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DIREITO PREVIDENCIÁRIO. DIREITO DA SAÚDE. ATROFIA MUSCULAR ESPINHAL. INCLUSÃO NA POLÍTICA PÚBLICA. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. NECESSIDADE DE COERÊNC...

Data da publicação: 12/07/2020, 15:35:48

EMENTA: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. DIREITO DA SAÚDE. ATROFIA MUSCULAR ESPINHAL. INCLUSÃO NA POLÍTICA PÚBLICA. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. NECESSIDADE DE COERÊNCIA DOS PRONUNCIAMENTOS JUDICIAIS. JULGAMENTO NA FORMA DO ART. 942 DO CPC. 1 - Segundo o entendimento desta Turma Regional Suplementar, conforme a posição lançada pelo Desembargador Federal Celso Kipper quando do julgamento da Apelação nº 5000428-25.2018.4.04.7207, juntado aos autos em 06/03/2020, inexiste "segurança ou comprovação de eficácia da medicação pleiteada para o caso específico da parte autora, que faz uso de traqueostomia". 2 - Contudo, quando do julgamento do agravo de instrumento relacionado a este processo, afirmou-se, por maioria, o direito de a parte ser contemplada com o fármaco em questão (Spinraza®) para tratamento de Ame tipo I em uso de ventilação mecânica invasiva permanente. 3 - Não existindo qualquer alteração fática, exige-se um mínimo de coerência na tomada de decisão, e é em nome dessa convergência que deve ser mantido o que decidido em sede cautelar. (TRF4 5009462-39.2018.4.04.7202, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 05/07/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5009462-39.2018.4.04.7202/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU)

APELADO: DAVI TEIXEIRA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

APELADO: EDRIANE MARIA BIANCHET TEIXEIRA (Pais) (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de remessa necessária e de apelações da União e do Estado de Santa Catarina em face de sentença, proferida em 25 de setembro de 2019 e integrada por embargos de declaração, acolhidos em 07 de novembro de 2019, que julgou procedente o pedido formulado para fornecimento do medicamento Spinraza® (Nusinersen) para tratamento de Atrofia Muscular Espinhal Tipo I (e. 159.1 e e. 185.1 da origem).

Afirma a União, em síntese, o seguinte: (i) paciente não preenche os requisitos previstos no PCDT da doença e sequer aqueles previstos na Portaria de incorporação da CONITEC; (ii) ausência de evidências científicas de eficácia do medicamento no caso concreto; (iii) alto custo do tratamento e, subsidiariamente, (iv) redução da verba honorária (e. 210.1 da origem).

Pede o Estado de Santa Catarina, de seu turno, o seguinte: (i) responsabilidade exclusiva da União pelo financiamento e aquisição do fármaco e (ii) redução da verba honorária (e. 179.1 e e. 205.1 da origem).

Com contrarrazões.

O Ministério Público Federal, em parecer, opinou pelo parcial provimento das apelações (e. 5.1).

É o relatório.

VOTO

I - Tendo sido o presente feito sentenciado na vigência do atual CPC, não há falar em remessa oficial, porquanto foi interposto recurso voluntário pelos réus, o que vai de encontro ao disposto no art. 496, § 1º, do NCPC [Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á.].

Com efeito, a redação do art. 496, § 1º, do CPC/2015 é clara e inequívoca, não admitindo o seu texto outra interpretação, que seria ampliativa do condicionamento do trânsito em julgado da sentença ao reexame necessário. Trata-se de instituto amplamente criticado por ser desnecessário no atual estágio de evolução das Procuradorias Públicas. É excepcional, e por isso mesmo deve ser interpretado restritíssimamente, consoante recente julgado do Egrégio TJRS:

REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. ACIDENTE DE TRABALHO. DESCABIMENTO DO DUPLO GRAU OBRIGATÓRIO DE JURISDIÇÃO. INCOMPATIBILIDADE LÓGICA ENTRE REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO FAZENDÁRIA NA SISTEMÁTICA PROCESSUAL NOVA (ART. 496, § 1º, DO CPC VIGENTE). REMESSA NÃO CONHECIDA. AUXÍLIO-ACIDENTE. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO NA ESPÉCIE. REDUÇÃO FUNCIONAL SUFICIENTEMENTE EVIDENCIADA. 1. Reexame necessário. De acordo com o artigo 496 ,§ 1º, do novo Código de Processo Civil, é descabida a coexistência de remessa necessária e recurso voluntariamente interposto pela Fazenda Pública. Com efeito, a nova codificação processual instituiu uma lógica clara de mútua exclusão dos institutos em referência, resumida pela sistemática segundo a qual só caberá remessa obrigatória se não houver apelação no prazo legal; em contrapartida, sobrevindo apelo fazendário, não haverá lugar para a remessa oficial. Precedentes doutrinários. Caso em que a apelação interposta pelo ente público dispensa o reexame oficioso da causa. Remessa necessária não conhecida. [...]. REEXAME NECESSÁRIO NÃO CONHECIDO. APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE E, NESTA, DESPROVIDA. (Apelação e Reexame Necessário Nº 70076942127, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Eduardo Richinitti, Julgado em 30/05/2018) (Grifei).

Dessarte, o reexame necessário, não tem o mínimo cabimento quando há apelação, parcial ou total, da Fazenda Pública, estando sua obrigatoriedade, como condição para o trânsito em julgado da sentença, dependente da ausência de recurso da Fazenda Pública, consoante decisão unânime deste Colegiado (50102085220184049999, j. 12-12-2018).

II - Não há motivos para alterar o que decido na origem.

Registro, é verdade, que recentemente aderi à posição lançada pelo Desembargador Federal Celso Kipper quando do julgamento da Apelação nº 5000428-25.2018.4.04.7207, juntado aos autos em 06/03/2020. Na ocasião, concordei com Sua Excelência quando afirmou que inexiste "segurança ou comprovação de eficácia da medicação pleiteada para o caso específico da parte autora, que faz uso de traqueostomia", situação em tudo similar ao processo agora julgado.

Contudo, quando do julgamento do Agravo de Instrumento 5008919-74.2019.4.04.0000 (recurso relacionado a este processo, apreciação concluída em 09 de outubro de 2019), de minha relatoria e na honrosa companhia do Desembargador Federal Jorge Antonio Maurique, trilhamos caminho diverso, orientação essa que deve ser mantida.

Veja-se: não existindo qualquer alteração fática, exige-se, penso eu, um mínimo de coerência na tomada de decisão, e é em nome dessa convergência que reproduzo o que consignei na ocasião como razão de decidir:

Pois bem.

Destaco, de imediato, que este Tribunal fixou, levando em conta a assim chamada Medicina Baseada em Evidências, os seguintes requisitos para deferimento do medicamento Spinraza® (por exemplo, TRF4, AG 5032251-07.2018.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 14/12/2018):

(a) possuir atrofia muscular espinhal infantil (AME - Tipo 1);

(b) possuir até sete meses de idade no início do tratamento;

(c) possuir no mínimo duas cópias do gene SMN2;

(d) não possuir a necessidade de suporte ventilatório.

Registro, então, que a parte autora, portadora de atrofia muscular espinhal tipo 1, conta com 3 anos e 2 meses de idade e faz uso de suporte de ventilação mecânica, não preenchendo, em linha de princípio, os requisitos estabelecidos judicialmente.

Diante disso, nos autos do AI nº 5002088-10.2019.404.0000 determinei a realização de perícia médica que foi efetivada na origem, sobrevindo, diante das conclusões obtidas, a presente decisão que concede o medicamento. Dessarte, como já me manifestei, os critérios, ditos gerais, podem ser superados levando em conta as especificidades do caso concreto; o que foi atendido na espécie. A tal respeito, a decisão da magistrada a quo assim dispôs:

"Realizada a perícia, a perita judicial respondeu aos quesitos do juízo e das partes, sendo que a conclusão apresentada somente veio corroborar e ratificar a decisão antes proferida por este juízo.

Vejamos as respostas apresentadas aos questionamentos:

(...)

(...)

As demais respostas aos quesitos podem ser acessadas no evento 94.

Assim, o laudo apresentado corrobora que o fármaco pleiteado pela parte autora é o único existente para o tratamento da enfermidade que acomete a parte autora, bem como restou evidente a urgência no início do tratamento, e, acima de dúvidas, a indicação ao caso clínico do autor. Restou evidenciado que o tratamento paliativo ofertado pelo SUS não é suficiente para o tratamento da moléstia, assim como a da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento. O registro na ANVISA do fármaco e a indicação em bula do uso deste para o tratamento da enfermidade que acomete o autor é incontroverso. Por fim, a hipossuficiência do autor, em relação ao custo do tratamento, também resta devidamente comprovada.

Neste contexto, agora ratificada pelas conclusões apresentadas pela perícia médica judicial, é de ser novamente deferida a medida liminar, em relação ao medicamento pleiteado na inicial."

Registro, a partir de excerto transcrito, que o perito judicial é claro ao demonstrar, com fulcro na medicina baseada em evidências, os ganhos no tratamento que a parte autora obterá com a administração da droga solicitada, portadora que é de Atrofia Muscular Espinhal Tipo 1.

Anoto, ainda, que o custo do tratamento em questão - na casa dos milhões de reais - igualmente não impede, frente à existência, repito, de evidências científicas da eficácia do fármaco ao caso concreto, o respectivo fornecimento.

A reserva do possível, seguindo a linha de argumentação de Ingo Wolfgang Sarlet (Comentário ao art. 6º. In: Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013, p. 545), não pode impedir, por si só, a concretização do direito à saúde, já que “o que de fato é falaciosa é a forma pela qual o argumento tem sido por vezes utilizado, entre nós, como óbice à intervenção judicial e desculpa genérica para uma eventual omissão estatal no campo da efetivação dos direitos fundamentais, especialmente daqueles de cunho social”.

Assim, afigura-se prudente a manutenção da decisão impugnada quanto ao ponto.

No mais, assiste razão à União.

Registro, em primeiro lugar, que o prazo de concedido para cumprimento da ordem - que inclui cotação do fármaco - é por demais exíguo; assim, concedo à União trinta dias para cumprimento da ordem a contar da intimação desta decisão.

Destaco, em segundo lugar, que tenho ciência de que este Tribunal tem fixado, em casos tais, o valor da multa diária em R$ 100,00; observo, contudo e considerando a absoluta prioridade do direito à saúde - corolário do direito à vida -, que me parece adequado a fixação do valor diário de R$ 200,00 para o caso de descumprimento.

Assim, defiro apenas em parte o pedido de efeito suspensivo da União para elastecer o prazo para cumprimento da ordem e reduzir o valor das astreintes.

Não há motivos para alterar o que decidido em sede liminar.

Registro, então, que, após a decisão acima transcrita, o Sistema Único de Saúde incorporou o Spinraza para tratamento de Atrofia Muscular Espinhal (AME) tipo I para pacientes com diagnóstico genético confirmatório que não estejam em ventilação mecânica invasiva permanente (Portaria 24, de 24 de abril de 2019), contrariando, em princípio, série de Pareceres Técnicos que vinham afirmando, reiteradamente, a inexistência de evidências suficientes para indicação da droga.

Seja como for, o fato é que este Tribunal não está atrelado às indicações estabelecidas pelo Sistema Único de Saúde: grande parte dos fármacos que vimos deferindo não estão incorporados no âmbito do SUS e, algumas vezes, sequer possuem registro na ANVISA.

Assim, frente à existência, repito, de evidências científicas dando conta da indicação do fármaco também para pacientes portadores de AME tipo I em uso de ventilação mecânica permanente, aliado à declaração, trazida na origem (e. 139, DECL2) e firmada pela Coordenadora da UTI Pediátrica do Hospital Regional do Oeste, indicando a manutenção de "hipotonia muscular em melhora após início do Spinraza", mantenho o que decidido preambularmente quanto ao mérito.

Aponto, tão-somente, que o valor da multa diária deverá ser ajustada para R$ 100,00 (cem reais), nos termos definidos por esta Turma Regional Suplementar para casos desse jaez.

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao agravo de instrumento apenas para reduzir o valor das astreintes, prejudicado o agravo interno apresentado pela União.

Mantenho a sentença quanto ao mérito.

No que toca aos honorários advocatícios, assiste razão aos recorrentes.

Tratando-se de causa relacionada à garantia do direito à saúde, cujo valor material é inestimável, correta a aplicação do § 8º do art. 85 do novo CPC, que remete à apreciação equitativa considerando os incisos do § 2º do artigo citado (grau de zelo profissional, lugar da prestação do serviço, natureza e importância da causa, trabalho realizado pelo advogado e tempo exigido para o seu serviço).

Assim, frente à complexidade do caso concreto, reduzo a verba honorária para R$ 5.000,00 (cinco mil reais), pro rata.

Finalmente, e considerando a informação lida no sítio do Ministério da Saúde1 dando conta de que "medicamentos que representam elevado impacto financeiro para o Componente, [e] aqueles indicados para as doenças com tratamento mais complexo (...)" compõem o grupo 1 e são de responsabilidade financeira exclusiva da União (nos mesmos termos, aliás, do disposto no § 3º do art. 540 da Portaria de Consolidação nº 6, de 28 de setembro de 2017), e que o fármaco objeto do processo (Spinraza®) está, indubitavelmente, abrangido nesse grupo, caberá à União fornecer a droga, sem prejuízo de eventual redirecionamento em caso de descumprimento.

III - Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa necessária e por dar parcial provimento às apelações.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001779091v13 e do código CRC b838dec0.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 5/6/2020, às 18:40:11


1. https://www.saude.gov.br/assistencia-farmaceutica/medicamentos-rename/componente-especializado-da-assistencia-farmaceutica-ceaf

5009462-39.2018.4.04.7202
40001779091.V13


Conferência de autenticidade emitida em 12/07/2020 12:35:45.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5009462-39.2018.4.04.7202/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU)

APELADO: DAVI TEIXEIRA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

APELADO: EDRIANE MARIA BIANCHET TEIXEIRA (Pais) (AUTOR)

VOTO DIVERGENTE

O eminente Relator entende por bem não conhecer da remessa necessária, assim como dar parcial provimento às apelações da União e do Estado de Santa Catarina, nos seguintes termos:

I - Tendo sido o presente feito sentenciado na vigência do atual CPC, não há falar em remessa oficial, porquanto foi interposto recurso voluntário pelos réus, o que vai de encontro ao disposto no art. 496, § 1º, do NCPC [Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á.].

Com efeito, a redação do art. 496, § 1º, do CPC/2015 é clara e inequívoca, não admitindo o seu texto outra interpretação, que seria ampliativa do condicionamento do trânsito em julgado da sentença ao reexame necessário. Trata-se de instituto amplamente criticado por ser desnecessário no atual estágio de evolução das Procuradorias Públicas. É excepcional, e por isso mesmo deve ser interpretado restritíssimamente, consoante recente julgado do Egrégio TJRS:

REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. ACIDENTE DE TRABALHO. DESCABIMENTO DO DUPLO GRAU OBRIGATÓRIO DE JURISDIÇÃO. INCOMPATIBILIDADE LÓGICA ENTRE REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO FAZENDÁRIA NA SISTEMÁTICA PROCESSUAL NOVA (ART. 496, § 1º, DO CPC VIGENTE). REMESSA NÃO CONHECIDA. AUXÍLIO-ACIDENTE. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO NA ESPÉCIE. REDUÇÃO FUNCIONAL SUFICIENTEMENTE EVIDENCIADA. 1. Reexame necessário. De acordo com o artigo 496 ,§ 1º, do novo Código de Processo Civil, é descabida a coexistência de remessa necessária e recurso voluntariamente interposto pela Fazenda Pública. Com efeito, a nova codificação processual instituiu uma lógica clara de mútua exclusão dos institutos em referência, resumida pela sistemática segundo a qual só caberá remessa obrigatória se não houver apelação no prazo legal; em contrapartida, sobrevindo apelo fazendário, não haverá lugar para a remessa oficial. Precedentes doutrinários. Caso em que a apelação interposta pelo ente público dispensa o reexame oficioso da causa. Remessa necessária não conhecida. [...]. REEXAME NECESSÁRIO NÃO CONHECIDO. APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE E, NESTA, DESPROVIDA. (Apelação e Reexame Necessário Nº 70076942127, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Eduardo Richinitti, Julgado em 30/05/2018) (Grifei).

Dessarte, o reexame necessário, não tem o mínimo cabimento quando há apelação, parcial ou total, da Fazenda Pública, estando sua obrigatoriedade, como condição para o trânsito em julgado da sentença, dependente da ausência de recurso da Fazenda Pública, consoante decisão unânime deste Colegiado (50102085220184049999, j. 12-12-2018).

II - Não há motivos para alterar o que decido na origem.

Registro, é verdade, que recentemente aderi à posição lançada pelo Desembargador Federal Celso Kipper quando do julgamento da Apelação nº 5000428-25.2018.4.04.7207, juntado aos autos em 06/03/2020. Na ocasião, concordei com Sua Excelência quando afirmou que inexiste "segurança ou comprovação de eficácia da medicação pleiteada para o caso específico da parte autora, que faz uso de traqueostomia", situação em tudo similar ao processo agora julgado.

Contudo, quando do julgamento do Agravo de Instrumento 5008919-74.2019.4.04.0000 (recurso relacionado a este processo, apreciação concluída em 09 de outubro de 2019), de minha relatoria e na honrosa companhia do Desembargador Federal Jorge Antonio Maurique, trilhamos caminho diverso, orientação essa que deve ser mantida.

Veja-se: não existindo qualquer alteração fática, exige-se, penso eu, um mínimo de coerência na tomada de decisão, e é em nome dessa convergência que reproduzo o que consignei na ocasião como razão de decidir:

Pois bem.

Destaco, de imediato, que este Tribunal fixou, levando em conta a assim chamada Medicina Baseada em Evidências, os seguintes requisitos para deferimento do medicamento Spinraza® (por exemplo, TRF4, AG 5032251-07.2018.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 14/12/2018):

(a) possuir atrofia muscular espinhal infantil (AME - Tipo 1);

(b) possuir até sete meses de idade no início do tratamento;

(c) possuir no mínimo duas cópias do gene SMN2;

(d) não possuir a necessidade de suporte ventilatório.

Registro, então, que a parte autora, portadora de atrofia muscular espinhal tipo 1, conta com 3 anos e 2 meses de idade e faz uso de suporte de ventilação mecânica, não preenchendo, em linha de princípio, os requisitos estabelecidos judicialmente.

Diante disso, nos autos do AI nº 5002088-10.2019.404.0000 determinei a realização de perícia médica que foi efetivada na origem, sobrevindo, diante das conclusões obtidas, a presente decisão que concede o medicamento. Dessarte, como já me manifestei, os critérios, ditos gerais, podem ser superados levando em conta as especificidades do caso concreto; o que foi atendido na espécie. A tal respeito, a decisão da magistrada a quo assim dispôs:

"Realizada a perícia, a perita judicial respondeu aos quesitos do juízo e das partes, sendo que a conclusão apresentada somente veio corroborar e ratificar a decisão antes proferida por este juízo.

Vejamos as respostas apresentadas aos questionamentos:

(...)

(...)

As demais respostas aos quesitos podem ser acessadas no evento 94.

Assim, o laudo apresentado corrobora que o fármaco pleiteado pela parte autora é o único existente para o tratamento da enfermidade que acomete a parte autora, bem como restou evidente a urgência no início do tratamento, e, acima de dúvidas, a indicação ao caso clínico do autor. Restou evidenciado que o tratamento paliativo ofertado pelo SUS não é suficiente para o tratamento da moléstia, assim como a da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento. O registro na ANVISA do fármaco e a indicação em bula do uso deste para o tratamento da enfermidade que acomete o autor é incontroverso. Por fim, a hipossuficiência do autor, em relação ao custo do tratamento, também resta devidamente comprovada.

Neste contexto, agora ratificada pelas conclusões apresentadas pela perícia médica judicial, é de ser novamente deferida a medida liminar, em relação ao medicamento pleiteado na inicial."

Registro, a partir de excerto transcrito, que o perito judicial é claro ao demonstrar, com fulcro na medicina baseada em evidências, os ganhos no tratamento que a parte autora obterá com a administração da droga solicitada, portadora que é de Atrofia Muscular Espinhal Tipo 1.

Anoto, ainda, que o custo do tratamento em questão - na casa dos milhões de reais - igualmente não impede, frente à existência, repito, de evidências científicas da eficácia do fármaco ao caso concreto, o respectivo fornecimento.

A reserva do possível, seguindo a linha de argumentação de Ingo Wolfgang Sarlet (Comentário ao art. 6º. In: Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013, p. 545), não pode impedir, por si só, a concretização do direito à saúde, já que “o que de fato é falaciosa é a forma pela qual o argumento tem sido por vezes utilizado, entre nós, como óbice à intervenção judicial e desculpa genérica para uma eventual omissão estatal no campo da efetivação dos direitos fundamentais, especialmente daqueles de cunho social”.

Assim, afigura-se prudente a manutenção da decisão impugnada quanto ao ponto.

No mais, assiste razão à União.

Registro, em primeiro lugar, que o prazo de concedido para cumprimento da ordem - que inclui cotação do fármaco - é por demais exíguo; assim, concedo à União trinta dias para cumprimento da ordem a contar da intimação desta decisão.

Destaco, em segundo lugar, que tenho ciência de que este Tribunal tem fixado, em casos tais, o valor da multa diária em R$ 100,00; observo, contudo e considerando a absoluta prioridade do direito à saúde - corolário do direito à vida -, que me parece adequado a fixação do valor diário de R$ 200,00 para o caso de descumprimento.

Assim, defiro apenas em parte o pedido de efeito suspensivo da União para elastecer o prazo para cumprimento da ordem e reduzir o valor das astreintes.

Não há motivos para alterar o que decidido em sede liminar.

Registro, então, que, após a decisão acima transcrita, o Sistema Único de Saúde incorporou o Spinraza para tratamento de Atrofia Muscular Espinhal (AME) tipo I para pacientes com diagnóstico genético confirmatório que não estejam em ventilação mecânica invasiva permanente (Portaria 24, de 24 de abril de 2019), contrariando, em princípio, série de Pareceres Técnicos que vinham afirmando, reiteradamente, a inexistência de evidências suficientes para indicação da droga.

Seja como for, o fato é que este Tribunal não está atrelado às indicações estabelecidas pelo Sistema Único de Saúde: grande parte dos fármacos que vimos deferindo não estão incorporados no âmbito do SUS e, algumas vezes, sequer possuem registro na ANVISA.

Assim, frente à existência, repito, de evidências científicas dando conta da indicação do fármaco também para pacientes portadores de AME tipo I em uso de ventilação mecânica permanente, aliado à declaração, trazida na origem (e. 139, DECL2) e firmada pela Coordenadora da UTI Pediátrica do Hospital Regional do Oeste, indicando a manutenção de "hipotonia muscular em melhora após início do Spinraza", mantenho o que decidido preambularmente quanto ao mérito.

Aponto, tão-somente, que o valor da multa diária deverá ser ajustada para R$ 100,00 (cem reais), nos termos definidos por esta Turma Regional Suplementar para casos desse jaez.

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao agravo de instrumento apenas para reduzir o valor das astreintes, prejudicado o agravo interno apresentado pela União.

Mantenho a sentença quanto ao mérito.

No que toca aos honorários advocatícios, assiste razão aos recorrentes.

Tratando-se de causa relacionada à garantia do direito à saúde, cujo valor material é inestimável, correta a aplicação do § 8º do art. 85 do novo CPC, que remete à apreciação equitativa considerando os incisos do § 2º do artigo citado (grau de zelo profissional, lugar da prestação do serviço, natureza e importância da causa, trabalho realizado pelo advogado e tempo exigido para o seu serviço).

Assim, frente à complexidade do caso concreto, reduzo a verba honorária para R$ 5.000,00 (cinco mil reais), pro rata.

Finalmente, e considerando a informação lida no sítio do Ministério da Saúde1 dando conta de que "medicamentos que representam elevado impacto financeiro para o Componente, [e] aqueles indicados para as doenças com tratamento mais complexo (...)" compõem o grupo 1 e são de responsabilidade financeira exclusiva da União (nos mesmos termos, aliás, do disposto no § 3º do art. 540 da Portaria de Consolidação nº 6, de 28 de setembro de 2017), e que o fármaco objeto do processo (Spinraza®) está, indubitavelmente, abrangido nesse grupo, caberá à União fornecer a droga, sem prejuízo de eventual redirecionamento em caso de descumprimento.

III - Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa necessária e por dar parcial provimento às apelações.

Concessa maxima venia, dissinto da solução alvitrada por Sua Excelência, a fim de acolher a pretensão recursiva da União para, no mérito, reformar a sentença impugnada, obstando que os réus sejam obrigados a fornecer à parte autora, de forma solidária e gratuita, o medicamento NUSINERSENA (Spinraza) para tratamento de Atrofia Muscular Espinhal (AME) do tipo I (CID 10 G12.1) da qual é portadora.

Explico.

Embora o medicamento NUSINERSENA (Spinraza) tenha sido incorporado ao SUS, seu fornecimento gratuito pelo Poder Público, nos termos do artigo 1º da Portaria MS/SCTIE n.º 24, de 24 de abril de 2019, restou limitado a pacientes com diagnóstico genético confirmatório de atrofia muscular espinhal (AME) do tipo 1 e que não estejam em ventilação mecânica invasiva permanente.

Verifico, pois, que o Ministério da Saúde, chancelando os desfechos clínicos alusivos aos escassos estudos científicos ainda existentes sobre a medicação requerida, tratou - a meu ver, com acerto - de restringir a dispensação da droga a um certo grupo populacional para o qual a eficácia farmacológica encontra-se até então direcionada. A esse respeito, replico a literatura científica constante do Relatório de Recomendação da CONITEC:

[...]

Pechmann et al., 2018 - Tipo 1

Pechmann e colaboradores (2018) conduziram um estudo de coorte concorrente multicêntrico na Alemanha, com 61 pacientes diagnosticados geneticamente com AME 5q tipo I e em uso de nusinersena. [...] As crianças que necessitavam de suporte ventilatório permanente ou traqueostomia antes do tratamento apresentaram menores escores CHOP INTEND na linha de base e, consequentemente, menores melhoras ao final do estudo.

[...]

Farrar et al., 2018

Farrar e colaboradores (2018) conduziram um estudo de coorte prospectivo multicêntrico com 16 pacientes com diagnóstico genético de AME 5q tipo I que receberam nusinersena do EAP da Austrália. [...] Na linha de base, todos os pacientes diagnosticados durante o EAP alimentavam-se por via oral e não necessitavam de suporte ventilatório.

[...]

6.5 CONCLUSÃO SOBRE AS EVIDÊNCIAS SELECIONADAS NA NOVA BUSCA

Dois ECR, um estudo de extensão e seis relatos de coorte foram encontrados. Dos ECR, um avaliou o uso de nusinersena em pacientes com AME de início precoce (ou tipo 1) e o outro AME de início tardio.

O ECR avaliando AME 5q tipo 1 (ENDEAR) incluiu apenas pacientes com início dos sintomas até os seis meses de idade e encontrou diferenças estatisticamente significantes entre o grupo em uso do medicamento e o controle no desfecho primário melhora do escore HINE 2. O mesmo foi observado em alguns secundários, como sobrevida livre de evento, CHOP INTEND e morte. Já para os desfechos proporção de pacientes que passaram a requerer ventilação mecânica e incidência de EA não houve diferença estatisticamente significante entre os dois grupos. Quando feita uma análise de subgrupo entre crianças com menos de 13 semanas de duração da doença versus com mais de 13 semanas, observou-se que aquelas com menor tempo de duração tiveram melhor resultado em uso do nusinersena em relação à mortalidade e uso de ventilação mecânica.

[...](Disponível em: http://conitec.gov.br/images/Consultas/Relatorios/2019/Relelatorio_Nusinersena_AME5q_CP_12_2019.pdf, sem o grifo no original)

A propósito, cito as informações contidas na Nota Técnica n.º 169/2018, subscrita pelo NAT-Jus/TJCE:

3) Eficácia do medicamento e evidências científicas.

[...]

O Canadian Drug Expert Committee (CDEC) do CADTH recomenda o reembolso do medicamento nusinersen para tratamento da AME, desde que alguns critérios sejam seguidos, tais como, comprovação genética, duração da doença de menos de 26 semanas com início dos sinais e sintomas clínicos compatíveis com AME após a primeira semana do nascimento, ou antes dos sete meses de idade. Além disso, o paciente não pode estar em uso de ventilação invasiva permanente. Ademais, o tratamento deve ser descontinuado se, antes da quinta dose ou de todas as doses subsequentes, não houver demonstração de manutenção ou de melhora da função do marco motor ou se for necessária ventilação invasiva permanente. Ressalte-se também que o paciente deve estar sob cuidado de um especialista com experiência no diagnóstico e manejo da AME, sendo este profissional o responsável pela coleta de dados de evidências de mundo real do uso do nusinersen para tratamento do AME[...] (Disponível em: https://www.tjce.jus.br/nota-tecnica/page/12/, sem o grifo no original)

Na mesma linha de conta, o NATJus-TJMG, por meio da Nota Técnica n.º 642/2018, referiu que:

Os estudos apresentam limitações e incertezas quanto a duração do tratamento, os efeitos da droga a longo prazo e quanto a definição de critérios de eleição para indicação do tratamento e qual população realmente se beneficiará do uso da droga. (Disponível em: https://bd.tjmg.jus.br/jspui/handle/tjmg/9039, sem o grifo no original)

Na hipótese sub examine, o autor, que conta atualmente com 4 (quatro) anos de idade, embora seja portador de AME do tipo 1, faz uso de suporte de ventilação mecânica invasiva permanente (traqueostomia), não sendo eletivo, a meu entender, ao tratamento reclamado às custas do Poder Público, uma vez que eventuais benefícios, nesta condição clínica, são incertos ou pouco expressivos. Além do que a própria perita judicial, especialista em neuropediatria, admitiu que mais estudos a longo prazo são necessários para elucidar os benefícios do uso nos casos de pacientes em ventilação mecânica (evento 94, LAUDO1, fl. 06, dos autos originários).

Ora, não atestada, com a segurança científica necessária, a relevância da suposta melhoria terapêutica ocasionada pelo uso da medicação requerida em face de pacientes que necessitam de ventilação mecânica invasiva, a imprescindibilidade do medicamento, na espécie vertente, resta, a meu sentir, comprometida, a impedir sua dispensação pelo Estado.

Ressalto que em duas ocasiões em que esta Turma apreciou a possibilidade de concessão gratuita do remédio em comento - vide Agravo Interno em Agravo de Instrumento n.º 5043217-29.2018.4.04.0000 e Agravo Interno em Pedido de Efeito Suspensivo à Apelação n.º 5039981-69.2018.4.04.0000, ambos de relatoria do eminente Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz -, o deferimento judicial alcançou apenas portadores de AME do tipo 1 que não estavam em ventilação mecânica ou que estavam sob ventilação mecânica não-invasiva, não destoando, portanto, do critério restritivo acertadamente adotado pelo Ministério da Saúde.

Não desconheço que esta TRS-SC, nos autos do Agravo de Instrumento n.º 5008919-74.2019.4.04.0000, vinculado a este processo, decidiu, por maioria, negar provimento ao recurso interposto pela União para manter a tutela provisória outorgada no primeiro grau. Nada obstante, adiro aos termos do voto vencido lançado naquele feito pela ilustre Juíza Federal Gabriela Pietsch Serafin, que provia o agravo do ente federal para obstar a dispensação medicamentosa pelo Poder Público, resultado que, de igual modo, entendo cabível neste instante.

Também quando do julgamento da Apelação n.º 5011431-95.2018.4.04.7200, realizado sob a égide deste Colegiado ampliado, o Desembargador Federal Osni Cardoso Filho, em judicioso voto, referiu que embora os estudos científicos relatados tenham sido direcionados a uma população mais jovem, a contraindicação se dá para pacientes com dificuldades respiratórias e que utilizam ventilação mecânica (evento 30), a corroborar, portanto, o acolhimento do recurso da União.

Acrescento que a Quinta Turma deste Regional (Apelação n.º 5048103-14.2018.4.04.7100, Relator Juiz Federal Altair Antônio Gregório, j. 22-10-2019) concluiu, em uníssono, nos termos do voto condutor do aresto, que a parte somente faria jus à provisão farmacológica porque seu suporte ventilatório não ostentava caráter de permanência, a saber (evento 41, RELVOTO2):

Todavia, por conta da Portaria SCTIE nº 24, de 24 de abril de 2019, foi incorporado o Nusinersen para portadores de AME 5q, tipo I, para pacientes com diagnóstico genético confirmatório que não estejam em ventilação mecânica invasiva permanente de modo ininterrupto. Observa-se que os condicionantes presentes na recomendação inicial foram mitigados na incorporação, de modo que a limitação de idade inicialmente presente foi eliminada.

Entretanto, o laudo pericial ratifica que a autora respira mediante traqueostomia (evento 56) e, muito embora o perito discuta os resultados das pesquisas quanto à ventilação mecânica (evento 66), observa-se que utiliza-se dos mesmos estudos apreciados pela CONITEC na portaria de incorporação, não tendo logrado reunir corpo de evidências que supere o corpo de evidências reunido pela referida comissão.

No caso concreto, todavia, a autora apresenta as condições eleitas pela incorporação, uma vez que a ventilação mecânica da autora está sendo retirada, ou seja, não é permanente (evento 7).

Aliás, como já salientado pelo ilustre Relator, o precedente unânime mais recente deste Órgão Julgador é justamente no sentido de reconhecer a ausência de evidências científicas robustas acerca da eficácia do Spinraza em indivíduos com necessidade de suporte ventilatório permanente. Vejamos:

APELAÇÃO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. ATROFIA MUSCULAR ESPINHAL. AUSÊNCIA DE EVIDÊNCIAS CIENTÍFICAS ROBUSTAS ACERCA DA EFICÁCIA DO NUSINERSENA (SPINRAZA) PARA INDIVÍDUOS COM NECESSIDADE DE SUPORTE VENTILATÓRIO PERMANENTE. 1. O direito à saúde se traduz em um direito subjetivo público dos indivíduos de exigir do Estado prestações positivas, passíveis de garantia pela via judicial. Nesse aspecto, a velha concepção de que os preceitos constitucionais alusivos à matéria encerrariam diretrizes de caráter meramente programático restou há muito superada em face da necessidade imperiosa de que as normas definidoras das prerrogativas fundamentais, a exemplo dos direitos à vida e à saúde, tenham aplicação imediata, nos termos do artigo 5º, §1º, da Magna Carta, o que autoriza, por consectário, a interferência do Poder Judiciário, quando chamado a atuar, na concretização de tais direitos. 2. A imprescindibilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência, do esgotamento ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS. 3. Embora o medicamento NUSINERSENA (Spinraza) tenha sido incorporado ao SUS, seu fornecimento gratuito pelo Poder Público, nos termos do artigo 1º da Portaria MS/SCTIE n.º 24, de 24 de abril de 2019, restou limitado a pacientes com diagnóstico genético confirmatório de atrofia muscular espinhal (AME) do tipo 1 e que não estejam em ventilação mecânica invasiva permanente. 4. In casu, o perito judicial afirmou, categoricamente, inexistir segurança ou comprovação de eficácia da medicação pleiteada para o caso específico da parte autora, que faz uso de traqueostomia. (TRF4, AC 5000428-25.2018.4.04.7207, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 06/03/2020)

Doutro vértice, valendo-me ainda da Nota Técnica n.º 642/2018, subscrita pela NATJUS-TJMG, registro que o Spinraza é uma das drogas mais caras existentes no mundo e o seu tratamento inicial no EUA custa em torno de US$ 750 mil, com custo anual de manutenção de US$ 350 mil. No Brasil estima-se que o custo para tratar cada paciente chega a R$ 2,5 milhões.

Nesse quadrante, entendo não ser dado ao Judiciário desprezar, em absoluto, os custos envolvidos na concretização da assistência farmacêutica, até porque as políticas públicas, notadamente aquelas relativas à saúde, estão assentadas na capacidade financeira do Estado de arcar com as prestações correspondentes.

Acrescento, em face da atual redação do artigo 22 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), dada pela Lei n.º 13.655, de 25 de abril de 2018, ser possível inferir que o legislador pretendeu anexar certo consequencialismo à teoria da decisão judicial, bem como vincular a atividade exegética dos magistrados à ponderação acerca dos obstáculos, das dificuldades reais do gestor e das exigências das políticas públicas, vedando, inclusive, prejuízos aos administrados.

A par de todo o cenário esposado, seja pela medicina baseada em evidências, seja pelo trecho do laudo pericial que corrobora a incerteza quanto aos possíveis benefícios do remédio buscado, seja por seu custo-efetividade, tenho que a pretensão recursal da União merece ser agasalhada para que a demanda seja julgada improcedente e a tutela provisória seja cassada de imediato.

Honorários advocatícios

Considerando que a sentença foi publicada após 18-03-2016, data definida pelo Plenário do STJ para início da vigência do NCPC (Enunciado Administrativo nº 1-STJ), bem como o Enunciado Administrativo n. 7 - STJ (Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC), aplica-se ao caso a sistemática de honorários advocatícios ora vigente.

Ressalto que, em se tratando de causa afeta à garantia do direito à saúde, cujo valor material é inestimável, a incidência da norma contida no artigo 85, §8º, do Novo Código de Processo Civil, revela-se de todo adequada, ficando a cargo do julgador, por apreciação equitativa, o arbitramento da verba honorária.

In casu, invertido o ônus da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), restando suspensa a satisfação respectiva, por ser beneficiária da AJG.

Dispositivo

Ante o exposto, com a devida vênia, voto por não conhecer da remessa necessária e por dar provimento à apelação da União, julgando prejudicado o apelo do Estado de Santa Catarina.



Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001818638v22 e do código CRC d934aef2.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CELSO KIPPER
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5009462-39.2018.4.04.7202
40001818638.V22


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5009462-39.2018.4.04.7202/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU)

APELADO: DAVI TEIXEIRA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

APELADO: EDRIANE MARIA BIANCHET TEIXEIRA (Pais) (AUTOR)

EMENTA

Direito previdenciário. direito da saúde. ATROFIA MUSCULAR ESPINHAL. INCLUSÃO NA POLÍTICA PÚBLICA. NÃO PREENCHIMENTO DOS requisitos. NECESSIDADE DE COERÊNCIA DOS PRONUNCIAMENTOS JUDICIAIS. JULGAMENTO NA FORMA DO ART. 942 DO CPC.

1 - Segundo o entendimento desta Turma Regional Suplementar, conforme a posição lançada pelo Desembargador Federal Celso Kipper quando do julgamento da Apelação nº 5000428-25.2018.4.04.7207, juntado aos autos em 06/03/2020, inexiste "segurança ou comprovação de eficácia da medicação pleiteada para o caso específico da parte autora, que faz uso de traqueostomia".

2 - Contudo, quando do julgamento do agravo de instrumento relacionado a este processo, afirmou-se, por maioria, o direito de a parte ser contemplada com o fármaco em questão (Spinraza®) para tratamento de Ame tipo I em uso de ventilação mecânica invasiva permanente.

3 - Não existindo qualquer alteração fática, exige-se um mínimo de coerência na tomada de decisão, e é em nome dessa convergência que deve ser mantido o que decidido em sede cautelar.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por maioria, vencidos o Desembargador Federal CELSO KIPPER e o Juiz Federal JOÃO BATISTA LAZZARI, não conhecer da remessa necessária e por dar parcial provimento às apelações, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 30 de junho de 2020.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001779092v8 e do código CRC 021c5318.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 5/7/2020, às 21:2:19


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Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 27/05/2020 A 03/06/2020

Apelação/Remessa Necessária Nº 5009462-39.2018.4.04.7202/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER

PROCURADOR(A): WALDIR ALVES

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU)

APELADO: DAVI TEIXEIRA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

ADVOGADO: JOÃO ALBERTO AIMI (OAB SC027396)

ADVOGADO: ANITA MUXFELDT AIMI (OAB SC011879)

APELADO: EDRIANE MARIA BIANCHET TEIXEIRA (Pais) (AUTOR)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 27/05/2020, às 00:00, a 03/06/2020, às 16:00, na sequência 402, disponibilizada no DE de 18/05/2020.

Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

APÓS O VOTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ NO SENTIDO DE NÃO CONHECER DA REMESSA NECESSÁRIA E POR DAR PARCIAL PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES, DA DIVERGÊNCIA INAUGURADA PELO DESEMBARGADOR FEDERAL CELSO KIPPER NO SENTIDO DE NÃO CONHECER DA REMESSA NECESSÁRIA E POR DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA UNIÃO, JULGANDO PREJUDICADO O APELO DO ESTADO DE SANTA CATARINA , E O VOTO DO JUIZ FEDERAL JOÃO BATISTA LAZZARI ACOMPANHANDO A DIVERGÊNCIA, O JULGAMENTO FOI SOBRESTADO NOS TERMOS DO ART. 942 DO CPC/2015.

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Juiz Federal JOÃO BATISTA LAZZARI

ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES

Secretária

MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES

Acompanha a Divergência - GAB. 93 (Des. Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ) - Juiz Federal JOÃO BATISTA LAZZARI.



Conferência de autenticidade emitida em 12/07/2020 12:35:45.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 22/06/2020 A 30/06/2020

Apelação/Remessa Necessária Nº 5009462-39.2018.4.04.7202/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER

PROCURADOR(A): WALDIR ALVES

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU)

APELADO: DAVI TEIXEIRA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

ADVOGADO: JOÃO ALBERTO AIMI (OAB SC027396)

ADVOGADO: ANITA MUXFELDT AIMI (OAB SC011879)

APELADO: EDRIANE MARIA BIANCHET TEIXEIRA (Pais) (AUTOR)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 22/06/2020, às 00:00, a 30/06/2020, às 16:00, na sequência 451, disponibilizada no DE de 10/06/2020.

Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS OS VOTOS DO DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA E DO DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO ACOMPANHANDO O RELATOR, A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR MAIORIA, VENCIDOS O DESEMBARGADOR FEDERAL CELSO KIPPER E O JUIZ FEDERAL JOÃO BATISTA LAZZARI, NÃO CONHECER DA REMESSA NECESSÁRIA E POR DAR PARCIAL PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES

Secretária

MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES

Acompanha o(a) Relator(a) - GAB. 101 (Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO) - Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO.

Acompanho o(a) Relator(a)

Acompanha o(a) Relator(a) - GAB. 61 (Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA) - Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA.

Acompanho o(a) Relator(a)



Conferência de autenticidade emitida em 12/07/2020 12:35:45.

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