Apelação/Remessa Necessária Nº 5044501-10.2021.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
APELADO: MONICA BRISOLARA DE FREITAS (IMPETRANTE)
RELATÓRIO
O Instituto Nacional do Seguro Social interpôs apelação em face de sentença que concedeu a segurança para determinar a:
(...) reabertura do requerimento nº 1910933130, determinar a retomada do exame do pedido ali veiculado sem os óbices da IN 77/2015 e revisar a certidão antes expedida para incluir as competências 02/82 e de 04/82 a 12/82, caso não tenham sido utilizadas para outra inativação no RGPS, devendo comprovar o cumprimento da medida no prazo de trinta dias a contar da intimação da presente sentença.
O recorrente alegou, preliminarmente, a ausência de direito líquido e certo. Quanto ao mérito, afirmou que a decisão administrativa que indeferiu a emissão de certidão de tempo de contribuição, com a inclusão de períodos anteriores ao jubilamento pelo RGPS, está amparada na Instrução Normativa nº 77/2015. Pediu a reforma da sentença.
O Ministério Público Federal manifestou-se em parecer.
VOTO
Remessa necessária
Considerando que houve concessão da segurança em favor do impetrante, deverá a sentença ser submetida ao duplo grau de jurisdição obrigatório, nos termos do artigo 14º da Lei n. 12.016, que assim dispõe:
Art. 14. Da sentença, denegando ou concedendo o mandado, cabe apelação.
§ 1º Concedida a segurança, a sentença estará sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição.
Nesse contexto, impõe-se o reexame do julgado.
Direito líquido e certo
O objeto litigioso veiculado no "mandamus" diz respeito ao afastamento de norma prevista em portaria, a qual teria desbordado da sua função regulamentar, ao impor restrições não previstas nas normas regulamentadas.
Trata-se, pois, de mera discussão de matéria de direito, sem a necessidade de dilação probatória.
Além disso, no tópico referente ao mérito, o recorrente reafirmou a legitimdidade da decisão administrativa que o impetrante pretende que seja desconstituída, evidenciando-se, assim, o interesse de agir.
Com efeito, rejeito a preliminar.
Mérito
Quanto ao mérito, acolho como razões de decidir, a fundamentação formulada na sentença, nos seguintes termos:
A Impetrante requereu a revisão de certidão de tempo de contribuição já expedida pelo INSS, para fins de inclusão das competências 02/82 e de 04/82 a 12/82, não contempladas no documento anterior, pedido registrado sob o nº 1910933130 (evento 1, PROCADM3, fl. 01). O indeferimento do pedido foi assim motivado (evento 1, PROCADM3, fl. 57):
A Certidão não pode ser revista, visto que para requerente aposentado no RGPS, a CTC somente pode ser emitida para períodos após a Data do Inicio da aposentadoria e esta solicitando períodos anterior, conforma IN 77/2015.
O dispositivo da IN 77/2015 a que se refere a manifestação da Autoridade Impetrada é o art. 433, §3º, verbis:
Art.433. Para efeito de contagem recíproca, hipótese em queos diferentes sistemas de Previdência Social compensar-se-ão financeiramente,é assegurado:
(...)
§ 3º Caso o segurado seja aposentado pelo RGPS, será permitidaa emissão de CTC somente para períodos de contribuiçãoposteriores à data do início da aposentadoria concedida no RGPS,ainda que haja comprovação de tempo anterior não incluído no benefício.
Ocorre que tal dispositivo extrapola de sua função meramente regulamentar, porquanto estabelece regramentos que não encontram respaldo na Lei nº 8.213/91 e sequer no Decreto nº 3.048/99.
Nesse sentido já decidiu o TRF da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CERTIDÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO FRACIONADA. SEGURADO APOSENTADO POR IDADE. TEMPO EXCEDENTE. UTILIZAÇÃO EM REGIME PRÓPRIO. POSSIBILIDADE. 1. Espécie em que o segurado obteve aposentadoria por idade pelo RGPS e teve indeferido pedido de expedição de certidão de tempo de contribuição (CTC) para fins de aproveitamento em regime próprio, quanto a períodos não utilizados como carência para o deferimento do benefício, ao fundamento de que a legislação (artigo 433, §3º, da IN INSS/PRES nº 77/2015) vedaria a emissão de CTC relativa ao tempo anterior ao benefício concedido. 2. O artigo 96 da Lei nº 8.213/91 veda tão somente a utilização de tempo de serviço aproveitado para a concessão de aposentadoria por outro sistema, com proibição do cômputo do excesso (artigo 98 da mesma lei), e que o artigo 130, §10, do Decreto nº 3.048/99 permite a emissão de CTC fracionada, vedando apenas a emissão quanto a período já aproveitado para concessão de benefício. Assim, é evidente que o artigo 433, §3º, da IN INSS/PRES nº 77/2015 desbordou de sua função meramente regulamentar ao restringir direitos sem base legal. Ademais, o referido ato infralegal vai de encontro ao disposto no artigo 125, §3º, do Decreto nº 3.048/1999, que ao permitir a emissão de CTC de tempo posterior, não veda a emissão de CTC relativa a tempo anterior, desde que, obviamente, não aproveitado para a concessão em outro regime. 3. Precedentes desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça que permitem a emissão de CTC fracionada (TRF4, REOAC 2008.71.00.019398-0, Sexta Turma, relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 07/07/2010; TRF4, REOAC nº 5002807-52.2012.404.7108/RS, Sexta Turma, Rel. Des. Federal Néfi Cordeiro,j. 30/01/2013; STJ, AgRg no REsp 924.423/RS, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 15/04/2008, DJe 19/05/2008 (TRF4 5010031-60.2020.4.04.7205, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relatora ERIKA GIOVANINI REUPKE, juntado aos autos em 26/05/2021)
À vista da identidade entre o caso sob exame e aquele objeto do acórdão acima reproduzido, importante reproduzir parte das razões adotadas pela Eminente Relatora, que assim discorreu em seu voto:
(...)
A Constituição Federal garante a contagem recíproca, para fins de aposentadoria, "do tempo de contribuição entre o Regime Geral de Previdência Social e os regimes próprios de previdência social, e destes entre si, observada a compensação financeira, de acordo com os critérios estabelecidos em lei" (artigo 201, §9º, modificado pela Emenda Constitucional nº 103/2019, que praticamente repetiu a redação a redação anterior, inclusída pela Emenda Constitucional nº 20/98.).
O artigo 96 da Lei nº 8.213/96 assim dispõe acerca da contagem do tempo de contribuição:
Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes:
I - não será admitida a contagem em dobro ou em outras condições especiais;
II - é vedada a contagem de tempo de serviço público com o de atividade privada, quando concomitantes;
III - não será contado por um sistema o tempo de serviço utilizado para concessão de aposentadoria pelo outro;
O artigo 98 da Lei nº 8.213/91, por sua vez, veda apenas o cômputo do excesso assim definido:
Art. 98. Quando a soma dos tempos de serviço ultrapassar 30 (trinta) anos, se do sexo feminino, e 35 (trinta e cinco) anos, se do sexo masculino, o excesso não será considerado para qualquer efeito.
Quanto à emissão da certidão, assim dispõe o Decreto nº 3.048/99:
Art. 130. O tempo de contribuição para regime próprio de previdência social ou para Regime Geral de Previdência Social deve ser provado com certidão fornecida:
§ 10. Poderá ser emitida, por solicitação do segurado, certidão de tempo de contribuição para período fracionado.
§ 11. Na hipótese do parágrafo anterior, a certidão conterá informação de todo o tempo de contribuição ao Regime Geral de Previdência Social e a indicação dos períodos a serem aproveitados no regime próprio de previdência social.
§ 12. É vedada a contagem de tempo de contribuição de atividade privada com a do serviço público ou de mais de uma atividade no serviço público, quando concomitantes, ressalvados os casos de acumulação de cargos ou empregos públicos admitidos pela Constituição.
§ 13. Em hipótese alguma será expedida certidão de tempo de contribuição para período que já tiver sido utilizado para a concessão de aposentadoria, em qualquer regime de previdência social.
Extrai-se do exame dos dispositivos supratranscritos que o artigo 96 da Lei nº 8.213/91 veda tão somente a utilização de tempo de serviço aproveitado para a concessão de aposentadoria por outro sistema, com proibição do cômputo do excesso (artigo 98 da mesma lei), e que o artigo 130, §10, do Decreto nº 3.048/99 permite a emissão de CTC fracionada, vedando apenas a emissão quanto a período já aproveitado para concessão de benefício. Assim, é evidente que o artigo 433, §3º, da IN INSS/PRES nº 77/2015 desbordou de sua função meramente regulamentar ao restringir direitos sem base legal. Ademais, o referido ato infralegal vai de encontro ao disposto no artigo 125, §3º, do Decreto nº 3.048/1999, que ao permitir a emissão de CTC de tempo posterior, não veda a emissão de CTC relativa a tempo anterior, desde que, obviamente, não aproveitado para a concessão em outro regime.
Nesta linha de raciocínio, firmou-se o entendimento desta Corte Regional, segundo o qual é possível a emissão de CTC de maneira fracionada, ou seja, de modo que os vínculos do segurado possam ser desmembrados, a fim de que um deles possa ser considerado para o Regime Próprio de Previdência Social e outro para o Regime Geral da Previdência Social (RGPS).
À vista do conteúdo exauriente do voto acima reproduzido desnecessárias outras considerações a respeito da matéria sob exame, pois evidenciada a pertinência do pleito deduzido pela Impetrante, impondo-se determinar à Autoridade Impetrada a reabertura do requerimento nº 1910933130 para apreciar o exame do pedido ali veiculado sem os óbices da IN 77/2015 e emitir nova certidão contemplando as competências 02/82 e de 04/82 a 12/82, caso não tenham sido utilizadas para outra inativação.
Para cumprimento da medida determinada nesta sentença, mediante análise e decisão no processo administrativo - ou eventualmente andamento mediante a determinação de diligências que se fizerem necessárias - estabeleço, à falta de previsão, o prazo de trinta dias.
(...)
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto por negar provimento à remessa oficial e à apelação.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003173477v6 e do código CRC 9560329b.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5044501-10.2021.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
APELADO: MONICA BRISOLARA DE FREITAS (IMPETRANTE)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. REMESSA NECESSÁRIA. APELAÇÃO CÍVEL. certidão de tempo de contribuição. período anterior ao jubilamento. ilegalidade do artigo 433, § 3º, da IN INSS/PRES nº 77/2015.
1. Nos termos do artigo 14 da Lei nº 12.016, concedida a segurança, a sentença estará sujeita ao duplo grau de jurisdição.
2. Nos termos dos artigos 96 da Lei 8.213 e 130, § 10, do Decreto 3.048, tem direito o segurado ao aproveitamento de tempo de serviço para a obtenção de benefício em regime próprio, com a proibição do cômputo do excesso, e a emissão de certidão de tempo de serviço fracionada, vedada a certificação de período já aproveitado para a obtenção de benefício.
3. O artigo 433, §3º, da IN INSS/PRES nº 77/2015, ao limitar a emissão de certidão de tempo de contribuição somente para períodos posteriores à aposentação pelo RGPS, ainda que comprovada a ocorrência de período anterior não aproveitado, desbordou dos limites da função regulamentar.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial e à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de maio de 2022.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003173478v4 e do código CRC 1eaf6cdf.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 17/05/2022 A 24/05/2022
Apelação/Remessa Necessária Nº 5044501-10.2021.4.04.7100/RS
RELATORA: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
PROCURADOR(A): CÍCERO AUGUSTO PUJOL CORRÊA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
APELADO: MONICA BRISOLARA DE FREITAS (IMPETRANTE)
ADVOGADO: DIEGO GOMES FERREIRA (OAB RS089283)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/05/2022, às 00:00, a 24/05/2022, às 16:00, na sequência 164, disponibilizada no DE de 06/05/2022.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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