Apelação Cível Nº 5003673-08.2022.4.04.7012/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: GERALDO DAL BOSCO (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de embargos de declaração opostos pela parte autora contra acórdão assim ementado (
):PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. REQUISITOS LEGAIS. ART. 48, § 3º, DA LEI Nº 8.213/1991. ATIVIDADE URBANA E ATIVIDADE RURAL. TEMA 1007/STJ. PROVA. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES RELATIVAS AO PERÍODO RURAL. DESNECESSIDADE.
1. Tem direito à aposentadoria por idade, mediante conjugação de tempo de serviço/contribuição rural e urbano durante o período de carência, nos termos do § 3º do art. 48 da Lei nº 8.213/1991, incluído pela Lei nº 11.718/2008, o segurado que cumpre o requisito etário de 60 anos, se mulher, ou 65 anos, se homem. Tratando-se de trabalhador rural que migrou para a área urbana, o fato de não estar desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo não pode servir de obstáculo à concessão do benefício.
2. Conforme o art. 18. da EC 103/19, o segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor da referida Emenda Constitucional poderá aposentar-se quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos: I - 60 (sessenta) anos de idade, se mulher, e 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem; e II - 15 (quinze) anos de contribuição, para ambos os sexos. § 1º A partir de 1º de janeiro de 2020, a idade de 60 (sessenta) anos da mulher, prevista no inciso I do caput, será acrescida em 6 (seis) meses a cada ano, até atingir 62 (sessenta e dois) anos de idade. Conforme o art. 19 da EC 103/19, o segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social após a data de entrada em vigor da Emenda Constitucional será aposentado aos 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, com 15 (quinze) anos de tempo de contribuição, se mulher, e 20(vinte) anos de tempo de contribuição, se homem.
3. Ao definir o Tema 1007 dos Recursos Especiais Repetitivos, o Superior Tribunal de Justiça fixou a seguinte tese: "o tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3º. da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo."
4. O Plenário do Supremo Tribunal Federal não reconheceu a constitucionalidade da questão no Recurso Extraordinário nº 1281909, interposto contra o acórdão representativo do Tema 1007/STJ, conforme decisão publicada em 25.09.2020: "O Tribunal, por maioria, reconheceu a inexistência de repercussão geral da questão, por não se tratar de matéria constitucional, vencido o Ministro Ricardo Lewandowski. Não se manifestou o Ministro Celso de Mello."
5. Para a comprovação do tempo de atividade rural é preciso existir início de prova material, não sendo admitida, em regra, prova exclusivamente testemunhal. Em face da alteração legislativa introduzida pela MP nº 871/2019, convertida na Lei nº 13.846/2019, que modificou os arts. 106 e 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, e acrescentou os artigos 38-A e 38-B, a comprovação da atividade do segurado especial pode ser feita por meio de autodeclaração, corroborada por documentos que se constituam em início de prova material de atividade rural, ratificada por entidades públicas credenciadas, nos termos do art. 13 da Lei nº 12.188, de 11 de janeiro de 2010, e por outros órgãos públicos, na forma prevista no regulamento.
6. Comprovados o preenchimento do requisito etário e o exercício de atividades laborais urbanas e rurais no período exigido de carência, a parte autora faz jus à concessão do benefício.
7. Determinada a imediata implantação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do Código de Processo Civil de 2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário.
Sustenta o embargante, em síntese, a existência de omissão no acórdão, pois deixou de analisar o pedido de concessão do benefício mais vantajoso (RE 630.501 e tema 334 STF) e da exclusão das contribuições desvantajosas nos termos do artigo 26 § 6º da EC 103/2019. Sustenta que a DER ocorreu em 28/01/2022, após a publicação da referida EC e anteriormente à Lei nº 14.331/2022, que extinguiu tal possibilidade, e requer o prequestionamento dos dispositivos que elenca ( ).
Intimado o INSS para oferecer contrarrazões, deixou transcorrer o prazo sem manifestação.
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
VOTO
Embargos de declaração
São cabíveis embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para esclarecer obscuridade ou eliminar contradição, suprir omissão ou corrigir erro material, consoante dispõe o artigo 1.022 do Código de Processo Civil.
No caso vertente, examinando a fundamentação invocada no voto condutor do acórdão embargado, verifica-se, de fato, que o pedido de aplicação da regra de descarte das menores contribuições, no cálculo do benefício, prevista no art. 26, § 6º, da EC n. 103/2019, a fim de proporcionar ao segurado o melhor benefício, restou não analisado, o que passo a fazer.
A questão trazida em embargos se restringe à forma de cálculo da RMI. O acórdão ora embargado determinou a concessão do benefício ao embargante sem delimitar a forma de apuração da RMI.
Esta turma, em relação ao tema, tem entendido conforme o precedente que ora colaciono:
MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. REAFIRMAÇÃO DA DER. CÔMPUTO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA FEITA COMO SEGURADO FACULTATIVO. POSSIBILIDADE. DESCARTE DE CONTRIBUIÇÃO QUE RESULTA EM REDUÇÃO DO VALOR DO BENEFÍCIO. ARTIGO 26, § 6º, DA EC 103/2019. 1. O direito líquido e certo a ser amparado através de mandado de segurança é aquele que pode ser demonstrado de plano, mediante prova pré-constituída, sem a necessidade de dilação probatória. 2. É cediço que o INSS permite a reafirmação da DER quando o segurado preencher os requisitos para a concessão de benefício mais vantajoso no curso do processo administrativo, consoante sucessivas Instruções Normativas que editou. 3. A lei não veda ao segurado especial o recolhimento de contribuições como facultativo. "O recolhimento de contribuições como contribuinte facultativo não constitui óbice à caracterização da condição de segurada especial, pois o §1.º, do art. 25, da Lei 8.212/91 dispõe que o segurado especial, além da contribuição obrigatória referida no caput, poderá contribuir facultativamente, na forma do art. 21 desta Lei." (TRF4, AC 5026162-41.2018.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 21/05/2020). 4. Inexiste óbice ao reconhecimento do direito à reafirmação da DER e cálculo do benefício previdenciário de aposentadoria por idade com descarte da contribuição de menor valor, considerando-se o previsto no artigo 26, § 6º, da Emenda Constitucional nº 103/2019. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000205-13.2021.4.04.7031, 10ª Turma, Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 07/07/2022)
Por oportuno, transcrevo os fundamentos do precedente referido, in verbis:
Como se vê, o Juízo de origem entendeu por ausência de boa-fé da segurada no recolhimento de contribuições como contribuinte facultativo, pois realizadas "com nítido intuito de que a parte impetrante tivesse o pedido de aposentadoria por idade híbrida concedido".
Contudo, não se verifica irregularidades nos recolhimentos feitos como contribuinte facultativo referentes às competências 04/2020 e 09/2020.
A lei não veda ao segurado especial o recolhimento de contribuições como facultativo. "O recolhimento de contribuições como contribuinte facultativo não constitui óbice à caracterização da condição de segurada especial, pois o §1.º, do art. 25, da Lei 8.212/91 dispõe que o segurado especial, além da contribuição obrigatória referida no caput, poderá contribuir facultativamente, na forma do art. 21 desta Lei." (TRF4, AC 5026162-41.2018.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 21/05/2020).
Além disso, o reconhecimento de tempo de serviço prestado na área rural até 31.10.1991, para efeito de concessão de benefício no Regime Geral da Previdência Social, não está condicionado ao recolhimento das contribuições previdenciárias correspondentes (arts. 55, §2.º, e 96, IV, da Lei 8.213/91, art. 195, §6.º, CF e arts. 184, V, do Decreto 2.172/97, e 127, V, do Decreto 3.048/1999).
De se ressaltar que o INSS não alegou irregularidade nos recolhimentos. Ao contrário, acolheu o pedido de aposentadoria por idade híbrida com base na contribuição referente à competência 04/2020 e, em suas informações, orientou à segurada que entrasse com pedido de revisão, solicitando a reafirmação da DER para 02/10/2020, a fim de possibilitar o cômputo da contribuição 09/2020 e consequentemente majorar o valor da sua aposentadoria (Evento 10 do processo originário, PET1).
Desse modo, não vejo óbice ao reconhecimento do direito à reafirmação da DER e cálculo do benefício previdenciário de aposentadoria por idade com descarte da contribuição de menor valor, considerando-se o previsto no artigo 26, § 6º, da Emenda Constitucional nº 103/2019:
Art. 26. Até que lei discipline o cálculo dos benefícios do regime próprio de previdência social da União e do Regime Geral de Previdência Social, será utilizada a média aritmética simples dos salários de contribuição e das remunerações adotados como base para contribuições a regime próprio de previdência social e ao Regime Geral de Previdência Social, ou como base para contribuições decorrentes das atividades militares de que tratam os arts. 42 e 142 da Constituição Federal, atualizados monetariamente, correspondentes a 100% (cem por cento) do período contributivo desde a competência julho de 1994 ou desde o início da contribuição, se posterior àquela competência.
§ 6º Poderão ser excluídas da média as contribuições que resultem em redução do valor do benefício, desde que mantido o tempo mínimo de contribuição exigido, vedada a utilização do tempo excluído para qualquer finalidade, inclusive para o acréscimo a que se referem os §§ 2º e 5º, para a averbação em outro regime previdenciário ou para a obtenção dos proventos de inatividade das atividades de que tratam os arts. 42 e 142 da Constituição Federal.
Registre-se, por fim, que o Ministério Público Federal exarou parecer pelo provimento da apelação, referindo que "tendo a impetrante vertido contribuição previdenciária no decurso do procedimento administrativo, cuja existência foi verificada de acordo com o CNIS disponibilizado nos autos (Evento 1 – PROCADM3), é possível a reafirmação da DER para a competência 10/2020. A partir disso, a impetrante terá como abrangida renda mais vantajosa, pois aplicar-se-á a sistemática de cálculo da RMI do art. 26, § 6º, da Emenda Constitucional n.º 103, majorando o valor do benefício percebido pela impetrante" (evento 4).
Por esses fundamentos, o apelo merece provimento para reafirmar a DER do benefício de aposentadoria por idade híbrida (NB 41/191.763.899-7) para 02/10/2020, com cômputo da contribuição referente à competência 09/2020 e descarte de contribuição que implique redução do valor da aposentadoria, conforme autoriza o artigo 26, § 6º, da Emenda Constitucional nº 103/2019.
Destarte, diante do entendimento desta Turma, deve ser suprida a omissão, ressalvando a aplicabilidade ao caso da regra prevista no art. 26, § 6º, da EC n. 103/2019, quando do cálculo definitivo de apuração da RMI, na fase de cumprimento do julgado.
Prequestionamento
Quanto ao prequestionamento de dispositivos legais e/ou constitucionais que não foram examinados expressamente no acórdão, consigno que se consideram nele incluídos os elementos suscitados pela parte embargante, independentemente do acolhimento ou não dos embargos de declaração, conforme disposição expressa do artigo 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
Embargos de declaração providos para suprir omissão.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento aos embargos de declaração.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004332057v5 e do código CRC 0aae6e7d.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5003673-08.2022.4.04.7012/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: GERALDO DAL BOSCO (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CABIMENTO. CÁLCULO DA RENDA MENSAL INICIAL (RMI). ARTIGO 26, § 6º, DA EC N° 103/2019.
1. São cabíveis embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão ou corrigir erro material, nos termos do artigo 1.022 do Código de Processo Civil.
2. Conforme o § 6º do art. 26 da EC 103/2019, para o cálculo da RMI fica autorizada a exclusão da média os salários de contribuições mais baixos, desde que não seja afetado o tempo mínimo exigido, bem como a carência. Precedente da Turma.
3. O prequestionamento de dispositivos legais e/ou constitucionais que não foram examinados expressamente no acórdão, suscitados pelo embargante, nele se consideram incluídos independentemente do acolhimento ou não dos embargos de declaração, nos termos do artigo 1.025 do Código de Processo Civil.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento aos embargos de declaração, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 27 de fevereiro de 2024.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004332058v3 e do código CRC 793fe705.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 20/02/2024 A 27/02/2024
Apelação Cível Nº 5003673-08.2022.4.04.7012/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PROCURADOR(A): RODOLFO MARTINS KRIEGER
APELANTE: GERALDO DAL BOSCO (AUTOR)
ADVOGADO(A): Paula Miriã Santa Catarina (OAB PR058769)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 20/02/2024, às 00:00, a 27/02/2024, às 16:00, na sequência 743, disponibilizada no DE de 07/02/2024.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Conferência de autenticidade emitida em 09/03/2024 04:01:52.