
Apelação Cível Nº 5003723-20.2025.4.04.7112/RS
RELATORA Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
RELATÓRIO
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo impetrante diante da sentença que denegou a segurança pela qual requereu fosse declarada a nulidade do ato que indeferiu o pedido de benefício assistencial determinando sua concessão desde a data do respectivo requerimento administrativo.
Em suas razões recursais, relatou o apelante ter sido indeferido o benefício sob o fundamento de que não teria atendido os critérios de deficiência para acesso ao BPC-LOAS. Apontou que a perícia administrativa identificou a existência de impedimento de longo prazo, além da satisfação do critério socioeconômico. Defendeu que, diferentemente da conclusão alcançada pelo juízo de origem, não há necessidade de dilação probatória na medida em que o preenchimento dos requisitos teria sido reconhecido pela própria autarquia em âmbito administrativo. Nessa medida, por atender ao que estabelece a legislação, requereu a reforma da sentença a fim de que seja concedida a segurança pleiteada, deferindo-se tutela especípfica para o fim de imediata implantação do benefício.
Oportunizadas as contrarrazões, o INSS não se manifestou.
Remetidos eletronicamente os autos a este Tribunal, o Ministério Público Federal com assento nesta Corte manifestou-se pelo provimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
Mérito
O mandado de segurança é o remédio cabível para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso do poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça, segundo o art. 1º da Lei n. 12.016/2009.
O direito líquido e certo, por seu turno, é aquele que pode ser comprovado de plano, desafiando prova pré-constituída, já que o mandado de segurança não comporta dilação probatória.
No caso dos autos, o impetrante insurgiu-se contra a decisão administrativa que indeferiu o benefício de prestação continuada requerido por reputar ter sido ilegal a negativa haja vista que o preenchimento dos requisitos legais para sua concessão teriam sido reconhecidos no âmbito do correspondente processo administrativo.
A sentença proferida denegou a segurança a partir dos seguintes fundamentos:
(...)
MÉRITO
O mandado de segurança consiste em instituto de direito processual constitucional que visa garantir a recomposição imediata do direito individual ou coletivo, lesado por ato ilegal ou abusivo de autoridade.
A ação mandamental tem o propósito de afastar a ocorrência de lesão ou ameaça de lesão a direito líquido e certo não amparado por outros remédios constitucionais (habeas corpus e habeas data). Para viabilizar seu processamento, mostra-se necessário que o jurisdicionado, ao fazer uso deste expediente, apresente, no momento do oferecimento da peça vestibular, a chamada "prova pré-constituída"
Segundo Hely Lopes Meirelles (mandado de segurança, 23ª edição, p. 36), quando a lei alude a direito líquido e certo, está exigindo que esse direito se apresente com todos os requisitos para o seu reconhecimento e exercício no momento da impetração. Em última análise, direito líquido e certo "é direito comprovado de plano". Se depender de comprovação posterior, não é líquido e certo, para fins de segurança.
No caso dos autos, o INSS analisou o pedido formulado e indeferiu o benefício, entendendo que o requerente "não atende ao critério de deficiência para acesso ao BPC-LOAS".
O impetrante aponta a contradição da conclusão do INSS ao indeferir o benefício, uma vez que reconhecida a existência de impedimento de longo prazo pela perícia médica.
Apesar dos fundamentos invocados, entendo que não está caracterizado o direito líquido e certo para a concessão da ordem pleiteada.
Cabe salientar que, como bem observa do processo administrativo, a avaliação do direito ao benefício leva em conta não apenas a avaliação médica, mas o conjunto de elementos caracterizadores da deficiência, assim como a avaliação social, para fins de acesso ao benefício assistencial.
No caso, embora confirmada a existência de longo prazo, está claro que o resultado da avaliação conjunta de tais elementos motivou a conclusão de que o impetrante não preenchia os requisitos legais pertinentes (Ev01, Procadm7, p. 47/49):


Nesse caso, embora reconhecida a existência de impedimento de longo prazo, a autoridade impetrada entendeu que esse impedimento, em interação com uma ou mais barreiras, não obstrui sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas.
A desconsideração do critério adotado pela autoridade impõe a reavaliação do conjunto probatório, o que não é cabível em sede de mandado de segurança.
Vê-se, pois, que não há certeza em relação ao direito vindicado, a justificar o ingresso do presente mandamus.
Assim, a impetrante deve valer-se de ação apropriada e não da via estreita do mandado de segurança, que exige direito líquido e certo, definido como o que não admite controvérsia fática. Desse modo, o provimento jurisdicional pretendido deve ser buscado pela via adequada.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. DECISÃO DE INDEFERIMENTO DO BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CRITÉRIO ADOTADO PELA ADMINISTRAÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA. QUESTÃO QUE DEMANDA DILAÇÃO PROBATÓRIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. 1. Conquanto a administração previdenciária haja reconhecido que a Impetrante padece de impedimento de longo prazo, ela não considera que esse impedimento, em interação com uma ou mais barreiras, possa obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas. 2. É esse o critério adotado pela administração previdenciária, que fundamentou adequadamente suas conclusões, quer com se concorde com essa fundamentação, quer dela se discorde. 3. A desconsideração desse critério reclama a realização de nova perícia, entretanto, a via angusta do mandado de segurança não comporta dilação probatória. Apelação desprovida. (TRF4, AC 5000057-57.2024.4.04.7205, NONA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 25/06/2024)
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. RISCO SOCIAL. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS INDENIZAÇÃO PELO VENCIDO. DESCABIMENTO. 1. O mandado de segurança destina-se a proteger direito líquido e certo, a partir de prova pré-constituída, o que impede a superveniente instrução para, no caso, apurar a questão pertinente à existência de deficiência. 2. Incabível a condenação do vencido ao pagamento de verba honorária indenizatória e a condenação ao pagamento de honorários advocatícios em sede de mandado de segurança, a teor do disposto no art. 25 da Lei nº 12.016/09 e nas Súmulas nºs 512 do STF e 105 do STJ. (TRF4, AC 5010218-84.2023.4.04.7004, DÉCIMA TURMA, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 26/06/2024)
III - DISPOSITIVO
Ante o exposto, DENEGO A SEGURANÇA, resolvendo o mérito com base no art. 487, inciso I, do CPC.
(...)
Das razões apresentadas pelo impetrante não se identificam fundamentos aptos a superar a conclusão alcançada pela sentença.
Com efeito, é certo que o §2º do art. 20 da Lei 8.742/93 define que, para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, "considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas".
Em vista disso, foi editada a Portaria Conjunta MDS/INSS nº 2/2015 a qual, ao dispor sobre critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médica da pessoa com deficiência para acesso ao Benefício de Prestação Continuada, definiu em seu art. 8º as seguintes hipóteses nas quais não se reconheceria a qualificação do impedimento de longo prazo e, com isso, indeferir-se-ia o requerimento:
Art. 8º A combinação de qualificadores finais resultantes da avaliação social e da avaliação médica será confrontada com a Tabela Conclusiva de Qualificadores – Anexo IV desta Portaria, para fins de reconhecimento ou não do direito ao beneficio, devendo ser indeferido o requerimento quando:
I - o qualificador final do componente Funções do Corpo for nenhum (N) ou leve (L);
II - o qualificador final do componente Atividades e Participação for nenhum (N) ou leve (L); e
III - as alterações de Funções e/ou Estruturas do Corpo puderem ser resolvidas em menos de 2 (dois) anos, consideradas as condições especificadas no inciso III do art. 7º.
O quadro relativo aos "qualificados finais" do impetrante foi apresentado com o seguinte resultado (E1 - PROCADM7 - p.49):

Assim, na medida em que foi atribuído grau leve para o componente "Funções do Corpo", não há se falar em ilegalidade do indeferimento porque lastrado no disposto no inciso I do art. 8º da Portaria Conjunta MDS/INSS nº 2/2015.
Nessa medida, vota-se por negar provimento ao recurso de apelação interposto.
Encargos Processuais
Sem honorários face ao conteúdo das Súmulas 105 do STJ e 512 do STF, consolidado com sua positivação no ordenamento jurídico pátrio pelo art. 25 da Lei nº 12.016/2009.
Ressalta-se ainda, nesse sentido, ser descabida a fixação de honorários recursais, no âmbito do Mandado de Segurança, com fulcro no §11 do art. 85 do CPC/15, na medida em que tal dispositivo não incide nas hipóteses em que o pagamento da verba, na ação originária, não é devido por ausência de previsão legal, raciocínio já exarado pelo STJ (AgInt no REsp 1507973/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/05/2016, DJe 24/05/2016) e pelo STF (ARE 948578 AgR, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 21/06/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-163 DIVULG 03-08-2016 PUBLIC 04-08-2016).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso de apelação interposto.
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Apelação Cível Nº 5003723-20.2025.4.04.7112/RS
RELATORA Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (BPC-LOAS). CRITÉRIO DE DEFICIÊNCIA. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. RECURSO DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME:
1. Apelação interposta contra sentença que denegou a segurança pleiteada para declarar a nulidade do ato administrativo que indeferiu o pedido de benefício assistencial (BPC-LOAS), com a consequente concessão do benefício desde a data do requerimento administrativo.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:
2. Há duas questões em discussão: (i) a legalidade do indeferimento administrativo do benefício de prestação continuada com base na avaliação da deficiência; e (ii) a existência de direito líquido e certo para a concessão do benefício via mandado de segurança.
III. RAZÕES DE DECIDIR:
3. A sentença denegou a segurança, pois o mandado de segurança exige direito líquido e certo, comprovado de plano, sem dilação probatória, e a controvérsia sobre o preenchimento dos requisitos da deficiência não se enquadra nessa via processual.4. O indeferimento administrativo do benefício foi legal, pois a avaliação conjunta dos elementos caracterizadores da deficiência, incluindo a avaliação social e médica, resultou na atribuição de grau "leve" para o componente "Funções do Corpo", o que, conforme o art. 8º, I, da Portaria Conjunta MDS/INSS nº 2/2015, justifica a negativa do benefício.5. A definição de pessoa com deficiência para fins de BPC-LOAS, nos termos do art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742/1993, considera o impedimento de longo prazo em interação com barreiras que possam obstruir a participação plena e efetiva na sociedade, sendo a avaliação administrativa um conjunto de elementos que não se restringe à perícia médica.6. Não são devidos honorários advocatícios em mandado de segurança, conforme Súmulas 105 do STJ e 512 do STF e art. 25 da Lei nº 12.016/2009, sendo incabível a fixação de honorários recursais, nos termos da jurisprudência do STJ e do STF.
IV. DISPOSITIVO E TESE:
7. Recurso de apelação desprovido.Tese de julgamento: 8. A denegação de benefício assistencial por não preenchimento do critério de deficiência, conforme avaliação administrativa e Portaria Conjunta MDS/INSS nº 2/2015, não configura direito líquido e certo para mandado de segurança, exigindo dilação probatória.
___________
Dispositivos relevantes citados: Lei nº 12.016/2009, arts. 1º e 25; Lei nº 8.742/1993, art. 20, § 2º; Portaria Conjunta MDS/INSS nº 2/2015, art. 8º, I; CPC, arts. 487, inc. I, e 85, § 11.
Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 105; STF, Súmula 512; TRF4, AC 5000057-57.2024.4.04.7205, Rel. Sebastião Ogê Muniz, 9ª Turma, j. 25.06.2024; TRF4, AC 5010218-84.2023.4.04.7004, Rel. Luiz Fernando Wowk Penteado, 10ª Turma, j. 26.06.2024; STJ, AgInt no REsp 1507973/RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 3ª Turma, j. 19.05.2016; STF, ARE 948578 AgR, Rel. Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, j. 21.06.2016.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso de apelação interposto, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de outubro de 2025.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 17/10/2025 A 24/10/2025
Apelação Cível Nº 5003723-20.2025.4.04.7112/RS
RELATORA Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PRESIDENTE Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PROCURADOR(A) VITOR HUGO GOMES DA CUNHA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/10/2025, às 00:00, a 24/10/2025, às 16:00, na sequência 1505, disponibilizada no DE de 08/10/2025.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO.
RELATORA DO ACÓRDÃO Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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