pelo relator para negar aplicabilidade imediata ao art. 201, V da Constituição Federal (ofensa ao disposto no art. 195, § 5º da Constituição Federal). Nenhum dos demais Ministros que participaram do julgamento afirmou que o art. 201, V da Constituição Federal não possui aplicabilidade imediata. A discussão que se seguiu ao voto do relator, ao contrário, tratou expressamente acerca da interpretação e da definição dos efeitos do citado art. 201, V. Nesse sentido, ponderou o Ministro Moreira Alves, a respeito dos efeitos do dispositivo citado relativamente à exigência de prova da invalidez do cônjuge varão supérstite para obtenção da pensão por morte: "O tratamento tem que ser o mesmo dado à mulher. Se ela tem a presunção de ser dependente, o marido também passa a ter a presunção de ser dependente da mulher. Para essa igualdade de tratamento não há necessidade de lei". Na oportunidade, em que pese tenha sido dado provimento ao recurso do IPERGS para reformar o acórdão do TJRS que havia confirmado a sentença que concedeu o benefício ao viúvo não-inválido, e ainda que tenha sido incluído na ementa do julgado excerto do voto do relator no qual se afirmou que "(...) a extensão automática da pensão ao viúvo, em decorrência do falecimento de esposa-segurada, assim considerado aquele dependente desta, exige lei específica (...)", restou debatido e acordado entre os Ministros, tão-somente, a impossibilidade de imposição ao cônjuge varão de exigência inexistente para a mulher, sob pena de violação da isonomia.

Nesse sentido, inclusive, observou o Ministro Sepúlveda Pertence por ocasião do julgamento do RE n.º 385.397-AgR/MG, em que o Plenário do Supremo Tribunal Federal voltou a analisar a validade da exigência de comprovação da condição de incapacidade do viúvo para fins de obtenção de benefício de pensão por morte . Disse o Ministro relator, na oportunidade: "A exigência de fonte de custeio para que o cônjuge varão sadio usufrua pensão por morte de sua mulher e a necessidade de lei específica que previsse a sua inclusão como dependente da esposa, nos termos do que ficou estabelecido no julgamento do RE 204.193, Velloso, conflita, a meu ver, com a jurisprudência do Tribunal firmada no sentido da aplicabilidade imediata e independente de fonte de custeio dos benefícios previstos pela própria Constituição Federal (v.g. RE 220.742, 03.03.1998, 2ª T, Néri, e RE 170.574, Pertence, RTJ 159/1.021). (...) o que pesa em favor da mulher é a presunção de dependência econômica e não a presunção de invalidez. Isso ficou extremamente claro no voto-condutor do Ministro Carlos Velloso no julgamento do RE 204.193 (...) Nele ficou evidenciado que o dado sociológico que se presume em favor da mulher é o de dependência econômica e não, a de invalidez, razão pela qual, também não pode ser exigida do marido. Se a condição de invalidez revela, de modo inequívoco, a dependência econômica, a recíproca não é verdadeira; a condição de dependência econômica não implica declaração de invalidez. (...) Reitero que não se trata de extensão ao cônjuge varão da presunção de dependência que favorece a mulher, mas, sim, de não se impor a exigência de invalidez comprovada - por se mostrar desarrazoada -, conseqüência lógica a que se chegaria com o provimento do recurso extraordinário. (...) Assim, provejo o agravo regimental para conhecer do recurso extraordinário e negar-lhe provimento por afrontar o princípio da isonomia a exigência de invalidez do marido.". A decisão proferida naquele julgamento, nos termos do voto do relator, foi sintetizada na seguinte ementa:

I. Recurso extraordinário: descabimento. Ausência de prequestionamento do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, tido por violado: incidência das Súmulas 282 e 356. II. Pensão por morte de servidora pública estadual, ocorrida antes da EC 20/98: cônjuge varão: exigência de requisito de invalidez que afronta o princípio da isonomia. 1. Considerada a redação do artigo 40 da Constituição Federal antes da EC 20/98, em vigor na data do falecimento da servidora, que não faz remissão ao regime geral da previdência social, impossível a invocação tanto do texto do artigo 195, § 5º - exigência de fonte de custeio para a instituição de benefício -, quanto o do art. 201, V - inclusão automática do cônjuge, seja homem ou mulher, como beneficiário de pensão por morte. 2. No texto anterior à EC 20/98, a Constituição se preocupou apenas em definir a correspondência entre o valor da pensão e a totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido, sem qualquer referência a outras questões, como, por exemplo os possíveis beneficiários da pensão por morte (Precedente: MS 21.540, Gallotti, RTJ 159/787). 3. No entanto, a lei estadual mineira, violando o princípio da igualdade do artigo 5º, I, da Constituição, exige do marido, para que perceba a pensão por morte da mulher, um requisito - o da invalidez - que, não se presume em relação à viúva, e que não foi objeto do acórdão do RE 204.193, 30.5.2001, Carlos Velloso, DJ 31.10.2002. 4. Nesse precedente, ficou evidenciado que o dado sociológico que se presume em favor da mulher é o da dependência econômica e não, a de invalidez, razão pela qual também não pode ela ser exigida do marido. Se a condição de invalidez revela, de modo inequívoco, a dependência econômica, a recíproca não é verdadeira; a condição de dependência econômica não implica declaração de invalidez. 5. Agravo regimental provido, para conhecer do recurso extraordinário e negar-lhe provimento.(STF, Pleno, RE 385397 AgR/MG, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJe-096, DIVULG 05-09-2007, PUBLIC 06-09-2007, DJ 06-09-2007, PP-00037)

O posicionamento firmado na decisão proferida no RE n.º 385.397-AgR/MG passou, então, a ser adotado nos julgamentos proferidos pelas Turmas do STF:

Agravo regimental no recurso extraordinário. Pensão. Cônjuge varão. Invalidez. Ofensa ao princípio da isonomia. Precedentes. 1. A exigência de invalidez do marido para ser beneficiário de pensão por morte da esposa, no caso o óbito é anterior à promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98, fere o princípio da isonomia contido no artigo 5º, inciso I, da Constituição Federal, uma vez que tal requisito não é exigido em relação à esposa. 2. Agravo regimental desprovido.

(STF, Primeira Turma, RE 452615 AgR/MG, Rel. Min. Menezes Direito, j. 13/05/2008, DJe-117, DIVULG 26-06-2008, PUBLIC 27-06-2008)

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PENSÃO. EXTENSÃO. CÔNJUGE VARÃO. 1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n. 385.397-AgR, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 6.9.07, decidiu que viola o princípio da isonomia lei que exige do marido, para fins de recebimento de pensão por morte da mulher, a comprovação da condição de invalidez. 2. Agravo regimental não provido.

(STF, Segunda Turma, RE 451447 AgR/MG, rel. Min. Eros Grau, j. 11/12/2007, DJe-031, DIVULG 21-02-2008, PUBLIC 22-02-2008)

Como se verifica, a partir da análise das decisões supra citadas, não é correta a afirmação de que o Supremo Tribunal Federal entende que o art. 201, V da Constituição Federal não é auto-aplicável. Ao contrário, o STF reconhece e afirma que a exigência de comprovação da invalidez como requisito para obtenção da pensão por morte não pode ser imposta ao viúvo, porque não há exigência nesse sentido para a viúva, uma vez que, em razão do disposto na Constituição Federal (arts. 5º, I, e 201, V), homens e mulheres tem direito ao benefício em condições iguais.

(...)" (negritei)

Na esteira desse entendimento, pelo que se depreende do teor do voto-vista do Min. Marco Aurélio no AgR. no RE 385.397-0, "a regra do artigo 195, §5º, da Constituição Federal, a evidenciar que "Nenhum benefício ou serviço de seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total", fez-se com visão prospectiva, ou seja, direcionada à atividade legiferante posterior, implementada no campo ordinário. Não diz respeito aos benefícios previstos na própria Constituição Federal, e a pensão o foi indistintamente considerado cônjuge ou companheiro do sexo masculino ou feminino. Surgiu a exigência de fonte de custeio, com endereço certo a revelar que, criando o legislador comum benefício ou serviço, indispensável seria, ante o sistema atuarial, a previsão de fonte de custeio".

Como visto, embora não tenha ficado claro na ementa de julgamento acima transcrita, o único obstáculo ao pagamento do benefício ao marido da segurada falecida após a vigência da Constituição Federal seria a fonte custeio. Todavia, a questão foi debatida na sessão de julgamento, tendo sido declarada a desnecessidade de fonte de custeio para benefícios já previstos na Constituição Federal, pois esta é necessária apenas na hipótese de criação de novos benefícios.

Assim, o intérprete da norma constitucional não deve perder de vista o norte principiológico, sob pena de causar entraves aos legítimos direitos dos cidadãos que a Constituição teve o intento de assegurar. No caso concreto, retirando a justa proteção familiar que o texto constitucional pretendeu regular.

Portanto, para aquelas hipóteses em que o óbito da segurada ocorreu entre a promulgação da Constituição Federal (05.10.1988) e a vigência da Lei 8.213/91 (05.04.1991), é possível a concessão da pensão por morte ao marido ou companheiro, justamente em decorrência da retirada do mundo jurídico do critério discriminatório que, não reconhecendo a mútua dependência entre os cônjuges, previa a comprovação de que o(a) falecido(a) trabalhador rural era chefe ou arrimo de família, ou inválido, no caso dos trabalhadores urbanos."

Na mesma linha de entendimento, registro, ainda, o seguinte precedente:

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ÓBITO DA ESPOSA ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. SEGURADO ESPECIAL. TEMPUS REGIT ACTUM. LC 11/71. DECRETO 83.080/79. APLICABILIDADE. REQUISITOS. DEPENDENTE. MARIDO INVÁLIDO. INCONSTITUCIONALIDADE. ATIVIDADE RURAL. COMPROVAÇÃO. TERMO INICIAL. PRESCRIÇÃO. TUTELA ESPECÍFICA. 1. A concessão do benefício previdenciário rege-se pela norma vigente ao tempo em que o beneficiário preenchia as condições exigidas para tanto, em conformidade com o princípio do tempus regit actum e nos termos da Súmula 340 do STJ. 2. A legislação vigente à época do óbito, ocorrido em 1985, era a LC 11/71 e o Decreto 83.080/79, os quais dispunham que a pensão por morte era devida aos dependentes do trabalhador rural chefe o arrimo de família, listando como dependentes, entre outros, a esposa, o marido inválido, a companheira mantida há mais de cinco anos, os filhos menores de 18 anos ou inválidos e as filhas solteiras menores de 21 anos ou inválidas. 3. É inconstitucional, mesmo antes da Constituição de 1988, a exigência de invalidez para o dependente do sexo masculino. Precedente da 3ª Seção. Todavia, a necessidade de que o de cujus fosse chefe de família era exigida dos dois sexos, não havendo inconstitucionalidade. 4. Por outro lado, existindo alegação de que ambos os cônjuges desenvolviam o trabalho rural sem qualquer distinção quanto à direção da vida do casal, e não havendo nada que afaste a presunção, é possível inferir-se que ambos, marido e mulher, trabalhavam em igualdade de condições para o sustento da família. 5. Comprovado que a esposa falecida desenvolvia labor rural ao tempo do óbito, o autor faz jus à pensão por morte pleiteada. 6. O termo inicial do benefício de pensão por morte deve ser fixado de acordo com as leis vigentes por ocasião do óbito. Antes da Lei 9.528/97, de 10/12/1997, o benefício era devido a contar do falecimento, independente da data do requerimento. A partir do advento dessa lei, a pensão por morte passou a ser devida: a) a contar do óbito, quando requerida até trinta dias depois deste; b) do requerimento, quando pleiteada após o prazo mencionado. In casu, o pedido na petição inicial é para concessão desde a DER, razão pela qual o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo. 7. Em se tratando de obrigação de trato sucessivo e de verba alimentar, não há falar em prescrição do fundo de direito. Contudo, são atingidas pela prescrição as parcelas vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação, conforme os termos do parágrafo único do art. 103 da Lei nº 8.213/91 e da Súmula 85/STJ. 8. A definição dos índices de correção monetária e juros de mora deve ser diferida para a fase de cumprimento do julgado. 9. O cumprimento imediato da tutela específica independe de requerimento expresso do segurado ou beneficiário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/2015. 10. A determinação de implantação imediata do benefício, com fundamento nos artigos supracitados, não configura violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973 e 37 da CF/1988. (TRF4, AC 0019203-47.2015.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, D.E. 16/03/2017)

Também no mesmo sentido, merece referência a decisão monocrática do Min. Humberto Martins, do STJ, proferida em 13/12/2013 no ECIAL Nº 1.421.374 - PR (2013/0389413-8).

De todo o exposto, revejo meu posicionamento anterior, para entender ser possível o reconhecimento da qualidade de segurada rural da mulher casada, mesmo quando ela não detinha a condição de chefe ou arrimo de família, no regime anterior à Constituição Federal de 1988."



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:41:25.

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