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DIREITO PENAL. ESTELIONATO. DOSIMETRIA. TRF4. 5025466-49.2016.4.04.7000...

Data da publicação: 07/07/2020, 23:35:47

EMENTA: DIREITO PENAL. ESTELIONATO. DOSIMETRIA. 1. Configura o delito de estelionato a conduta de utilizar de vínculos empregatícios fictícios com o intuito de receber indevidamente benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de serviço, induzindo a entidade autárquica em erro. 2. O estelionato previdenciário praticado pelo beneficiário, conforme cita o relator, é crime permanente. 3. Readequação da pena procedida de ofício. (TRF4, ACR 5025466-49.2016.4.04.7000, OITAVA TURMA, Relator para Acórdão LEANDRO PAULSEN, juntado aos autos em 19/10/2018)


APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5025466-49.2016.4.04.7000/PR
RELATOR
:
VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
REL. ACÓRDÃO
:
Des. Federal LEANDRO PAULSEN
APELANTE
:
EVERLI TEREZINHA LANGNER SOCHER
ADVOGADO
:
OSMAR NODARI
:
LUIZ FELIPE JANSEN DE MELLO NODARI
APELADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
EMENTA
DIREITO PENAL. ESTELIONATO. DOSIMETRIA.
1. Configura o delito de estelionato a conduta de utilizar de vínculos empregatícios fictícios com o intuito de receber indevidamente benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de serviço, induzindo a entidade autárquica em erro.
2. O estelionato previdenciário praticado pelo beneficiário, conforme cita o relator, é crime permanente.
3. Readequação da pena procedida de ofício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, vencido parcialmente o relator, negar provimento à apelação e, de ofício, redimensionar a pena privativa de liberdade, nos termos do voto do Des. Federal Leandro Paulsen, que lavrará o acórdão.

Porto Alegre, 13 de dezembro de 2017.
Desembargador Federal Leandro Paulsen
Relator


Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal Leandro Paulsen, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9472109v4 e, se solicitado, do código CRC C3107BCE.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Leandro Paulsen
Data e Hora: 19/10/2018 15:11




APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5025466-49.2016.4.04.7000/PR
RELATOR
:
Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
APELANTE
:
EVERLI TEREZINHA LANGNER SOCHER
ADVOGADO
:
OSMAR NODARI
:
LUIZ FELIPE JANSEN DE MELLO NODARI
APELADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RELATÓRIO
O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de EVERLI TEREZINHA LANGNER SOCHER (nascida em 01-6-1948), imputando-lhe a prática do delito tipificado no artigo 171, § 3º, do Código Penal, em razão dos seguintes fatos (evento 01, DENUNCIA2 do processo originário):
"A denunciada EVERLI TEREZINHA LANGNER SOCHER, agindo dolosamente e consciente da ilicitude de sua conduta, protocolou, no dia 16.10.2008, pedido de aposentadoria por idade n° 41/148.340.235-2, junto à Agência da Previdência Social XV de Novembro, localizada em Curitiba-PR, utilizando-se, para fins de contagem de tempo de serviço, de vínculos empregatícios inexistentes (fictícios) supostamente mantidos pela segurada com as empresas J.J. SERVIÇOS REPROGRÁFICOS LTDA. e CONFEITARIA TRÊS ILHAS LTDA.

A Autarquia Previdenciária, desconhecendo a irregularidade, deferiu a concessão do benefício de aposentadoria, tendo a denunciada EVERLI TEREZINHA LANGNER SOCHER recebido indevidamente benefício previdenciário desde 16.10.2008 (f. 54, evento 1 - AP- INQPOL2 ) até ao menos junho/2013, renovando a fraude a cada mês recebido. Verifica-se, ademais,que não há nos autos informação sobre eventual cancelamento do benefício, fazendo crer que a fraude ainda aconteça.

Conforme apurado pelo INSS, não foi confirmado o vínculo junto a empresa J.J. SERVIÇOS REPROGRÁFICOS LTDA. durante os períodos de 01/1995 a 12/1999. Do mesmo modo, não se confirmou o vínculo da denunciada com a empresa CONFEITARIA TRÊS ILHAS LTDA. durante o período de 01/1995 a 12/1999. Ressalte-se, ainda, a evidente fraude nos vínculos inseridos junto ao CNIS, pois os períodos informados na base de dados da autarquia previdenciária são idênticos em relação às duas empresas. Com isso, concluiu-se que o benefício previdenciário foi concedido irregularmente desde o início, resultando num prejuízo de R$ 82.675,87 (oitenta e dois mil, seiscentos e setenta e cinco reais e oitenta e sete centavos), até o mês de junho/2013, em que foi constatada a irregularidade (f. 52-53, evento 1 - AP-INQPOL2).

Para lograr seu intento criminoso, EVERLI juntou ao requerimento do benefício uma carteira de trabalho com informações ideologicamente falsas, registrando que ela teria trabalhado nas citadas empresas (evento 1 - AP-INQPOL2).

Ademais, EVERLI utilizou-se dos serviços do contador JOEL CALIXTO DE MENEZES , que, por sua vez, foi responsável pela inserção das informações falsas de vínculos trabalhistas fictícios supostamente mantidos pela denunciada com as empresas supramencionadas no cadastro do CNIS da autarquia previdenciária, através da elaboração de GFIP's extemporâneas. Contudo, para que tal prática pudesse ter êxito, JOEL CALIXTO também providenciou a documentação falsa utilizada por EVERLI, gerando a homologação do tempo de serviço, consoante verifica-se na Pesquisa Interna Extemporânea Homologada (evento 1 AP-INQPOL2). Com isso, a fraude empregada em detrimento da autarquia previdenciária resultou na obtenção indevida do benefício previdenciário em favor de EVERLI TEREZINHA LANGNER SOCHER.

A materialidade delitiva restou devidamente comprovada pelo conjunto probatório produzido nos autos de IPL n ° 5033170-50.2015.4.04.7000 , principalmente pelas informações constantes no Processo Administrativo relativo ao benefício previdenciário 41/148.340.235- 2, da segurada EVERLI TEREZINHA LANGNER SOCHER (f. 54-57, evento 1 - AP-INQPOL2) , bem como pelos documentos acostados às f. 14-15, em que constam as inserções fraudulentas dos vínculos empregatícios da denunciada.

A autoria delitiva, por sua vez, restou amplamente evidenciada, inclusive pela contradição entre os depoimentos prestados em sede policial. Isso porque, JOEL CALIXTO DE MENEZES , quando questionado se EVERLI teria efetivamente trabalhado na empresa J.J. SERVIÇOS LTDA. respondeu que não, alegando " ter ocorrido outro equívoco, pois ela, assim como seu amigo Joel, também trabalhou na CONFEITARIA TRÊS ILHAS, e foi equivocadamente registrada na J.J. [...]" (f. 58-59, evento 08) . Todavia, EVERLI TEREZINHA LANGNER SOCHER afirmou em sede policial que não tralhou nas empresas J.J. SERVIÇOS REPROGRÁFICOS LTDA. e CONFEITARIA TRÊS ILHAS LTDA., sendo que no período de 1995 a 1999 não possuía nenhum vínculo empregatício (f. 25-26, evento 06). Sendo assim, resta evidente a fraude utilizada pela denunciada, a fim de obter uma vantagem indevida junto ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Além disso, verifica-se que a empresa J.J. SERVIÇOS REPROGRÁFICOS LTDA., CNPJ 76.469.527/0001-21, com sede em Curitiba-PR, não encontra-se cadastrada no sistema SINTEGRA, da Secretaria da Fazendo do Estado do Paraná. Também, o registro no Cadastro Nacional de Empresas - CNE, que contém informações oriundas da Junta Comercial do respectivo Estado, não possui informações para a citada empresa. No sistema de arrecadação PLENUS constam recolhimentos de contribuições previdenciárias para a empresa até a competência 09/1994, ocorrendo apenas dois recolhimentos posteriores a esta data, em 05/1997 e 06/1997. Da análise desses dados a autarquia previdenciária concluiu que a empresa teria paralisado ou encerrado suas atividades no ano de 1998, sendo reativada bem mais recentemente, provavelmente para o lançamento extemporâneo dos vínculos empregatícios fraudulentos junto ao sistema CNIS. Aliás, em depoimento (evento 4) JOEL CALIXTO DE MENEZES, proprietário da empresa J.J Serviços Ltda., confirmou que houve o encerramento das atividades comerciais em 1995.

Não obstante, a empresa CONFEITARIA TRÊS ILHAS LTDA, CNPJ 76.500.933/0001-00, com sede em Curitiba-PR, encontra-se em situação cadastral baixada desde 31.12.2008. No cadastro da Secretaria da Fazenda do Estado do Paraná, a empresa encontra-se baixada desde 08/2006. Do mesmo modo, perante o cadastro CNE, a empresa encontra-se cancelada. Ainda, no sistema de arrecadação PLENUS, constam recolhimentos de contribuições previdenciárias para a empresa até a competência de 06/1996, sendo que os últimos recolhimentos são de pequeno valor. Por fim, no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, constam informações RAIS para empresa até o exercício de 1996, o que resultou na conclusão de que a empresa teria paralisado suas atividades já no ano de 1996, sendo inautêntico, portanto, o período cadastrado como vínculo empregatício da denunciada durante 01/1995 a 12/1999."

A peça incoativa foi recebida em 20-6-2016 (evento 04, idem).
Instruído o feito, com alegações finais, sobreveio sentença (evento 81, idem), disponibilizada na plataforma eletrônica em 07-8-2017, julgando procedente a pretensão deduzida na exordial acusatória para condenar EVERLI pela prática do delito disposto no artigo 171, §3º, do Estatuto Repressivo, à pena privativa de liberdade de 02 (dois) anos e 02 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e 180 (cento e oitenta) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente em junho de 2013, atualizado, substituída a reprimenda corporal por duas penas restritivas de direitos, consubstanciadas em prestação de serviço à comunidade e prestação pecuniária no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais). Ainda, fixada a reparação de danos no montante de R$82.675,87 (oitenta e dois mil seiscentos e setenta e cinco reais e oitenta e sete centavos).
Irresignada, a defesa interpôs recurso de apelação requerendo a absolvição da ré por atipicidade da conduta, em razão da ausência de dolo (evento 87, idem).

Com contrarrazões (evento 95, idem), ascenderam os autos a este Regional.
O representante do Ministério Público Federal atuante nesta instância ofereceu parecer manifestando-se pelo desprovimento do recurso (evento 05).
É o relatório.

À revisão.
Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Relator


Documento eletrônico assinado por Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9211352v4 e, se solicitado, do código CRC DC555F14.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Victor Luiz dos Santos Laus
Data e Hora: 05/09/2018 23:52




APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5025466-49.2016.4.04.7000/PR
RELATOR
:
Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
APELANTE
:
EVERLI TEREZINHA LANGNER SOCHER
ADVOGADO
:
OSMAR NODARI
:
LUIZ FELIPE JANSEN DE MELLO NODARI
APELADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
VOTO
A controvérsia trazida a este Colégio cinge-se à condenação de EVERLI TEREZINHA LANGNER SOCHER pela prática do crime previsto no artigo 171, §3º, do Código Penal.
1. Contextualização dos fatos
Na espécie em julgamento, consta da peça vestibular que, de 16-10-2008 a junho de 2013, a denunciada teria obtido, em seu favor, vantagem ilícita, consistente no recebimento indevido de valores do aposentadoria por idade, utilizando-se, para fins de contagem de tempo de serviço vínculos empregatícios inexistentes supostamente mantidos pela segurada com as empresas J.J Serviços Reprográficos Ltda. e Confeitaria Três Ilhas Ltda., induzindo e mantendo em erro o Instituto Nacional do Seguro Social, em prejuízo ao erário público.
2. Prescrição
Passo ao exame de eventual ocorrência da prescrição retroativa pela pena em concreto, de ofício, na medida em que, em se tratando de recurso exclusivo da defesa, não pode resultar deste julgamento um desfecho desfavorável à sua situação jurídica consolidada nos autos, sob pena de reformatio in pejus.
Nesse sentido, o limite de devolução do apelo, impede que o cômputo do lapso prescricional seja feito de forma diversa daquela que terminou por transitar em julgado para a acusação, muito embora o entendimento desta Corte, alinhado ao do Supremo Tribunal Federal, seja de que o delito de estelionato em detrimento do erário público possui duas facetas (Habeas Corpus 99.112 e 91.716): constitui crime (eventualmente) permanente em relação ao beneficiário do engodo, cujos efeitos, por isso, protraem-se no tempo; e consubstancia-se delito instantâneo quanto ao terceiro que viabiliza a fraude.
No caso em apreço, o delito seria considerado permanente, haja vista ter sido a acusada a própria beneficiária da fraude, a qual estendeu-se até o último recebimento do pagamento indevido, que se operou em junho de 2013.
Todavia, tendo sido reconhecido que os delitos foram praticados em continuidade delitiva, conclusão imune à revisão deste Colegiado como acima mencionado, tal fato projeta importantes reflexos sobre o tratamento da prescrição.
Com efeito, a prescrição penal é instituto de natureza material, de modo que a alteração introduzida no Código Penal pela Lei 12.234, publicada em 6-5-2010, não se aplica a fatos ocorridos em momento pretérito à sua vigência, em observância à anterioridade da lei penal.
Ademais, é computada isoladamente, ou seja, sem o acréscimo decorrente da continuação, e sem a comunicação dos efeitos da norma penal mais grave sobre toda a série continuada, mas considerando-se apenas os delitos que sobejarem à sua vigência, tudo na forma combinada dos enunciados sumulares 497 e 711 do Supremo Tribunal Federal.
No caso concreto, a acusada foi condenada a 2 (dois) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão pela percepção indevida do benefício previdenciário no período de 16-10-2008 a junho de 2013, e a exordial foi recebida em 20-6-2016 (evento 4, do processo originário).
Assim, excluindo-se o acréscimo resultante da continuidade delitiva (dois terços), tem-se que a pena remanescente, 1 (um) ano e 4 (quatro) meses, fica aquém de 2 (dois) anos, atraindo o prazo prescricional de 4 (quatro) anos, a teor do inciso V, do artigo 109, do Código Penal.
Nesse passo, no que tange aos fatos compreendidos entre 16-10-2008 a 5-5-2010, o prazo de 4 (quatro) anos, referente à prescrição retroativa pela pena em concreto, é computado não apenas a contar do recebimento da denúncia, mas, também, da data dos fatos até essa, ao passo que, em relação aos fatos situados de 6-5-2010 a 30-6-2013, apenas a contar desse último marco temporal, de forma prospectiva.
Nesse horizonte, a pretensão punitiva remanesce hígida apenas com relação ao conjunto de fatos verificados entre 6-5-2010 e 30-6-2013, pois o transcurso do quatriênio não se consumou de 20-6-2016, data do recebimento da peça incoativa, até 7-8-2017, data da publicação do decreto condenatório, e nem desta até o presente julgamento.
3. Imputação penal
O delito atribuído à ré encontra-se assim descrito no Código Penal:
"Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.
§ 3º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência."
Destarte, para a subsunção de determinada conduta ao tipo penal acima descrito, exige-se a presença dos seguintes elementos objetivos:
"1º) o emprego, pelo agente, de artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento; 2º) induzimento ou manutenção da vítima em erro; 3º) obtenção de vantagem patrimonial ilícita pelo agente; 4º) prejuízo alheio (do enganado ou de terceira pessoa). Portanto, mister se faz que haja o duplo resultado (vantagem ilícita e prejuízo alheio) relacionado com a fraude (ardil, artifício etc.) e o erro que esta provocou." (DELMANTO, Celso et alli. Código penal comentado. 6ª ed. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 396)
Assim, a conduta imputada à acusada se amolda perfeitamente ao tipo penal do estelionato (artigo 171, §3º, do Código Penal), considerando a narrativa de obtenção de vantagem ilícita, consubstanciada no recebimento indevido de aposentadoria por idade, no período de 6-5-2010 a 30-6-2013, em prejuízo do Instituto Nacional do Seguro Social, mantendo intencionalmente em erro a referida Autarquia Previdenciária ao utilizar, para fins de contagem de tempo de serviço, vínculos empregatícios inexistentes, causando prejuízo ao erário.
4. Materialidade
A materialidade da infração penal em julgamento restou demonstrada pelos seguintes elementos:
(a) Cópia do processo administrativo que concedeu o benefício previdenciário à ré (evento 1, AP-INQPOL2, fls. 1-34, do Inquérito Policial nº 1587/2015-4-SR/PF/PR);
(b) Relatório de Informação nº 17/2013/14099/APEGR/SE/MPS/12 JUN 2013 (idem, fls. 40-43);
(c) Relatório de Informação nº 18/2013/14099/APEGR/SE/MPS/ 12 JUN 2013 (idem, fls. 44-47);
(d) Relação de Crédito (idem, fls. 50-51);
(e) Termo de Declarações da acusada à autoridade policial, conforme consta (evento 06, DESP1, fl.13, idem):
"QUE requereu benefício de aposentadoria por idade no INSS em 2008, quando completou 60 anos QUE requereu o benefício sozinha, sem auxílio de intermediários QUE nada pagou para outra pessoa, pois ninguém lhe auxiliou no requerimento de benefício QUE a sua CTPS está retina do INSS, tendo entregue após receber uma cartinha solicitando a entrega do documento QUE trabalhou no SESC, APADEVI e SERVEÍCULOS, não se recordando as datas QUE não trabalhou nas empresas JJ SERVIÇOS REPROGRÁFICOS S/C LTDA. e CONFEITARIA TRÊS ILHA LTDA. QUE inquirida sobre o fato de tais vínculos contarem na sua CTPS e no requerimento de benefício, esclarece que foi JOEL CALIXTO DE MENEZES o responsável por inserir tais vínculos em sua CTPS QUE JOEL é cunhado do marido da declarante CELSO PEDRO SOCHER, e pediu para que a declarante 'olhasse' o seu escritório de contabilidade enquanto estava fora, residindo no exterior, sendo que para tanto registraria a declarante para que houvesse recolhimento previdenciário no período QUE somente depois a declarante verificou que havia sido registrada na empresa CONFEITARIA TRÊS ILHAS, ficando indignada com tal fato QUE inquiriu JOEL sobre tal fato sendo que o mesmo respondeu que os recolhimentos estavam sendo feitos através de tal empresa, pois o proprietário seria seu amigo e que fazia a contabilidade de tal empresa, sendo que tal prática não acarretaria problemas para a declarante QUE no final das contas não teve envolvimento com o escritório de JOEL, pois não aceitou tais condições, tendo pedido sua CTPS de volta QUE nunca recebeu qualquer remuneração de JOEL QUE neste período de 1995 a 1999, portanto, não trabalhava sendo dona de casa QUE não conhece os proprietário da empresa CONFEITARIA TRÊS ILHAS, BELMIRO DO NASCIMENTO OLIVEIRA e AMILCAR DOS SANTOS OLIVEIRA QUE não conhece JOEL RODRIGUES DA SILVA e os demais citados nas fls. 38 e 42 do Apenso X, exceto LUCIANO DE MENEZES, que provavelmente é o filho de JOEL QUE nada pagou para JOEL, para se apresentar QUE tais vínculos acima referido não foram inseridos na sua CTPS e informados ao INSS propositalmente para fraudar o INSS e obter o benefício indevidamente." (grifos originais e nossos)
(f) Termo de Declarações de Joel Calixto de Menezes à Polícia Federal, no qual narra as seguintes circunstâncias quanto aos registros empregatícios da ré (evento 8, DESP1, fls.2-4, idem):
"QUE perguntado sobre quem seria EVERLI TEREZINHA LANGER SOCHER, tem a dizer que seria sua concunhada, sendo cunhada de sua esposa; QUE perguntado se ela foi funcionária da J;J SERVIÇOS REPROGRÁFICOS, diz que não; QUE não participou de seu requerimento de aposentadoria, e nem sabia que ela estava aposentada; QUE perguntado sobre as razões de ela ter sido incluída na CNIS da J.J SERVIÇOS REPROGRÁFICOS, diz que deve ter ocorrido outro equívoco, pois ela, assim como seu amigo JOEL, também trabalhou na CONFEITARIA TRÊS ILHAS, e foi equivocadamente registrada na J.J; QUE 'deve ter mais gente ainda'; QUE perguntado se não acha que isso é muita coincidência, diz que 'sim, mas o que que eu vou fazer?'; QUE não sabe por quanto tempo ela trabalhou na panificadora, e acredita que ela era caixa"
(g) Termo de Declarações de Cirlene Socher à autoridade policial (idem, fls. 5-6);
(h) Relatório Final do Delegado de Polícia Federal (evento 12, REL_FINAL_IPL1, idem).
Os documentos acima elencados atestam a efetiva ocorrência do delito em comento, uma vez que a ré recebeu proventos de aposentadoria por idade (NB 1483402352), de 6-5-2010 a 30-6-2013, induzindo e mantendo em erro a Previdência Social, utilizando para fins de contagem de tempo de serviço vínculos empregatícios inexistentes, referentes ao período de 1995 a 1999, quando não exercia atividade laborativa.
5. Autoria e dolo
Assim como a materialidade, a autoria e o dolo da denunciada também são incontestáveis, inobstante alegação defensiva em contrário. Nesse sentido, tenho que o juízo a quo bem solveu a referida questão, de modo que, a fim de evitar tautologia, adoto sua fundamentação como razões de decidir (evento 81, do processo originário):
"No que concerne à autoria, a ré Everli confirmou que jamais trabalhara na empresa Confeitaria Três Irmãos Ltda. Contudo, alegou que prestou serviços para a empresa JJ Serviços Reprográficos Ltda pertencente a Joel Calixto, o qual trazia roupas dos Estados Unidos juntamente com sua esposa e que eram comercializadas pela denunciada. Alega que ao invés de efetuar o seu registro junto a JJ. Serviços foi registrada junto a empresa Três Ilhas Ltda. Defende desconhecer a falsidade do vínculo empregatício (Evento 72- Vídeo3):
"(Sra diz que trabalhou na JJ Serviços?) Ele não me registrou lá. (Senhora trabalhou efetivamente lá?) É assim, eles traziam roupas dos Estados Unidos. A esposa dele deixava para eu vender, quando eles vinham eu entregava o dinheiro, passava no escritório. Ele fez essa proposta porque estavam fora, o escritório de Contabilidade dele continuava aqui. Mas ele ao invés de me registrar na empresa dele, registrou na "Três Ilhas". (Por quanto tempo a Sra prestou esse tipo de serviço?) Foram quatro anos. (A Sra tinha vínculo empregatício mesmo ou era só esporádico?) Era trabalho fora, eu não ficava lá na base. Ele ligava, tem que pagar tal coisa, essas coisas assim. Passava no apartamento deles, tava uma olhada. Mas a carteira está registrada na "Três Ilhas". (E quem registrou?)Então, ele que levou minha carteira para registrar na empresa dele. (Ele que a senhora fala é o Joel ?) O Joel. (A empresa era dele?)A JJ era dele. Ele levou minha carteira para registrar mas registrou na outra empresa. (Quando a Sra fez o pedido no INSS a sra sabia disso?) Não. Quer dizer, eu sabia, que eu estava registrada lá, mas não que não tinha sido recolhido o INSS. Então eu fiz 60 anos e estava me informando, que teria já o direito, fiz em maio, acho que foi em setembro que fui requerer. Me informaram que tinha que ligar para o INSS, liguei e foi agendado. Eu fui sozinha lá, com minha carteira de trabalho, entreguei, recebi um protocolo e depois recebi a cartinha de concessão. (...) (Sra, fez um pedido incluindo ambas as empresas e está me dizendo que só trabalhou para uma?) Não, eu trabalhei para outras empresas. E essa JJ não tem o registro na minha carteira. Porque ele não registrou na empresa dele. Ele disse que ia registrar. Eu questionei ele, ele falou que não tinha problema, porque 'ele é meu amigo e eu faço a contabilidade deles'.(...) (A senhora recebia um holerite da empresa?) Ele me pagava quando vinha dos Estados Unidos. Até então não sabia que estava registrado lá. Eu me pagava, eu vendia umas roupas, eles traziam a titulo de pagar a passagem de avião. Eles traziam sempre algumas coisas, a esposa dele tinha algumas pessoas que compravam. Então, em troca eu estava sendo "beneficiada" com o recolhimento lá da empresa, 'eu te pago o recolhimento do INSS e vc faz isso para mim'. Não tinha salário.(Essa empresa qual era o objeto dela, qual a atividade da empresa?) Contabilidade (senhora exercia a atividade de contabilidade?) Não. (A senhora então não recebia pagamento mensal?) Não. (A Sra. nunca recebeu qualquer tipo de recibo quanto as contribuições?) Não. (...)Porque era assim, olha vc faz isso para mim... porque na realidade, o Sr. Joel é casado com a irmã do meu marido. Então é aquela coisa, estavam indo para fora. Você faz essas coisinhas para gente, em contrapartida eu te registro lá e recolho lá. (A senhora nunca exerceu atividade nesta empresa?) Não. Porque eu fazia essas coisas fora, na rua, na empresa não. (Certo, mas essas coisas que senhora fazia fora diziam respeito a empresa?) Algumas, algumas. Tipo ir lá no banco, tirar alguma via de alguma coisa (Senhora atendia clientes da empresa?) Não, clientes da empresa não. (...)"
A justificativa apresentada pela ré Everli, contudo, não convence.
Inicialmente, em que pese a denunciada ter afirmado constar na sua CTPS apenas o registro da empresa Três Ilhas Ltda, fato é que tanto os vínculos referente a empresa Três Ilhas Ltda quanto a empresa JJ. Serviços Reprográficos Ltda foram considerados na concessão do beneficio previdenciário, tendo em vista os lançamentos existentes no cadastro do CNIS, conforme mencionou o Relatório nº 40/2013 do INSS citado acima.
Destaco, ainda, que no evento 32- DECL2 e no procedimento do INSS (evento 01- AP-INQPOL2, p. 14-17 do IPL) consta apenas cópia parcial da CTPS da denunciada contendo o vínculo com a empresa Três Ilhas Ltda, não sendo possível confirmar a ausência de anotação do registro da sua CTPS.
Além disso, a defesa não se desincumbiu do ônus de demonstrar a veracidade das demais alegações.
Não há elementos comprobatórios de que a denunciada prestou serviços e possuía, de fato, vínculo empregatício com qualquer das empresas administradas por Joel Calixto de Menezes.
Ademais, todos elementos contidos nos autos indicam que a denunciada utilizou-se dos documentos confeccionados por Joel Calixto, nos quais constavam vínculos empregatícios que sabia serem falsos, uma vez que não possuía relação empregatícia, vínculo de subordinação, não eventualidade e tampouco recebia salário, características essenciais para configurar a relação de trabalho. Oportuno salientar que a denunciada, em seu interrogatório, nem sequer conseguiu delimitar as atividades desenvolvidas relacionadas à empresa para qual alegava existir relação empregatícia.
Aliado a isto, deve-se sopesar as inúmeras contradições existentes e versões diversas apresentadas pela defesa.
A testemunha Joel Calixto de Menezes (evento 72- VIDEO2), que inclusive foi apontado como o responsável pelos registros e documentos falsos utilizados na obtenção do benefício previdenciário da denunciada, em total contradição ao depoimento da ré, afirmou que a denunciada Everli jamais trabalhou na empresa JJ. Serviços Reprográficos Ltda. Afirmou, no entanto, que teria trabalhado na empresa Confeitaria Três Ilhas Ltda, fato que a denunciada nega.
Convém relembrar que o feito foi arquivado em relação a Joel Calixto de Menezes, indiciado no inquérito correlato, em razão da prescrição da pretensão punitiva.
Por outro lado, no interrogatório perante a autoridade policial, a denunciada confirmou que não trabalhava para qualquer das empresas, Três Ilhas Ltda e JJ Serviços Reprográficos (evento 06-DESP1 do IPL):
(...)
Ainda, extrai-se da defesa administrativa apresentada perante o INSS, que a a denunciada apresentou outra versão, na qual apenas trabalharia com a esposa de Joel Calixto denunciado, Sra Cirlene, comercializando roupas (evento 32 - DEFESA PREVIA3):
(...)
Por fim, pertinente o argumento MPF de que a denunciada agiu com dolo em fraudar a Previdência Social, principalmente pelo fato de que tinha plena consciência que nunca trabalhara para as mencionadas empresas.
Em síntese, em face de todos esses elementos probatórios, da explicação vacilante da denunciada quanto ao efetivo vínculo com qualquer das empresas, bem como a ausência de qualquer elemento a confirmar suas alegações, firmo a convicção de que a ré foi a autora da prática delituosa narrada na denúncia e o fez com conhecimento e vontade de obter benefício previdenciário mediante fraude, mais especificamente mediante a apresentação de documentos que continham a inserção de vínculos empregatícios falsos.
O dolo, em casos como o presente, é identificável pelos sinais externos da conduta do agente. E de outra forma não poderia ser, pois a produção de provas se presta justamente a fazer o cotejo entre as circunstâncias que permeiam o caso para delas concluir pela deliberada prática criminosa.
Não se pode olvidar que, na definição adotada pelo Código Penal, há dolo "quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo". Na preleção de CEZAR ROBERTO BITENCOURT, "dolo é a consciência e a vontade de realização da conduta descrita em um tipo penal, ou, na expressão de Welzel, "dolo, em sentido técnico penal, é somente a vontade de ação orientada à realização do tipo de um delito"."
Continua o penalista: "O dolo, elemento essencial da ação final, compõe o tipo subjetivo. Pela sua definição constata-se que o dolo é constituído por dois elementos: um cognitivo, que é o conhecimento do fato constitutivo da ação típica; e um volitivo, que é a vontade de realizá-la. O primeiro elemento, o conhecimento, é pressuposto do segundo, a vontade, que não pode existir sem aquele." (Tratado de direito penal, Parte geral, vol. 1. 10.ed. São Paulo: Saraiva, pp.332-333).
No presente, caso, como dito, ós elementos de convicção jungidos aos autos deixam claro o propósito ilícito da acusada."
Nada impede que o órgão revisor se convença das razões lançadas pela instância originária e as adote como fundamento de decidir, pois é livre o convencimento judicial. Desde que as transcreva em seu voto, estão declinados os motivos que conduziram o seu convencimento. Aliás, assim pode proceder com as razões de quaisquer dos sujeitos processuais (acusação, defesa, órgão julgador, órgão ministerial).
Com efeito, verifico que os elementos probatórios coligidos aos autos são cristalinos no sentido da autoria delitiva da denunciada.
Quando ouvida pela Polícia Federal, a ré admitiu que, no período de 1995 a 1999, não exerceu atividade laborativa, pois era dona de casa, atribuindo o registro empregatício em nome das empresas JJ Serviços Reprográficos Ltda. e Confeitaria Três Ilhas Ltda. a Joel Calixto Calixto Menezes, o qual teria realizado as anotações contra a vontade da acusada (evento 6, DESP1, fl.13, do Inquérito Policial nº 1587/2015-4-SR/PF/PR):
"QUE trabalhou no SESC, APADEVI e SERVEÍCULOS, não se recordando as datas QUE não trabalhou nas empresas JJ SERVIÇOS REPROGRÁFICOS S/C LTDA. e CONFEITARIA TRÊS ILHA LTDA. QUE inquirida sobre o fato de tais vínculos contarem na sua CTPS e no requerimento de benefício, esclarece que foi JOEL CALIXTO DE MENEZES o responsável por inserir tais vínculos em sua CTPS QUE JOEL é cunhado do marido da declarante CELSO PEDRO SOCHER, e pediu para que a declarante 'olhasse' o seu escritório de contabilidade enquanto estava fora, residindo no exterior, sendo que para tanto registraria a declarante para que houvesse recolhimento previdenciário no período QUE somente depois a declarante verificou que havia sido registrada na empresa CONFEITARIA TRÊS ILHAS, ficando indignada com tal fato QUE inquiriu JOEL sobre tal fato sendo que o mesmo respondeu que os recolhimentos estavam sendo feitos através de tal empresa, pois o proprietário seria seu amigo e que fazia a contabilidade de tal empresa, sendo que tal prática não acarretaria problemas para a declarante QUE no final das contas não teve envolvimento com o escritório de JOEL, pois não aceitou tais condições, tendo pedido sua CTPS de volta QUE nunca recebeu qualquer remuneração de JOEL QUE neste período de 1995 a 1999, portanto, não trabalhava sendo dona de casa"
Por ocasião da defesa prévia, a defesa argumentou que, ao contrário do que narrado em sede policial, a ré teria trabalhado em uma loja de venda de roupas junto com a esposa de Joel, Cirlene Socher (evento 14, DEFESA PRÉVIA1, do processo originário).
Por sua vez, quando ouvida na fase inquisitorial, Cirlene disse que a acusada trabalhou por um período para a empresa Confeitaria Três Ilhas Ltda (evento 8, DEPS1, fls.5-6, do Inquérito Policial nº 1587/2015-4-SR/PF/PR):
"QUE sobre a cunhada EVERLI SOCHER, diz que 'não se dá muito bem com ela'; QUE ela já trabalhou nessa CONFEITARIA TRÊS ILHAS, mas não sabe o período; QUE, contudo, sabe que isso já faz muitos anos, e pode dizer que há cerca de 20 anos ela não trabalha mais naquele estabelecimento; QUE também não sabe se EVERLI TEREZINHA LANGNER SOCHER já trabalhou em uma empresa chamada J.J. SERVIÇOS REPROGRÁFICOS LTDA., e apenas agora descobre que a J.J SERVIÇOS é sucessora da J.J ORGANIZAÇÕES CONTÁBEIS; QUE acredita que seu esposo nunca tenha sido patrão de EVERLI."
No interrogatório judicial, a acusada apresentou nova versão dos fatos, afirmando que trabalhou durante 4 (quatro) anos para Joel Calixto e Cirlene, auxiliando-os na venda de vestuários trazidos do exterior. Ao ser questionada se possuía efetivo vínculo empregatício, afirmou que "não ficava na base, trabalhava fora". Disse que acreditava que Joel Calixto anotaria sua carteira em nome de empresa da qual era proprietário, vindo a descobrir somente posteriormente que os vínculos foram registrados em nome de J.J Serviços Reprográficos Ltda. e Confeitaria Três Ilhas (evento 72, VÍDEO3, do processo originário):
"(Sra diz que trabalhou na JJ Serviços?) Ele não me registrou lá. (Senhora trabalhou efetivamente lá?) É assim, eles traziam roupas dos Estados Unidos. A esposa dele deixava para eu vender, quando eles vinham eu entregava o dinheiro, passava no escritório. Ele fez essa proposta porque estavam fora, o escritório de Contabilidade dele continuava aqui. Mas ele ao invés de me registrar na empresa dele, registrou na "Três Ilhas". (Por quanto tempo a Sra prestou esse tipo de serviço?) Foram quatro anos. (A Sra tinha vínculo empregatício mesmo ou era só esporádico?) Era trabalho fora, eu não ficava lá na base. Ele ligava, tem que pagar tal coisa, essas coisas assim. Passava no apartamento deles, tava uma olhada. Mas a carteira está registrada na "Três Ilhas". (E quem registrou?)Então, ele que levou minha carteira para registrar na empresa dele. (Ele que a senhora fala é o Joel ?) O Joel. (A empresa era dele?)A JJ era dele. Ele levou minha carteira para registrar mas registrou na outra empresa. (Quando a Sra fez o pedido no INSS a sra sabia disso?) Não. Quer dizer, eu sabia, que eu estava registrada lá, mas não que não tinha sido recolhido o INSS. Então eu fiz 60 anos e estava me informando, que teria já o direito, fiz em maio, acho que foi em setembro que fui requerer. Me informaram que tinha que ligar para o INSS, liguei e foi agendado. Eu fui sozinha lá, com minha carteira de trabalho, entreguei, recebi um protocolo e depois recebi a cartinha de concessão. (...) (Sra, fez um pedido incluindo ambas as empresas e está me dizendo que só trabalhou para uma?) Não, eu trabalhei para outras empresas. E essa JJ não tem o registro na minha carteira. Porque ele não registrou na empresa dele. Ele disse que ia registrar. Eu questionei ele, ele falou que não tinha problema, porque 'ele é meu amigo e eu faço a contabilidade deles'.(...) (A senhora recebia um holerite da empresa?) Ele me pagava quando vinha dos Estados Unidos. Até então não sabia que estava registrado lá. Eu me pagava, eu vendia umas roupas, eles traziam a titulo de pagar a passagem de avião. Eles traziam sempre algumas coisas, a esposa dele tinha algumas pessoas que compravam. Então, em troca eu estava sendo "beneficiada" com o recolhimento lá da empresa, 'eu te pago o recolhimento do INSS e vc faz isso para mim'. Não tinha salário.(Essa empresa qual era o objeto dela, qual a atividade da empresa?) Contabilidade (senhora exercia a atividade de contabilidade?) Não. (A senhora então não recebia pagamento mensal?) Não. (A Sra. nunca recebeu qualquer tipo de recibo quanto as contribuições?) Não. (...)Porque era assim, olha vc faz isso para mim... porque na realidade, o Sr. Joel é casado com a irmã do meu marido. Então é aquela coisa, estavam indo para fora. Você faz essas coisinhas para gente, em contrapartida eu te registro lá e recolho lá. (A senhora nunca exerceu atividade nesta empresa?) Não. Porque eu fazia essas coisas fora, na rua, na empresa não. (Certo, mas essas coisas que senhora fazia fora diziam respeito a empresa?) Algumas, algumas. Tipo ir lá no banco, tirar alguma via de alguma coisa (Senhora atendia clientes da empresa?) Não, clientes da empresa não. (...)" (Destaquei)
Joel Calixto, ouvido em juízo na qualidade de testemunha, disse que a ré trabalhou na empresa Confeitaria Três Ilhas, porém negou que a acusada tenha trabalhado com sua esposa Cirlene na venda de vestuário (evento 72, VÍDEO2, idem):
"(O senhor é proprietário ou foi proprietário da JJ Organizações Contábeis e Serviços?) Sim, fui proprietário sim. (Essa empresa JJ Serviços Contábeis prestava serviços para a empresa Confeitaria Três Ilhas Companhia Limitada?) Prestava. (A senhora Cirlene é sua esposa?) é. (O senhor conheceu conheceu a Sr. Everli na empresa JJ Serviços ou na Três Ilhas?) Nas Três Ilhas. (O senhor lembra de ter registrado, na qualidade de contador, o senhor registrou a Sra. Everli como empregada da empresa Confeitaria Três Ilhas?) Ela foi registrada, mas não era eu que fazia. Eu tinha um funcionário que fazia o departamento pessoal. (O senhor se qualificava como proprietário ou gerente da Três Ilhas?) Não, eu trabalhei uma época na Três Ilhas como gerente. (O senhor então registrou a Sra. Everli Terezinha na Confeitaria Três Ilhas). Sim, sim. (O senhor na qualidade de contador como tenha registrado a funcionária, o senhor recolheu o INSS necessário no período em que ela trabalhou?) Bom, eu não sei, pois a Três Ilhas não era minha. A Três Ilhas era do Belmiro e do Amilcar. Não era minha. (O senhor disse que era gerente da empresa, não tem conhecimento se recolhia ou deveria recolher INSS). Não, eu não. Isso aí eu não tomava parte. (Mas o senhor na qualidade de contador teria conhecimento de que deveria ser recolhido o INSS?) Não, porque nessa época eu não era mais contador deles. Fui contador deles até 1991, por ai, não lembro direito. (A Sra. Everli Terezinha prestou serviços juntamente para a Sra. Cirlene, sua esposa?) Não. (Elas não trabalhavam juntas de roupas?) Não, não. Não sei se fizeram alguma coisa juntas. Não sei. (A empresa Confeitaria Três Ilhas tinha mais funcionários, o senhor tem ideia?) Tinha bastante funcionários. (Todos eram registrados pela carteira de trabalho?) Acredito que sim. (E quanto aos recolhimentos do INSS, o senhor tem conhecimento se eram feitos por todos os funcionários?) Não, eles fazia. Depois de um tempo, acho que estavam em dificuldade. Não sei se atrasaram ou não recolheram. Não sei. (O senhor lembra se prestou a informação no CNIS, no INSS, em relação aos funcionários?) Como é? (O CNIS é um registro junto ao INSS, o senhor lembra se o senhor providenciou esse registro junto ao INSS?) Não." (Grifei)
Evidente a existência de relatos totalmente distintos e diametralmente opostos acerca das circunstâncias do registro empregatício da ré nas empresas JJ Serviços Reprográficos Ltda. e Confeitaria Três Ilhas Ltda. Primeiramente, em sede policial, a ré admitiu que não trabalhou para qualquer das referidas empresas. Todavia, em juízo, afirmou que trabalhou para Cirlene e Joel Calixto no ramo de vestuário e, em razão desse vínculo, sua carteira de trabalho foi assinada em nome de Confeitaria Três Ilhas Ltda., desconhecendo a origem do vínculo anotado em relação a empresa JJ Serviços Reprográficos Ltda.
Contrariando a versão dos fatos narrada pela apelante, Cirlene, em sede inquisitorial, e Joel Calixto, em sede judicial, negaram ter trabalhado com a ré na venda de roupas. Ambos afirmaram que teriam avistado a ré trabalhando na empresa Confeitaria Três Ilhas Ltda., situação jamais mencionada pela recorrente.
Assim, em razão das percucientes contradições relatadas, não é possível concluir que a ré tenha efetivamente trabalhado nas empresas JJ Serviços Reprográficos Ltda. e Confeitaria Três Ilhas Ltda., conforme inicialmente registrado no Cadastro Nacional de Informações Sociais.
No tocante aos elementos subjetivos do tipo, para a configuração do crime do artigo 171 do Código Penal é imprescindível que haja, além do dolo (livre vontade de praticar a conduta, consciente o agente de que está iludindo a vítima), a finalidade específica consubstanciada em obter vantagem ilícita para si ou para outrem.
Neste caso, em que pese tese defensiva em contrário, evidente o dolo na conduta da agente, haja vista requereu a concessão do benefício com base em registro empregatício que sabia ser inverídico, uma vez presente anotação em sua Carteira de Trabalho e Previdência Social de vínculos com empresas que disse jamais ter conhecido. Agiu dessa forma com a finalidade de receber vantagem ilícita às custas da Previdência Social.
Portanto, concluo que a acusada perpetrou, de forma livre e consciente, a conduta delituosa descrita na exordial acusatória, no intuito de obter vantagem ilícita consistente no recebimento indevido de benefício previdenciário. Nestes termos, porque ausente qualquer circunstância que exclua a tipicidade, a antijuridicidade ou a culpabilidade, afigura-se incensurável a bem fundamentada sentença, devendo ser mantida a condenação da ré como incursa no delito do artigo 171, §3º, do Código Penal.
6. Dosimetria das penas
O tipo penal em comento prevê a pena de reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.
6.1. Pena privativa de liberdade
O juiz singular procedeu à dosimetria da reprimenda da seguinte forma (evento 81, do feito originário):
"2.1. DOSIMETRIA DA PENA
Antes de tudo, resguardo meu posicionamento pessoal, por estar convencido do seguinte: a) é ilegítimo todo e qualquer fator de mensuração da pena que se lastreie no Direito Penal de autor, por ser contrário ao princípio da culpabilidade. São exemplos de direito penal de autor em nosso Código Penal a reincidência, a personalidade, os antecedentes e a conduta social, os quais não passam de resquícios da Escola Positiva, que via o delinquente como um ser que deveria ser neutralizado a todo custo. Conforme tem chamado a atenção a moderna doutrina, o agente deve ser julgado por aquilo que "fez" e não por aquilo que "é"; b) A medida da pena é a medida da culpabilidade revelada no fato. A culpabilidade, portanto, é o único aspecto a ser levado em conta pelo magistrado na ora de proceder ao juízo de censura penal (maior ou menor dever de pautar a conduta de acordo com a norma no caso concreto). Todo e qualquer fator que se baseie numa culpabilidade pela condução de vida ou de caráter é ilegítimo e infringe o princípio da culpabilidade. Sendo assim, somente os aspectos objetivos do art. 59 poderiam ser considerados (motivos, consequências, circunstâncias, conduta da vítima), sendo certo que tal rol não é exaustivo.
Contudo, até que se modifique a legislação penal ou se declare ilegítima a mensuração das vetoriais lastreadas no Direito Penal do Autor, e para que se evite futura alegação de nulidade, passo a analisar todas as circunstâncias previstas no art. 59 do Código Penal.
A ré EVERLI está sujeita a uma pena de 1 (um) a 5 (cinco) anos de reclusão, e multa, pela prática do delito de estelionato, aumenta de 1/3 (um terço) em razão de ter sido contra entidade de direito público (INSS) - Súmula 24 do STJ.
Culpabilidade. Verifico que a culpabilidade é normal. Efetivamente, para se aferir o grau de censurabilidade da conduta deve-se analisar as condições pessoais (ao tempo do fato) e as circunstâncias concomitantes, conforme lição de FRANK, para se avaliar o esforço que deveria ter empreendido o agente para atuar em conformidade com o norma. Trata-se de avaliar normativamente a conduta do autor com todos os seus conhecimentos, capacidades, carências e experiências.
A partir de uma perspectiva de uma pessoa com disposição ou motivação a favor do Direito, é possível concluir que a conduta da ré não é altamente censurável, tendo em vista que suas condições pessoais não eram superiores ao do "homem médio". Em outras palavras, não tinha um dever maior de obediência à norma em comparação com a generalidade das pessoas.
Não registra antecedentes criminais.
A conduta social da acusada é normal.
Personalidade. Não há elementos suficientes nos autos para avaliar a personalidade da ré, sendo certo que nada consta em seu desfavor.
Os motivos são ínsitos ao tipo penal, quais sejam a obtenção de vantagem patrimonial ilícita por meio do emprego de fraude.
As circunstâncias não permitem uma valoração desfavorável à acusada.
As consequências são normais à espécie, dado que a vantagem obtida pela acusada, na ordem de 80 mil reais, não pode ser considerada expressiva a ponto de causar prejuízo excessivo à autarquia previdenciária.
A vítima, por meio de seus agentes, em nada contribuiu para o deslinde dos fatos, devendo a vetorial ser considerada neutra.
Tudo sopesado e tendo em conta a inexistência de circunstâncias judiciais desfavoráveis à ré, fixo a pena-base no mínimo legal, em 01 (um) ano de reclusão.
Na segunda fase, não incidem circunstâncias agravantes ou atenuantes.
Na terceira fase incide o disposto no § 3º do art, 171 do CP, razão pela qual aumento a pena em 1/3, tendo em vista que a ré recebeu o benefício em detrimento do INSS, entidade de direito público. A pena, assim, resta fixada em 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão.
Além disso, tendo em conta que a ré recebeu o benefício por vários anos, incide o disposto no art. 71 do CP, razão pela qual aumento a pena em 2/3 (dois terços), resultando em uma pena de 02 (dois) anos, 02 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão.
Em razão da proporcionalidade que deve nortear a pena privativa de liberdade e pecuniária, fixo a pena de multa em 180 (cento e oitenta) dias-multa.
Não há elementos nos autos para precisar a atual situação econômica da acusada. Assim, fixo o valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato (06/2013), corrigido monetariamente.
Tendo em vista a quantidade da pena fixada à denunciada e as circunstâncias judiciais já analisadas, à luz do disposto no artigo 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal, fixo o regime aberto, na forma do artigo 33, § 2º, "c", do mesmo codex, mediante cumprimento de condições a serem estabelecidas pelo MM. Juízo competente para a Execução Penal.
Substituição da pena privativa de liberdade
Tendo em conta que a pena privativa de liberdade aplicada à ré é menor que quatro anos, que o crime não foi cometido com violência ou grave ameaça à pessoa e que se verificam as condições estabelecidas no artigo 44, e incisos II e III, do Código Penal, na forma ainda como previsto no § 2º (2ª parte), do mesmo art. 44, CP, substituo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direito, sendo, respectivamente:
1ª) prestação pecuniária (art. 43, inciso I, CP), consistente no pagamento da quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a entidade pública com destinação social, a ser designada pelo Juízo responsável pela execução da pena;
2ª) prestação de serviço à comunidade (art. 43, inciso IV, CP), a ser realizada em entidade assistencial designada pelo Juízo de Execução, à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação.
A prestação de serviços à comunidade revela-se mais consentânea com os fins de repressão e prevenção da prática delitiva, atendendo ainda ao objetivo de ressocialização do Direito Penal. A readaptação é favorecida pela possibilidade de cumprimento da pena em horário não conflitante com a jornada normal de trabalho do condenado e por seu caráter pedagógico (evita a impressão de pagamento pelo crime).
A prestação pecuniária, por seu turno, possui o benefício de manter o condenado social inserido no seio da comunidade em que vive e ao mesmo tempo se apresentar como razoável reprimenda criminal.
Direito de apelar em liberdade
Considerando que a ré respondeu ao processo em liberdade e inexistem motivos para a decretação de sua prisão preventiva, reconheço a possibilidade de apelar em liberdade.
Reparação dos danos
Na denúncia (evento 1- DENUNCIA2), o Ministério Público Federal requereu a fixação de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, atendendo ao disposto na Súmula nº 131 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Desse modo, constatada a responsabilidade penal da ré Everli Terezinha Langner Socher, que, no caso dos autos, possui idênticos elementos aos da responsabilidade civil, deve ser ela também condenada a ressarcir à Previdência Social os valores referentes ao benefício previdenciário indevidamente recebidos.
Não há nos autos a informação acerca da data da cessação dos pagamentos do benefício previdenciário, que ao tempo da denúncia, indicava estar ainda ativo. Assim, deverá ser observado apenas ao período descrito na inicial.
Assim, a título de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, sem prejuízo de liquidação do valor da indenização em ação própria, fixo o montante de R$ 82.675,87 (oitenta e dois mil, seiscentos e setenta e cinco reais e oitenta e sete centavos), correspondente ao valor indevidamente recebido de 16/10/2008 a 06/2013, conforme descrito na denúncia." (grifos originais)
Ao analisar as vetoriais do artigo 59 do Código Penal, verifico que o magistrado sentenciante entendeu serem todas neutras, de modo que mantenho a pena basilar fixada em seu mínimo legal, qual seja, 1 (um) ano de reclusão.
Na segunda fase, inexistem circunstâncias agravantes, restando prejudicada a análise de eventuais atenuantes, a teor do verbete sumular 231 do Superior Tribunal de Justiça.
Na terceira etapa, incidiu corretamente a causa de aumento do §3º do artigo 171 do Código Penal, na fração de 1/3 (um terço), considerando que o sujeito passivo da conduta é entidade de direito público.
Em seguida, mantenho a exasperação da pena em 2/3 (dois terços), em razão da incidência do artigo 71 do Código Penal, pois, conforme discorri alhures, em que pese o estelionato praticado contra o Instituto Nacional do Seguro Social, em relação ao beneficiário segurado, constitua crime permanente, a análise de tal questão não foi devolvida a esta Corte.
Destarte, mantenho a pena definitiva em 2 (dois) anos e 2 (dois) meses e 20 (vinte) de reclusão, em regime inicial aberto, nos termos do artigo 33, §2º, alínea "c", do Código Penal.
6.2. Pena de multa
Quanto à pena de multa, entendo que, na fixação de suas unidades, devem ser observadas todas as circunstâncias que influíram na dosagem da pena privativa de liberdade - judiciais, legais, majorantes e minorantes -, critério que restou consolidado pela Quarta Seção desta Corte (EINACR 2002.71.13.003146-0/RS, D.E. 5-6-2007), e, uma vez atendida a ideia de proporcionalidade, num momento subsequente, o valor da penalidade pecuniária será informado/balizado pela capacidade econômica da ré.
Assim, mantenho a referida pena em 180 (cento e oitenta) dias-multa, uma vez que esse é o quantum que guarda relação de proporcionalidade com a sanção corporal e, à míngua de informações acerca dos rendimentos atuais da ré, mantenho o valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo nacional vigente em junho de 2013, atualizado.
6.3. Substituição da reprimenda corporal por restritivas de direitos
Presentes os requisitos objetivos e subjetivos exigidos pelo artigo 44 do Código Penal, mantenho a substituição da pena privativa de liberdade aplicada por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e em prestação pecuniária, por serem as que melhor atingem a finalidade da persecução criminal. A primeira, porque exige da condenada um esforço no sentido de contribuir com o interesse público. A segunda, porque, ao contrário da multa que reverte sempre ao Estado, converte-se em prol da vítima, seus dependentes ou entidade pública ou privada com destinação social.
Nessa linha, tenho que tal prestação deve ser suficiente para a prevenção e reprovação do crime praticado, atentando-se ainda, para a extensão dos danos decorrentes do ilícito - haja vista a prática da conduta delitiva por aproximadamente 3 (três) anos, acarretando prejuízo ao erário na monta de R$54.287,43 (cinquenta e quatro mil duzentos e oitenta e sete reais e quarenta e três centavos) - e para a situação econômica da condenada, a fim de que se possa viabilizar seu cumprimento. Levando em conta tais premissas, preservo, por entender adequado ao caso concreto, o montante de R$5.000,00 (cinco mil reais) arbitrado na sentença, atualizado desde então.
Saliento que poderá haver o parcelamento da referida pena restritiva de direitos, caso comprovada, perante o juízo da execução, a impossibilidade de seu pagamento em parcela única.
7. Reparação dos danos
Em observância ao entendimento consolidado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, através da jurisprudência de ambas as Turmas Penais daquela Corte, no sentido de que a fixação do valor mínimo para reparação do dano depende de pedido expresso do órgão acusatório no momento de oferecimento da denúncia, este Colegiado aprovou o enunciado sumular 131, que assim dispõe:
"Para que o juiz possa fixar o valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração, é necessário que a denúncia contenha pedido expresso nesse sentido ou que controvérsia dessa natureza tenha sido submetida ao contraditório da instrução criminal."
Nessa linha, colaciono precedentes:
"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. FURTO. ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO. NULIDADE DO LAUDO PERICIAL. NOMEAÇÃO DE PERITOS SEM DIPLOMA DE CURSO SUPERIOR. REPARAÇÃO PELOS DANOS CAUSADOS À VÍTIMA PREVISTA NO ART. 387, INCISO IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. NECESSIDADE DE SUBMISSÃO AO CONTRADITÓRIO. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGOU SEGUIMENTO. DECISÃO MANTIDA EM SEUS PRÓPRIOS TERMOS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. Inexistindo qualquer fundamento apto a afastar as razões consideradas no julgado ora agravado, deve ser a decisão mantida por seus próprios fundamentos.
2. O art. 159, § 1.º, do Código Penal dispõe que, na falta de perito oficial, o exame será realizado por duas pessoas idôneas, portadoras de diploma de curso superior preferencialmente na área específica.
3. Para que seja fixado na sentença o valor mínimo para reparação dos danos causados à vítima, com base no art. 387, inciso IV, do Código Penal, deve haver pedido formal nesse sentido pelo ofendido e ser oportunizada a defesa pelo réu, sob pena de violação aos princípios da ampla defesa e do contraditório.
4. Agravo regimental desprovido." (STJ, AgRg no REsp 1186956, 5ª Turma, Relatora Ministra Laurita Vaz, DJe 1-2-2013)
"PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ART. 387, IV, DO CPP. REPARAÇÃO CÍVEL MÍNIMA. NECESSIDADE DE CONTRADITÓRIO. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO. SÚMULA 283/STF. NECESSIDADE DE PEDIDO PRÉVIO DO OFENDIDO OU DO MINISTÉRIO PÚBLICO. SUMULA 83/STJ. NORMA DE DIREITO MATERIAL. NÃO APLICAÇÃO AOS DELITOS PRATICADOS ANTES DE SUA ENTRADA EM VIGOR. PRECEDENTES DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.
1. Segundo o enunciado da Súmula 283/STF, é inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles.
2. Esta Corte entende que a pretensão indenizatória, prevista no art. 387, inciso IV, do Código de Processo Penal não dispensa o expresso pedido formulado pela vítima, até mesmo em homenagem aos princípios da ampla defesa e do contraditório, possibilitando ao réu, defender-se oportunamente.
3. Encontra-se consolidado, também, o entendimento de que a regra do art. 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, que dispõe sobre a fixação, na sentença condenatória, de valor mínimo para reparação civil dos danos causados ao ofendido, é norma híbrida, de direito processual e material, razão pela que não se aplica a delitos praticados antes da entrada em vigor da Lei n.º 11.719/2008, que deu nova redação ao dispositivo (REsp 1.193.083/RS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 20/8/2013, DJe de 27/8/2013). 4. Agravo Regimental a que se nega provimento." (STJ, AgRg no REsp 1206643/RS, 6ª Turma, Relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 25-2-2015)
Verifico, na hipótese em tela, que, de acordo com o disposto no artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, há pedido expresso do órgão acusatório na denúncia acerca da fixação do encargo, razão pela qual preservo a condenação à reparação dos danos.
Contudo, em razão do reconhecimento da prescrição parcial da pretensão punitiva pela pena em concreto, deve o valor mínimo da reparação ser readequado em conformidade com o dano perpetrado no período em que a pretensão punitiva estatal permanece hígida.
Assim, redimensiono o valor mínimo da reparação dos danos em R$54.287,43 (cinquenta e quatro mil, duzentos e oitenta e sete reais e quarenta e três centavos), valor correspondente às parcelas recebidas indevidamente pela ré no período de maio de 2010 a junho de 2013, conforme Relatório de Créditos da Autarquia Previdenciária (evento 1, AP-INQPOL2, fls. 50-51, do Inquérito Policial).
8. Execução imediata
Aderindo à nova orientação do Supremo Tribunal Federal (HC 126.292, Plenário, Rel. Ministro Teori Zavascki, DJe 17-5-2016), este Colegiado aprovou o enunciado sumular 122, in verbis:
"Encerrada a jurisdição criminal de segundo grau, deve ter início a execução da pena imposta ao réu, independentemente da eventual interposição de recurso especial ou extraordinário."
Encontram-se, pois, preenchidas as condições necessárias ao início da execução penal, uma vez exaurido o duplo grau de jurisdição, assim entendida a entrega de título judicial condenatório, ou confirmatório de decisão dessa natureza de primeiro grau, em relação à qual tenha decorrido, sem manifestação, o prazo para recurso com efeito suspensivo (embargos de declaração/infringentes e de nulidade, quando for cabível) ou, se apresentado, após a conclusão do respectivo julgamento.
Assim, tão logo implementadas tais condições, o juízo de origem deverá ser comunicado para dar início à execução penal.
9. Conclusão
Reconhecida, de ofício, a prescrição da pretensão punitiva pela pena em concreto quanto aos fatos ocorridos de 16-10-2008 a 5-5-2010.
Mantida a condenação da ré pela prática do crime do artigo 171, §3º, do Código Penal, uma vez comprovadas a materialidade e autoria delitivas, bem assim o dolo específico, sendo o fato típico, antijurídico e culpável e inexistindo causas excludentes.
A pena privativa de liberdade restou definitivamente fixada em 2 (dois) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e foi substituída por duas restritivas de direitos, consubstanciadas em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e prestação pecuniária, esta mantida em R$5.000,00 (cinco mil reais), atualizado.
Na primeira fase da dosimetria da reprimenda corporal, a pena foi estabelecida no mínimo legal; na segunda, não foram reconhecidas agravantes e restou prejudicada a avaliação de eventuais atenuantes; na terceira, foi aplicada a causa de aumento do §3º do artigo 171 do Código Penal, em 1/3 (um terço); e, na sequência, exasperada a pena em 2/3 (dois terços) em razão da continuidade delitiva.
A pena de multa foi mantida em 180 (cento e oitenta) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente em junho de 2013, atualizado.
Redimensionado o valor da condenação à reparação dos danos.
Determinada a execução imediata da pena tão logo esgotado o segundo grau jurisdicional.
10. Dispositivo
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação criminal, conceder, de ofício, a ordem de habeas corpus para declarar extinta a punibilidade quanto aos fatos ocorridos de 16-10-2008 a 5-5-2010, redimensionar o valor a título de reparação do dano, e comunicar o juízo de origem para que dê início à execução penal, uma vez implementadas as condições previstas neste julgamento.
Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5025466-49.2016.4.04.7000/PR
RELATOR
:
VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
APELANTE
:
EVERLI TEREZINHA LANGNER SOCHER
ADVOGADO
:
OSMAR NODARI
:
LUIZ FELIPE JANSEN DE MELLO NODARI
APELADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
VOTO DIVERGENTE
O Senhor Desembargador Leandro Paulsen: Peço vênia ao eminente relator para divergir em parte da solução proposta.
Primeiro, o estelionato previdenciário praticado pelo beneficiário, conforme cita o relator, é crime permanente:

EMENTA: DIREITO PENAL. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. ART. 171, § 3º, DO CP. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. DOSIMETRIA. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME NORMAIS AO DELITO. CONTINUIDADE DELITIVA. CONFIGURAÇÃO. (...) 3. Consoante entendimento firmado pelo STF e pelo STJ, o estelionato praticado em detrimento do erário público constitui crime permanente em relação ao beneficiário da fraude e crime instantâneo em relação ao terceiro que realiza a fraude. (...) (TRF4, ACR 5002877-38.2013.4.04.7204, OITAVA TURMA, Relator LEANDRO PAULSEN, juntado aos autos em 11/05/2017)

EMENTA: PENAL. ART. 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL. ESTELIONATO CONTRA O INSS. ART. 304 C/C ART. 298 DO CÓDIGO PENAL. USO DE DOCUMENTO FALSO. REVELIA. AUSÊNCIA DE NULIDADE. PRESCRIÇÃO. INOCORÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA. COMPROVAÇÃO. DOLO. DEMONSTRAÇÃO. DOSIMETRIA DAS PENAS. CONTINUIDADE DELITIVA. NÃO CABIMENTO. CRIME PERMANENTE. REPARAÇÃO MÍNIMA. EFEITOS DA SENTENÇA. NECESSIDADE DE PEDIDO. PRESCRIÇÃO. RECONHECIMENTO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. (...) 2. O crime de estelionato contra a Previdência Social praticado pelo próprio beneficiário da vantagem indevida assume caráter permanente, sendo o termo inicial da prescrição a data em que cessa a permanência ou o recebimento do benefício. (...) (TRF4, ACR 0026436-09.2008.4.04.7100, OITAVA TURMA, Relator JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, D.E. 30/06/2015)

Segundo, entendo que cabe ao magistrado, valendo-se das balizas normativas estabelecidas de forma bastante detalhada pelo Código Penal, a tarefa de individualizar a pena de forma proporcional à conduta praticada pelo réu. Somente cabe a intervenção deste Tribunal quando houver nítido descompasso entre os critérios utilizados na dosimetria e os fatos em julgamento.
A partir dessas premissas, divirjo do eminente relator quanto ao reconhecimento da prescrição e quanto às penas aplicadas. Embora em uma primeira análise conclua-se que a declaração de prescrição é benéfica à apelante, não o é na medida em que enseja a exasperação da pena em razão da continuidade delitiva. No caso, o descompasso entre entendimento do juízo a quo e jurisprudência desta Turma acarreta a exasperação da pena em 2/3, ensejando a revisão de ofício.
Pelo exposto, fixo a pena definitiva em 1 ano e 4 meses, mantidas multa, regime inicial para cumprimento de pena e restritivas de direitos substitutivas nos termos do voto do relator.

Dispositivo.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e, de ofício, redimensionar a pena privativa de liberdade.
Desembargador Federal Leandro Paulsen


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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 13/12/2017
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5025466-49.2016.4.04.7000/PR
ORIGEM: PR 50254664920164047000
RELATOR
:
Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
PRESIDENTE
:
Desembargador Federal Leandro Paulsen
PROCURADOR
:
Dr. Carlos Augusto da Silva Cazarré
REVISOR
:
Des. Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
SUSTENTAÇÃO ORAL
:
POR VIDEOCONFERÊNCIA (SJ DE CURITIBA/PR): DR. OSMAR NODARI, pela apelante Everli Terezinha Langner Socher
APELANTE
:
EVERLI TEREZINHA LANGNER SOCHER
ADVOGADO
:
OSMAR NODARI
:
LUIZ FELIPE JANSEN DE MELLO NODARI
APELADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 13/12/2017, na seqüência 6, disponibilizada no DE de 24/11/2017, da qual foi intimado(a) o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 8ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR MAIORIA, VENCIDO PARCIALMENTE O RELATOR, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E, DE OFÍCIO, REDIMENSIONAR A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE, NOS TERMOS DO VOTO DO DES. FEDERAL LEANDRO PAULSEN, QUE LAVRARÁ O ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO
:
Des. Federal LEANDRO PAULSEN
VOTANTE(S)
:
Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
:
Des. Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
:
Des. Federal LEANDRO PAULSEN
Lisélia Perrot Czarnobay
Diretora de Secretaria
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Sustentação Oral - Processo Pautado
Divergência em 12/12/2017 11:42:46 (Gab. Des. Federal LEANDRO PAULSEN)


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