APELAÇÃO CÍVEL Nº 5080127-37.2014.4.04.7100/RS
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | JOCELI ASSIS DA ROSA |
ADVOGADO | : | ANDERSON DA CUNHA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRA. FALTA DE QUALIDADE DE SEGURADA. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES ÀS VÉSPERAS DO ÓBITO. SIMULAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.
2. Hipótese em que os recolhimentos individuais visando à recuperação da condição de segurada (competências de 06/2005 a 10/2007) foram todos feitos com atraso e na mesma data em que realizada cirurgia de lipoaspiração, da qual resultaram complicações (embolia cerebral gasosa e hemorragia intracerebral) que levaram ao óbito sete dias depois.
3. O sistema previdenciário não pode admitir o que, à toda evidência, se trata de simulação, ante a possibilidade de se antever o triste desfecho, pela gravidade do quadro clínico instaurado.
4. O recolhimento das contribuições em favor da de cujus, poucos dias antes do óbito e no mesmo dia do evento que lhe deu causa, revela o intuito deliberado de buscar futuro benefício previdenciário para o autor, alegadamente companheiro e dependente, o que não pode ser considerada uma filiação de boa-fé, apta a produzir uma obrigação do Estado de amparar tal estado de necessidade social, não podendo, por consequência, ser albergada pelo Poder Judiciário.
5. O sistema de seguridade social contém um valor ético intrínseco que deve nortear a interpretação do sistema jurídico e as práticas individuais e sociais na busca da melhor maneira de concretizar a proteção previdenciária.
6. O fato de não ser exigida carência para a concessão de pensão por morte (art. 26 da Lei 8.213/91) não implica dispensa da qualidade de segurado na data do óbito, pois são institutos diversos, estando expresso no art. 102, § 2º do mesmo diploma legal que "não será concedida pensão por morte aos dependentes do segurado que falecer após a perda desta qualidade, nos termos do art. 15 desta Lei, salvo se preenchidos os requisitos para obtenção da aposentadoria na forma do parágrafo anterior", o que não é o caso dos autos.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 26 de julho de 2017.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9069466v27 e, se solicitado, do código CRC 195EE847. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5080127-37.2014.4.04.7100/RS
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | JOCELI ASSIS DA ROSA |
ADVOGADO | : | ANDERSON DA CUNHA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação da parte autora contra sentença (25/02/2016) que julgou improcedente ação visando à concessão de pensão por morte da companheira, desde a data do óbito (26/11/2017), condenando-a ao pagamento de honorários advocatícios de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), suspensa a exigibilidade por litigar ao amparo da assistência judiciária gratuita.
Alega que, para fins de concessão de pensão por morte, "por raciocínio lógico se inexiste carência não se tem, igualmente, como falar na perda da qualidade de segurado". Afirma, portanto, que "interpretados sistematicamente os artigos 26 - inciso I c/c. artigo 102, ambos da mesma Lei, conclui-se que o art. 15, do Diploma Legal de Benefícios, não se aplica à pensão por morte. Somente assim é que se poderá dizer que houve uma exegese contextualizadora".
Ainda que assim não fosse, aduz que a de cujus era professora particular, o que restou demonstrado pelos recolhimentos das contribuições previdenciárias constantes do CNIS, bem como pelos vínculos empregatícios registrados, que somam mais de 31 anos de tempo de serviço.
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
VOTO
Para a obtenção do benefício de pensão por morte, deve a parte interessada preencher os requisitos previstos na legislação previdenciária vigente na data do óbito, conforme dispõe a Súmula 340, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
À época, quando do falecimento de GRIZELDA CAROLINA SANCHEZ ROSA, ocorrido em 26/11/2007, a legislação aplicável à espécie - Lei 8.213, de 24 de julho de 1991 (Plano de Benefícios da Previdência Social) - apresentava a seguinte redação:
Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:
I - do óbito, quando requerida até trinta dias depois deste;
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.
São, portanto, três os requisitos para a concessão do benefício de pensão por morte previdenciária:
a) o óbito (ou morte presumida);
b) a qualidade de segurada da pessoa falecida;
c) a existência de dependentes, na forma prevista no artigo 16, da Lei n. 8.213/1991.
O evento morte está comprovado pela certidão de óbito (evento 16, PROCADM1, fl. 6).
O INSS não reconheceu a condição de segurada da de cujus, bem como a qualidade de dependente previdenciário do autor para com a falecida.
O autor alega que foi casado com Grizelda e separou-se em 1994, retomando o relacionamento tempos depois. No curso da ação foi colhida prova testemunhal para fins de comprovação da convivência more uxorio.
Desnecessário, porém, o exame desta questão, tendo em vista a ausência do outro requisito à concessão da pensão. A de cujus não ostentava qualidade de segurada por ocasião do óbito.
Analisando os extratos do CNIS juntados aos autos (evento 6, CNIS1 e CNIS2) verifico que Grizelda era servidora pública estadual quando faleceu, vinculada à Secretaria Estadual de Educação desde 14/04/1978, com regime próprio de previdência. Este vínculo, portanto, não confere ao autor direito a pensão por morte no âmbito da Previdência Social.
Consta também no CNIS, entre outros mais antigos, registro de vínculo celetista junto à Congregação de Santa Doroteia do Brasil, de 01/08/1987 a 10/07/1997, bem como contribuições previdenciárias individuais de 08/1997 a 02/2002 e de 06/2005 a 10/2007.
Ocorre, como bem frisou o julgador singular, que "essas contribuições mais recentes foram todas recolhidas em atraso e no mesmo dia, em 19/11/2007, a teor do CNIS no Evento 51, que vem a ser o mesmo dia em que a instituidora da pensão se internou no Hospital Mãe de Deus para uma cirurgia de lipoaspiração, cujas complicações provocaram a sua morte em 26/11/2007 (prontuário hospitalar no Evento 54, OUT2 a 5)".
Acrescento que os recolhimentos (período de 06/2005 a 10/2007), foram efetuados na mesma data em que realizado o procedimento cirúrgico do qual resultaram as complicações (embolia cerebral gasosa e hemorragia intracerebral) que levaram ao óbito de Grizelda.
O recolhimento das contribuições em favor da de cujus, poucos dias antes de falecer e no mesmo dia da cirurgia são circunstâncias que indicam que houve intuito deliberado de viabilizar futuro benefício previdenciário para o autor, alegadamente companheiro e dependente. Em tais condições, a tentativa de nova filiação não é apta a produzir a obrigação do Estado de amparar tal estado de necessidade social, não podendo, por consequência, ser albergada pelo Poder Judiciário.
O colega Juiz Federal Daniel Machado da Rocha, professor e autor em Direito Previdenciário, em artigo publicado, defende que "o nosso sistema de seguridade social contém um valor ético intrínseco e sua aplicação deve concretizar este valor interpretando o sistema jurídico e as práticas individuais e sociais com o objetivo de aperfeiçoar a proteção social da melhor maneira possível" (Resolvendo questões difíceis que envolvem o exame da qualidade de segurado e da carência", in "Direito da Previdência e Assistência Social - Elementos para uma compreensão interdisciplinar", ano 2009, Editora Conceito Editorial).
Em sentido similar, colaciono o seguinte precedente da Sexta Turma deste Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. REINGRESSO AO RGPS. DOENÇAS E INCAPACIDADE PREEXISTENTES. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO.
1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.
2. Restando comprovado nos autos que as doenças e a incapacidade do de cujus eram preexistentes à sua nova filiação ao RGPS, falece à autora o direito à pensão por morte.
3. In casu, após ter perdido a qualidade de segurado, o de cujus reingressou no Regime Geral da Previdência Social em 19-09-2007, ao efetuar uma única contribuição previdenciária, vindo a falecer dez dias depois, em 29-09-2007, devido a choque hipovolêmico, hemorragia digestiva alta, varizes no esôfago, cirrose hepática e desnutrição. Considerando a natureza das patologias que o levaram ao óbito, é certo que já existiam antes da nova filiação à Previdência, não sendo crível supor, de outra parte, que a incapacidade tenha sobrevindo justamente nos dez dias que se seguiram à nova filiação até a data do óbito.
(AC Nº 0005715-98.2010.404.9999/SC, julg. em 11-07-2012, DE 19-07-2010, Rel. Juiz Federal Roger Raupp Rios)
Por outro lado, como bem salientou o juízo a quo, "diante do histórico contributivo e da idade de 51 anos, a falecida não tinha direito adquirido à aposentadoria por tempo de contribuição ou por idade. Ao passo que a eventual aposentadoria por invalidez, apesar de não alegada, também esbarraria, em tese, na falta da qualidade de segurada".
Por fim, não merece guarida a tese do autor de que, por não haver exigência de carência para a concessão de pensão também não seria necessário que a de cujus detivesse a condição de segurada na data do óbito. São institutos diversos. A questão da carência vem disciplinada nos artigos 24 a 27 da Lei 8.213/91, havendo expressa previsão de inexigência do requisito para os benefícios elencados no art. 26, nas condições ali expostas. Já o art. 15 do mesmo diploma legal dispõe sobre a manutenção da condição de segurado. Todavia, é no art. 102 da LBPS que são abordados os efeitos da perda da qualidade de segurado, estando expresso, em seu § 2º, que "não será concedida pensão por morte aos dependentes do segurado que falecer após a perda desta qualidade, nos termos do art. 15 desta Lei, salvo se preenchidos os requisitos para obtenção da aposentadoria na forma do parágrafo anterior", o que não é o caso dos autos, como se viu.
Por tais razões, deve ser confirmada a sentença que julgou improcedente a ação.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 26/07/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5080127-37.2014.4.04.7100/RS
ORIGEM: RS 50801273720144047100
RELATOR | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dra. Adriana Zawada Melo |
APELANTE | : | JOCELI ASSIS DA ROSA |
ADVOGADO | : | ANDERSON DA CUNHA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído no Aditamento da Pauta do dia 26/07/2017, na seqüência 432, disponibilizada no DE de 12/07/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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