Apelação Cível Nº 5003911-68.2015.4.04.7207/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: GISELE DEMETRIO (AUTOR)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença que julgou procedente o pedido de revisão da pensão por morte, para o fim de:
a) determinar ao INSS que revise o benefício de pensão por morte da autora desde a data da concessão (NB 21/146.422.468-1, DIB 15/04/2011), de modo que a respectiva renda passe a corresponder à renda atualizada de uma aposentadoria por invalidez concedida em 19/01/2011 e em cujo período básico de cálculo sejam computados, mensalmente, os valores referentes ao auxílio-acidente NB 94/547.722.603-6 a partir de 01/04/2002, respeitado o limite do salário-de-contribuição em cada competência, observando-se ainda que o primeiro reajuste da nova renda obtida para a pensão deverá ser integral;
b) condenar o INSS a pagar à parte autora em Juízo os valores correspondentes às parcelas vencidas, corrigidos monetariamente pelo IGP-DI de 05/1996 a 08/2006 e pelo INPC a contar de 09/2006 e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, acumulados de forma simples, desde a citação até 30/06/2009, a partir de quando incide a taxa de juros aplicável às cadernetas de poupança (artigo 1º F da Lei nº. 9.494/97, com redação dada pela Lei nº. 11.960/2009 c/c artigo 12 da Lei nº. 8.177/91, conforme Lei nº. 12.703/2012).
Condeno ainda o INSS ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) do valor da condenação, excluídas as parcelas que se vencerem a partir de hoje.
O apelante alega, preliminarmente, a ilegitimidade ativa da parte autora e a falta de interesse de agir, por ausência de pedido administrativo. No mérito, diz que se o segurado falecido não estava aposentado por invalidez, mas recebendo o benefício de auxílio-doença, deve-se efetuar apenas a simulação do cálculo de aposentadoria, nos termos do artigo 29 da Lei 8.213/91. Assim, se o segurado falecido não estava recebendo o benefício de aposentadoria por invalidez, até porque não havia incapacidade total e definitiva, o valor do auxílio-acidente não entra no cômputo do período básico de cálculo (
).Foram apresentadas contrarrazões (
).É o relatório.
VOTO
Quanto à questão da legitimidade, destaco que, na forma do art. 112 da Lei 8.213/91, os sucessores de titular falecido de benefício previdenciário detêm legitimidade processual para, em nome próprio e por meio de ação própria, pleitear em juízo os valores não recebidos em vida pelo de cujus, tenham eles ou não reflexos em pensão.
Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema 1.057 dos recursos especiais repetitivos, em 23.06.2021, firmou a seguinte tese jurídica:
I. O disposto no art. 112 da Lei n. 8.213/1991 é aplicável aos âmbitos judicial e administrativo;
II. Os pensionistas detêm legitimidade ativa para pleitear, por direito próprio, a revisão do benefício derivado (pensão por morte) - caso não alcançada pela decadência -, fazendo jus a diferenças pecuniárias pretéritas não prescritas, decorrentes da pensão recalculada;
III. Caso não decaído o direito de revisar a renda mensal inicial do benefício originário do segurado instituidor, os pensionistas poderão postular a revisão da aposentadoria, a fim de auferirem eventuais parcelas não prescritas resultantes da readequação do benefício original, bem como os reflexos na graduação econômica da pensão por morte; e
IV. À falta de dependentes legais habilitados à pensão por morte, os sucessores (herdeiros) do segurado instituidor, definidos na lei civil, são partes legítimas para pleitear, por ação e em nome próprios, a revisão do benefício original - salvo se decaído o direito ao instituidor - e, por conseguinte, de haverem eventuais diferenças pecuniárias não prescritas, oriundas do recálculo da aposentadoria do de cujus.
Portanto, afasto a preliminar de ilegitimidade de parte.
Em relação ao segundo ponto trazido, tenho que o Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, nos autos do RE 631240/MG, assentou entendimento no sentido da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, ressaltando ser prescindível o exaurimento daquela esfera.
O Relator do RE 631240, Ministro Luís Roberto Barroso, dividiu as ações previdenciárias em dois grupos, quais sejam:
(i) demandas que pretendem obter uma prestação ou vantagem inteiramente nova ao patrimônio jurídico do autor (concessão de benefício, averbação de tempo de serviço e respectiva certidão, etc.); e
(ii) ações que visam ao melhoramento ou à proteção de vantagem já concedida ao demandante (pedidos de revisão, conversão de benefício em modalidades mais vantajosa, restabelecimento, manutenção, etc.).
E concluiu o Ministro afirmando que: "no primeiro grupo, como regra, exige-se a demonstração de que o interessado já levou sua pretensão ao conhecimento da Autarquia e não obteve a resposta desejada", sendo que a falta de prévio requerimento administrativo de concessão deve implicar na extinção do processo judicial sem resolução de mérito, por ausência de interesse de agir; "no segundo grupo, precisamente porque já houve a inauguração da relação entre o beneficiário e a Previdência, não se faz necessário, de forma geral, que o autor provoque novamente o INSS para ingressar em juízo." Importante menção fez ainda o Relator aos casos em que o entendimento da Autarquia for notoriamente contrário à pretensão do interessado, salientando não ser exigível o prévio requerimento administrativo, todavia assegurou não se enquadrar aqui os casos em que se pretende obter benefício para trabalhador informal.
Na hipótese, observo que a requerente pretende a revisão de seu benefício, e, portanto, é desnecessário o prévio pedido administrativo.
Quanto ao mérito, a sentença recorrida, que deve ser integralmente mantida pelos seus percucientes fundamentos, os quais transcrevo (
):"...
1. Dos fatos
A autora é titular do benefício de pensão por morte NB 21/146.422.468-1, com DIB em 15/04/2011, em decorrência do óbito do segurado Salveni da Silva Honorato.
Quando faleceu, o referido instituidor recebia simultaneamente um auxílio-doença (NB 31/544.437.681-0, DIB 19/01/2011) e um auxílio-acidente (NB 94/547.722.603-6, DIB 01/04/2002).
O referido auxílio-acidente foi concedido após a cessação de auxílio-doença anterior, decorrente de acidente de trabalho (NB 91/120.306.300-5, DIB 21/10/2001).
O cálculo da renda da pensão da autora corresponde a evolução do salário-de-benefício do último auxílio-doença, sem computar o valor do referido auxílio-acidente, que é o que se pretende na presente ação.
Em síntese, eis os benefícios cujo regramento há de ser analisado para dirimir a presente questão:
1. Auxílio-doença por acidente de trabalho do instituidor: NB 91/120.306.300-5, DIB 21/10/2001 e DCB 31/03/2002;
2. Auxílio acidente do instituidor: NB 94/547.722.603-6, DIB 01/04/2002 e DCB 15/04/2011 (óbito do segurado);
3. Auxílio-doença do instituidor: NB 31/544.437.681-0, DIB 19/01/2011 e DCB 15/04/2011 (óbito do segurado); e
4. Pensão da autora: NB 21/146.422.468-1, DIB 15/04/2011.
2. Da interpretação mais razoável à legislação aplicável ao caso
Conforme aponta o INSS em sua contestação, a Lei de Benefícios, no § 1º de seu artigo 86 determina a cessação do auxílio-acidente com a concessão de qualquer aposentadoria ou com o óbito do segurado, nos seguintes termos:
Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem seqüelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia. (Redação dada pela Lei nº. 9.528, de 1997)
§ 1º O auxílio-acidente mensal corresponderá a cinqüenta por cento do salário-de-benefício e será devido, observado o disposto no § 5º, até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou até a data do óbito do segurado. (Redação dada pela Lei nº. 9.528, de 1997)
Tal dispositivo, contudo, não implica em diminuição dos rendimentos do segurado titular de auxílio-acidente que venha a se aposentar. Aliás, qualquer norma nesse sentido estaria contrariando a própria função do benefício de auxílio-acidente: compensar a diminuição nos rendimentos do segurado em razão da redução de sua capacidade laboral por força da consolidação de sequelas.
Ou seja, a interpretação isolada do § 1º do artigo 86 acima transcrito conduziria à conclusão de que o portador de sequelas que limitam sua capacidade passaria sua vida ativa recebendo a devida compensação, mas, sem qualquer razão lógica, perderia essa diferença ao se aposentar, diferentemente da situação dos demais segurados aos quais o Regime Geral se pautaria pelo princípio de assegurar um benefício com renda proporcional ao salário-de-contribuição que percebia na ativa.
Obviamente não é este o propósito da norma.
A redação do referido § 1º só faz sentido quando interpretada conjuntamente com o artigo 31 da Lei nº. 8.213/91:
Art. 31. O valor mensal do auxílio-acidente integra o salário-de-contribuição, para fins de cálculo do salário-de-benefício de qualquer aposentadoria, observado, no que couber, o disposto no art. 29 e no art. 86, § 5º. (Restabelecido com nova redação pela Lei nº 9.528, de 1997 - grifou-se)
Portanto, com a concessão de uma aposentadoria, cancela-se o auxílio-acidente justamente porque o seu valor integra o salário-de-contribuição para cálculo daquela.
Até aqui, a questão não suscita maiores controvérsias. Mas é importante que fique claro o propósito da norma insculpida no § 1º do artigo 86 da Lei de Benefícios para que se encontre uma solução adequada à situação apresentada no presente feito.
Isso porque, nos termos do artigo 75 da Lei nº. 8.213/91:
Art. 75. O valor mensal da pensão por morte será de cem por cento do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito se estivesse aposentado por invalidez na data de seu falecimento, observado o disposto no art. 33 desta lei. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
Em princípio, a questão parece simples quando o segurado instituidor recebia auxílio-acidente. Com o seu falecimento, os beneficiários de sua pensão receberão ou a aposentadoria que o segurado já recebia ou aquela a que faria jus, o que, em qualquer caso, traria embutido o valor do auxílio-acidente, nos termos acima.
O problema ocorre quando se verifica a situação experimentada pela autora: quando do óbito, o segurado instituidor vinha recebendo um benefício de auxílio-doença e mais a renda do auxílio-acidente.
Neste caso, o segurado não estava aposentado. Logo, a renda da pensão deve ter por base a aposentadoria por invalidez a que o segurado teria direito na data do falecimento.
A solução seria simples se fosse o caso de aplicar o disposto no artigo 29, § 5º da Lei de Benefícios:
Art. 29. O salário-de-benefício consiste: (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
(...)
II - para os benefícios de que tratam as alíneas "a", "d", "e" e "h" do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo. (Incluído pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
(...)
§ 5º Se, no período básico de cálculo, o segurado tiver recebido benefícios por incapacidade, sua duração será contada, considerando-se como salário-de-contribuição, no período, o salário-de-benefício que serviu de base para o cálculo da renda mensal, reajustado nas mesmas épocas e bases dos benefícios em geral, não podendo ser inferior ao valor de 1 (um) salário mínimo.
Porém, embora pareça indiscutível a aplicação do dispositivo acima a qualquer aposentadoria por invalidez, já que se trata do benefício previsto na citada alínea "a" do inciso I do artigo 18 da Lei, o que, por sinal, resolveria de imediato a questão aqui analisada, o fato é que se unificou no Superior Tribunal de Justiça o entendimento no sentido de que o referido § 5º do artigo 29 deve ser interpretado conjuntamente com o artigo 55, II da mesma Lei, segundo o qual o período em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença só é computado como tempo de serviço quando intercalado a períodos de contribuição.
Assim, aquela Corte, partindo da posição adotada igualmente por suas duas Turmas especializadas em Direito Previdenciário sobre a questão, em incidente de uniformização suscitado pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS e que foi autuado sob o registro de petição nº. 7108-RJ (2009/0041519-6), proferiu decisão monocrática com amparo no artigo 557, § 1º-A, do Código de Processo Civil, com a seguinte conclusão:
Destarte, inafastável o reconhecimento de que o v. acórdão prolatado pela Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais - TNU, ao determinar a utilização do salário-de-benefício do auxílio-doença como salário-de-contribuição para o cálculo da renda mensal inicial da aposentadoria por invalidez, em caso em que não há período de contribuição intercalado entre este benefício e aquele, contrariou jurisprudência dominante desta e. Corte, razão pela qual o presente incidente deve ser acolhido.
Ante o exposto, com fundamento no art. 557, § 1º-A, do CPC, dou provimento ao incidente de uniformização, para determinar a aplicação in casu do art. 36, § 7º, do Decreto nº 3.048/99, que determina que "A renda mensal da aposentadoria por invalidez concedida por transformação de auxílio-doença será de cem por cento do salário-de-benefício que serviu de base para o cálculo da renda mensal inicial do auxílio-doença". (relator Ministro Felix Fischer, decisão de 07/04/2009).
E é justamente esta interpretação que dá origem ao presente litígio.
Em se tratando de aposentadoria por invalidez decorrente da transformação de auxílio-doença, como não há intervalo contributivo entre um e outro, não há também um novo cálculo, mas apenas se aproveita o salário-de-benefício deste, isto é, há apenas uma majoração do coeficiente: o segurado que vinha recebendo 91% do salário-de-benefício, passa a receber uma RMI correspondente a 100%.
O que ocorre, então, com a renda do auxílio-acidente que era paga simultaneamente ao auxílio-doença transformado em aposentadoria por invalidez?
A interpretação adotada pelo INSS na concessão da pensão por morte aqui discutida foi no sentido de simplesmente suprimir o auxílio-acidente sem qualquer repercussão no novo benefício.
Contudo, tal decisão vai contra a finalidade do benefício de auxílio-acidente de assegurar a seu titular uma renda equivalente à que estaria auferindo se não houvesse experimentado a redução de sua capacidade laborativa.
Diante disso, entre aplicar isoladamente o dispositivo que determina a cessação do auxílio-acidente com a concessão da aposentadoria (artigo 86, § 1º) e utilizar, da maneira que se mostrar possível, a interpretação conjunta deste com a norma que determina que o valor mensal do auxílio-acidente integra o cálculo de qualquer aposentadoria (artigo 31), parece ser mais adequada esta última opção.
Com efeito, no conflito entre os dois dispositivos da Lei de Benefícios, que não ocorreria em sua interpretação literal, mas acaba se verificando por força da interpretação jurisdicional dada ao artigo 29, § 5º, há de prevalecer a regra que assegura a continuidade da compensação mesmo após a inativação definitiva ou o óbito do segurado, sem qualquer ressalva.
Nestes termos, a renda da pensão por morte do segurado que vinha recebendo conjuntamente um auxílio-acidente e um auxílio-doença, além de representar o salário-de-benefício deste último, deve ser acrescida do valor daquele.
Contudo, como a maneira que a jurisprudência definiu para se apurar a renda de uma aposentadoria por invalidez e, consequentemente, de uma pensão por morte neste caso impede a realização de um novo cálculo em que se efetue a soma do valor do auxílio-acidente com a do salário-de-benefício do último auxílio-doença (no período da respectiva vigência) porque não há intervalo contributivo entre este e o novo benefício.
Por outro lado, simplesmente somar a renda do auxílio-acidente na data do óbito com o salário-de-benefício do auxílio-doença, como foi feito na simulação de cálculo do evento 10, representaria, na prática, manter o benefício acidentário, só que disfarçado sob o número da pensão por morte. Além disso, efetuando-se o cálculo desta maneira, estaria se obtendo uma nova renda resultante da soma do valor do auxílio-acidente com a média dos salários-de-contribuição do instituidor, média esta que incluiria tanto aqueles salários que supostamente sofreram uma redução proporcional à sua limitação laboral, como aqueles que eram anteriores à consolidação das lesões e, portanto, refletiam perfeitamente os rendimentos de seu trabalho para fins previdenciários.
Nestes termos, entendo que a melhor interpretação para fazer valer o comando contido no artigo 31 da Lei de Benefícios é simular a concessão de uma aposentadoria por invalidez na data de início do último auxílio-doença e, neste cálculo, somar aos salários-de-contribuição do período básico de cálculo o valor do auxílio-acidente nas respectivas competências.
O segundo passo é simular a evolução que esta aposentadoria por invalidez experimentaria até a data do óbito e alcança-se, deste modo, a uma renda para a pensão por morte que reflete a compensação que o segurado instituidor recebia em razão da sua redução da capacidade laborativa.
Portanto, a revisão a ser feita consiste na realização de um cálculo de concessão simulada de uma aposentadoria por invalidez originária em 19/01/2011 (DIB do auxílio-doença NB 31/544.437.681-0), somando-se os salários-de-contribuição ao valor recebido mensalmente a título do auxílio-acidente NB 94/547.722.603-6, desde DIB 01/04/2002 até a última competência utilizada no PBC (12/2010), respeitando-se o limite máximo do salário-de-contribuição. Obitda a renda desta aposentadoria por invalidez, efetua-se a evolução pelos índices de atualização do salário-de-benefício até 15/04/2011, encontrando-se então o valor a ser fixado como RMI da pensão por morte NB 21/146.422.468-1, cujo primeiro reajuste deverá ser integral, uma vez que já foi observada a proporcionaldiade na evolução da aposentadoria por invalidez simulada.
Nessa linha, cancela-se o auxílio-acidente, observando o disposto no artigo 86, § 1º da Lei de Benefícios, mas atende-se também ao comando do artigo 31 da Lei, sem, contudo, ampliar indevidamente a compensação proporcionada pelo auxílio-acidente a salários-de-contribuição anteriores às sequelas que o legitimaram.
Um detalhe que é importante registrar é que o auxílio-doença que o instituidor recebia na data do óbito tinha origem em afecção diversa da que ensejou a concessão do auxílio-acidente.
Isso porque, se fosse o caso de agravamento do mesmo quadro, até mesmo a cumulação do auxílio-acidente com o último auxílio-doença seria indevida, por força do § 6º do artigo 104 do Decreto nº. 3.048/99:
Art. 104. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado empregado, exceto o doméstico, ao trabalhador avulso e ao segurado especial quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultar seqüela definitiva, conforme as situações discriminadas no anexo III, que implique: (Redação dada pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
(...)
§ 6º No caso de reabertura de auxílio-doença por acidente de qualquer natureza que tenha dado origem a auxílio-acidente, este será suspenso até a cessação do auxílio-doença reaberto, quando será reativado.
No presente caso, o auxílio-acidente do instituidor decorre de consolidação de lesões decorrentes de uma fratura na perna esquerda (evento 34, PROCADM1, p. 9 e evento 30, PROCADM1, p. 7), ao passo que o auxílio-doença que ele recebia na data do óbito tem por base um quadro de transtornos decorrentes do consumo de álcool (evento 32, PROCADM1, p. 13).
Portanto, não havendo óbice legal, deve ser acolhido o pedido para que seja revista a renda do benefício de pensão da autora, desde a respectiva DIB, nos termos acima descritos. ..."
Dessarte, a regra que prevê a integração da renda do auxílio-acidente ao salário-de-contribuição do mês/competência para fins de cálculo da aposentadoria encontra sua justificativa no fato de que, embora não tenha caráter substitutivo da renda do trabalhador, trata-se de renda que acaba se agregando aos ganhos habituais do trabalhador. Assim, e em face de sua inacumulabilidade com qualquer aposentadoria, a desconsideração pura e simples do auxílio-acidente no cálculo da renda da aposentadoria operaria verdadeiro prejuízo ao trabalhador. Trata-se, então, de medida compensatória à mudança operada pela Lei 9.528/97, que não mais permitiu a acumulação entre os benefícios - medida estabelecida em atenção à vedação de retrocesso social.
Assim, não prospera o apelo da Autarquia.
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, D DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-102019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
A partir de dezembro de 2021, a variação da SELIC passa a ser adotada no cálculo da atualização monetária e dos juros de mora, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021:
"Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente."
Juros moratórios
Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.
A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.
Custas processuais
O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).
Honorários advocatícios recursais
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Aplica-se, portanto, em razão da atuação do advogado da parte em sede de apelação, o comando do §11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85.
Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% (quinze por cento) sobre as parcelas vencidas (Súmula 76 do TRF4), considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Tutela específica - revisão do benefício
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à revisão do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
ados para cumprimento: ( ) Concessão ( ) Restabelecimento (X) Revisão | |
NB | 146.422.468-1 |
Espécie | 21 |
DIB | 15-04-2011 |
DIP | |
DCB | |
RMI | a apurar |
Observações | A renda deve corresponder à renda atualizada de uma aposentadoria por invalidez concedida em 19/01/2011 e em cujo período básico de cálculo sejam computados, mensalmente, os valores referentes ao auxílio-acidente NB 94/547.722.603-6 a partir de 01/04/2002, respeitado o limite do salário-de-contribuição em cada competência, observando-se ainda que o primeiro reajuste da nova renda obtida para a pensão deverá ser integral |
Requisite a Secretaria da Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 30 (trinta) dias.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por JAIRO GILBERTO SCHAFER, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003386876v18 e do código CRC 611d094a.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JAIRO GILBERTO SCHAFER
Data e Hora: 22/8/2022, às 18:12:34
Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 16:34:16.
Apelação Cível Nº 5003911-68.2015.4.04.7207/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: GISELE DEMETRIO (AUTOR)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. INTERESSE DE AGIR. legitimidade. pensionista. tema 1057 do stj. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. RE 63.1240/MG. pensão por morte. Revisão da rmi da aposentadoria por invalidez. artigo 31 da Lei nº 8.213/91. interpretação. cumulação.
Os sucessores de titular falecido de benefício previdenciário detêm legitimidade processual para, em nome próprio e por meio de ação própria, pleitear em juízo os valores não recebidos em vida pelo de cujus, tenham eles ou não reflexos em pensão. Nesse sentido, o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema 1.057 dos recursos especiais repetitivos, em 23.06.2021.
O Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, nos autos do RE 631240/MG, assentou entendimento no sentido da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, ressalvando as ações que visam ao melhoramento ou à proteção de vantagem já concedida ao demandante (pedidos de revisão, conversão de benefício em modalidades mais vantajosa, restabelecimento, manutenção, etc.).
A regra que prevê a integração da renda do auxílio-acidente ao salário-de-contribuição do mês/competência para fins de cálculo da aposentadoria encontra sua justificativa no fato de que, embora não tenha caráter substitutivo da renda do trabalhador, trata-se de renda que acaba se agregando aos ganhos habituais do trabalhador. Assim, e em face de sua inacumulabilidade com qualquer aposentadoria, a desconsideração pura e simples do auxílio-acidente no cálculo da renda da aposentadoria operaria verdadeiro prejuízo ao trabalhador. Trata-se, então, de medida compensatória à mudança operada pela Lei 9.528/97, que não mais permitiu a acumulação entre os benefícios - medida estabelecida em atenção à vedação de retrocesso social.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 19 de agosto de 2022.
Documento eletrônico assinado por JAIRO GILBERTO SCHAFER, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003386877v5 e do código CRC d7a4df8b.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JAIRO GILBERTO SCHAFER
Data e Hora: 22/8/2022, às 18:12:34
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 12/08/2022 A 19/08/2022
Apelação Cível Nº 5003911-68.2015.4.04.7207/SC
RELATOR: Juiz Federal JAIRO GILBERTO SCHAFER
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: GISELE DEMETRIO (AUTOR)
ADVOGADO: ADILSON WARMLING ROLING (OAB SC012920)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 12/08/2022, às 00:00, a 19/08/2022, às 16:00, na sequência 8, disponibilizada no DE de 02/08/2022.
Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JAIRO GILBERTO SCHAFER
Votante: Juiz Federal JAIRO GILBERTO SCHAFER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 16:34:16.