Apelação Cível Nº 5007075-54.2018.4.04.7104/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: CARLOS ROCHA FERREIRA (IMPETRANTE)
APELADO: Chefe da Agência - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - Passo Fundo (IMPETRADO)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
RELATÓRIO
Trata-se de mandado de segurança, com pedido liminar, impetrado visando ao restabelecimento do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição e cessação de qualquer ato que vise à cobrança de valores alegadamente recebidos de forma indevida.
O Impetrante alegou que, indeferida a aposentadoria requerida em 28/07/2008, ajuizou ação que tomou o nº 2009.71.54.003875-8, na qual foi reconhecido tempo de contribuição e concedida a apsoentadoria, mas em 24/02/2017 o INSS determinou a cessação do benefício e a cobrança dos valores pagos ao argumento de "forte indício de fraude".
Argumentou que o ato administrativo é abusivo porque ignorou decisão judicial transitada em julgado, e há abuso de poder quando o INSS coloca o benefício sob suspeita sem prova irrefutável sobre a invalidade dos vínculos ou indicação dos motivos que desqualifiquem as anotações na CTPS apoiadas em registros do CNIS.
O juízo a quo denegou a segurança. Condenou o impetrante ao pagamento das custas processuais, mas suspendeu a exigibiliadde em face da concessão da justgiça gratuita, e deixou de condená-lo em honorários advocatícios (art. 25 da Lei 12.016/09 e Súmulas n° 512 do STF e n° 105 do STJ).
O Impetrante apelou sustentando o abuso de poder na cassação do benefício e cobrança de valores pagos, pois não foram apresentados quais seriam os fortes indícios de fraude na concessão, cerceando o direito de defesa. Ademais, ainda que fosse reconhecida eventual irregularidade nos períodos questionados, somaria tempo suficiente à concessão da aposentadoria por idade.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
O representante do MPF ofertou parecer pela manutenção da sentença.
É o relatório.
VOTO
A r. sentença proferida pelo MM. Juiz Federal Fabiano Henrique de Oliveira, bem analisou as questões controvertidas, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos, os quais adoto como razões de decidir, in verbis:
A questão posta foi suficientemente abordada e resolvida quando da apreciação do pedido liminar, razão pela qual me reporto àqueles fundamentos para dar solução definitiva a este caso concreto (E11):
1. Do pedido liminar
Na petição inicial, a parte impetrante postula (INIC1, E1):
[...]
4.2. tutela de urgência para que o INSS restabeleça o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição de n° 145.316.313-9, omitindo-se praticar quaisquer atos de restrição do crédito e/ou cobrança dos valores supostamente devidos, nos termos do item 3 deste petitório;
Referiu que requereu em 28/07/2008 o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição NB nº 145.316.313-9, o qual foi indeferido na esfera administrativa, razão pela qual ingressou com a ação judicial nº 2009.71.54.003875-8 no Juizado Especial Federal desta Subseção Judiciária, na qual foi prolatada decisão reconhecendo e computando o tempo de contribuição, concedendo-lhe o respectivo benefício de aposentadoria. Disse que, em 24/02/2017, o INSS emitiu o Ofício 0142/2017, indicando forte indício de fraude, o que determinou na cassação do benefício e cobrança dos valores mediante ofício 0362/2018, datado de 12/09/2018. Aduziu que tal ato é ilegal e abusivo, pois ignora decisão judicial transitada em julgado. Argumentou que há abuso de poder quando o INSS coloca o benefício sob suspeita sem indicar os motivos reais para tanto. Sustentou que, mesmo desconsiderados os períodos sob 'indício forte de fraude', o segurado implementaria os requisitos necessários para o gozo do benefício de aposentadoria por idade em 04/11/2016.
Analiso e decido.
A concessão de liminar em mandado de segurança requer a coexistência de dois pressupostos, consubstanciados no artigo 7º, III, da Lei 12.016/2009, quais sejam: [i] a relevância do fundamento alegado pelo impetrante, que deve comprovar a violação do seu direito líquido e certo, ou a sua iminente ocorrência – fumus boni juris; [ii] a possibilidade de ineficácia da medida se concedida apenas ao final – periculum in mora -, em segurança definitiva.
Examino, sob este enfoque, a presença concreta de tais requisitos no que se refere aos requerimentos feitos pela parte impetrante nos autos.
Ocorre que, com base apenas nos documentos trazidos aos autos, não vislumbro, pelo menos em um juízo precário de cognição sumária, configurada hipótese que autorize a antecipação liminar da tutela pretendida, uma vez que ausente a relevância do fundamento da alegação de violação de direito líquido e certo.
Segundo consta, na data de 01/08/2008, o autor requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, o qual foi indeferido.
Em razão do indeferimento administrativo do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, o autor ajuizou o processo nº 2009.71.54.003875-8, no qual foi reconhecido o benefício de aposentadoria por tempo de serviço da regra de transição, devido desde 28/07/2008, data do requerimento administrativo, com RMI de 75% (setenta e cinco por cento) do salário de benefício, calculada de acordo com a sistemática da Lei nº 9.876/99, ou seja, com aplicação do fator previdenciário (PROCJUDIC2, E9).
Posteriormente, o INSS identificou indícios de irregularidade no benefício concedido NB nº 42/145.316.313-9 por forte indício de fraude em vínculos empregatícios considerados na concessão do benefício, tais como ALFA SERVIÇOS EMPRESARIAIS LTDA, SAS SERVIÇOS EMPRESARIAIS LTDA, INDUSTRIA E COMÉRCIO DE ARTESANATOS TUDO ARTE LTDA e ASTRODENT MEDICAL (E1, OUT3 - Ofício 0071, de 24/02/2017).
O autor apresentou defesa no âmbito administrativo, a qual foi julgada insuficiente em 05/04/2017 (Ofício nº 142/2017 - OUT3, E1).
O autor foi intimado da suspensão e dos cálculos, apresentando recurso (OUT3, E1), ao qual foi negado provimento (PROCJUDIC3, E9), razão pela qual foi realizada a cobrança administrativa do débito.
Analisando o processo administrativo, verifica-se que, a princípio, seguiu-se o devido processo legal, no qual possibilitou-se ao autor o contraditório e a ampla defesa.
O ato que ensejou na cessação do benefício e cobrança dos respectivos cálculos está aparentemente devidamente fundamentado.
O processo administrativo deu-se início por indícios de irregularidades na concessão do benefício, tendo em vista fortes indícios de fraude referente a vários vínculos empregatícios, os quais, inclusive, foram investigados por parte da Polícia Federal, em relação às empresas ALFA SERVIÇOS EMPRESARIAIS LTDA, SAS SERVIÇOS EMPRESARIAIS LTDA, INDUSTRIA E COMÉRCIO DE ARTESANATOS TUDO ARTE LTDA e ASTRODENT MEDICAL.
Verificou-se fortes indícios de fraude documental que levaram a crer que não houve exercício de atividade nas referidas empresas e em alguns casos nem mesmo as empresas existiram.
O autor foi devidamente intimado no âmbito administrativo para comprovar a veracidade dos vínculos supostamente fraudulentos, o que, a princípio, não foi realizado.
Assim, não havendo prova da regularidade dos vínculos considerados fraudulentos, os quais, sendo desconsiderados, não permitem a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, não vislumbro justificativa para o deferimento da liminar pretendida - restabelecimento do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/145.316.313-9, bem como da abstenção de qualquer ato de cobrança do débito.
Ademais, quanto a impossibilidade de cobrança do débito, é necessário verificar se o autor estava de boa ou má-fé quando do recebimento do benefício, situação que depende de dilação probatória, a qual é incabível no rito no mandado de segurança.
No que tange à ofensa à coisa julgada, frise-se que o INSS tem o direito e dever de realizar a revisão e manutenção dos benefícios concedidos pela Previdência Social, nos termos do artigo 179 do Decreto nº 3.048/99:
Art. 179. O Ministério da Previdência e Assistência Social e o Instituto Nacional do Seguro Social manterão programa permanente de revisão da concessão e da manutenção dos benefícios da previdência social, a fim de apurar irregularidades e falhas existentes.
§ 1o Havendo indício de irregularidade na concessão ou na manutenção do benefício ou, ainda, ocorrendo a hipótese prevista no § 4º, a previdência social notificará o beneficiário para apresentar defesa, provas ou documentos de que dispuser, no prazo de dez dias. (Redação dada pelo Decreto nº 5.699, de 2006)
§ 2º A notificação a que se refere o § 1º far-se-á por via postal com aviso de recebimento e, não comparecendo o beneficiário nem apresentando defesa, será suspenso o benefício, com notificação ao beneficiário. (Redação dada pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
Além disso, tem o dever de computar no CNIS os períodos reconhecidos em razão de decisão transitada em julgado, salvo indício de fraude ou má-fé. Eis o teor do artigo 162 da Instrução Normativa 77/2015:
Art. 162. Considera-se tempo de contribuição o tempo, contado de data a data, desde o início até a data do desligamento de atividade abrangida pela Previdência Social ou até a data de requerimento de benefício, descontados os períodos legalmente estabelecidos, tais como:
[...]
§ 2º O tempo de contribuição, inclusive o decorrente de conversão de atividade especial em comum, reconhecido em razão de decisão judicial transitada em julgado em que o INSS for parte, ou de decisão definitiva do Conselho de Recursos da Previdência Social - CRPS, será incluído no CNIS, devendo ser aceito independentemente de apresentação de novos documentos, salvo indício de fraude ou má-fé. (Incluído pela IN INSS/PRES nº 85, de 18/02/2016)
Assim, ainda que tenha havido reconhecimento por decisão transitada em julgado, havendo indício de fraude em vínculos empregatícios que ensejaram a concessão do benefício, o INSS tem o dever de revisar o benefício a fim de apurar irregularidades e falhas existentes.
Do exposto, INDEFIRO o pedido de liminar.
Ora, não houve inovação significativa nos autos após tal decisão, que pudesse concretamente modificar aquelas razões.
Logo, mantidas as condições e os contornos essenciais do caso, é de ser confirmada a decisão que indeferiu a liminar, denegando-se a segurança pleiteada.
Com efeito, o trâmite do procedimento administrativo foi regular, observando os princípios do contraditório e ampla defesa.
Como se verifica de cópia do processo administrativo, o autor foi comunicado da identificação de indícios de irregularidade na concessão do benefício por indício de fraude em vínculos empregatícios, que, conforme cópia da CTPS e de registro do CNIS, são os seguintes: Alfa Serviços Empresariais Ltda. (14/04/1995 a 31/01/1999 e 01/06/2001 a 30/07/2001), SAS Serviços Empresariais Ltda. (02/01/2002 a 31/03/2002 e 01/03/2003 a 30/04/2003), Ind. e Comércio de Artesanatos Tudo Arte Ltda. (02/08/2006 a 30/09/2006) e Astrodent Medical (02/07/2004 a 30/08/2004 e 01/03/2007 a 31/06/2007) (
).Tendo o segurado interposto recurso contra a decisão que determinou a cessação do benefício, foi mantida a decisão pela 18ª Junta de Recursos da Previdência Social (
).Assim, ante a regularidade do procedimento administrativo, não há ilegalidade a ser reconhecida pela via do mandado de segurança.
Ademais, cabia ao impetrante realizar a prova singela da veracidade dos vínculos supostamente fraudulentos na esfera administrativa e, posteriormente a essa análise administrativa, poderia demandar em juízo para a comprovação desses fatos, permitindo ao INSS o contraditório e a ampla defesa nos autos de uma ação ordinária. Optando pelo Mandado de Segurança, não resta outra solução senão a denegação da segurança, exatamente como decidido na sentença hostilizada.
Frise-se, ainda, que a ação nº 2009.71.54.003875-5 foi julgada extinta por falta de interesse processual quanto aos períodos questinados, uma vez que foram computados administrativamente, não sendo hipótese, portanto, de ter o ato administrativo ignorado decisão judicial transitada em julgado (
).Impositiva, pois, a manutenção da sentença.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002932757v15 e do código CRC 7c42a0d7.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5007075-54.2018.4.04.7104/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: CARLOS ROCHA FERREIRA (IMPETRANTE)
APELADO: Chefe da Agência - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - Passo Fundo (IMPETRADO)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. processo administrativo. RESTABELECIMENTO de benefício suspenso por irregularidade. FRAUDE. ampla defesa.
Tendo o processo administrativo seguido o devido processo legal, no qual possibilitou-se ao impetrante o contraditório e a ampla defesa, e estando o ato que ensejou a cessação do benefício devidamente fundamentado, não há ilegalidade a ser reparada pela via do mandado de segurança.
Cabia ao impetrante realizar a prova singela da veracidade dos vínculos supostamente fraudulentos na esfera administrativa e, posteriormente a essa análise administrativa, poderia demandar em juízo para a comprovação desses fatos, permitindo ao INSS o contraditório e a ampla defesa nos autos de uma ação ordinária. Optando pelo Mandado de Segurança, não resta outra solução senão a denegação da segurança, exatamente como decidido na sentença hostilizada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, NEGAR provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de dezembro de 2021.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002932758v8 e do código CRC 8b15c7ca.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO TELEPRESENCIAL DE 07/12/2021
Apelação Cível Nº 5007075-54.2018.4.04.7104/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): LUIZ CARLOS WEBER
APELANTE: CARLOS ROCHA FERREIRA (IMPETRANTE)
ADVOGADO: ÍGOR LOSS DA SILVA (OAB RS057143)
APELADO: Chefe da Agência - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - Passo Fundo (IMPETRADO)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 07/12/2021, na sequência 607, disponibilizada no DE de 22/11/2021.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 17/12/2021 08:01:08.