Apelação Cível Nº 5004088-88.2017.4.04.7101/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: VANY CLAY PIRES COSTA (AUTOR)
RELATÓRIO
O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS interpôs recurso de apelação em face de sentença, proferida em 03/05/2018, que julgou parcialmente procedente o pedido, nos seguintes termos:
ANTE O EXPOSTO, reconhecendo a ausência de interesse processual, DECLARAR EXTINTO O PROCESSO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO, em relação ao pedido de reconhecimento da atividade especial no período de 01.07.1989 a 30.11.1993 e de 01.04.1994 a 28.04.1995, nos termos do art. 485, inciso VI, do Código de Processo Civil.
Quanto ao restante, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para:
a) reconhecer como tempo especial o trabalho desenvolvido pelo autor nos períodos de 01.12.1993 a 31.03.1994 e de 29.04.1995 a 31.12.1997, bem como o direito à conversão para tempo comum, pelo fator 1,4;
b) condenar o INSS à implantação e ao pagamento do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição ao demandante, no percentual de 100% (cem por cento), desde a DER, em 27.06.2017, sem a aplicação do fator previdenciário (art. 29-C da Lei nº 8.213/91), nos termos da fundamentação;
c) condenar o réu ao pagamento das parcelas vencidas a contar de 27.06.2017 (DER), acrescidas de correção monetária desde o vencimento de cada parcela pela variação do IPCA-E e, a partir da citação, também de juros de mora de 6% ao ano.
Dada a sucumbência mínima da parte autora, condeno o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios ao patrono desta, verba que, em atenção aos referenciais do art. 85, §2º, do Código de Processo Civil, fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vencidas após a sentença (Súmula nº 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região).
Interposto recurso, intime-se a parte apelada para, querendo, no prazo legal, apresentar contrarrazões e, após, não sendo suscitadas as questões referidas no art. 1009, §1º, do Código de Processo Civil, encaminhe-se ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (art. 1.010, §§1º e 3º, do Código de Processo Civil).
Apesar de a sentença não trazer o valor preciso da condenação, resta dispensado o reexame necessário, porque mesmo na hipótese de a renda mensal atingir o teto dos benefícios previdenciários, a condenação, aí incluídos correção monetária e juros de mora, será inferior ao equivalente a mil salários mínimos, patamar a partir do qual, de acordo com o disposto no art. 496, §3º, inciso I, do Código de Processo Civil, ficam as sentenças proferidas em face de autarquias federais sujeitas ao duplo grau de jurisdição.
O INSS, em suas razões de apelação, requereu a anulação da sentença, uma vez que o PPP em que a sentença se baseou para reconhecer a especialidade foi preenchido pelo sindicato da categoria, apesar do OGMO ser o responsável legítimo pela emissão do documento. Aduziu que o período em que o autor esteve em gozo de benefício por incapacidade não pode ser computado como tempo de serviço especial, à luz do art. 65, parágrafo único, do Decreto nº 3.048/99 e do art. 63 do Decreto nº 2.172/97.
Apresentadas contrarrazões pela parte autora.
VOTO
Nos termos do art. 370 do Código de Processo Civil (CPC), caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito, indeferindo as que julgar desnecessárias ou inúteis ao deslinde da questão.
Para a verificação da especialidade das atividades exercidas com exposição a agentes nocivos, leva-se em consideração, via de regra, o conteúdo da documentação técnica lavrada pela empresa (formulários, laudos e perfil profissiográfico previdenciário (PPP), por exemplo). Contudo, em caso de dúvida sobre a fidedignidade ou suficiência de tal documentação é plausível a produção de laudo pericial em juízo.
Nesse sentido, colaciona-se recente precedente da egrégia Terceira Seção deste tribunal, no sentido da viabilidade da elaboração da prova técnica judicial, não obstante a existência de PPP, inclusive quando guarnecido por laudos lavrados pelo empregadora, acaso a higidez das informações nele(s) contida(s) seja questionada pelo trabalhador. O aresto a seguir reproduzido reflete a síntese da tese resultante da apreciação do IRDR nº 15 desta Corte:
PREVIDENIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. EPI. NEUTRALIZAÇÃO DOS AGENTES NOCIVOS. PROVA. PPP. PERÍCIA. 1. O fato de serem preenchidos os específicos campos do PPP com a resposta 'S' (sim) não é, por si só, condição suficiente para se reputar que houve uso de EPI eficaz e afastar a aposentadoria especial. 2. Deve ser propiciado ao segurado a possibilidade de discutir o afastamento da especialidade por conta do uso do EPI, como garantia do direito constitucional à participação do contraditório. 3. Quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, não há mais discussão, isso é, há a especialidade do período de atividade. 4. No entanto, quando a situação é inversa, ou seja, a empresa informa no PPP a existência de EPI e sua eficácia, deve se possibilitar que tanto a empresa quanto o segurado, possam questionar - no movimento probatório processual - a prova técnica da eficácia do EPI. 5. O segurado pode realizar o questionamento probatório para afastar a especialidade da eficácia do EPI de diferentes formas: A primeira (e mais difícil via) é a juntada de uma perícia (laudo) particular que demonstre a falta de prova técnica da eficácia do EPI - estudo técnico-científico considerado razoável acerca da existência de dúvida científica sobre a comprovação empírica da proteção material do equipamento de segurança. Outra possibilidade é a juntada de uma prova judicial emprestada, por exemplo, de processo trabalhista onde tal ponto foi questionado. 5. Entende-se que essas duas primeiras vias sejam difíceis para o segurado, pois sobre ele está todo o ônus de apresentar um estudo técnico razoável que aponte a dúvida científica sobre a comprovação empírica da eficácia do EPI. 6. Uma terceira possibilidade será a prova judicial solicitada pelo segurado (após analisar o LTCAT e o PPP apresentados pela empresa ou INSS) e determinada pelo juiz com o objetivo de requisitar elementos probatórios à empresa que comprovem a eficácia do EPI e a efetiva entrega ao segurado. 7. O juízo, se entender necessário, poderá determinar a realização de perícia judicial, a fim de demonstrar a existência de estudo técnico prévio ou contemporâneo encomendado pela empresa ou pelo INSS acerca da inexistência razoável de dúvida científica sobre a eficácia do EPI. Também poderá se socorrer de eventuais perícias existentes nas bases de dados da Justiça Federal e Justiça do Trabalho. 8. Não se pode olvidar que determinada situações fáticas, nos termos do voto, dispensam a realização de perícia, porque presumida a ineficácia dos EPI´s. (TRF4 5054341-77.2016.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator para Acórdão JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 11/12/2017).
No caso examinado, o INSS insurge-se contra o reconhecimento da especialidade dos períodos em que o demandante prestou serviço para o Sindicato dos Estivadores de Rio Grande – Pelotas e São José do Norte, ao argumento de que o órgão legítimo para preenchimento do documento seria o Órgão Gestor de Mão de Obra (OGMO). Insurge-se também contra o reconhecimento da especialidade do período em que o autor esteve em gozo de benefício de auxílio-doença.
Primeiramente, em relação ao período de 01/12/1993 a 31/03/1994, em que o autor esteve em gozo de auxílio-doença, anote-se que este Tribunal Regional Federal consolidou o entendimento de que a limitação imposta pela norma infralegal não possui respaldo na Lei nº 8.213/91, de modo que o o administrador exorbitou do poder regulamentar. O tema foi apreciado no julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 8 (5017896-60.2016.4.04.0000), quando ficou assentada a seguinte tese:
O período de auxílio-doença de natureza previdenciária, independente de comprovação da relação da moléstia com a atividade profissional do segurado, deve ser considerado como tempo especial quando trabalhador exercia atividade especial antes do afastamento.
Cuida-se de precedente de observância obrigatória pelos órgãos fracionários desta Corte (art. 927, III, CPC), o que dispensa, inclusive, digressões mais detidas sobre o tópico.
Conclui-se, desse modo, que o tempo em gozo de benefício por incapacidade -- seja acidentário, seja previdenciário -- deve ser computado como tempo especial quando o trabalhador exercia atividade especial antes do afastamento.
No caso em apreço, o autor gozou de auxílio-doença previdenciário de 01/12/1993 a 31/03/1994 (NB 91/059.830.396-0). O período imediatamente anterior (01/01/1993 a 30/11/1993), foi reconhecido como especial pelo INSS na via administrativa (evento 34, RESPOSTA1, página 98), de modo que o tempo em gozo do benefício deve ser computado como tempo de serviço especial.
Contudo, em relação ao período de 29/04/1995 a 31/12/1997, a documentação acostada aos autos é insuficiente para o reconhecimento da especialidade.
O PPP (Evento 1, PPP9), emitido pelo Sindicato dos Estivadores de Rio grande - Pelotas e São José do Norte indica que o autor laborou como estivador entre 01/07/1989 e 31/12/1997, e descreve as atividades do demandante nos seguintes termos:
"Executava a arrumação e ou retirada das mercadorias dos porões e convés dos navios de forma manual ou com ajuda de máquinas de acordo com a natureza da carga, tais como: manobras de guincho, tratores e empilhadeiras"
O documento aponta exposição a ruído entre 91 e 94 dB (valores apurados através de técnica denominada "E.T.B"), bem como a frio (20º/08º C) e agentes biológicos (contato com tripulações potenciais portadoras de doenças infecto-contagiosas).
O MM. Juiz Federal reconheceu a especialidade do período em razão do agente nocivo ruído, e fez as seguintes ponderações a respeito dos agentes nocivos frio e biológicos:
Com relação a alegada exposição ao frio, verifica-se não ser suficiente para configurar a especialidade laboral no caso concreto, uma vez não explicitada no formulário em destaque qual a fonte artificial do frio excessivo.
Na mesma linha, inviável o reconhecimento de tempo especial com lastro no contato com agentes biológicos, conquanto não demonstrada a efetiva presença de agentes biológicos na jornada laboral do demandante, sendo insuficiente a mera informação da existência de tripulações "potenciais portadoras" de doenças infecto-contagiosas.
Contudo, conforme exposto acima, o PPP é insuficiente para o reconhecimento da especialidade do período, ante a parcialidade do documento, uma vez que foi emitido pelo sindicato da categoria, bem como por apontar agentes nocivos em dissonância com a descrição das atividades.
Havendo dúvidas acerca do caráter especial das atividades desempenhadas pelo autor, deve ser realizada prova judicial, pois deve ser prestigiada a imparcialidade que caracteriza a prova produzida no curso do processo jurisdicional.
Desta forma, impõe-se a anulação da sentença com o retorno dos autos à origem, para que seja reaberta a instrução processual e realizada perícia judicial referente a exposição aos agentes nocivos elencados pelo segurado no período de 29/04/1995 a 31/12/1997.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação do INSS, apenas para anular a sentença, determinando-se a reabertura da fase instrutória, com a produção de provas pertinentes.
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Apelação Cível Nº 5004088-88.2017.4.04.7101/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: VANY CLAY PIRES COSTA (AUTOR)
EMENTA
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL.
É cabível a anulação de sentença, com a subsequente remessa dos autos à origem para produção de prova pericial, com o fim de possibilitar a comprovação de atividade especial, quando a instrução processual é insuficiente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, apenas para anular a sentença, determinando-se a reabertura da fase instrutória, com a produção de provas pertinentes, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 01 de outubro de 2019.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 01/10/2019
Apelação Cível Nº 5004088-88.2017.4.04.7101/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: VANY CLAY PIRES COSTA (AUTOR)
ADVOGADO: JESSICA SAN MARTINS GARCIA (OAB RS114593)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 01/10/2019, na sequência 75, disponibilizada no DE de 13/09/2019.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, APENAS PARA ANULAR A SENTENÇA, DETERMINANDO-SE A REABERTURA DA FASE INSTRUTÓRIA, COM A PRODUÇÃO DE PROVAS PERTINENTES.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA
Votante: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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