D.E. Publicado em 30/01/2017 |
EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0018856-14.2015.4.04.9999/SC
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
EMBARGANTE | : | ORIDALVA MARIA PAGEL |
ADVOGADO | : | Osmar Schutz e outro |
EMBARGADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. DESCONSTINUIDADE. PERÍODOS INTERCALADOS DE TRABALHO URBANO.
1. A descontinuidade não pode ser interpretada judicialmente de modo mais rigoroso do que o faz a Administração, que, no artigo 145 da IN 45/2010, estabelece tão somente dois pressupostos: (a) completar o segurado número de meses igual ao período de carência exigido para a concessão do benefício e (b) estar em efetivo exercício da atividade rural à época do requerimento administrativo. Desse modo, o direito ao benefício somente será afastado quando o retorno ao campo se der unicamente com o objetivo de requerer a aposentadoria especial, sendo admitido, contrariamente, sempre que o segurado tiver efetivamente voltado às lides rurais para dele sustentar-se, sem a fixação de um lapso definido.
2. Hipótese em que restou demonstrado, por robusta prova material e testemunhal o exercício de atividade rural, por período muito superior à carência exigida, ainda que de forma descontínua.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, dar provimento aos embargos infringentes, determinando a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 15 de dezembro de 2016.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8607524v6 e, se solicitado, do código CRC 9B3194B1. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
Data e Hora: | 19/01/2017 14:49 |
EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0018856-14.2015.4.04.9999/SC
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
EMBARGANTE | : | ORIDALVA MARIA PAGEL |
ADVOGADO | : | Osmar Schutz e outro |
EMBARGADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de embargos infringentes opostos em face de acórdão com o seguinte teor:
APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR/BOIA-FRIA. RECONHECIMENTO DE TEMPO. DESCONTINUIDADE DO LABOR RURAL. REQUISITOS NÃO CUMPRIDOS. AVERBAÇÃO.
1. A comprovação do exercício de atividade rural pode ser efetuada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea.
2. Embora tenha havido o preenchimento do requisito etário, a parte autora esteve afastada das lides rurais por extenso período dentro do prazo de carência.
3. A locução "descontinuidade" (art. 48, § 2º, da Lei nº 8.213/91) não pode abarcar as situações em que o segurado para com a atividade rural por muito tempo.
4. Não comprovada a carência suficiente à concessão da aposentadoria pleiteada, é indevido o benefício de aposentadoria por idade rural, sendo que o período reconhecido como de efetivo labor rural deve ser averbado para futura concessão de benefício previdenciário, sem necessidade de aporte contributivo, o período anterior à vigência da Lei 8.213/91.
A embargante, autora da ação, preliminarmente, defendeu a aplicação do art. 942 do Novo Código de Processo Civil, em razão da existência de julgamento não unânime. Caso inadmitida a postulação, requereu o processamento dos embargos infringentes, por meio dos quais pretende a prevalência do voto vencido ao argumento de que comprovou tempo de serviço rural, ainda que de forma descontínua, por tempo superior ao exigido.
Foi rejeitada a aplicação do Novo Código de Processo Civil, admitindo-se, porém, o processamento dos embargos infringentes.
Sem contrarrazões, vieram conclusos.
É o relatório.
VOTO
O voto condutor do acórdão, da lavra da Des. Federal Vânia Hack de Almeida, negou o direito à aposentadoria por idade rural, tendo em vista que a parte autora exerceu atividade urbana:
"Do caso concreto
A parte postulou o reconhecimento do exercício de labor rural juntamente com seus pais no período de 1967 a 1973, de 1973 a 1995 em terras de vizinhos, de 2002 a 2012 ao lado do esposo, em terras próprias e, por fim, postulou a concessão do beneficio de aposentadoria por idade rural.
Tendo a recorrida implementado o requisito etário em 20/06/2010 e requerido o benefício em 21/06/2012, deveria comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 174 meses anteriores aos respectivos marcos indicados.
Com relação aos períodos postulados, juntou início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea.
Entre os períodos de atividades rurais, a segurada exerceu atividades urbanas - de 1995 a 2002, de sorte que a concessão do benefício de Aposentadoria Rural Por Idade encontra óbice na perda da qualidade de segurada especial da demandante ao se afastar do meio rural.
Ocorre que, para ter direito ao benefício postulado, a requerente deveria comprovar o efetivo exercício de labor agrícola pelo intervalo de 174 meses que antecedem o implemento do requisito etário e o requerimento administrativo, ainda que de forma descontínua, entendendo-se tal expressão "descontinuidade" como um período ou períodos não muito longos sem o labor rural. (TRF - 4ª Região, EIAC n. 0016359-66.2011.404.9999, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, DE 15-05-2012; TRF - 4ª Região, AC n. 2006.71.99.001397-8, Rel. Des. Federal Celso Kipper, Quinta Turma, DE 26-08-2008).
Caso o objetivo da lei fosse permitir que a descontinuidade da atividade agrícola pudesse consistir em um longo período de tempo - muitos anos ou até décadas -, o parágrafo 2º do art. 48 da LBPS não determinaria que o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, mas sim disporia acerca da aposentadoria para os trabalhadores rurais que comprovassem a atividade agrícola exercida a qualquer tempo. A locução "descontinuidade" não pode abarcar as situações em que o segurado para com a atividade rural por muito tempo.
Assim, o pedido principal, de concessão do benefício de Aposentadoria Por Idade Rural deve ser rejeitado.
Reconheço, contudo, o labor rural em regime de economia familiar e como boia-fria nos períodos de 20/06/67 a 31/01/1995 e de 05/12/2002 até a DER, devendo ser averbado para fins de concessão de futuro benefício de aposentadoria, sem necessidade de aporte contributivo, o período anterior à vigência da Lei 8.213/91.
Portanto, faz jus a autora à averbação dos períodos de labor rural de 20/06/67 a 31/10/1991, independentemente de recolhimento das contribuições respectivas."
Já o voto vencido, proferido pelo Des. Federal João Batista Pinto Silveira, entendeu preenchidos os requisitos para a concessão de aposentadoria por idade rural, nos seguintes termos:
"Do caso concreto
No presente caso, observo que a parte autora preencheu o requisito etário (55 anos) em 20/06/2010, porquanto nascida em 20/06/1955. O requerimento administrativo foi efetuado em 21/06/2010. Dessa forma, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural no período de 174 meses anteriores ao implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
Para comprovar o trabalho agrícola no período de carência, a parte autora juntou aos autos os seguintes documentos:
a) notas fiscais de produtor rural em nome da autora e seu cônjuge, dos anos de 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011, 2012 e 2013 (fls. 33-35, 67-76, 80-84 e 162-267);
b) documentos do processo administrativo do INSS: relatório do CNIS das remunerações da autora (fls. 36-38); depoimentos de testemunhas perante a Previdência Social (fls. 41-43); entrevista rural da autora perante a Previdência Social (fls. 44-45); relatório do CNIS mencionando os períodos dos documentos apresentados da autora, no total de 4 anos, 6 meses e 6 dias, no período de 04/1995 a 31/05/1997 e de 15/12/2005 a 20/06/2010 (fl. 47); comunicação de indeferimento do pedido de aposentadoria por idade rural efetuado em 21/06/2010 por falta de período de carência (fls. 50-51);
c) certidão de casamento da autora em 1973, constando a profissão de lavrador do cônjuge (fl. 57);
d) relatório do CNIS de períodos de contribuição da autora, no qual constam registros de empregos urbanos a partir de 19/04/1995 a 25/10/2002 (fl. 58); relatório do sistema Dataprev, que menciona a percepção de auxílio-doença pela autora de 27/11/2003 a 20/01/2004 (fl. 59);
e) fichas escolares dos anos de 1964, 1965, 1966, em que consta a profissão de lavrador do pai da autora (fls. 60-61 e 137-143);
f) declaração da secretaria municipal de educação de Mirim Doce, afirmando que autora freqüentou a escola no período de 1964-1966 (fl. 62);
g) certidão de matrícula de imóvel rural, em que consta o registro de compra pela autora e seu cônjuge em 05/12/2002 (fls. 63-66);
h) cópias da Carteira de Trabalho e Previdência Social da autora, em que constam os empregos urbanos na empresa Teka's Confecções Ltda., com admissão em 01/02/1995, saída em abril/1995; e na empresa Sanju Indústria Têxtil Ltda., admissão em 19/04/1995, saída em 25/10/2002 (fls. 77/79);
i) relatório do CNIS em períodos de contribuição do pai da autora, mencionando somente a percepção de benefício da previdência social (fl. 86); relatório do sistema Dataprev do pai da autora, mencionando a aposentadoria por idade rural em 06/11/1991 (fl. 87);
j) certidão do INCRA de imóvel rural em nome do pai da autora no período de 1978 a 1991 (fl. 88);
k) certidão de Ofício do Registro de Imóveis informando que o pai da autora possuía imóvel rural desde 1969, vendido em 14/10/1987 (fl. 89);
l) documentos probatórios do pagamento da contribuição ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Taió pelo cônjuge da autora, nos anos de 1976 a 1982 (fl. 90);
m) relatório do sistema de réu informando o reconhecimento do período de 14 anos, 5 meses e 11 dias (fl. 96); comunicação de indeferimento do pedido de aposentadoria por idade efetuado em 29/03/2012 por falta de período de carência (fls. 101-102);
n) relatório do sistema Dataprev mencionando a aposentadoria por idade rural do cônjuge da autora, com início em 11/08/2010 (fl. 146); relatórios do CNIS do cônjuge da autora, informando vínculo de emprego com Companhia Sudan de Produtos de Tabaco de 13/03/1989 a 20/07/1989; e como segurado especial em Sítio Pagel de 31/12/2002 em diante (fls. 147-148);
o) CCIR emitido em 30/12/2002, referente a imóvel rural em nome do cônjuge da autora (fl. 149);
p) declaração de exercício de atividade rural emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Taió, informando que a autora é agricultora e exerceu a atividade em regime de economia familiar, em terras do pai, no período de 20/06/1967 a 1973, em terras de Jonas Gomes, no período de 1973 a 30/01/1995, e em terras próprias, no período de 01/11/2002 a 2010 (fls. 158-159).
Tais documentos demonstram que a parte autora pode ser qualificada como sendo agricultora de profissão, o que também vem sendo aceito pela jurisprudência como início de prova material.
Na audiência de instrução realizada em 16-06-2010 foi colhido o depoimento pessoal da parte autora e foram ouvidas as testemunhas Sr. Rodolfo Greuel, Sr. Vitor Tibola (fl. 351 em CD anexo) - advertidas, compromissadas e não impugnadas pelo INSS -, as quais afirmaram:
Oridalva Maria Pagel
"Afirma que nasceu na roça, que sempre trabalhou na roça, e que continua hoje trabalhando, pois hoje tem o seu sitio que antes não tinha; que antes trabalhava nos terrenos dos outros em parceria rural junto ao seu marido; afirma que o seu marido em nenhum momento trabalhou de carteira assinada; afirma ter trabalhado de carteira assinada 92 meses, mas, que nunca deixou de fazer suas atividades; afirma que trabalhava da 13h e 30 min as 22h00min e ao meio dia tinha as suas atividades que sempre continuou; afirma que trabalhou só na roça desde criança, mas não se lembra bem da data em que foi e voltou a trabalhar na roça de novo; afirma que plantava tudo que se planta para comer e o que sobrava era vendido; afirma que tem filhos e que era difícil criar os filhos com esse valor; afirma que seu marido e ela que trabalhavam nas colheitas e que o que mais plantavam era milho que era vendido também e que foi plantado um pouco de fumo, mas que foi pouco por causa do veneno; afirma que trabalhava nas terras do Ari Gomes e do filho que era o Jonas; afirma que nessa parceria eles cediam às terras e ela tinha que dar uma parte do que era plantado; afirma que durante 22 anos ela utilizou as terras do senhor Ari Gomes que hoje esta no nome do senhor Jonas Gomes; afirma que da data de fevereiro de 1995 até 2002 trabalhou em uma empresa de confecções numa malharia em que era costureira; mas diz que trabalhava nessa malharia só a tarde que até meio dia tinha suas atividades em casa; afirma que durante 2 anos e 8 meses mais ou menos trabalhou em empresas privadas; e que a partir 2002 até hoje exerce atividades rural em terras próprias".
Rodolfo Greuel
"Afirma ser só vizinho da dona Oridalva; afirma que a conhece a bastante tempo do tempo de solteira mais ou menos uns 30 anos; afirma que nesses 30 anos a dona Oridalva trabalhou só na lavoura; perguntado se o depoente não acompanhava a vida da autora de perto disse que se conhecem muito bem mas que ela sempre trabalhou na lavoura; afirma que a autora plantava aipim, milho, batata; afirma que o que era plantado era para consumo próprio que não vendia; não soube dizer do que a autora vivia; afirma que o marido dela e toda a família trabalhavam na lavoura; afirma que no começo a autora trabalhava em terras arrendadas, mas que agora em terras próprias; afirma que a maioria do trabalho era braçal e familiar; não sabe a extensão que era a propriedade em que era trabalhado; afirma que a autora desde que trabalhava em casa que era solteira começou a trabalhar e depois que casou começou a atividade na lavoura; afirma que até agora a autora esta trabalhando na lavoura; afirma que a autora devia ter uns 14 anos quando começou a trabalhar na lavoura; afirma que a autora tem filhos dois rapaz e uma menina que ajudavam na lavoura que hoje não mais; afirma que a propriedade atual é de 14 hectares e que nesses hectares tem plantio e tem pastagem para a criação; e afirma que quem cuida é só ela e o marido".
Vitor Tibola
"Afirma não ser parente e nem amigo muito próximo da dona Oridalva; afirma que faz muito tempo que conhece a dona Oridalva que era amigo dos pais dela; afirma que quando ia pescar a via voltando da roça tirando leite e que desde a infância já trabalhava lá na roça; afirma que quando a autora casou ela já trabalhava na roça e que quando ela se casou foram morar na Vila Mariana que o pai do marido dela tinha um terreno agrícola e continuaram trabalhando na roça; afirma que o marido da autora sempre trabalhou na roça; afirma que plantavam aipim, milho, batata; diz não saber se vendiam só sabe que eles tinham plantação lá; afirma que na Vila Mariana as terras eram deles e que depois se mudaram para Bela Vista e continuam trabalhando na roça mas que lá ele não conhece o local; afirma que a autora trabalhou fora na cidade mas nunca deixou de trabalhar na roça que fazia as duas coisas juntas; diz que atualmente a autora trabalha na roça e mora na Bela Vista no interior; fala que não tem como dizer se a autora vendia as coisas por que não a acompanhava; afirma que a produção era feita com a família, mas não tinham trator, não tinham cavalo, maquinas, era mais trabalho manual que a produção era pequena; diz que na Vila Mariana tinham umas 10/12 hectares; diz que o terreno era pequeno que não era muito grande, não sabe dizer se ocupavam todo terreno para plantação; afirma que a autora tem filhos e que quando eles eram pequenos eles trabalhavam junto com os pais depois que cresceram casaram e não trabalham mais com os pais".
Assim, em que pese os documentos apresentados pela autora não cubram todo o período, são válidos como início de prova material, uma vez que as testemunhas foram uníssonas em afirmar que a demandante laborou por período superior ao de carência exigida para a concessão do benefício.
No caso, os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material de que a autora exerceu o labor rural em regime de economia familiar de 1967 a 1995 e de 2002 a 2012.
Da descontinuidade:
O tema da descontinuidade merece especial atenção tendo em vista a controvérsia estabelecida em torno da melhor interpretação a ser conferida ao termo.
Assim, no que diz respeito à possibilidade do cômputo de períodos rurais intercalados para efeitos de concessão de aposentadoria por idade rural, uma vez demonstrada a condição de segurado especial no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou no implemento do requisito etário, impõem-se tecer algumas considerações.
Acerca do exercício de atividade rural intercalado com curtos períodos de atividade urbana, que estaria albergado no conceito de descontinuidade, assim entendeu esta Turma no julgamento da AC nº 0006519-95.2012.404.9999, relator Des. Federal Celso Kipper (D.E. 10/02/2015, publicação em 11/02/2015):
"A respeito do interregno que pode ser considerado como curto período de não exercício do trabalho campesino, para o efeito de não descaracterizar a condição de segurado especial e possibilitar a perfectibilização do período equivalente ao da carência, ficando a interrupção, dessa forma, albergada no conceito de descontinuidade, tenho o entendimento de que deve ser associado, por analogia, ao período de graça estabelecido no art. 15 da Lei de Benefícios, podendo chegar, portanto, conforme as circunstâncias, ao máximo de 38 meses [24+12+2]. Esta exegese, no tocante à utilização do período de graça do art. 15 da Lei de Benefícios como parâmetro de aferição do tempo de descontinuidade permitido, tem ressonância no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, como se observa de recente julgamento da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SEGURADO ESPECIAL. ART. 11, § 9º, III, DA LEI 8.213/91 COM A REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 11.718/08. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA NO PERÍODO DE CARÊNCIA. ADOÇÃO, POR ANALOGIA, DOS PRAZOS DO PERÍODO DE GRAÇA. ART. 15 DA LEI 8.213/91. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Os arts. 39, I, e 143 da Lei 8.213/91 dispõem que o trabalhador rural enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social na forma da VII do art. 11 [segurado especial], tem direito a requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.
2. A norma previdenciária em vigor à época do ajuizamento da ação, antes do advento da Lei 11.718/08, não especificava, de forma objetiva, quanto tempo de interrupção na atividade rural seria tolerado para efeito da expressão legal "ainda que de forma descontínua".
3. A partir do advento da Lei 11.718/08, a qual incluiu o inciso III do § 9º do art. 11 da Lei 8.213/91, o legislador possibilitou a manutenção da qualidade de segurado especial quando o rurícola deixar de exercer atividade rural por período não superior a cento e vinte dias do ano civil, corridos ou intercalados, correspondentes ao período de entressafra. Todavia, a referida regra, mais gravosa e restritiva de direito, é inaplicável quando o exercício da atividade for anterior à inovação legal.
4. A teor do disposto nos arts. 4º e 5º da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro - LINDB, diante da ausência de parâmetros específicos indicados pelo legislador originário, mostra-se mais consentânea com o princípio da razoabilidade a adoção, de forma analógica, da regra previdenciária do art. 15 da Lei 8.213/91, que garante a manutenção da qualidade de segurado, o chamado "período de graça".
5. Demonstrado que a parte recorrente exerceu atividade urbana por período superior a 24 (vinte e quatro) meses no período de carência para a aposentadoria rural por idade, forçosa é a manutenção do acórdão recorrido.
6. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp 1354939/CE, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/06/2014, DJe 01/07/2014)
Ressalte-se, ainda, que a interpretação acima é plenamente aplicável nas seguintes circunstâncias: a) aos períodos equivalentes à carência compreendidos, total ou parcialmente, em tempo anterior à publicação da Lei n.º 11.718/2008, independentemente de a descontinuidade no trabalho rural consistir em completa inatividade ou decorrer de atividade urbana remunerada; b) aos períodos equivalentes à carência que se seguirem à publicação da aludida lei (total ou parcialmente), quando a descontinuidade no trabalho rural consistir em inatividade.
Tratando-se, porém, (c) de período equivalente à carência que se perfectibilizar sob a égide da Lei n.º 11.718/2008, que acrescentou o parágrafo 9º ao art. 11 da Lei de Benefícios, e da Lei n.º 12.873/2013 (que alterou a redação do seu inciso III), no tocante à porção de tempo posterior a tais leis, quando a descontinuidade for decorrente de atividade urbana remunerada, deve-se ter como norte o estabelecido nas aludidas leis, ou seja, considera-se possível a interrupção no trabalho rural sem descaracterizar a condição de segurado especial se o exercício de atividade remunerada não exceder a 120 (cento e vinte) dias, corridos ou intercalados, no ano civil."
Todavia, tratando-se de período perfectibilizado antes da Lei nº 11.718, de 20-06-2008, vou além da consideração da descontinuidade pelo limite máximo do período de graça, cumprindo lembrar que a aplicação da hipótese do item "c" para afastar a contagem de alguns anos civis, não exclui a possibilidade de consideração de períodos pretéritos de labor rural, anteriores à vigência da Lei nº 11.718, de 20-06-2008. Nessa compreensão não há qualquer incongruência com o entendimento da Turma, desde que seja adotado como critério de inclusão.
A propósito da linha que adoto, a fim de evitar tautologia, passo a transcrever a fundamentação adotada no julgamento da Apelação/Reexame Necessário n.º 002134473.2014.404.9999/PR, sessão de 09-12-2014 (DJE de 21/01/2015), por unanimidade, pelo Des. Federal Rogério Favreto, assim assentada pela Quinta Turma desta Corte:
"(...)
Passo, então, a análise da questão, iniciando por reproduzir o art. 143 da Lei nº 8.213/91, que estabeleceu regra transitória para a concessão de aposentadoria por idade em favor dos trabalhadores rurais enquadrados como segurado especiais, nestes termos:
"Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício. (Redação dada pela Lei nº. 9.063, de 1995)"
Necessário, antes de adentrar no exame da descontinuidade, estabelecer claramente sobre o trecho do dispositivo legal citado, na parte que trata da exigência de comprovação de atividade rural, no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo.
Referida exigência diz respeito à necessidade de ostentar a qualidade de segurada especial no momento da implementação de todos os requisitos (idade e carência), tomando como referência, via de regra, os parâmetros exigidos na data do requerimento administrativo, ou, então, no momento em que completada a idade mínima para a inativação (55 anos para mulheres ou 60 anos para homens). Vale dizer, deve o segurado provar o exercício de atividade rural desempenhada até o momento imediatamente anterior à implementação de todos os requisitos para a concessão do benefício, pois no caso específico da aposentadoria dos segurados especiais, ao contrário da aposentadoria por idade prevista no caput do artigo 48 da Lei de Benefícios, não lhes se assegura a inovação trazida pelo artigo 3º, da Lei nº 10.666/03, no sentido de que os requisitos para a inativação não precisam ser preenchidos simultaneamente. Isso, aliás, já conta com manifestação do Superior Tribunal de Justiça, conforme se extrai do seguinte julgado, in verbis:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REQUISITOS: IDADE E COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE AGRÍCOLA NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. ARTS. 26, I, 39, I, E 143, TODOS DA LEI N. 8.213/1991. DISSOCIAÇÃO PREVISTA NO § 1º DO ART. 3º DA LEI N. 10.666/2003 DIRIGIDA AOS TRABALHADORES URBANOS. PRECEDENTE DA TERCEIRA SEÇÃO.
(...)
5. Não se mostra possível conjugar de modo favorável ao trabalhador rural a norma do § 1º do art. 3º da Lei n. 10.666/2003, que permitiu a dissociação da comprovação dos requisitos para os benefícios que especificou: aposentadoria por contribuição, especial e por idade urbana, os quais pressupõem contribuição.
(...)
(Pet 7476/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 13/12/2010, DJe 25/04/2011)
Logo, o segurado especial deve demonstrar o desempenho de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo pelo número de meses idêntico à carência, ou, então, na data do implemento do requisito etário. Nesses termos, o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça serve de exemplo concreto a tudo o que foi dito acima. Vejamos:
PREVIDENCIÁRIO. RURAL. PERÍODO DE CARÊNCIA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL. NÃO DEMONSTRAÇÃO.
(...)
2. Segundo a instância ordinária, o conjunto fático- probatório dos autos não foi suficiente para demonstrar o labor rural em regime de economia familiar, pois a prova testemunhal atestou que a autora não trabalha no campo há mais de 10 anos e que desenvolve atividade não rural para sua subsistência.
3. O implemento da idade para aposentadoria, por seu turno, ocorreu em 2005, ou seja, após o abandono das lides no meio rural. 4. Assim, não se verifica, no caso, o exercício de atividade rurícola no período imediatamente anterior ao requerimento, pelo número de meses idêntico à carência.
(...)
(AgRg no REsp 1294351/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 07/02/2012, DJe 05/03/2012)
Essa, em síntese, é a compreensão que tenho sobre a exigência de comprovação de atividade rural "no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício", contida no artigo 143, estendendo idêntica conclusão à regra estabelecida no artigo 39, que estabelece as regras permanentes para a aposentadoria dos segurados especiais, ambos da Lei de Benefícios.
Passo, agora, à análise da expressão descontínua, reiterando a exigência de possuir a qualidade de segurado especial, seja por ocasião do requerimento administrativo, seja na data da implementação do requisito etário, como condição para admissão de períodos de labor rural, mesmo que intercalados, para fins de concessão da aposentadoria por idade ao trabalhador rural.
Diz, o artigo 143, que o segurado deve demonstrar o exercício de atividade rural pelo número de meses correspondentes à carência exigida, ainda que de forma descontínua.
De regra, elege-se o marco que definirá o número de contribuições correspondentes à carência necessária para a concessão do benefício (implemento da idade ou o requerimento administrativo). No caso da aposentadoria rural por idade, cabe esclarecer, o número de contribuições equivale ao tempo de labor rural independentemente do recolhimento daquelas. Em seguida, são fixados os marcos iniciais e finais e, dentro desses limites, incumbe à parte demonstrar o exercício de trabalho rural pelos números de meses correspondentes à carência.
Apresento o seguinte exemplo para melhor compreensão: implementada a idade no ano de 2011 e requerido nessa mesma data a aposentadoria por idade rural, deverá o segurado demonstrar o exercício de atividade rural pelo período equivalente a 180 meses. Deve, pois, provar que exerceu atividades rurais entre 1995 e 2011.
A interpretação tradicional conferida ao termo "descontínua" orienta-se no sentido de admitir interrupções do exercício das atividades campesinas, durante o período de carência, desde que o afastamento não implique perda da condição de segurado especial. De qualquer forma, deve o segurado demonstrar o desempenho de atividade rural dentro daquele intervalo estabelecido no momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício.
Essa orientação, de outra parte, não se aplica aos segurados que postulam a concessão de aposentadoria por idade urbana, pois para estes se admite a soma de todos os períodos contributivos para fins de carência, ainda que entre um e outro tenha ocorrido a perda da qualidade de segurado da previdência, com posterior reaquisição desse status. E mais, tais requisitos não precisam ser implementados simultaneamente, à luz do disposto no 3º da Lei nº 10.666/2003. Dita autorização legal, contudo, não alcança os segurados que pretendem a concessão de aposentadoria rural por idade, nos termos do precedente do STJ anteriormente citado.
A limitação do alcance da descontinuidade, estabelecida em relação aos trabalhadores rurais, conforme acima declinado, é fruto da interpretação há muito tempo adotada nos Tribunais. De qualquer forma, não há na Lei de Benefícios, seja no artigo 143 ou mesmo no artigo 39, expressa vedação quanto à admissão de interregnos de labor rural intercalados para fins de complementação da carência do benefício.
Exige-se, como visto, a demonstração de exercício de atividade rural, na condição de segurado especial, no lapso imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou na data do implemento do requisito etário. Eventuais interrupções das atividades campesinas, decorrentes de vínculos urbanos ou mesmo de inatividade, não são contempladas pela legislação previdenciária como causa impeditiva do aproveitamento de períodos de labor rural intercalados.
Dessa forma, face à ausência de vedação legal na Lei de Benefícios quanto à admissão de períodos intercalados de labor rural para fins de concessão de aposentadoria por idade dos segurados especiais, nada impede admitir a revisão do entendimento acerca da definição da descontinuidade do trabalho rural para fins de composição da carência. De acrescentar, ainda, outro fundamento relevante no sentido de que a "adoção de entendimento restritivo quanto ao conceito de descontinuidade acaba por deixar ao desamparo segurados que desempenharam longos períodos de atividade rural, mas por terem intercalado períodos significativos de atividade urbana ou mesmo de inatividade, restam excluídos da proteção previdenciária", nas palavras do Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, quando aborda a cláusula da descontinuidade.
Conquanto não haja vedação legal, é fato que o regramento interno do INSS autoriza a admissão de períodos de trabalho rural intercalados com períodos de atividade urbana para fins dos benefícios previstos no inciso I do artigo 39 e artigo 143, da Lei de Benefícios, desde que a carência seja preenchida exclusivamente com tempo de exercício de labor rural. A propósito, vejamos a redação dos artigos 145, 148, 214 e 215, da Instrução Normativa INSS/PRES 45, de 06/08/2010:
Art. 145. No caso de comprovação de desempenho de atividade urbana entre períodos de atividade rural, com ou sem perda da qualidade de segurado, poderá ser concedido benefício previsto no inciso I do art. 39 e art. 143, ambos da Lei nº 8.213, de 1991, desde que cumpra o número de meses de trabalho idêntico à carência relativa ao benefício, exclusivamente em atividade rural, observadas as demais condições.
Parágrafo único. Na hipótese de períodos intercalados de exercício de atividade rural e urbana, observado o disposto nos arts. 149 e 216, o requerente deverá apresentar um documento de início de prova material do exercício de atividade rural após cada período de atividade urbana.
Art. 148. Para fins de concessão dos benefícios devidos ao trabalhador rural previstos no inciso I do art. 39 e art. 143, ambos da Lei nº 8.213, de 1991, considera-se como período de carência o tempo de efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, correspondente ao número de meses necessários à concessão do benefício requerido, computados os períodos a que se referem os incisos III a VIII do § 5º do art. 7º, observando-se que:
(...)
Parágrafo único. Entende-se como forma descontínua os períodos intercalados de exercício de atividades rurais, ou urbana e rural, com ou sem a ocorrência da perda da qualidade de segurado, observado o disposto no art. 145.
Art. 214. A aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais referidos na alínea "a" do inciso I, na alínea "g" do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11 da Lei nº 8.213, de 1991, será devida para o segurado que, cumprida a carência exigida, completar sessenta anos de idade, se homem, e cinquenta e cinco anos, se mulher.
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, o trabalhador rural deverá comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, ou, conforme o caso, ao mês em que cumpriu o requisito etário, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência exigida.
(...)
Art. 215. Para fins de aposentadoria por idade prevista no inciso I do art. 39 e art. 143 da Lei nº 8.213, de 1991 dos segurados empregados, contribuintes individuais e especiais, referidos na alínea "a" do inciso I, na alínea "g" do inciso V e no inciso VII do art. 11 do mesmo diploma legal, não será considerada a perda da qualidade de segurado os intervalos entre as atividades rurícolas, devendo, entretanto, estar o segurado exercendo a atividade rural ou em período de graça na DER ou na data em que implementou todas as condições exigidas para o benefício.
(...)
Da leitura dos dispositivos transcritos é possível constatar que os fundamentos lançados linhas acima encontra respaldo nas disposições normativas editadas pelo órgão responsável pela concessão de benefícios. Vale dizer, a descontinuidade, vista sobre essa nova orientação, permite o aproveitamento de períodos intercalados de atividade rural, com ou sem a perda da qualidade de segurado, para integrar a carência necessária à concessão de aposentadoria por idade dos segurados especiais. E mais, o afastamento da atividade campesina não é considerado fator determinante, desde que no período imediatamente anterior ao requerimento ostente a condição de segurado especial.
A descontinuidade com a adoção desses parâmetros visa à reparação de profunda injustiça em relação àquele trabalhador que dispensou vários anos de sua vida exercendo atividade rural, notadamente exercida com sacrifício físico e pouca recompensa financeira, porém por circunstâncias diversas possui em seu histórico registro de vínculos urbanos, ou mesmo interrupção de atividade, e que ficará, adotando-se a posição restritiva, desamparado no momento mais sensível de sua vida, qual seja quando já possui idade avançada e sofre com as conseqüências inerentes da idade. Fica, com isso, garantido a merecida "recompensa" pelos anos de trabalho, tal como assegurado ao trabalhador urbano, à luz do princípio da isonomia, e também em observância aos direitos assegurados nos artigos 6º e 7º, inciso XXIV, ambos da Constituição Federal.
Anoto e reitero, tal como já exposto, que o segurado deverá demonstrar o exercício de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou do implemento do requisito etário.
E assim sendo, indaga-se nesse estágio da abordagem do tema sobre o quanto de tempo de labor rural deverá a parte demonstrar no período imediatamente anterior ao requerimento. Isso é importante definir para evitar com que eventualmente ocorra a iniciativa por parte daqueles que somente às vésperas de postular o benefício retornem ao meio rural com a finalidade de obter a aposentadoria por idade dos segurados especiais, aproveitando-se do abrandamento da descontinuidade.
Nesse cenário, entendo caber ao segurado demonstrar que o seu regresso visa à reaquisição de sua vocação agrícola, voltando a ter do meio rural sua principal fonte de subsistência. Assim sendo, descabe a aplicação da cláusula da descontinuidade em relação àquele que se afastou definitivamente do meio rural, mas que busca com seu regresso ao campo apenas obter a aposentadoria por idade prevista aos segurados especiais.
Valho-me, sobre essa questão, do trecho do voto vista do Juiz Federal José Antônio Savaris, no Incidente de Uniformização JEF nº 5002637-56.2012.404.7116/RS:
"De acordo com as premissas acima estabelecidas, verifica-se que somente um longo período de afastamento de atividade, com sinais de saída definitiva do meio rural, poderia anular todo histórico de trabalho rural da recorrente. Apenas quando se identifica que não se trata de propriamente um regresso ao meio campesino, mas uma mudança do trabalhador, da cidade para o campo, estrategicamente provocada para fins de obtenção de benefício previdenciário, é que se torna inviável o manejo da cláusula de descontinuidade prevista no art. 143 da Lei de Benefícios."
Dessa forma, havendo elementos concretos evidenciando que o retorno ao ambiente campesino se deu com o intuito de retomada da atividade rural como fonte de subsistência, e não apenas para se valer da condição de segurado especial às vésperas do protocolo do pedido de aposentadoria por idade, é que poderá ser admitida a descontinuidade nos termos acima propostos. É certo, porém, que não serão alguns meses, mas um período de tempo razoável entre o retorno e o requerimento capazes de resgatar sua origem/identidade campesina. Por óbvio, havendo no percurso temporal a perda da qualidade de segurado, deverá ser observada a exigência do parágrafo único, do artigo 24, da Lei 8.213/91.
De outra parte, inexistindo demonstração da efetiva retomada da "vocação" rural, nada impede que o segurado venha a postular a aposentadoria com a utilização do tempo rural e/ou urbano. Porém, os requisitos a serem preenchidos serão diversos da aposentadoria por idade do segurado especial, seja pelo cumprimento das exigências da modalidade de aposentadoria prevista no caput do artigo 48 ou do § 3º desse mesmo dispositivo (híbrida), da Lei nº 8.213/91.
Essas modalidades de aposentadoria acima mencionadas podem até servir, em tese, de argumento contra a admissão de períodos intercalados de trabalho rural para a concessão de aposentadoria por idade do segurado especial. No entanto, a descontinuidade para o benefício em questão somente admite o cômputo de períodos de labor rural. Eventuais contribuição (na qualidade de empregado urbano ou contribuinte individual, por exemplo) que tenham ingressado nos cofres da previdência não integrarão o cálculo do salário-de-benefício, pois se trata de benefício correspondente ao valor de um salário-mínimo (artigo 39, inc. I, pelas regras permanentes, ou 143, segundo regra transitória, ambos dispositivos da Lei de Benefícios). Preservado, de certa forma, o equilíbrio atuarial.
Em suma, se por um lado a descontinuidade, nos termos propostos, favorece a concessão de benefício com o preenchimento dos requisitos da aposentadoria por idade do segurado especial, por outro agrava sua situação por não poder agregar, no cálculo de seu benefício, as contribuições efetivamente vertidas aos cofres da previdência no cálculo do benefício com o objetivo de aumentar a renda mensal inicial, pois sempre será no valor de um salário mínimo. Corre por sua conta e risco a opção.
O julgado a seguir transcrito, embora não corresponda à descontinuidade ora tratada, apresenta hipótese com efeitos semelhantes, vejamos:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO DO LABOR RURAL PELO PERÍODO DE CARÊNCIA. IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO. BENEFÍCIO DEVIDO. AGRAVO REGIMENTAL DO INSS DESPROVIDO.
(...)
2. Além disso, se a aposentadoria rural por idade seria concedida independentemente do pagamento de contribuições, com maior razão deve-se garantir também a concessão do benefício ao segurado que recolheu contribuições previdenciárias para a Seguridade Social como trabalhador urbano em pequenos períodos, sem, no entanto, cumprir a carência para a concessão da aposentadoria urbana, uma vez que essa situação não acarreta qualquer prejuízo ao equilíbrio atuarial do sistema previdenciário e, pelo contrário, até o favorece.
(...)
(AgRg no REsp 1309591/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/06/2012, DJe 29/06/2012).
Do exposto, em revisão de entendimento, é possível admitir o cômputo de períodos de labor rural intercalados para fins de concessão de aposentadoria por idade rural, desde que demonstrada a condição de segurado especial no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou implemento do requisito etário.
(...)"
Cumpre referir que a 3ª Seção desta Corte, no julgamento dos Embargos Infringentes nº 0017236-98.2014.4.04.9999/PR, em 03-12-2015, decidiu, por maioria, dar provimento aos embargos infringentes, para admitir o cômputo de períodos de labor rural intercalados para fins de concessão de aposentadoria por idade rural, desde que demonstrada a condição de segurado especial no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou implemento do requisito etário.
O desempenho de atividade rural no período imediatamente anterior ao preenchimento do requisito etário ou do requerimento administrativo (de 2002 a 2012) demonstra que a parte autora inequivocamente retornou às lides rurícolas, readquirindo a sua qualidade de segurada especial, razão pela qual deve ser admitido o direito à contagem de períodos descontínuos anteriores (de 1967 a 1995).
Portanto, somando-se os períodos em que a parte autora desempenhou atividades rurais, restou preenchida a carência necessária para a concessão do benefício.
Assim, preenchidos os requisitos - idade exigida (completou 55 anos em 20/06/2010, (nascimento em 20/06/1955) e exercício de atividades rurícolas no período de carência, é de ser mantida a sentença para conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por idade devida a trabalhador rural, desde a data do requerimento administrativo, formulado em 21/06/2010."
A divergência reside na circunstância de ter a parte autora exercido atividade urbana no período compreendido entre 1995 a 2002, perdendo, nos dizeres do voto vencedor, a qualidade de segurada especial. Já o voto vencido aplicou a descontinuidade, entendendo que, considerados os períodos anteriores e posteriores, a parte autora cumpriu o período correspondente à carência, devendo ser concedido o benefício de aposentadoria por idade rural.
Com relação à interpretação do termo "descontinuidade" (art. 143 da LBPS), encontram-se ao menos três interpretações na jurisprudência deste Regional:
a) a descontinuidade não impede o direito ao benefício desde que o retorno ao campo seja por período razoável, sendo este estabelecido por analogia ao art. 24, parágrafo único, da LBPS (1/3 do período de carência). Exemplo disso é o julgado na APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0006832-51.2015.404.9999/RS, rel. Ricardo Teixeira do Valle Pereira, j. 19/06/2015)
b) a descontinuidade somente é admitida quando não superados os prazos de período de graça previstos no artigo 15 da Lei 8.213/91 ("O interregno que pode ser considerado como curto período de não exercício do trabalho campesino, para o efeito de não descaracterizar a condição de segurado especial e possibilitar a perfectibilização do período equivalente ao da carência, ficando a interrupção, dessa forma, albergada no conceito de descontinuidade, deve ser associado, por analogia, ao período de graça estabelecido no art. 15 da Lei de Benefícios, podendo chegar, portanto, conforme as circunstâncias, ao máximo de 38 meses [24+12+2]. Essa exegese, no tocante à utilização do período de graça do art. 15 da Lei de Benefícios como parâmetro de aferição do tempo de descontinuidade permitido, tem ressonância no âmbito do STJ.". Exemplo disso é o julgado no APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013645-65.2013.4.04.9999/RS, rel. Celso Kipper, j. 16/12/2015.
c) a descontinuidade não pode ser interpretada judicialmente de modo mais rigoroso que o faz a Administração, que no artigo 145 da IN 45/2010 estabelece tão somente dois pressupostos: (a) completar o número de meses igual ao período de carência exigido para a concessão do benefício e (b) esteja em efetivo exercício da atividade rural à época do requerimento administrativo. Desse modo, o direito ao benefício somente será afastado quando o retorno ao campo se der unicamente com o objetivo de requerer a aposentadoria especial, sendo admitido, contrariamente, sempre que o segurado tiver efetivamente voltado às lides rurais para dele sustentar-se, sem a fixação de um lapso definido. (EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0008065-83.2015.4.04.9999/RS, rel. Paulo Afonso, j. 19/05/2016).
A diretriz contemporânea deve ser prestigiada.
Não somente pelo fato de ter sido o posicionamento vencedor em julgamento recente da 3ª Seção, mas porque melhor se coaduna aos princípios constitucionais que regem a relação dos segurados com a Administração Pública.
De fato, não se pode restringir a interpretação administrativa, estabelecida na IN 45/2010, invocando a legalidade estrita por força da aplicação analógica do artigo 24, parágrafo único, da LBPS, diante da incidência dos princípios da boa fé e da segurança jurídica, que asseguram ao cidadão, uma vez observado o regramento administrativo, o respeito aos efeitos prometidos pela própria Administração.
Ademais, milita em favor dessa interpretação não somente o artigo 145 da referida IN, como também os artigos 215 e 216 desse instrumento normativo, que admitem até mesmo a possibilidade de requerimento de aposentadoria especial mesmo que o segurado esteja em atividade urbana, desde que dentro de igual período previsto para a graça. Mais ainda, se estiver voltado para as lides rurais.
Transcrevo:
Art. 215. Para fins de aposentadoria por idade prevista no inciso I do art. 39 e art. 143 da Lei nº 8.213, de 1991 dos segurados empregados, contribuintes individuais e especiais, referidos na alínea "a" do inciso I, na alínea "g" do inciso V e no inciso VII do art. 11 do mesmo diploma legal, não será considerada a perda da qualidade de segurado os intervalos entre as atividades rurícolas, devendo, entretanto, estar o segurado exercendo a atividade rural ou em período de graça na DER ou na data em que implementou todas as condições exigidas para o benefício.
Parágrafo único. Os trabalhadores rurais de que trata o caput enquadrados como empregado e contribuinte individual, poderão, até 31 de dezembro de 2010, requerer a aposentadoria por idade prevista no art. 143 da Lei 8.213, de 1991, no valor de um salário mínimo, observando que o enquadrado como segurado especial poderá requerer o respectivo benefício sem observância ao limite de data, conforme o inciso I do art. 39 da Lei nº 8.213, de 1991.
Art. 216. Na hipótese do art. 215, será devido o benefício ao segurado empregado, contribuinte individual e segurado especial, ainda que a atividade exercida na DER seja de natureza urbana, desde que o segurado tenha preenchido todos os requisitos para a concessão do benefício rural previsto no inciso I do art. 39 e no art. 143 da Lei nº 8.213, de 1991 até a expiração do prazo para manutenção da qualidade, na atividade rural, previsto no art. 15 do mesmo diploma legal e não tenha adquirido a carência necessária na atividade urbana.
Ou seja: a compreensão administrativa do artigo 143 pode ser entendida como interpretação sistemática da LBPS, em que se conjuga a letra do artigo 143 com o artigo 15 da mesma lei, cujo resultado hermenêutico pode ser assim explicitado:
Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no perío]do imediatamente anterior ao requerimento do benefício, (OBSERVADO O PERÍODO DE GRAÇA), em número de meses idêntico à carência do referido benefício.
Com essas considerações, entendo que deve prevalecer o voto vencido, que reconheceu o direito à aposentadoria rural por idade, em todos os seus termos, inclusive a determinação de implantação imediata do benefício. De fato, os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material de que a autora exerceu o labor rural em regime de economia familiar de 1967 a 1995 e de 2002 a 2012, ou seja, lapso temporal muito superior ao exigido.
Ante o exposto, voto por dar provimento aos embargos infringentes, determinando a imediata implantação do benefício.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8607523v2 e, se solicitado, do código CRC 6B52DF2F. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
Data e Hora: | 21/10/2016 19:57 |
EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0018856-14.2015.4.04.9999/SC
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
EMBARGANTE | : | ORIDALVA MARIA PAGEL |
ADVOGADO | : | Osmar Schutz e outro |
EMBARGADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
VOTO-VISTA
A controvérsia estabelecida no presente recurso diz respeito, especificamente, ao não preenchimento do requisito da carência para a percepção do benefício de aposentadoria por idade rural, nos termos dos art. 39 e 143 da Lei 8.213/91, tendo em vista o período de descontinuidade da atividade rural.
A eminente Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida no voto majoritário proferido no julgamento de 09-03-2016 na Sexta Turma desta Corte, assim se manifestou:
(...)
Da Aposentadoria Por Idade Rural
São requisitos para a aposentadoria por idade rural, a idade mínima de 60 anos para o homem e 55 anos para a mulher (art. 48, § 1º, da Lei nº 8.213/91) e o exercício de atividade rural por período correspondente à carência do benefício nos termos do art. 142 da Lei nº 8.213/91 (ou cinco anos, se momento anterior a 31/08/94, data de publicação da MP nº 598, que modificou o artigo 143 da Lei de Benefícios), considerando-se da data da idade mínima, ou, se então não aperfeiçoado o direito, quando isto ocorrer em momento posterior, especialmente na data do requerimento administrativo, tudo em homenagem ao princípio do direito adquirido, resguardado no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91.
Da idade para reconhecimento do labor rural
A idade mínima a ser considerada, no caso de segurado especial, em princípio, dependeria da data da prestação da atividade, conforme a legislação então vigente (nesse sentido: EREsp 329.269/RS, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2002, DJ 23/09/2002, p. 221). Não obstante, cumpre destacar que a limitação constitucional ao trabalho de menor é norma protetiva da infância, não podendo conduzir ao resultado de que, uma vez verificada a prestação laboral, a incidência do preceito legal/constitucional resulte em sua nova espoliação (desta feita, dos direitos decorrentes do exercício do trabalho).
Assim, é de ser admitida a prestação laboral, como regra, a partir dos 12 anos, pois, já com menos responsabilidade escolar e com inegável maior potência física, os menores passam efetivamente a contribuir na força de trabalho do núcleo familiar, motivo pelo qual tanto a doutrina quanto a jurisprudência aceitam esta idade como termo inicial para o cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial (nesse sentido: TRF4, EIAC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, julgado na sessão de 12-03-2003; STF, AI n.º 529694/RS, Relator Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, decisão publicada no DJU de 11-03-05).
Do caso concreto
A parte postulou o reconhecimento do exercício de labor rural juntamente com seus pais no período de 1967 a 1973, de 1973 a 1995 em terras de vizinhos, de 2002 a 2012 ao lado do esposo, em terras próprias e, por fim, postulou a concessão do beneficio de aposentadoria por idade rural.
Tendo a recorrida implementado o requisito etário em 20/06/2010 e requerido o benefício em 21/06/2012, deveria comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 174 meses anteriores aos respectivos marcos indicados.
Com relação aos períodos postulados, juntou início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea.
Entre os períodos de atividades rurais, a segurada exerceu atividades urbanas - de 1995 a 2002, de sorte que a concessão do benefício de Aposentadoria Rural Por Idade encontra óbice na perda da qualidade de segurada especial da demandante ao se afastar do meio rural.
Ocorre que, para ter direito ao benefício postulado, a requerente deveria comprovar o efetivo exercício de labor agrícola pelo intervalo de 174 meses que antecedem o implemento do requisito etário e o requerimento administrativo, ainda que de forma descontínua, entendendo-se tal expressão "descontinuidade" como um período ou períodos não muito longos sem o labor rural. (TRF - 4ª Região, EIAC n. 0016359-66.2011.404.9999, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, DE 15-05-2012; TRF - 4ª Região, AC n. 2006.71.99.001397-8, Rel. Des. Federal Celso Kipper, Quinta Turma, DE 26-08-2008).
Caso o objetivo da lei fosse permitir que a descontinuidade da atividade agrícola pudesse consistir em um longo período de tempo - muitos anos ou até décadas -, o parágrafo 2º do art. 48 da LBPS não determinaria que o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, mas sim disporia acerca da aposentadoria para os trabalhadores rurais que comprovassem a atividade agrícola exercida a qualquer tempo. A locução "descontinuidade" não pode abarcar as situações em que o segurado para com a atividade rural por muito tempo.
Assim, o pedido principal, de concessão do benefício de Aposentadoria Por Idade Rural deve ser rejeitado.
Reconheço, contudo, o labor rural em regime de economia familiar e como boia-fria nos períodos de 20/06/67 a 31/01/1995 e de 05/12/2002 até a DER, devendo ser averbado para fins de concessão de futuro benefício de aposentadoria, sem necessidade de aporte contributivo, o período anterior à vigência da Lei 8.213/91.
Portanto, faz jus a autora à averbação dos períodos de labor rural de 20/06/67 a 31/10/1991, independentemente de recolhimento das contribuições respectivas.
Pois bem. O que se discute nesta lide é se o longo período descontínuo de labor rural autorizaria ou não a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural pleiteado na inicial.
É certo que, para a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, os artigos 39, inciso I, e 143, ambos da Lei de Benefícios determinam que o trabalhador rural deverá comprovar o efetivo exercício da atividade, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ou número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício.
A legislação previdenciária exige, portanto, que o segurado seja efetivamente trabalhador rural no momento do implemento das condições, não se admitindo a benesse a quem não retornou às lides agrícolas ou se afastou por longo tempo. Segundo entendimento já consolidado no âmbito do STJ, inclusive sob o regime de julgamento de recurso repetitivo, à aposentadoria por idade rural não contributiva prevista nos artigos 143 e 39, I, da Lei 8213/91, não se aplica o artigo 3º, § 1º, da Lei 10.666/03:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL.
COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)
Outrossim, a lei em tela admite a descontinuidade do tempo de serviço rural, sendo certo que, pelo menos durante o período da manutenção da qualidade de segurado previsto no artigo 15, II, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91, é possível considerar o afastamento das atividades sem configurar o abandono do meio rurícola. Para os demais casos, deve ser valorada a vocação rural, caso a caso.
Havendo elementos concretos evidenciando que o retorno ao ambiente campesino se deu com o intuito de retomada da atividade rural como fonte de subsistência, e não apenas para se valer da condição de segurado especial às vésperas do protocolo do pedido de aposentadoria por idade, é que poderá ser admitida a descontinuidade nos termos acima propostos. Exige-se, assim, um período de tempo razoável entre o retorno e o requerimento capazes de resgatar sua origem/identidade campesina.
Deve ser observado todo o período contributivo do segurado, de modo a qualificá-lo efetivamente como trabalhador rural e não urbano, vocacionado às lides agrícolas, justificando, dessa maneira, a redução do requisito etário.
À vocação rural pode-se também agregar o preenchimento da regra prevista no artigo 24, parágrafo único, da Lei 8213/91, no sentido de que, havendo interrupção do labor rurícola no período da carência, o segurado comprove, após o seu retorno, pelo menos um terço do período total necessário para o implemento do benefício, o qual, somado ao intervalo anterior, seja suficiente ao seu deferimento. Este critério objetivo no período de carência parece razoável para embasar a preponderante inclinação agrícola do trabalhador.
De outra parte, inexistindo demonstração da efetiva retomada do trabalho rural, nada impede que o segurado venha a postular a aposentadoria com a utilização do tempo rural e/ou urbano. Porém, os requisitos a serem preenchidos serão diversos, conforme previsão do artigo 48, §§ 3 e 4º, da Lei 8213/91.
Tendo em vista tais premissas, passo a analisar a situação dos autos.
Segundo se extrai dos elementos trazidos, a autora comprovou o exercício de atividade rural de 1967 a 1995 e de 2002 a 2012, sendo que no intervalo entre 1995 a 2002 exerceu atividade urbana.
Considerando a situação descrita é possível concluir, conforme acima, que a parte autora comprovou a sua vocação aos trabalhos rurais, pois em sua grande maioria, no período de carência, exerceu tal atividade. Destaco, para isso, inclusive, que após o exercício de atividade urbana retornou ao meio agrícola por período superior aos 58 (cinquenta e oito) meses a que o artigo 24, parágrafo único, da Lei 8213/91, refere, mesmo excluindo os intervalos em que esteve em gozo de auxílio-doença.
Por tais motivos, voto por acompanhar o eminente Relator Des. Federal Roger Raupp Rios no sentido de fazer prevalecer o voto minoritário da 6ª Turma mantendo a sentença que concedeu o benefício de aposentadoria por idade rural desde a DER em 21/06/2010.
Ante o exposto, voto por dar provimento aos embargos infringentes, consoante a fundamentação supra.
Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO, , na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8752921v13 e, se solicitado, do código CRC 6082AFA. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Marina Vasques Duarte de Barros Falcão |
Data e Hora: | 12/12/2016 17:49 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 20/10/2016
EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0018856-14.2015.4.04.9999/SC
ORIGEM: SC 00003394620138240070
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz |
PROCURADOR | : | Dr. Sérgio Cruz Arenhart |
EMBARGANTE | : | ORIDALVA MARIA PAGEL |
ADVOGADO | : | Osmar Schutz e outro |
EMBARGADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 20/10/2016, na seqüência 125, disponibilizada no DE de 30/09/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª SEÇÃO, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
INICIADO O JULGAMENTO, APÓS O VOTO DO RELATOR, DES. FEDERAL ROGER RAUPP RIOS, NO SENTIDO DE DAR PROVIMENTO AOS EMBARGOS INFRINGENTES, DETERMINANDO A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, NO QUE FOI ACOMPANHADO PELA JUÍZA FEDERAL ANA PAULA DE BORTOLI, PEDIU VISTA A DES. FEDERAL SALISE MONTEIRO SANCHOTENE. AGUARDA O DES. FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ.
PEDIDO DE VISTA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI | |
AUSENTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Jaqueline Paiva Nunes Goron
Diretora de Secretaria
Documento eletrônico assinado por Jaqueline Paiva Nunes Goron, Diretora de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8665056v1 e, se solicitado, do código CRC C95517EF. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Jaqueline Paiva Nunes Goron |
Data e Hora: | 20/10/2016 17:16 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 15/12/2016
EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0018856-14.2015.4.04.9999/SC
ORIGEM: SC 00003394620138240070
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz |
PROCURADOR | : | Dra. Márcia Neves Pinto |
EMBARGANTE | : | ORIDALVA MARIA PAGEL |
ADVOGADO | : | Osmar Schutz e outro |
EMBARGADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que o(a) 3ª SEÇÃO, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS O VOTO-VISTA DA JUÍZA FEDERAL MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO NO SENTIDO DE DAR PROVIMENTO AOS EMBARGOS INFRINGENTES, NO QUE FOI ACOMPANHADA PELOS DES. FEDERAIS PAULO AFONSO BRUM VAZ E JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, E DO VOTO DA DES. FEDERAL VÂNIA HACK DE ALMEIDA NEGANDO PROVIMENTO AOS EMBARGOS INFRINGENTES, A SEÇÃO, POR MAIORIA, DECIDIU DAR PROVIMENTO AOS EMBARGOS INFRINGENTES, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, VENCIDA A DES. FEDERAL VÂNIA HACK DE ALMEIDA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTO VISTA | : | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Jaqueline Paiva Nunes Goron
Diretora de Secretaria
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Voto-Vista - Processo Apresentado em Mesa
Certidão de Julgamento
Data da Sessão de Julgamento: 20/10/2016 (SE3)
Relator: Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Pediu vista: Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
INICIADO O JULGAMENTO, APÓS O VOTO DO RELATOR, DES. FEDERAL ROGER RAUPP RIOS, NO SENTIDO DE DAR PROVIMENTO AOS EMBARGOS INFRINGENTES, DETERMINANDO A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, NO QUE FOI ACOMPANHADO PELA JUÍZA FEDERAL ANA PAULA DE BORTOLI, PEDIU VISTA A DES. FEDERAL SALISE MONTEIRO SANCHOTENE. AGUARDA O DES. FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ.
Comentário em 15/12/2016 13:02:17 (Gab. Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA)
Coma vênia da eminente Relatora, reafirmo o voto lançado na sessão de 09/03/2016.Assim, voto por negar provimento aos embargos infringentes.
Comentário em 15/12/2016 14:47:21 (Gab. Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA)
Acompanho.
Documento eletrônico assinado por Jaqueline Paiva Nunes Goron, Diretora de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8778364v1 e, se solicitado, do código CRC C1CD4863. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Jaqueline Paiva Nunes Goron |
Data e Hora: | 16/12/2016 18:01 |