
Remessa Necessária Cível Nº 5015070-68.2020.4.04.7001/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PARTE AUTORA: PATRICIA HELENA VIVAN RIBEIRO (IMPETRANTE)
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
RELATÓRIO
Trata-se de mandado de segurança em que se objetiva o reconhecimento de tempo de serviço especial, exercido nos cargos de enfermeira/chefe de enfermagem, para o fim de obtenção da respectiva certidão de tempo de contribuição.
A sentença julgou procedente o pedido (evento 33), constando do respectivo dispositivo:
Por todo o exposto, JULGO EXTINTO o processo sem apreciação do mérito, relativamente ao período de 26/07/1994 a 06/02/1995 por falta de interesse processual, na forma do art. 485, inciso VI, do Código de Processo Civil. No mais, JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS NA INICIAL, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processual Civil, e CONCEDO A SEGURANÇA para determinar à Autoridade Impetrada que:
- reconheça como especial os períodos de 02/03/1995 a 28/04/1995, 29/04/1995 a 17/11/1995 e 13/11/1995 a 28/12/1999, com a aplicação do multiplicador 1,20;
- Expeça a CTC.
Sem condenação em honorários (art. 25 da Lei nº 12.016/2009).
Sem recursos voluntários, vieram os autos a este Tribunal.
O MPF opinou pela não intervenção no feito.
É o relatório.
VOTO
Analisando os autos, fico convencida do acerto da sentença de procedência, que transcrevo e adoto como razões de decidir, a saber:
(...)
3. Tempo especial
O exercício de atividade sob condições especiais é disciplinado pela lei vigente à época em que o trabalho foi efetivamente prestado, integrando, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.
Portanto, o reconhecimento da exposição a agentes agressivos depende do preenchimento dos requisitos legais existentes na data do efetivo exercício da atividade insalubre.
À exceção das regras relativas aos agentes nocivos de intensidade mensurável (ruído, calor, frio), cujas peculiaridades serão tratadas mais adiante, passo a descrever os critérios para a comprovação da atividade especial, de acordo com as alterações legislativas:
Antes do advento da Lei 9.032, de 28.4.1995, é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho por enquadramento dos agentes nocivos ou da categoria profissional do segurado nas atividades previstas nos anexos dos Decretos 53.831, de 10.4.1964, e 83.080, de 24.1.1979. Além disso, o efetivo exercício da atividade deve ser comprovado mediante a apresentação de formulário (SB-40, DSS-8030 ou outro equivalente).
A insalubridade da atividade profissional ou do agente nocivo que não estiver previsto nos referidos Decretos pode ser aferida por qualquer meio de prova aliado ao formulário correspondente.
A Lei 9.032/95 conferiu nova redação ao artigo 57 da Lei 8.213, de 24.7.1991, e extinguiu a presunção de insalubridade por enquadramento da atividade profissional.
Dessa forma, na vigência da Lei 9.032/95, o segurado deve comprovar a exposição permanente e habitual ao agente insalubre por quaisquer meios de prova, desde que acompanhados do respectivo formulário.
Com a edição do Decreto 2.172, de 5.3.1997, que regulamentou a Medida Provisória 1.523, de 11.10.1996, a qual foi posteriormente convertida na Lei 9.528, de 10.12.1997, tornou-se imprescindível a apresentação de formulário e de laudo técnico de condições ambientais do trabalho para a comprovação da exposição aos agentes nocivos, em conformidade com o disposto nos § § 1º e 2º do art. 58 da Lei 8.213/91, com redação dada pela Lei 9.528/97, nos seguintes termos:
§ 1º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista.
§ 2º Do laudo técnico referido no parágrafo anterior deverão constar informação sobre a existência de tecnologia de proteção coletiva ou individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo.
Em síntese, no que se refere à prova da especialidade da atividade exercida:
a) até 28.4.1995: é possível o reconhecimento por enquadramento da atividade profissional ou do agente nocivo, admitidas outras formas de prova;
b) de 29.4.1995 a 5.3.1997: afastada a presunção de nocividade por enquadramento, a insalubridade pode ser aferida por qualquer meio; e
c) a partir de 6.3.1997: é indispensável a apresentação do laudo técnico de condições ambientais da empresa.
Oportuno mencionar que o fato de o laudo pericial ter sido elaborado após o término do período postulado em juízo não impede o reconhecimento da atividade especial, até porque, como as condições do ambiente de trabalho tendem a aprimorar-se com a evolução tecnológica, é razoável supor que em tempos pretéritos a situação era pior ou quando menos igual à constatada na data da elaboração (Processo 2002.72.08.001261-1, relator Juiz Sebastião Ogê Muniz, sessão de 10.9.2002).
Agentes nocivos de intensidade mensurável
Para a comprovação da exposição aos agentes nocivos de intensidade mensurável (ruído, calor, frio) sempre foi exigido laudo técnico, pois a condição insalubre depende da intensidade do agente.
Quanto à nocividade do agente ruído, segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, é considerada especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até a edição do Decreto nº 2.171/97; após essa data, o nível de ruído considerado prejudicial é o superior a 90 decibéis; a partir do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, o limite de tolerância ao agente físico ruído reduziu para 85 decibéis,não havendo falar em aplicação retroativa deste, uma vez que o tempo de serviço é regido pela legislação vigente à época em que efetivamente prestado o labor.
É o que se depreende do julgamento do Incidente de Uniformização de Jurisprudência suscitado pelo Instituto Nacional do Seguro Social:
PREVIDENCIÁRIO. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. ÍNDICE MÍNIMO DE RUÍDO A SER CONSIDERADO PARA FINS DE CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. APLICAÇÃO RETROATIVA DO ÍNDICE SUPERIOR A 85 DECIBÉIS PREVISTO NO DECRETO N. 4.882/2003. IMPOSSIBILIDADE. TEMPUS REGIT ACTUM. INCIDÊNCIA DO ÍNDICE SUPERIOR A 90 DECIBÉIS NA VIGÊNCIA DO DECRETO N. 2.172/97. ENTENDIMENTO DA TNU EM DESCOMPASSO COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR.
1. Incidente de uniformização de jurisprudência interposto pelo INSS contra acórdão da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais que fez incidir ao caso o novo texto do enunciado n. 32/TNU: O tempo de trabalho laborado com exposição a ruído é considerado especial, para fins de conversão em comum, nos seguintes níveis: superior a 80 decibéis, na vigência do Decreto n. 53.831/64 e, a contar de 5 de março de 1997, superior a 85 decibéis, por força da edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, quando a Administração Pública reconheceu e declarou a nocividade à saúde de tal índice de ruído. 2. A contagem do tempo de trabalho de forma mais favorável àquele que esteve submetido a condições prejudiciais à saúde deve obedecer a lei vigente na época em que o trabalhador esteve exposto ao agente nocivo, no caso ruído. Assim, na vigência do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, o nível de ruído a caracterizar o direito à contagem do tempo de trabalho como especial deve ser superior a 90 decibéis, só sendo admitida a redução para 85 decibéis após a entrada em vigor do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003.Precedentes: AgRg nos EREsp 1157707/RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Corte Especial, DJe 29/05/2013; AgRg no REsp 1326237/SC, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 13/05/2013; REsp 1365898/RS, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 17/04/2013; AgRg no REsp 1263023/SC, Rel. Min. Gilson Dipp, Quinta Turma, DJe 24/05/2012; e AgRg no REsp 1146243/RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 12/03/2012. 3. Incidente de uniformização provido.(Pet 9.059/RS, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2013, DJe 09/09/2013) (sem grifos no original).
Em síntese, o nível de ruído que caracteriza a insalubridade para contagem de tempo de serviço especial deve ser superior a: 80 decibéis até 5.3.1997; 90 decibéis de 6.3.1997 a 18.11.2003; e 85 decibéis, a partir de 19.11.2003.
Permanência da exposição ao agente nocivo
Com o advento da Lei 9.032, publicada em 29.4.1995, para o reconhecimento da especialidade da atividade passou a ser necessária a comprovação da exposição ao agente nocivo de forma permanente, não ocasional nem intermitente.
No que tange aos períodos de trabalho anteriores, o critério da permanência é dispensado, conforme a Súmula 49 da Turma de Uniformização Nacional dos Juizados Especiais Federais, publicada no Diário Oficial da União em 15.3.2012: Para reconhecimento de condição especial de trabalho antes de 29.4.1995, a exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física não precisa ocorrer de forma permanente.
Utilização de equipamento de proteção individual
No que tange à utilização do equipamento de proteção individual (EPI) para o agente nocivo ruído, adoto como fundamento a Súmula 9 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, segundo a qual o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), ainda que elimine a insalubridade, no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado(13.10.2003).
Destaco que o Supremo Tribunal Federal declarou a validade da referida Súmula 9 da TNU, quanto à irrelevância da utilização de EPI no caso de exposição ao agente nocivo ruído (ARE n. 664335):
Decisão: O Tribunal, por unanimidade, negou provimento ao recurso extraordinário. Reajustou o voto o Ministro Luiz Fux (Relator). O Tribunal, por maioria, vencido o Ministro Marco Aurélio, que só votou quanto ao desprovimento do recurso, assentou a tese segundo a qual o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. O Tribunal, também por maioria, vencidos os Ministros Marco Aurélio e Teori Zavascki, assentou ainda a tese de que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria. Ausente, justificadamente, o Ministro Dias Toffoli. Presidiu o julgamento o Ministro Ricardo Lewandowski. Plenário, 04.12.2014. DJE 12.2.2015.
Noutro vértice, para os demais agentes nocivos, a eficácia dos EPIs atestada pela empregadora elide a agressividade, afastando, por conseguinte, a especialidade da atividade.
Perfil profissiográfico previdenciário
A partir de 1º.1.2004, a apresentação do perfil profissiográfico previdenciário tornou-se indispensável para o reconhecimento da especialidade da atividade, por força do artigo 148 da Instrução Normativa 99 do Instituto Nacional do Seguro Social.
Se o referido formulário contiver expressa indicação dos profissionais responsáveis pelos estudos ambientais e pelo monitoramento biológico da empresa, é suficiente para comprovar a especialidade da atividade e dispensa o segurado da apresentação de laudo técnico. Isso porque o formulário emitido pela empresa é preenchido com base no laudo, contendo, portanto, as mesmas constatações acerca da insalubridade.
Tal possibilidade se estende aos períodos anteriores a 1º.1.2004, desde que o perfil profissiográfico previdenciário contenha assinatura de médico ou engenheiro do trabalho.
Nesse sentido, o entendimento do Juiz Federal Fernando Zandoná, da Segunda Turma Recursal desta Seção Judiciária, exarado no julgamento do recurso cível 2006.72.95.020845-8/SC, na sessão de 15.6.2007, que passo a transcrever:
A partir de 01/01/2004 o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é documento indispensável para a análise do(s) período(s) cuja especialidade é postulada (art. 148 da Instrução Normativa nº 99 do INSS, publicada no DOU de 10/12/2003).Tal documento substitui os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido com a indicação, inclusive, dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.Contudo, para o período anterior a 01/01/2004, o PPP também tem sido aceito, mas o entendimento desta Turma é de que ele só substitui os antigos formulários e o laudo, caso esteja também assinado por médico ou engenheiro do trabalho. Se estiver assinado apenas pelo representante legal da empresa, vale, tão-somente, como se fosse os antigos formulários, obrigando a parte-autora a providenciar a juntada aos autos do respectivo laudo no caso deste ser indispensável ao reconhecimento do caráter especial da atividade (por exemplo, nos casos em que a especialidade é postulada com base na exposição ao agente ruído, ou para o período posterior a 06/03/1997, quando a apresentação do laudo passou a ser obrigatória para todos os agentes nocivos).
Assim, no período anterior a 1º.1.2004, se o perfil profissiográfico previdenciário contiver somente a assinatura do representante legal da empresa, o segurado deverá apresentar o laudo técnico que embasou o seu preenchimento, porquanto se presume que este signatário não detém condições técnicas para atestar a existência da insalubridade.
Pois bem.
Feitas tais considerações, passo à analise da especialidade das atividades desempenhadas nos períodos requeridos:
a) 02/03/1995 a 28/04/1995, 29/04/1995 a 17/11/1995 - Instituto Geral de Assistência Social Evangélica – IGASE
Na CTPS, consta que a parte autora trabalhou como "chefe de unidade de enfermagem" CBO 07190 (evento 14 - PROCADM2 - pg. 8):
Nada obstante a ausência de formulário PPP contendo descrição das atividades desempenhadas à época, a classificação brasileira de ocupações contida na CTPS demonstra que o trabalho efetivamente desenvolvido à época era como "enfermeira".
Os fatores de risco biológicos no ambiente de trabalho são previstos como fatores de risco causadores de insalubridade no Anexo do Decreto 53.831/64, conforme abaixo transcrito:
1.3.2 | GERMES INFECCIOSOS OU PARASITÁRIOS HUMANOS - ANIMAIS
Serviços de Assistência Médica, Odontológica e Hospitalar em que haja contato obrigatório com organismos doentes ou com materiais infecto-contagiantes. | Trabalhos permanentes expostos ao contato com doentes ou materiais infecto-contagiantes - assistência-médico, odontológica, hospitalar e outras atividades afins. | Insalubre | 25 anos | Jornada normal ou especial fixada em Lei. Lei nº 3.999, de 15-12-61. Art. 187 CLT. Portaria Ministerial 262, de 6-8-62. |
Destaco que o Decreto 3.048/99 manteve a previsão da condição especial de trabalho para os profissionais que se expunham aos agentes biológicos em seu Anexo II, item XXV.
Como se constata, o simples contato com organismos doentes ou com materiais infectocontagiantes basta para provar a exposição aos germes infecciosos ou parasitários, humanos ou animais, não havendo necessidade da especificação ímpar, ou seja, da indicação precisa dos fungos, bactérias, vírus e outros microorganismos vivos.
Importante estabelecer que, conquanto as atividades de atendente de enfermagem, chefe de enfermagem e de auxiliar de enfermagem não estejam previstas expressamente no código 2.1.3 do Quadro anexo ao Decreto nº 53.831/64 e no código 2.1.3 do Quadro do Anexo I do Decreto 83.080/79, em cujas redações há referência apenas aos enfermeiros, não há qualquer óbice ao reconhecimento de suas naturezas especiais, pois aqueles, tal qual estes, praticam verdadeiras atividades de enfermagem que os colocam em contato com todo os tipos de riscos biológicos e químicos, o que lhes garantiu a presunção legal da natureza especial.
Com efeito, todos os profissionais que manipulam pacientes agressivos, materiais cirúrgicos, substâncias químicas para limpeza e desinfecção de materiais clínicos, materiais contaminados, fazem higiene pessoal dos pacientes, curativos, aplicação de medicamentos, aspiração de secreções etc, estão expostos a agentes biológicos e químicos.
Neste sentido, mutatis mutandis, cito a jurisprudência do e. TRF da 4ª região, in verbis:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM. ATIVIDADES DE ENFERMAGEM. EXPOSIÇÃO AOS AGENTES NOCIVOS À SAÚDE. CARACTERIZAÇÃO DA ATIVIDADE ESPECIAL.
1. O trabalho desenvolvido em atividade de atendente de enfermagem, exposto a agentes nocivos de natureza biológica, deve ser considerado como especial.
2. Possibilidade de conversão do tempo de serviço da atividade especial para comum, sendo desnecessário laudo pericial por se tratar de atividades de enfermagem, mormente quando existe laudo emitido pela empresa.
3. Agravo de instrumento provido.
(AI nº 2001.04.01.056660-4. Sexta Turma. Relator Desembargador Federal Nylson Paim de Abreu. DJU de 03/09/2003) - destaques acrescentados.
Vale transcrever trecho do voto proferido pelo e. Desembargador Federal Tadaaqui Hirose na Apelação Cível nº 1999.71.00.011241-0, in verbis:
"Deve-se ter em conta que, em que pese apenas a atividade de enfermeiro esteja enquadrada nos Decretos 53.831/64 e 83.080/79, não se pode olvidar que é inerente à função de atendente de enfermagem, a exposição, de forma habitual e permanente, aos mesmos agentes nocivos a que estão expostos os enfermeiros. Assim, não se mostra razoável que, exercendo a função de enfermeiro antes da Lei 9.032/95, presuma-se que a atividade seja insalubre, com base em formulário fornecido pela empresa e, quanto à atividade de atendente de enfermagem, haja entendimento diverso, porquanto os riscos de doenças infectocontagiosas, por contato com agentes biológicos, são os mesmos. Dessa forma, ao não enquadrar a atividade da autora como sendo de natureza especial, estaria a Justiça fechando seus olhos à realidade laboral e social." - destaques acrescentados.
Acerca do uso de EPI, como é notório, os profissionais de saúde são submetidos a diversos tipos de agentes, de modo que a mera utilização dos instrumentos ordinários de prevenção não elimina o risco totalmente. Basta um mero acidente ou lapso no manuseio dos materiais - o que infelizmente é trivial - para a efetiva exposição direta aos agentes biológicos.
Prosseguindo, averbo não ser necessário que a exposição a agentes biológicos ocorra durante a integralidade da jornada de trabalho do segurado, bastando que haja efetivo e constante risco de contaminação e de prejuízo à saúde do trabalhador, satisfazendo, assim, os conceitos de habitualidade e permanência, analisados à luz das particularidades do labor desempenhado.
O fato de o trabalhador realizar algumas tarefas que não o exponham ao contato direto com agentes biológicos durante a sua jornada de trabalho não elide o reconhecimento da especialidade do labor, pois em casos como este, a especialidade do trabalho não existe em virtude do desgaste que o agente nocivo provocaria à integridade do profissional, mas, sim, em virtude do risco dessa exposição.
O que deve ser verificado na hipótese é a permanência do risco e não da exposição em si, mesmo porque o fundamento da aposentadoria especial e do reconhecimento da especialidade do labor é a possibilidade de prejuízo à saúde do trabalhador e não o prejuízo em si.
Significa dizer que ainda que a efetiva exposição a agentes biológicos, proveniente do contato direto com pacientes potencialmente infectados e/ou utensílios por eles utilizados, pudesse não ocorrer durante todas as horas da jornada de trabalho, o risco de contágio inerente às atividades desempenhadas - para o qual basta um único contato com o agente infeccioso - e, consequentemente, o risco permanente de prejuízo à saúde do trabalhador, por certo caracterizam a especialidade do labor, integralmente despendido em ambiente hospitalar.
Nesse sentido, o posicionamento exarado recentemente pela Turma Regional de Uniformização da 4ª Região em caso semelhante:
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS. PERÍODO LABORADO COMO ESCRITURÁRIO. NÃO CONHECIMENTO. INTERREGNO LABORADO EM CONTATO COM AGENTE NOCIVO. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. EFETIVO E CONSTANTE RISCO DE CONTAMINAÇÃO. 1. "Para o enquadramento do tempo de serviço como especial após o início da vigência da Lei nº 9032/95, não é necessário que a exposição a agentes biológicos ocorra durante a integralidade da jornada de trabalho do segurado, bastando, nesse caso, que haja efetivo e constante risco de contaminação e de prejuízo à saúde do trabalhador, satisfazendo, assim, os conceitos de habitualidade e permanência, analisados à luz das particularidades do labor desempenhado" (IUJEF 0004501-62.2010.404.7254, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator p/ Acórdão Ana Cristina Monteiro de Andrade Silva, D.E. 15/03/2012). 2. Rejeita-se a pretensão de reexame de prova, nos termos da Súmula 42 da TNU. Pedido de uniformização parcialmente conhecido e provido. (5008900-55.2012.404.7003, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator p/ Acórdão Daniel Machado da Rocha, D.E. 28/01/2014)
No caso em tela, a especialidade ora verificada dá-se em razão do risco biológico, o qual decorre diretamente da natureza da atividade de "enfermagem".
Desta forma, na esteira da fundamentação acima, reputo caracterizada a especialidade do labor da autora, em decorrência do contato com agentes biológicos, nos períodos de 02/03/1995 a 28/04/1995, 29/04/1995 a 17/11/1995.
b) 13/11/1995 a 28/12/1999 - Associação Evangélica Beneficente de Londrina
O PPP emitido pela empresa informa o seguinte (evento 14 - PROCADM14 - pg. 60):
Valendo-me dos fundamentos expostos no item "a", reconheço, pois, a especialidade do labor no período de 13/11/1995 a 28/12/1999, em razão da comprovada sujeição a agentes biológicos por todo o período.
4. Da CTC
É questão pacífica no STF que o segurado faz jus à emissão de certidão de tempo de serviço na qual já reste consignado o reconhecimento de atividade executada em condição especial, senão vejamos:
(...)
Logo, em razão do princípio da isonomia, tanto o segurado do RGPS quanto o segurado estatutário (regime próprio) são detentores do direito à emissão da CTC com os lapso de trabalho especiais convertidos em tempo de serviço comum pelos fatores de conversão cabíveis.
O pedido deve ser acolhido.
No caso, os períodos controversos de atividade laboral exercidos em condições especiais estão assim detalhados:
Período: 02/03/1995 a 28/04/1995
Empresa: Instituto Geral de Assistência Social Evangélica – IGASE
Função: Chefe de Unidade de Enfermagem
Enquadramento legal por categoria profissional até 28/04/1995: Código 2.1.3 do Quadro Anexo ao Decreto nº 53.831/64 e no Código 2.1.3 do Quadro do Anexo II do Decreto 83.080/79.
Provas: CTPS
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período de 02/03/1995 a 28/04/1995, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude do enquadramento por categoria profissional (Enfermeiros).
Período: 29/04/1995 a 17/11/1995
Empresa: Instituto Geral de Assistência Social Evangélica – IGASE
Função: Chefe de Unidade de Enfermagem
Agentes nocivos: Agentes biológicos (microorganismos patogênicos)
Enquadramento legal: Códigos 1.3.2 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 (germes infecciosos ou parasitários humanos-animais), 1.3.4 do Anexo I do Decreto n. 83.080/79 (trabalhos permanentes com doentes ou materiais infecto-contagiantes); e código 3.0.1 do Decreto n. 2.172/97 e do Anexo IV do Decreto n. 3.048/99 (Micro-organismos e parasitas infecciosos vivos e suas toxinas - (a) trabalhos em estabelecimentos de saúde em contato com pacientes portadores de doenças infecto-contagiosas ou com manuseio de materiais contaminados).
Provas: DSS - 8030 (evento 4)
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição, de forma habitual e permanente, ao agente nocivo acima referido.
Período: 13/11/1995 a 28/12/1999
Empresa: Associação Evangélica Beneficente de Londrina
Função: Enfermeira, no Centro Cirúrgico
Agentes nocivos: Agentes biológicos (microorganismos patogênicos)
Enquadramento legal: Códigos 1.3.2 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 (germes infecciosos ou parasitários humanos-animais), 1.3.4 do Anexo I do Decreto n. 83.080/79 (trabalhos permanentes com doentes ou materiais infecto-contagiantes); e código 3.0.1 do Decreto n. 2.172/97 e do Anexo IV do Decreto n. 3.048/99 (Micro-organismos e parasitas infecciosos vivos e suas toxinas - (a) trabalhos em estabelecimentos de saúde em contato com pacientes portadores de doenças infecto-contagiosas ou com manuseio de materiais contaminados).
Provas: PPP
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição, de forma habitual e permanente, ao agente nocivo acima referido.
No que pertine à habitualidade e permanência da exposição aos agentes biológicos, ressalve-se que o conceito de permanência é diverso daquele utilizado para a exposição a outros agentes nocivos. Isto porque o que se protege não é o tempo de exposição (causador do eventual dano), mas sim, o risco de exposição a tais agentes.
Quanto ao tema, está pacificado nesta Corte que "a exposição de forma intermitente aos agentes biológicos não descaracteriza o risco de contágio, uma vez que o perigo existe tanto para aquele que está exposto de forma contínua como para aquele que, durante a jornada, ainda que não de forma permanente, tem contato com tais agentes (TRF4, APELREEX 5002443-07.2012.404.7100, Sexta Turma, Relator para Acórdão João Batista Pinto Silveira, julgado em 24/07/2013).
Ademais, cabe referir que, para a caracterização da especialidade, não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada. Caso se admitisse o contrário, chegar-se-ia ao extremo de entender que nenhum ofício faria jus àquela adjetivação, e, como é curial, o intérprete deve afastar a interpretação que o leve ao absurdo. Habitualidade e permanência hábeis para os fins visados pela norma - que é protetiva - devem ser analisadas à luz do serviço cometido ao trabalhador, cujo desempenho, não descontínuo ou eventual, exponha sua saúde à prejudicialidade das condições físicas, químicas, biológicas ou associadas que degradam o meio ambiente do trabalho.
Neste sentido, a Terceira Seção deste Tribunal já harmonizou seu entendimento:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. TEMPO ESPECIAL. ATIVIDADE INSALUBRE. HABITUALIDADE E CONTINUIDADE. CARACTERIZAÇÃO. A habitualidade e a continuidade a caracterizar o trabalho especial não pressupõe a permanência da insalubridade em toda a jornada de trabalho do segurado. Na verdade, o entendimento extraído da norma legal é a exposição diuturna de parcela da jornada de trabalho, desde que referida exposição seja diária. (EINF 5024390-63.2011.4.04.7000, Rel. Des. Federal Rogerio Favreto, julgado em 16/04/2015)
Conclusão: deve ser mantida a sentença, com o reconhecimento da especialidade nos períodos pleiteados, bem como o direito à emissão da respectiva certidão de tempo de contribuição.
Desta feita, a manutenção da sentença é medida que se impõe.
Ante o exposto, voto por negar provimento à remessa necessária.
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Remessa Necessária Cível Nº 5015070-68.2020.4.04.7001/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PARTE AUTORA: PATRICIA HELENA VIVAN RIBEIRO (IMPETRANTE)
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
EMENTA
previdenciário. mandado de segurança. enfermeira. certidão de tempo de contribuição com reconhecimento do labor especial. direito configurado. sentença de procedência mantida. remessa necessária desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à remessa necessária, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 10 de agosto de 2021.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 03/08/2021 A 10/08/2021
Remessa Necessária Cível Nº 5015070-68.2020.4.04.7001/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PRESIDENTE: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM
PARTE AUTORA: PATRICIA HELENA VIVAN RIBEIRO (IMPETRANTE)
ADVOGADO: CLAUDINEY ERNANI GIANNINI (OAB PR045167)
ADVOGADO: EDSON CHAVES FILHO (OAB PR051335)
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/08/2021, às 00:00, a 10/08/2021, às 16:00, na sequência 1080, disponibilizada no DE de 23/07/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À REMESSA NECESSÁRIA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
SUZANA ROESSING
Secretária
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