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PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. INOCORRÊNCIA. TRF4. 5015430-30.2020.4.04.9999...

Data da publicação: 17/12/2021, 11:01:22

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. INOCORRÊNCIA. 1. O mero julgamento do pedido, sem resolução de mérito, não pode conduzir à caracterização da litigância de má-fé. 2. Não se verificando quaisquer das circunstâncias previstas no art. 80 do CPC, indevida a condenação da parte autora por litigância de má-fé. (TRF4, AC 5015430-30.2020.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 09/12/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5015430-30.2020.4.04.9999/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: CLAUDIR PRESSI

ADVOGADO: ELISANDRA BISSANI (OAB RS089444)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Trata-se de apelação contra sentença publicada na vigência do Código de Processo Civil de 2015 em que foram julgados parcialmente procedentes os pedidos, com dispositivo de seguinte teor:

Ante o exposto, com fulcro no art. 487, inciso I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido deduzido pela parte autora em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, para efeito de:

a) RECONHECER que a parte autora exerceu atividade rural, em regime de economia familiar, no intervalo de 31.10.1991 a 31.12.1991, fazendo jus à averbação do correspondente tempo de serviço/contribuição, contanto que efetue a indenização das respectivas contribuições, nos termos da fundamentação;

b) declarar a inexigibilidade de juros e multa sobre a indenização das contribuições referentes ao período em que a parte autora laborou na atividade rural anteriormente à edição da Medida Provisória n.º 1.523/96, em 11/10/1996;

Diante da ínfima procedência dos pedidos, condeno a parte autora ao parte das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. Suspensa exigibilidade da sucumbência pois a autora goza de AJG (Ev. 8).

Apelou a parte autora sustentando a ausência de litigância de má-fé, bem como que seja avaliada a possibilidade de lhe ser concedida a aposentadoria por tempo de contribuição, na modalidade proporcional.

Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.

Do interesse de agir

Observo que o magistrado singular reconheceu o período de 31/10/1991 a a 31/12/1991, porém o dia 31/10/1991 já foi averbado pela Autarquia e o restante do intervalo, encontra-se sobrestado, administrativamente, apenas aguardando a indenização. Desse modo, não tem a parte autora interesse de agir no que diz com o seu reconhecimento. Sendo carente de ação no ponto, cabível, nesse limite, a extinção do feito sem resolução do mérito, de ofício.

MÉRITO

Não estando o feito submetido ao reexame necessário, a controvérsia no plano recursal restringe-se:

- à condenação em litigância de má-fé;

- à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, na modalidade proporcional, a contar da DER.

Litigância de má-fé

O julgador singular condenou a parte autora ao pagamento de multa e honorários advocatícios sancionatórios, em face de ter entendido que houve litigância de má-fé:

Da litigância de má-fé:

Sabido é que é possibilitado ao magistrado conhecer de ofício a matéria, conforme ditames do art. 81, caput, do CPC.

Restou evidenciado no curso da lide que o autor tentou induzir este magistrado em erro, valendo-se de situação que efetivamente não correspondia à realidade. Da análise do conjunto probatório, pode-se afirmar que a autora alterou intencionalmente a verdade dos fatos e usou do processo com o intuito de conseguir objetivo ilícito.

Destaco, o requerente, quando do ajuizamento da demanda, alegou não terem sido reconhecidos os períodos rurais de 06.03.78 a 31.12.91 e o interregno de 10.07.14 a 22.03.15.

Nesse sentido, resta claro que o autor postulou o reconhecimento de período já reconhecido administrativamente, em nítido comportamento inadequado, tentando utilizar o referido tempo como um instrumento para complementação do tempo que eventualmente estivesse faltando. Vale referir que, na inicial, em nenhum momento o requerente informou que o período postulado foi reconhecido administrativamente. Ao contrário, afirmou convictamente que tais períodos não foram reconhecidos.

Em se de réplica, aduziu que, mesmo computados pelo INSS, pugnava pelo reconhecimento na via judicial para computar o tempo de contribuição do requerente e assim lhe sendo seja concedido o benefício.

Dessarte, verifica-se a má-fé da parte autora ao passo em que, ao buscar salvaguarda na esfera judicial, após ter seu pedido de concessão de aposentadoria indeferido na esfera administrativa, utiliza-se de conduta ardilosa e, aproveitando-se da situação, postula o reconhecimento de período já reconhecido naquela esfera, em nítida intenção de acrescer (novamente) aquele interregno ao tempo de contribuição em caso de ainda lhe faltar algum período.

Ora, não há outra conclusão a se chegar, a não ser de que o autor obrou com dolo, tentando induzir este magistrado em erro.

A condenação às penas da litigância de má-fé tem por pressuposto a evidência de que o comportamento da parte atenta à dignidade da justiça, impondo-se a configuração de uma das hipóteses elencadas pelo artigo 80 do CPC1.

Conforme lições de Nelson Nery Júnior e de Rosa Maria de Andrade Nery, o litigante de má-fé é definido como

a parte ou interveniente que, no processo, age de forma maldosa, com dolo ou culpa, causando dano processual à parte contrária. É o improbus litigator, que se utiliza de procedimentos escusos com o objetivo de vencer ou que, sabendo ser difícil ou impossível vencer, prolonga deliberadamente o andamento do processo procrastinando o feito2.

Nesta senda, resta caracterizada a ação dolosa da parte autora que, com o intuito de causar dano processual à parte contrária, alterou de forma significativa a verdade dos fatos, estando sua conduta abrigada pelos incisos II e V. Explico.

Conforme nos alerta Celso Agrícola Barbi, em seus Comentários ao Código de Processo Civil3,

No item II, cuida a lei de quem alterar a verdade dos fatos, isto é, alegar sua inexistência, apesar de, na realidade, existirem, ou vice-versa.

[...] pensamos que o ato de alterar um fato pressupõe a intenção malévola, o elemento subjetivo. Se a parte apresenta o fato em desacordo com a realidade, mas o faz por erro, entendemos que não se configura a má-fé, porque não se pode ver aí erro grosseiro, equiparado à culpa; tem lugar, no caso, a aplicação do brocardo: error facti nemine nocet.

Em conclusão, o elemento subjetivo, a intenção, deve existir para que se caracterize a má-fé punível. A punição é justificada pela existência de um ato positivo, qual seja, a alteração da verdade dos fatos.

Não há falar em presunção de se tratar de mero erro material, in casu. Com efeito, está-se diante de manifesta alteração da verdade dos fatos. Não há falar apenas em erro, tendo em vista que, além de requerer na inicial, reitera em réplica, ou seja, se se tratava de erro, quando da segunda manifestação nos autos poderia a parte tê-lo corrigido, o que não o fez.

Analiso, agora, o conteúdo do item V. Pois bem, é notório que

No inciso V, o Código reprime a conduta temerária em qualquer ato ou incidente do processo. Com base em Carnelutti, ensina José Olímpeio de Castro Filho que a temeridade pode resultar de dolo ou de culpa. Aquele se traduz na consciência da própria sem-razão, por quem sustenta ter razão, quando o litigante espera ganhar a demanda mais por erro do juiz do que pela verdade da causa. A temeridade por culpa existe quando a parte não pondera suficientemente sobre as razões de sua pretensão, mas não basta qualquer culpa, é preciso que ela seja grave4.

Complementando o exposto, entendemos que a norma veda ao litigante ou interveniente "agir de modo temerário ao propor a ação, ao contestá-la ou em qualquer incidente ou fase do processo. Proceder de modo temerário é agir afoitamente, de forma açocada e anormal, tendo consciência do injusto, de que não tem razão"5.

Como se vê, incisos II e V do art. 80 do CPC, são as hipóteses nas quais se encaixa a conduta do autor, conforme fundamentação supra, ao alterar a verdade dos fatos, e ao buscar enriquecimento ilícito e vantagem indevida no processo, haja vista que interfereria diretamente no tempo de contribuição exercido pelo autor. O que se verifica neste feito, é o dolo.

Observo que o proceder da parte autora gera toda a movimentação da máquina do Judiciário, já abarrotada de processos, vindo o presente feito a prejudicar o andamento dos demais processos.

Por conseguinte, evidenciada a má-fé processual da parte autora, deve esta ser condenada às penalidades de estilo, conforme ditames do art. 81, caput, do CPC6.

No art. 81 está a disciplina da condenação pela conduta do litigante de má-fé, de dúplice caráter: punitivo, representado pela multa; e reparatório, pela obrigação de indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou.

No caso em apreço, cabível a condenação apenas à multa e honorários, pois não houve prejuízos indenizáveis. "É necessário que essas perdas tenham efetivamente acontecido, pois não se indenizam danos meramente imagináveis. É mister, portanto, sejam elas comprovadas quanto à sua existência, mesmo que não determinado desde logo o seu valor"7.

A conduta desleal de uma das partes é prejudicial a todo o sistema jurisdicional, delongando a apreciação de outras inúmeras causas. Portanto, ao magistrado cabe, inclusive de ofício, coibir e punir comportamento atentatório a dignidade da justiça8.

Outrossim, “o fato de o culpado litigar com justiça gratuita não o isenta da obrigação de indenizar. Do contrário, a pobreza constituiria imunidade inadmissível”9. Isso posto, comungo do entendimento de que aquele que obra com má-fé não tem direito ao benefício de gratuidade judiciária10.

Anoto, inclusive, que os honorários de sucumbência não se confundem com os honorários sancionatórios da má-fé. Com efeito, "esta verba independe da condenação em virtude da sucumbência (CPC 85 e 87). Deve ser calculada sobre as perdas e danos decorrentes da condenação do litigante de má-fé por dano processual"11. Assim, os honorários da má-fé não são abarcados pela gratuidade, nos termos retro.

Com a devida vênia, não se trata de caso de litigância de má-fé. Postulou o autor o reconhecimento como tempo de labor dos período de 06/03/1978 a 31/12/1991 e 10/07/2014 a 22/03/2015, mesmo já tendo sido averbado administrativamente.

O fato do autor ter ajuizado ação, pleiteando intervalos já reconhecidos administrativamente, não conduz, por si só, à caracterização da litigância de má-fé pelo segurado, tendo em vista que ele próprio veio a reconhecer que os mesmos se encontravam computados. Assim, o que se tem é a simples extinção do pedido sem resolução do mérito, o que não pode caracterizar a litigância de má-fé.

Não se trata, assim, de situação prevista no art. 80, II eV do CPC, uma vez que o autor, deliberadamente, não modificou a verdade dos fatos; nem procedeu de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo.

Dessa forma, considerando que a mera extinção do pedido sem julgamento de mérito não pode levar à caracterização da litigância de má-fé, dou provimento ao autor para afastar sua condenação ao pagamento de multa e honorários advocatícios sancionatórios.

Direito à aposentadoria no caso concreto

No caso em exame, considerado o presente provimento judicial, a parte autora alcança, na DER (11/04/2017), 28 anos, 05 meses e 24 dias de tempo de serviço.

Pelo extrato CNIS acostado aos autos, está demonstrado que, mesmo após a DER, a parte autora seguiu efetuando recolhimentos.

Em relação às competências de 06/2019 a 12/2019, consta recolhimento como contribuinte individual com a pendência "PREC-MENOR-MIN - Recolhimento Abaixo do Valor Mínimo", sendo inviável o seu cômputo até eventual complementação.

Frise-se, nesse ponto, que sequer eventual complementação do recolhimento das referidas competências não implementa o autor os requisitos para a obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição, ainda que proporcional.

Conclusão

Parcialmente provida a apelação do autor para afastar sua condenação por litigância de má-fé. Nos demais pontos, mantida a sentença.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002917177v28 e do código CRC 564b0de9.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 9/12/2021, às 17:56:7


5015430-30.2020.4.04.9999
40002917177.V28


Conferência de autenticidade emitida em 17/12/2021 08:01:21.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5015430-30.2020.4.04.9999/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: CLAUDIR PRESSI

ADVOGADO: ELISANDRA BISSANI (OAB RS089444)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. INOCORRÊNCIA.

1. O mero julgamento do pedido, sem resolução de mérito, não pode conduzir à caracterização da litigância de má-fé.

2. Não se verificando quaisquer das circunstâncias previstas no art. 80 do CPC, indevida a condenação da parte autora por litigância de má-fé.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 07 de dezembro de 2021.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002917178v5 e do código CRC 0c33af5e.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 9/12/2021, às 17:56:7


5015430-30.2020.4.04.9999
40002917178 .V5


Conferência de autenticidade emitida em 17/12/2021 08:01:21.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO TELEPRESENCIAL DE 07/12/2021

Apelação Cível Nº 5015430-30.2020.4.04.9999/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PROCURADOR(A): LUIZ CARLOS WEBER

APELANTE: CLAUDIR PRESSI

ADVOGADO: ELISANDRA BISSANI (OAB RS089444)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 07/12/2021, na sequência 548, disponibilizada no DE de 22/11/2021.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 17/12/2021 08:01:21.

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