Apelação Cível Nº 5006958-11.2019.4.04.7110/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: LUCIANA OLIVEIRA BOTTINI (AUTOR)
ADVOGADO: ANDIARA PORTANTIOLO CONCEIÇÃO (OAB RS047459)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada contra o INSS, na qual a parte autora objetiva o reconhecimento da especialidade do tempo prestado na área da saúde, para fins de salvaguardar seus direitos, tendo em vista o advento da Reforma da Previdência.
Na sentença, publicada na vigência do CPC/2015, a magistrada de origem assim decidiu:
Ante o exposto, indefiro a petição inicial e julgo extinto o processo sem resolução de mérito, nos termos do artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil.
Demanda isenta de custas (art. 4º, II, da Lei n. 9.289/1996).
Sem condenação em honorários advocatícios, uma vez que não houve citação da parte contrária.
Interposta apelação, proceda-se na forma do art. 331, §1º do CPC e, após, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Não havendo recurso ou no retorno deste com a manutenção da sentença:
- certifique-se o trânsito em julgado;
- esgotada a prestação jurisdicional, remetam-se os autos para baixa e arquivamento.
Intimem-se.
Sustenta a parte autora ser desnecessário o prévio requerimento administrativo de reconhecimento de tempo de serviço especial para fins de configuração do interesse de agir. Alega que o INSS reiteradamente não tem reconhecido, como atividade especial, o exercício profissional dos trabalhadores da área da saúde. Requer, assim, a reforma da sentença, mediante o reconhecimento do labor especial postulado, ou a anulação da sentença com a citação do INSS para examinar o mérito da causa.
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Mérito
Pretende a parte autora o reconhecimento da especialidade do tempo prestado na área da saúde, para fins de salvaguardar seus direitos, tendo em vista o advento da Reforma da Previdência.
A questão foi abordada com propriedade na sentença, a qual adoto como razões de decidir:
Nos dizeres da inicial, expressamente afirma que referido pleito não vem acompanhado de pedido de concessão de algum benefício previdenciário típico, tal como, aposentadoria por tempo de contribuição. Dito de outro modo, a exordial é expressa em dizer que o polo ativo não possui os requisitos para obtenção da prestação previdenciária, pretendendo obtenção de provimento judicial apenas como salvaguarda de direitos, diante da iminente possibilidade de ser aprovada a Reforma da Previdência, a qual, segundo sustenta, haverá a retirada de direitos dos Segurados, tais como, os de conversão e averbação do tempo de serviço prestado em condições especiais nos estabelecimentos hospitalares(sic inicial).
Pois bem, independentemente de não ter havido o prévio requerimento administrativo, da leitura de todos os fundamentos expostos na ação sub judice, a outra conclusão não chega esse Juízo senão a de que o feito deve ser de plano indeferido por ausência da condição da ação interesse de agir. Explica-se.
O interesse de agir verifica-se na necessidade de a parte socorrer-se do Poder Judiciário para obtenção do bem da vida almejado, bem como na utilidade que possa auferir caso seja procedente o seu pedido, o que importará num acréscimo no seu patrimônio jurídico. Destarte, somente o dano ou o perigo de dano jurídico, representado pela existência da lide (pretensão resistida), é que autoriza o exercício do direito de ação, não se podendo fazer uso do processo com o intuito, apenas, acadêmico ou de mera consulta. Igualmente, não se pode utilizar do processo como um salvo conduto (salvo as situações típicas de habeas corpus), no sentido de salvaguarda de direitos frente a uma legislação inexistente ou da iminência da edição de uma Reforma da Previdência em trâmite no Congresso Nacional, que sequer se sabe se efetivamente será aprovada na sua integralidade.
A alegação de que se discute no âmbito dos Poderes Legislativo e Executivo a mudança da Constituição Federal ou de uma lei não faz nascer a pretensão resistida, tampouco é suficiente para caracterização do interesse de agir na obtenção de uma decisão judicial que desde já expressamente reconheça e resguarde como tal esse direito, porquanto não há demonstração efetiva de dano.
Com efeito, é necessária a existência de um dano concreto e que o pretenso direito seja exercitável, para legitimar o manejo da ação judicial; não se podendo admitir que a parte possa mover toda a máquina judiciária apenas para emoldurar uma decisão que sequer sabe se, no futuro, dela fará uso. De fato, o reconhecimento, hoje, de um tempo de serviço especial com sua conversão para comum não é garantia de que o polo ativo dele se utilize num pedido de aposentadoria futuro, porque pode querer, por exemplo, aposentar-se por idade, benefício em que não se computa tempo ficto.
De outra banda, é importante destacar que, na esteira da consolidada jurisprudência do STF, não há direito adquirido a regime jurídico único. Assim, se o poder reformador entender não mais ser possível a concessão de aposentadoria especial, essa alteração legislativa terá imediata incidência nas situações jurídicas que estão se formando, não afetando, por corolário lógico, a quem já possuir o direito incorporado ao seu patrimônio jurídico, vale dizer, a quem já tiver cumprido todos os seus requisitos na data da promulgação/publicação da Emenda Constitucional. Obviamente que seria discutível a constitucionalidade de EC que extinga a aposentadoria especial, mas enquanto não fosse expurgada do ordenamento jurídico pelos mecanismos de controle de constitucionalidade, teria existência, validade e eficácia e como tal deveria ser respeitada e aplicada.
Agora, isoladamente, também segundo jurisprudência consolidada nos tribunais pátrios, a lei que rege o tempo de serviço é aquela em vigor na época em que prestado. Logo, se a parte autora tiver exercido atividade que seja tida por insalubre hoje ou há dez anos, assim permanecerá sendo reconhecida como tal, independentemente de, em lege ferenda, se diga o contrário, haja vista que, repita-se, é a lei vigente quando da sua prestação que será utilizada como base do reconhecimento do tempo como comum ou especial, e, assim, tratar-se-á de direito adquirido, motivo pelo qual totalmente desnecessário o ajuizamento desta ação judicial. Isso sem falar que não se sabe se o INSS, quando da efetiva análise do pedido de ATC, irá considerá-lo especial ou comum; sem olvidar que, em não o considerando, ai sim poderá buscar o Poder Judiciário com a configuração de uma lide, ocasião em que se examinará a natureza do serviço prestado.
Assim, ausente interesse de agir no processamento do feito, indefiro de plano a petição inicial.
No caso dos autos, a parte autora não formulou qualquer requerimento administrativo junto ao INSS, seja de concessão de benefício ou de reconhecimento e averbação de tempo de serviço especial.
Assim, não havendo pretensão resistida, deve ser mantida a sentença que extinguiu o feito sem exame de mérito nos termos do artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil.
Mantida a sentença ao não condenar no pagamento de honorários advocatícios, uma vez que não houve citação.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001497741v2 e do código CRC 171f94c1.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5006958-11.2019.4.04.7110/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: LUCIANA OLIVEIRA BOTTINI (AUTOR)
ADVOGADO: ANDIARA PORTANTIOLO CONCEIÇÃO (OAB RS047459)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. INTERESSE DE AGIR NÃO CONFIGURADO.
Não havendo qualquer requerimento administrativo anterior ao processo, seja de concessão de benefício, seja de reconhecimento e averbação de tempo de serviço, a extinção do feito sem exame de mérito por conta da ausência de interesse de agir é medida que se impõe.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 11 de dezembro de 2019.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 11/12/2019
Apelação Cível Nº 5006958-11.2019.4.04.7110/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR(A): ALEXANDRE AMARAL GAVRONSKI
APELANTE: LUCIANA OLIVEIRA BOTTINI (AUTOR)
ADVOGADO: ANDIARA PORTANTIOLO CONCEIÇÃO (OAB RS047459)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 11/12/2019, às 10:00, na sequência 325, disponibilizada no DE de 25/11/2019.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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