Apelação Cível Nº 5000040-95.2022.4.04.7203/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: SOLANGE REGINA VIGANO (IMPETRANTE)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença em que o magistrado a quo deixou de analisar o pedido de liminar e JULGOU EXTINTO o feito sem resolução de mérito, com fundamento no art. 485, V e VI, do Código de Processo Civil. Deferido o pedido de assistência judiciária gratuita. Sem custas. Sem honorários, ex vi Súmulas 512/STF e 105/STJ e artigo 25 da Lei 12.016/09. Justiça gratuita deferida no evento 4.
Em suas razões, a impetrante sustenta que não há prevenção a ser reconhecida, eis que, no caso dos autos, embora ambas as demandas façam referência ao reconhecimento do tempo de serviço rural, a causa de pedir e os fundamentos do pedido são diversos em cada um dos processos. Esclarece que a decisão proferida nos autos 5003067-57.2020.4.04.7203 se refere ao pedido de aposentadoria por tempo de contribuição formulado no E/NB 42/196.289.198-1, requerido em 27/05/19 (DER), não havendo no referido processo qualquer pedido relacionado ao E/NB 41/198.030.291-7, com DER 18/11/20 e que é objeto do presente mandado de segurança. Destaca que foi no benefício com DER em 18/11/2020 que o INSS reconheceu o tempo de serviço rural e emitiu a GPS para indenização do intervalo de 11/91 a 09/95, paga pela impetrante, e posteriormente deixou de computar esse período ao fundamento de que não pode ser utilizado para fins de aplicação das regras de transição da EC n. 103/19. Diante disso, pugna pela reforma da sentença e a concessão da segurança para determinar que a autoridade impetrada promova a reabertura do processo administrativo e compute o tempo de serviço rural indenizado pela impetrante no intervalo de 11/91 a 09/95 para fins de análise e concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição com direito adquirido até 12/11/2019, ou seja, pelas regras vigentes antes da reforma promovida pela EC n. 103/19, com a consequente concessão do benefício a partir da DER (18.11.2020).
Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
Nesta instância, o MPF deixou de se manifestar quanto ao mérito da causa.
É o relatório.
VOTO
Trata-se de mandado de segurança em que a parte impetrante busca a reabertura do procedimento administrativo de concessão da aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/198.030.291-7, a qual foi indeferida administrativamente, visando ao cômputo do tempo de atividade rural indenizado de 11/91 a 09/95, como tempo de contribuição para fins de direito adquirido antes da EC 103/19 e, pagamento dos valores em atraso desde a DER em 18/11/20, com a consequente prolação de nova decisão.
Intimada a parte autora para que esclarecesse sobre possível prevenção em relação ao processo 5003067-57.2020.4.04.7203, no qual foi proferida sentença reconhecendo sua condição de segurada especial no intervalo de 01/11/1991 a 15/03/1998, a impetrante manifestou-se no sentido de que se trata de pedidos distintos e novo requerimento administrativo (evento 7, PET1).
Sobreveio sentença julgando extinto o feito, sem resolução de mérito, com fundamento nos incisos V e VI do art. 485 do CPC/2015, antes mesmo de angularizada a relação processual, nos seguintes termos (evento 11, SENT1):
II - FUNDAMENTAÇÃO
No caso em tela o impetrante visa a reabertura do processo administrativo n. 42/198.030.291-7, para que lá seja devidamente computado período rural indenizado, relativo a 11/91 a 09/95.
O problema é que o impetrante possui uma anterior ação, autos n. 5003067-57.2020.4.04.7203, na qual já foi proferida sentença reconhecendo sua condição de segurado especial no intervalo de 01/11/1991 a 15/03/1998, e facultando-lhe o direito de recolher o valor da indenização das respectivas contribuições previdenciárias, para fim de possibilitar o cômputo administrativo do referido intervalo como tempo de serviço para fim de concessão/revisão de aposentadoria por tempo de contribuição, sendo que naquele feito o INSS renunciou ao prazo de recurso.
Ou seja, já existe pronunciamento judicial sobre o tema/pedido veiculado no presente mandamus, reconhecendo o direito do segurado de indenizar o período rural e tê-lo como efetivamente computado para fins de concessão de benefício, e mais ainda, nesse ponto em específico (direito de indenizar e computar o período rural) a sentença proferida nos autos 5003067-57.2020.4.04.7203 sequer pode ser alterada porquanto o INSS não quis recorrer, de tal sorte que, se a Autarquia não quer computar o referido período indenizado, caberia à impetrante informar essa situação nos autos da referida ação, como autêntico descumprimento da ordem judicial lá emanada.
Sendo assim, considero que a situação do presente caso conduz e torna imperiosa a extinção do processo sem julgamento de mérito.
III - DISPOSITIVO
Ante o exposto, deixo de analisar o pedido de liminar e JULGO EXTINTO o feito sem resolução de mérito, com fundamento no art. 485, V e VI, do Código de Processo Civil.
Como se vê, o julgador monocrático extinguiu o feito sem resolução de mérito, por ausência de interesse processual, por entender que a decisão prolatada nos autos do processo n. 5003067-57.2020.4.04.7203 produziu coisa julgada material em relação ao pedido veiculado na presente demanda, de modo que caberia à impetrante informar o descumprimento da obrigação de fazer nos autos daquela ação.
Na espécie, contudo, cotejando os processos ajuizados pelo autor, observo que, embora coincida, em parte, o pedido de cômputo do período de 01-11-1991 a 09-1995 para fins de concessão de aposentadoria, as respectivas causas de pedir não são as mesmas.
Compulsando os autos da ação anterior, ajuizada em 22-09-2020 e que tramitou perante o Juízo Federal da 1ª Vara Federal de Joaçaba, verifico que o pedido, referente ao benefício de aposentadoria NB 42/196.289.198-1, com DER em 27-05-2019, cingia-se ao reconhecimento do tempo de serviço rural exercido no período de 25-10-1980 a 15-03-1998, para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER, bem como à possibilidade de indenização do período rural faltante, após 31-10-1991, mediante a emissão da respectiva GPS. Veja-se o teor da petição inicial naqueles autos:
06. REQUERIMENTO
Ante o exposto, requer a Autora se digne Vossa Excelência a RECEBER a presente, determinando as diligências compatíveis, em especial:
(...)
6.3 Ao final, requer seja julgado PROCEDENTE O PEDIDO para:
6.3.1 Reconhecer o tempo de serviço rural exercido pela parte autora no período de 25/10/80 a 15/03/98, para seja acrescido àquele já reconhecido na esfera administrativa para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a DER em 27/05/19, e com a condenação do INSS no pagamento das prestações vencidas, inclusive as gratificações natalinas, desde aquela data, e as vincendas, relativas ao benefício que lhe for deferido, corrigidas monetariamente pelo INPC, desde o vencimento de cada parcela até a data de sua efetiva liquidação, e com juros moratórios calculados de forma mensal, tudo incidente sobre o valor corrigido das prestações a pagar, inclusive vencidas, contados a partir da citação, até o mês do efetivo pagamento. (Grifou-se)
6.3.2 Deferir a possibilidade da Autora indenizar o período de roça faltante para o implemento do requisito tempo de serviço após 31/10/91 – art. 55, §2º da LBPS e, determinar que o INSS junte aos autos referida GUIA; (Grifou-se)
6.3.3 Determinar que o INSS inclua no cálculo da Renda Mensal Inicial – RMI, o valor recebido a título de Auxílio-Acidente sob nº 94/162.467.100-1, com DER em 01/09/93;
6.3.4 Acaso não implementado o TC na DER, manifesta-se a Autora expressamente pela reafirmação da DER e computo do tempo de contribuição posterior a 27/05/19 necessário para implementação dos requisitos, com a fixação da DER na data do implemento dos requisitos legais, e com a condenação do INSS no pagamento das prestações vencidas e vincendas, inclusive as gratificações natalinas, corrigidas monetariamente pelo INPC e com juros moratórios até o mês do efetivo pagamento.;
6.4 Em qualquer caso requer seja determinado ao INSS que conceda a Autora o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER em 27/05/19 ou da DER reafirmada, e para que proceda aos necessários registros de concessão e manutenção do benefício que a decisão lhe assegurar. (Grifou-se)
(...)
A sentença respectiva, proferida e publicada em 09-12-2021, julgou procedente em parte o pedido inicial, resolvendo o mérito na forma do art. 487, I, do CPC, apenas para a) reconhecer a qualidade de segurada especial do autor entre 25/12/1984 a 31/10/1991, para todos os fins previdenciários, exceto carência; e b) reconhecer a condição de segurado especial do autor no intervalo de 01/11/1991 a 15/03/1998, facultando que recolha o valor da indenização das respectivas contribuições previdenciárias (sem incidência de juros e multa em relação aos períodos anteriores à MP 1.523/96), a ser calculado pelo INSS, para fim de possibilitar o cômputo administrativo do referido intervalo como tempo de serviço para fim de concessão/revisão de aposentadoria por tempo de contribuição (evento 23, SENT1) (grifou-se e sublinhou-se).
De outro lado, o objeto deste writ refere-se ao benefício de aposentadoria NB 42/198.030.291-7, com DER em 18-11-2020, e consiste no pedido de cômputo do período de atividade rural de 11/91 a 09/95, já indenizado, como tempo de contribuição, com vistas à concessão da aposentadoria pelas regras anteriores à reforma promovida pela EC 103/2019, ao fundamento de que o direito líquido e certo está sendo violado por ato ilegal do INSS que deixou de computá-lo alegando impossibilidade para fins de direito às regras de transição previstas na referida Emenda Constitucional, contrariando o disposto no art. 17 da EC 103/19, art. 45-A e 27 da LBPS e 167 da IN 77/15 (evento 1, INIC1):
Com efeito, assim constou daquela decisão administrativa, proferida em 10-01-2022 (evento 1, PROCADM7, página 96):
Como se vê, embora parcialmente coincidentes os pedidos, exclusivamente no que se refere ao cômputo do período rural para fins de concessão de aposentadoria, trata-se de requerimentos distintos, e que possuem causas de pedir diversas, recaindo, nestes autos, controvérsia relativa à possibilidade de cômputo do período para fins de direito adquirido, com base nas regras anteriores à EC 103/19, ou às regras de transição estabelecidas pela referida Emenda, em face de entendimento atual do INSS - questão de mérito que não foi objeto de exame na ação anterior -, o que afasta a coisa julgada material e a prevenção em relação àquele juízo.
Tanto é assim que, naqueles autos n. 5003067-57.2020.4.04.7203, após a prolação da sentença (ev. 23), a parte autora peticionou informando a negativa do INSS em computar o tempo rural, naquela altura já indenizado, no bojo do requerimento administrativo NB 42/198.030.291-7, sustentando autêntico descumprimento da ordem judicial emanada da sentença proferida nestes autos, e o pronunciamento judicial foi no sentido de que trata-se de situação vislumbrada em processo administrativo totalmente alheio ao presente feito (42/198.030.291-7), não havendo o que se falar em descumprimento de ordem judicial proferida nesses autos que, inclusive, sequer teve a certificação do trânsito em julgado. Assim, eventual descontentamento da parte autora relativo a situação advinda de fatos diversos daqueles narrados na inicial, deverá ser discutido em processo próprio, com a partipação da ré em todas as fases e o respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Em vista disso, indefiro o pedido do evento 31 (evento 35, DESPADEC1 - grifou-se).
Destarte, não se verifica a identidade de pedidos e causas de pedir que caracterizem a prevenção em relação ao processo 5003067-57.2020.4.04.7203, restando caracterizado o interesse processual da imperante no ajuizamento do presente writ.
Todavia, tendo havido a extinção do feito imediatamente após a impetração do mandamus, sem a angularização da relação processual, torna-se inviável a esta Corte examinar desde logo o mérito do pedido.
Dentro desse contexto, impõe-se a anulação da sentença para que seja devidamente processado o presente mandado de segurança, com a prolação de nova sentença após a angularização da relação processual e o regular trâmite deste mandamus.
Merece parcial provimento, pois, a apelação da parte autora.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003175501v16 e do código CRC a49ff8a6.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5000040-95.2022.4.04.7203/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: SOLANGE REGINA VIGANO (IMPETRANTE)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. JUÍZO PREVENTO. DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER. NÃO CARACTERIZAÇÃO. PEDIDO E CAUSAS DE PEDIR DIVERSOS. INTERESSE DE AGIR. CARACTERIZAÇÃO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO INDEVIDA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. RETORNO DOS AUTOS PARA PROSSEGUIMENTO.
1. Caso em que o julgador monocrático extinguiu o feito sem resolução de mérito, por falta de interesse processual, por entender que a decisão prolatada nos autos do processo n. 5003067-57.2020.4.04.7203 produziu coisa julgada material em relação ao pedido veiculado na presente demanda, de modo que caberia à impetrante informar o descumprimento da obrigação de fazer nos autos da referida ação.
2. Todavia, cotejando os processos ajuizados pelo autor, observo que, embora coincida, em parte, o pedido de cômputo de período rural para fins de concessão de aposentadoria, as respectivas causas de pedir não são as mesmas, cingindo-se a controvérsia, na presente demanda, a questão de mérito que não foi objeto de exame na ação anterior, o que afasta a coisa julgada material e a prevenção em relação àquele juízo.
3. Caracterizado o interesse de agir da impetrante no ajuizamento do presente writ.
4. Todavia, tendo havido a extinção do feito imediatamente após a impetração do mandamus, sem a angularização da relação processual, torna-se inviável a esta Corte examinar desde logo o mérito do pedido.
5. Dentro desse contexto, impõe-se a anulação da sentença para que seja devidamente processado o presente mandado de segurança, com a prolação de nova sentença após a angularização da relação processual e o regular trâmite deste mandamus.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de maio de 2022.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003175502v5 e do código CRC d5738579.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/05/2022 A 17/05/2022
Apelação Cível Nº 5000040-95.2022.4.04.7203/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: SOLANGE REGINA VIGANO (IMPETRANTE)
ADVOGADO: MARCOS COSSUL (OAB SC014476)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/05/2022, às 00:00, a 17/05/2022, às 16:00, na sequência 612, disponibilizada no DE de 29/04/2022.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
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