Apelação Cível Nº 5004779-43.2015.4.04.7111/RS
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: LEOCADIO ARDILLO SCHROEDER (AUTOR)
ADVOGADO: MARILENA TATSCH MAURER
RELATÓRIO
Trata-se de apelação em face de sentença que homologou o pedido de desistência e extinguiu o feito, sem julgamento de mérito, nos seguintes termos (evento 21 do originário):
DISPOSITIVO
Ante o exposto, homologo o pedido de desistência e julgo extinto o processo, sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, VIII, c/c art. 1.040, § 1º e § 3º, ambos do CPC.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios, esses fixados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, §§ 2° e 3°, do CPC, atualizados monetariamente pela variação do IPCA-E desde o ajuizamento da ação (Súmula n° 14 do STJ). A exigibilidade das verbas resta suspensa, ante a concessão de assistência judiciária gratuita.
Publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
Havendo interposição de apelação, intime-se a parte adversa intimada para oferecer contrarrazões. Decorrido o prazo, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, independentemente de juízo de admissibilidade.
Após o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquive-se o feito.
Em seu apelo, o INSS postula a revogação da gratuidade da justiça concedida à parte autora ou, alternativamente, que seja concedida de forma parcial. Refere que a afirmação da parte de não ter condições de arcar com as despesas do processo não gera presunção absoluta, podendo ser afastada pelo próprio magistrado, conforme apreciação dos elementos dos autos. Aduz, ainda, que a parte apresenta renda incompatível com o benefício, percebendo, em janeiro de 2018, o valor de R$ 7.453,51 (evento 26 do originário).
Apresentadas as contrarrazões (evento 30 do originário), vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Da Gratuidade da Justiça
Em seu apelo, o INSS postula a revogação da gratuidade da justiça, em face do elevado rendimento da parte autora.
Com relação aos parâmetros a serem observados quando da concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a Corte Especial deste Tribunal uniformizou entendimento nos seguintes termos:
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. LEI 1.060/50. ART. 4ª. ESTADO DE MISERABILIDADE. PRESUNÇÃO PELA SIMPLES AFIRMAÇÃO. ÔNUS DA PROVA. PARTE CONTRÁRIA.
1. Para a concessão da assistência judiciária gratuita basta que a parte declare não possuir condições de arcar com as despesas do processo sem prejuízo do próprio sustento ou de sua família, cabendo à parte contrária o ônus de elidir a presunção de veracidade daí surgida - art. 4º da Lei nº 1060/50.
2. Descabem critérios outros (como isenção do imposto de renda ou renda líquida inferior a 10 salários mínimos) para infirmar presunção legal de pobreza, em desfavor do cidadão.
3. Uniformizada a jurisprudência com o reconhecimento de que, para fins de Assistência Judiciária Gratuita, inexistem critérios de presunção de pobreza diversos daquela constante do art. 4º da Lei nº 1060/50.
(TRF4, Incidente de Uniformização de Jurisprudência na Apelação Cível nº 5008804-40.2012.404.7100, Corte Especial, Relator Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, Relator para Acórdão Desembargador Federal Néfi Cordeiro, por maioria, julgado em 22-11-2012)
Como se vê, em princípio, basta a declaração da parte requerente no sentido de que não possui condições de arcar com os ônus processuais, restando à contraparte a comprovação em sentido contrário, o que foi reforçado pelo atual CPC, no § 3º do art. 99.
Nesse sentido, destaco julgado desta Corte:
AGRAVO DE INSTRUMENTO DE INSTRUMENTO. procedimento comum. previdenciário. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. 1. A Corte Especial deste Tribunal, no julgamento da Apelação Civil nº 5008804-40.2012.404.7100, decidiu que, para concessão da assistência judiciária gratuita, basta que a parte declare não possuir condições de arcar com as despesas do processo sem prejuízo do próprio sustento ou de sua família, cabendo à parte contrária o ônus de elidir a presunção de veracidade daí surgida. 2. Ademais, o Código de Processo Civil passou a disciplinar a concessão da gratuidade da justiça em seu art. 98 e seguintes, estabelecendo, em relação à pessoa física, uma presunção iuris tantum de veracidade da alegação de insuficiência de recursos. (TRF4, AG 5071717-42.2017.4.04.0000, Turma Regional Suplementar do PR, Rel. Juiz Federal Luiz Antonio Bonat, juntado aos autos em 02/04/2018)
Sucede que o atual Código de Processo Civil (Lei 13.105, de 16 de março de 2015, que passou a vigorar a partir do dia 18/03/2016) prevê, a despeito de também presumir (juris tantum) a veracidade da declaração firmada pela parte demandante (§ 3º do art. 99), a possibilidade de o juiz verificar de ofício a existência de elementos infirmadores, haja vista o disposto no § 2º do seu art. 99, in verbis:
Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.
(...)
§ 2º. O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.
(...)
Neste passo, ainda que a priori, a Turma tem como paradigmático ao deferimento da benesse o valor do teto para aposentadoria pelo RGPS, atualmente de R$ 5.645,80, de modo que, para renda mensal inferior, permanece mantida a presunção de hipossuficiência resultante da própria declaração. Sendo superior, haverá necessidade de demonstração da impossibilidade de arcar com as custas processuais.
No caso dos autos, na peça inicial, refere o autor ter renda mensal de R$ 2.268,70 (dois mil, duzentos e sessenta e oito reais e setena centavos), decorrente de sua posentadoria. Todavia, após o pedido de desistência da ação e a sentença de homologação, o INSS junta Extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, no evento 27 do originário, onde consta que, em face do vínculo empregatício ativo, o autor percebe uma renda rensal de R$ 4.671,30 (quatro mil, seiscentos e setenta e um reais e trinta centavos). Ainda, no apelo refere que o valor atual do benefício é de R$ 2.782,21 (dois mil, setecentos e oitenta e dois reais e vinte e um centavos).
Logo, tem-se que a gratuidade da justiça foi concedida com base exclusiva na renda da aposentadoria, mas somadas as duas fontes de renda da parte autora, o rendimento mensal ultrapassa sete mil reais, valor que se apresenta muito superior ao teto de benefício previdenciário. Apesar de postulada a revogação da gratuidade da justiça no apelo, com indicação do documento de comprovação do elevado rendimento, a parte autora, nas contrarrazões, nada trouxe aos autos, limitando-se a referir a presunção de veracidade da declaração e de que não teria mudança de rendimento quando da concessão, pois o juízo e o INSS tinham ciência que a parte autora recebia aposentadoria e continuava trabalhando.
Todavia, conforme já referido, a presunção da declaração de hipossuficiência é relativa, podendo ser afastada com provas apresentadas nos autos, como no presente caso. Ainda, o rendimento informado na peça inicial foi apenas decorrente da aposentadoria, não havendo esclarecimento sobre a renda do vínculo empregatício. Assim sendo, demonstrado nos autos a auferição de rendimentos mensais superiores ao teto de benefício previdenciário, deve ser revogada a gratuidade da justiça.
Nesse sentido, seguem os precedentes:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. REQUISITOS NÃO COMPROVADOS. BENEFÍCIO INDEFERIDO. Demonstrado nos autos que os rendimentos do requerente estão acima do teto dos benefícios da Previdência Social, deve ser indeferida a concessão do benefício da assistência judiciária gratuita, mormente porque não demonstrado, nos autos, a impossibilidade de arcar com as despesas processuais sem prejuízo ao seu sustento e de sua família. (TRF4, AG 5006936-74.2018.4.04.0000, Sesta Turma, Rel. Juiz Federal Artur César de Souza, juntado aos autos em 12/04/2018)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. INDEFERIMENTO. 1-A concessão do benefício não estava condicionada à comprovação da miserabilidade do requerente, mas, sim, à impossibilidade de ele arcar com os custos e as despesas do processo (inclusive a verba honorária), sem prejuízo ao atendimento de necessidades básicas próprias ou de sua família. Além disso, a orientação jurisprudencial inclinou-se no sentido de que a declaração de pobreza cria presunção iuris tantum em favor do declarante. 2-O Código de Processo Civil de 2015, ao regular a matéria, dispôs que a parte gozará de seus benefícios mediante simples afirmação, na própria petição inicial, de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família. Contudo, a presunção de veracidade da respectiva declaração não é absoluta, devendo ser sopesada com as demais provas constantes nos autos. (TRF4, AG 5068215-95.2017.4.04.0000, Quarta Turma, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'azevedo Aurvalle, juntado aos autos em 05/04/2018)
Reformada a sentença, resta sucumbente a parte autora, que deverá arcar com o pagamento das custas judiciais e com os honorários advocatícios, os quais, com base no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC/2015, mantenho conforme fixados na sentença, ou seja, em 10% sobre o valor atualizado da causa.
Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso.
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Apelação Cível Nº 5004779-43.2015.4.04.7111/RS
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: LEOCADIO ARDILLO SCHROEDER (AUTOR)
ADVOGADO: MARILENA TATSCH MAURER
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA. PRESUNÇÃO RELATIVA. LIMITE PARA PRESUNÇÃO. TETO PARA APOSENTADORIA PELO RGPS. VERIFICAÇÃO DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE.
1. A gratuidade da justiça poderá ser concedida apenas com base na declaração da parte requerente no sentido de que não possui condições de arcar com os ônus processuais, com presunção relativa da hipossuficiência.
2. A presunção relativa poderá ser afastada mediente prova em contrário, sendo incumbência da parte contrária a produção da prova. Neste caso, deverá a parte requerente demonstrar a necessidade.
3. Para efeito de presunção de necessidade, tem entendido adotado este Tribunal, como paradigma de teto de rendimento, o limite para aposentadoria pelo RGPS.
4. Apesar da presunção relativa da declaração firmada pela parte demandante (§ 3º do art. 99 do CPC), a norma processual permite a possibilidade de o juiz verificar de ofício a existência de elementos infirmadores da veracidade da necessidade, conforme disposto no § 2º do seu art. 99 do CPC.
5. Havendo nos autos elementos que demonstram que a renda mensal da parte requerente supera o teto de valor para aposentadoria pelo RGPS e não apresentado pela parte outros elementos a indicar a hipossuficiência, deve ser revogada a gratuidade da justiça.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu dar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 18 de julho de 2018.
Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000504425v7 e do código CRC 66bb87aa.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 18/07/2018
Apelação Cível Nº 5004779-43.2015.4.04.7111/RS
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: LEOCADIO ARDILLO SCHROEDER (AUTOR)
ADVOGADO: MARILENA TATSCH MAURER
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 18/07/2018, na seqüência 251, disponibilizada no DE de 02/07/2018.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento ao recurso.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
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