Apelação Cível Nº 5007449-23.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ALICE ZANGANARO GOMES OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | ANTONIO VICTORIO ROMA |
: | INIS DIAS MARTINS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. NULIDADE DA SENTENÇA. NÃO ACOLHIDA. ATIVIDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO. MANUTENÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA POR FORÇA DO CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
1. Possibilidade de julgamento do processo pelo Tribunal face à cognição exauriente, restando o processo "maduro", mesmo que nele existam questões de fato e de direito, pois não há necessidade de produção de novas provas. Nessas condições, não deve ser acolhida a preliminar de nulidade da sentença monocrática.
2. A aposentadoria por idade rural, no valor de um salário-mínimo, é devido aos trabalhadores rurais que comprovem o desempenho de atividade rural no período de carência, imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou anterior ao requerimento administrativo.
3. Comprovado o exercício da atividade rural em regime de economia familiar, com base em início de prova material acompanhada por prova testemunhal idônea, deve ser computado o tempo de serviço respectivo, sendo devida a concessão da aposentadoria por idade desde a data do requerimento administrativo.
4. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
5. Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, observada a Súmula 76 desta Corte.
6. Mantida a tutela antecipada por força da tutela específica para o cumprimento imediato do acórdão, devendo ser comprovada a manutenção do benefício em 45 dias, nos termos do artigo 497, caput, do novo Código de Processo Civil.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, negar provimento ao reexame necessário e manter a tutela antecipada concedida em sentença, por força do cumprimento imediato do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 17 de maio de 2017.
Ezio Teixeira
Juiz Federal Convocado
Documento eletrônico assinado por Ezio Teixeira, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8960302v4 e, se solicitado, do código CRC 6E0D4289. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Ezio Teixeira |
Data e Hora: | 22/05/2017 14:58 |
Apelação Cível Nº 5007449-23.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ALICE ZANGANARO GOMES OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | ANTONIO VICTORIO ROMA |
: | INIS DIAS MARTINS |
RELATÓRIO
Trata-se de reexame necessário e apelação do INSS contra sentença que julgou procedente o pedido concedendo à parte autora o benefício de aposentadoria por idade rural desde a DER e condenou o INSS ao pagamento de honorários advocatícios no importe de 10 % sobre o valor da condenação.
O INSS, em seu apelo, alega preliminarmente a nulidade da sentença, pois esta se baseou em documentos que não instruíram o feito. No mérito, o INSS pede a análise da remessa necessária e defende a improcedência do feito sustentando o não cumprimento da carência do art. 142 da Lei nº 8.213/91. Aduz que não há início razoável de prova material do efetivo exercício das atividades campesinas, não sendo possível admitir exclusivamente a prova testemunhal para comprovação de tempo de serviço rural para fins previdenciários. Subsidiariamente, pede a fixação da correção e dos juros com base nos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança (art. 1-F da Lei 9.4949/1997).
A parte autora apresentou contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
O caso dos autos trata do pedido de concessão de aposentadoria por idade rural desde 15/07/2013 (DER), mediante o reconhecimento da atividade rural em regime de economia familiar suficiente ao preenchimento do período de carência, já tendo a parte autora preenchido o requisito etário na data do requerimento administrativo.
REMESSA NECESSÁRIA
O art. 14 do CPC/2015 prevê a irretroatividade da norma processual a situações jurídicas já consolidadas. A partir disso, verifico que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, de modo que não é aplicável o art. 496 do CPC/2015, em relação à remessa necessária, em razão da irretroatividade.
De acordo com a decisão do Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial (EREsp 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o INSS só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso dos autos, admito como interposta a remessa necessária.
DA NULIDADE DA SENTENÇA
O INSS pede a decretação de nulidade da sentença a quo sustentando que o Juízo monocrático fundamentou sua sentença em documentos estranhos ao feito.
Em análise à sentença atacada, observo que foram utilizadas para a formação da convicção do magistrado documentos comumente utilizados neste tipo de ação, tais como Certidão de Casamento com a qualificação do esposo como lavrador, contratos de parceria agrícola, fichas de unidade de saúde, notas fiscais de produtor, entre outros. Sobre os documentos citados, a fundamentação os situa em eventos sequenciais que destoam dos eventos deste processo.
No caso, entendo não ser o caso de declarar nula a sentença prolatada, pois nesta ação constam os mesmos documentos supra citadas, os quais, por si só, formam razoável início de prova material, possibilitando o pronto julgamento por esta Corte.
No ponto, não há se falar em suprimento de instância, pois o Juízo a quo não utilizou apenas as provas materiais mencionadas para sentenciar, mas, também, a prova oral produzida, não sendo empregado com exclusividade o meio probatório atacado.
Outrossim, há possibilidade de julgamento do processo pelo Tribunal face à cognição exauriente, restando o processo "maduro", mesmo que nele existam questões de fato e de direito, pois não há necessidade de produção de novas provas.
Logo, rejeito a preliminar aventada.
APOSENTADORIA POR IDADE DOS TRABALHADORES RURAIS
O benefício de aposentadoria por idade aos trabalhadores rurais está previsto no art. 48, § 1º da Lei nº 8.213/91, in verbis:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Parágrafo incluído pela Lei nº 9.032, de 28.4.95 e alterado pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)".
Já o art. 39, inciso I, da Lei nº 8.213/91, estabelece a concessão do benefício no valor de um salário-mínimo, desde que comprovado o desempenho da atividade rural em regime de economia familiar no período de carência, nos seguintes termos:
"Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido;"
A partir da redação dos dispositivos supra, retira-se que os requisitos necessários à concessão do benefício são a qualidade de segurado, o preenchimento do período de carência e a idade. O legislador, sensível às condições mais dificultosas do trabalhador do campo, reduziu a idade mínima exigida em cinco anos, para ambos os sexos.
Anoto que não é necessária a carência em si, ou seja, as contribuições referentes ao período, mas apenas o lapso temporal da carência. Para verificar-se qual o número de meses necessários utiliza-se o art. 142, quando o segurado especial tenha iniciado suas atividades em período anterior à Lei nº 8.213/91, bem como sua tabela de transição. O segurado deverá, por conseguinte, comprovar a atividade rural pelo número de meses correspondente ao ano de implemento das condições.
Caso o segurado tenha iniciado o desempenho de suas atividades em período posterior à Lei nº 8.213/91, aplica-se a carência de 180 meses de atividade rural, conforme o art. 25, II da Lei nº 8.213/91.
Seguindo o entendimento do STJ, a atividade rural para preenchimento do período de carência não deve, necessariamente, ser contínua e ininterrupta. Em decorrência disso, o exercício de trabalho urbano intercalado ou concomitante ao labor campesino, por si só, não retira a condição de segurado especial do trabalhador rural. (AgRg no REsp 1342355/SP, DJe 26/08/2013; AgRg no AREsp 334.161/PR, DJe 06/09/2013).
ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR
Inicialmente, entende-se por "regime de economia familiar" nas palavras da Lei nº 8.213/91, através de seu art. 11, § 1°, "a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados".
No que concerne à prova do tempo de serviço exercido nesse tipo de atividade, deve-se observar a regra art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, que dispõe que "a comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento".
Para a análise do início de prova material, filio-me aos seguintes entendimentos sumulados:
Súmula nº 73 do TRF da 4ª Região: Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Súmula nº 149 do STJ: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário.
Súmula nº 577 do STJ: É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.
Quanto à contagem do tempo de serviço rural em regime de economia familiar prestado por menor de 14 anos, entendo ser devida. Conforme o STJ, a legislação, ao vedar o trabalho infantil do menor de 14 anos, teve por escopo a sua proteção, tendo sido estabelecida a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo, aplicando-se o princípio da universalidade da cobertura da Seguridade Social (AR nº 3.629/RS, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 9/9/2008; EDcl no REsp nº 408.478/RS, Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 5/2/2007; AgRg no REsp nº 539.088/RS, Ministro Felix Fischer, DJ 14/6/2004). No mesmo sentido é a Sumula nº 05 da TNU dos JEF.
Esclareço ser possível a formação de início razoável de prova material sem a apresentação de notas fiscais de produtor rural em nome próprio. Com efeito, a efetiva comprovação da contribuição é flexibilizada pelo fato de o art. 30, inciso III, da Lei nº 8.212/91, atribuir a responsabilidade de recolher à empresa que participa da negociação dos produtos referidos nas notas fiscais de produtor, seja na condição de adquirente, consumidora, consignatária ou se trate de cooperativa. Nesse caso, a contribuição especificada não guarda relação direta com a prestação de serviço rural em família, motivo pelo qual se pode reconhecer o tempo de serviço rural, ainda que ausentes notas fiscais de produtor rural como início de prova material.
A existência de início de prova material, todavia, não é garantia de obtenção do tempo de serviço postulado. A prova testemunhal é de curial importância para que se confirme a atividade e seu respectivo lapso temporal, complementando os demais elementos probatórios.
No que respeita à não exigência de contribuições para a averbação do tempo de serviço do segurado especial, a questão deve ser analisada sob o prisma constitucional, eis que em seu texto foi prevista a unificação da Previdência Social, outorgando a qualidade de segurado do RGPS aos trabalhadores rurais.
Obedecendo a tais mandamentos, o § 2º, do art. 55, da Lei nº 8.213/91 previu a possibilidade de que o tempo de serviço rural dos segurados especiais fosse computado independentemente do recolhimento de contribuições ou indenização:
"O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência conforme dispuser o Regulamento."
Tal entendimento foi esposado pelo Supremo Tribunal Federal na decisão liminar da ADIN 1664-4-DF. Assim, desde que devidamente comprovado, o tempo de serviço que o segurado trabalhou em atividade rural poderá ser utilizado para fins de qualquer aposentadoria por tempo de serviço independentemente de contribuições.
Também devem ser observados os precedentes vinculantes, conforme estipula o art. 927 do CPC/2015. Do STJ, temos as seguintes teses firmadas:
Tema 644 - Concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição a trabalhador urbano mediante o cômputo de atividade rural
"Não ofende o § 2º do art. 55 da Lei 8.213/91 o reconhecimento do tempo de serviço exercido por trabalhador rural registrado em carteira profissional para efeito de carência, tendo em vista que o empregador rural, juntamente com as demais fontes previstas na legislação de regência, eram os responsáveis pelo custeio do fundo de assistência e previdência rural (FUNRURAL). (REsp 1352791/SP)
Tema 554 - Abrandamento da prova para configurar tempo de serviço rural do "boia-fria"
"o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal. (REsp 1321493/PR)
Temas 532, 533 - Repercussão de atividade urbana do cônjuge na pretensão de configuração jurídica de trabalhador rural previsto no art. 143 da Lei 8.213/1991
"3.O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana." (REsp 1304479/SP)
No caso dos autos, a parte autora apresentou os seguintes documentos como início de prova material:
- Notas fiscais de produtor em nome próprio, dos anos de 2009, 2011, 2012, 2013 (evento 1, OUT2);
- Certidão de casamento de uma filha da autora, celebrado em 12/09/2009, qualificados a autora e o esposo como lavradores (evento 1, OUT4, fl. 1);
- Históricos escolares e requerimentos de matrícula de filhos da autora, referentes aos anos de 1987 a 1992, em Escola do município de Marilena-PR e de 1996 a 1999, onde consta o endereço rural dos genitores (evento 1, OUT4, fls. 4/12);
- Fichas médicas com timbre do município de Marilena, em nome da autora, qualificada como lavradora, com endereço rural, com atendimento nos anos de 2007, 2001, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011 e 2012 (evento 1, OUT4, fls. 4/12);
- Certidão de casamento da autora, celebrado em 24/02/1979, qualificado o esposo como lavrador e a autora como professora (evento 1, OUT6);
- Fatura de energia elétrica com endereço rural em nome do esposo da autora, do mês de abril de 2013 (evento 1, OUT7);
- Diversos contratos de parceria rural em nome do esposo da autora, entre 30/09/1987 e 01/10/2001 (evento 1, OUT8, OUT9);
- INFBEN da autora acerca de auxílio-doença que auferiu no ano de 2011 na esfera administrativa na qualidade de segurada especial (evento 64, INFBEN1).
Mediante entrevista rural na esfera administrativa (evento 1, OUT5, fls. 2/3), a parte autora declarou que exerce atividade rural desde o ano de 2002, consistente em tirar leite e tratar das vacas. Não houve afastamentos. A área não é própria, possuindo a autora contrato firmado com o proprietário para exploração de uma pequena parte das terras. Nunca houve a necessidade de auxílio de terceiros, pois a propriedade é pequena e não lhe exige muito. Produzia leite e o vendia para o laticínio de Nova Londrina. Também cria porcos para o consumo. Não possui outra fonte de renda.
Prestou depoimento pessoal na audiência realizada em Juízo (evento 59, VÍDEO1) acrescentando que iniciou a atividade rural logo após casar-se, ao 23 anos. Antes disso não tinha trabalhado. O marido era arrendatário de uma lavoura de café no Sítio São Judas Tadeu de propriedade do Sr. Bento. A autora colhia café, carpia, rastelava e os demais serviços da roça. Trabalhou nesse sítio por 19 anos, que depois passou para o sítio do irmão do antigo proprietário, Sr. Camilo, depois trabalharam no sítio do Sr. Raimundo, também nas lavouras de café. O pagamento era por porcentagem, nesse sítio trabalhou até 2002. Depois, mudaram para o "Mandiocão", onde residiam e trabalhavam com mandioca. Adquiriram terras em Três Marias, trabalhando no café até 2011, quando venderam a propriedade e mudaram-se para o Assentamento Santo Ângelo para plantar mandioca, onde estão atualmente. As atividades eram realizadas pelo casal e três filhas.
Os depoimentos das testemunhas (evento 59, VÍDEO2 e VÍDEO3) foram uníssonos e convergentes com as alegações da parte autora, confirmando o labor campesino nos moldes de economia familiar.
Da análise dos autos, considero que os documentos acostados constituem início de prova material, contemporâneo aos fatos alegados, demonstrando que a segurada laborava no meio rural, em regime de economia familiar, no período reconhecido pelo provimento jurisdicional.
Cabível o aproveitamento dos documentos rurais em nome do esposo para fins de comprovação da atividade rurícola em face da impessoalidade característica desse regime, que tem sua relevância na participação de todos os seus membros.
Os documentos acima arrolados, a meu ver, são suficientes a evidenciar o histórico rurícola do casal, a contar da data do casamento, celebrado em 24/02/1979, considerando que a autora jamais realizou atividade diversa, o que se evidencia pelo CNIS acostado aos autos que demonstra inexistirem recolhimentos à Previdência Social em seu nome.
Ressalto que não há necessidade de apresentação de documento ano a ano, sendo suficiente que o contexto probatório conduza à conclusão de que efetivamente houve o desenvolvimento de atividade agrícola. Não se exigem elementos de prova que preencham todos os anos em que prestou o trabalho rural, sendo da essência a descontinuidade, devendo ser analisada a possibilidade do reconhecimento da atividade rural segundo o conjunto das provas trazidas nos autos. Ademais, a prova testemunhal demonstrou a dedicação campesina da parte, sem a utilização de empregados, devendo ser considerado como supletiva da ausência de outras provas materiais.
No tocante aos vínculos urbanos do esposo da autora (evento 65, CNBIS1), resumem-se a dois contratos de trabalho urbano por curto período, em épocas remotas, um anterior ao casamento, outro de 23/08/1979 a 25/03/1980, por aproximadamente 7 meses apenas, inexistindo outras provas a infirmar o labor rurícola alegado.
Observo que o esposo da autora encontra-se aposentado por invalidez desde o ano de 2006 na qualidade de segurado especial (evento 65, INFBEN2).
Por fim, a prova testemunhal corroborou de forma convincente o acervo material probatório, confirmando a tese discorrida na peça vestibular.
Dessa forma, reconheço em favor da parte autora para fins previdenciários, como tempo de serviço rural em regime de economia familiar, o período de 24/02/1979 a 15/07/2013 (DER), sem a necessidade de recolher contribuições, totalizando 34 anos, 4 meses e 22 dias de tempo de serviço, equivalentes a 414 meses de carência.
A partir desses fundamentos, implementou o requisito etário no ano de 2013, pois nasceu em 04/06/1958, e cumpriu, até a DER, mais de 180 meses de carência, conforme previsão do art. 142 da Lei nº 8.213/91.
Assim, preenchidos os requisitos legalmente exigidos, possui direito ao benefício previdenciário de aposentadoria por idade rural desde 15/07/2013 (DER), na forma dos arts. 39, I, e 49, II, da Lei 8.213/91.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária no ponto.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Por força da sucumbência, o INSS deve arcar com os honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
CUSTAS PROCESSUAIS
O INSS é isento do pagamento no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (art. 11 da Lei nº 8.121/85, com a redação dada pela Lei nº 13.471/2010), isenção esta que não se aplica quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
DO PREQUESTIONAMENTO
Os fundamentos para o julgamento do feito trazem nas suas razões de decidir a apreciação dos dispositivos citados, utilizando precedentes jurisprudenciais, elementos jurídicos e de fato que justificam o pronunciamento jurisdicional final. Ademais, nos termos do § 2º do art. 489 do CPC/2015, "A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé". Assim, para possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas nos recursos oferecidos pelas partes, nos termos em que fundamentado o voto.
TUTELA ESPECÍFICA
O CPC/2015 aprimorou a eficácia mandamental das decisões que tratam de obrigações de fazer e não fazer e reafirmou o papel da tutela específica. Enquanto o art. 497 do CPC/2015 trata da tutela específica, ainda na fase cognitiva, o art. 536 do CPC/2015 reafirma a prevalência da tutela específica na fase de cumprimento da sentença. Ainda, os recursos especial e extraordinário, aos quais está submetida a decisão em segunda instância, não possuem efeito suspensivo, de modo que a efetivação do direito reconhecido pelo tribunal é a prática mais adequada ao previsto nas regras processuais civis. Assim, mantenho a tutela antecipada, por força da tutela específica, quanto à implantação do benefício da parte autora (NB 159.420.499-0), comprovada a sua manutenção em 45 dias.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
CONCLUSÃO
O Apelo da parte ré, no que versa sobre os consectários legais, deve ser reconhecido como parcialmente provido, pois foi conhecido e será analisado na fase de cumprimento da Sentença, sem a determinação categórica dos índices e critérios a serem aplicadas no caso presente, possibilitando inclusive a transação/conciliação entre as partes litigantes, de forma a agilizar a solução do feito. No ponto, resta prejudicada a análise da remessa oficial e improvida quanto ao restante.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do INSS, negar provimento ao reexame necessário e manter a tutela antecipada concedida em sentença, por força do cumprimento imediato do acórdão.
Ezio Teixeira
Juiz Federal Convocado
Documento eletrônico assinado por Ezio Teixeira, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8960301v7 e, se solicitado, do código CRC 7DBE2459. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Ezio Teixeira |
Data e Hora: | 22/05/2017 14:58 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/05/2017
Apelação Cível Nº 5007449-23.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00016971220138160121
RELATOR | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da Republica Paulo Gilberto Cogo Leivas |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ALICE ZANGANARO GOMES OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | ANTONIO VICTORIO ROMA |
: | INIS DIAS MARTINS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/05/2017, na seqüência 2121, disponibilizada no DE de 02/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, NEGAR PROVIMENTO AO REEXAME NECESSÁRIO E MANTER A TUTELA ANTECIPADA CONCEDIDA EM SENTENÇA, POR FORÇA DO CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8997068v1 e, se solicitado, do código CRC 6609483A. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
Data e Hora: | 18/05/2017 10:07 |