
Apelação Cível Nº 5004497-28.2021.4.04.7003/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
APELANTE: ANGELINA APARECIDA BASAGLIA SCHUINDT (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação de procedimento comum em face do INSS em que a parte autora postula a concessão de pensão por morte na condição, respectivamente, de esposa e filha do instituidor, falecido em 31/08/2016.
Processado o feito, sobreveio sentença, em que julgado improcedente o pedido, uma vez que não comprovada a condição de segurado. A parte autora foi condenada ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios de 10% do valor da causa, cuja exigibilidade encontra-se suspensa em virtude da gratuidade da justiça concedida (evento 30).
A parte demandante apela, sustentando que após o último vínculo empregatício, encerrado em 09/2011, o instituidor não mais teve condições de laborar em razão de alcoolismo, patologia que o levou a uma internação em 11/2013, conforme demonstrado nos autos, a partir de quando esteve inválido. Nesse contexto, mantinha qualidade de segurado quando faleceu, de forma que é de ser reformada a sentença, para que concedida a pensão por morte a contar do óbito (evento 36).
Com contrarrazões (evento 39), vieram os autos a este Tribunal.
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo improvimento do recurso (evento 4 nesta instância).
É o relatório.
VOTO
MÉRITO
O benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) ocorrência do evento morte; b) condição de dependente de quem objetiva a pensão; e c) demonstração da qualidade de segurado do de cujus na data do óbito, nos termos do art. 74 e seguintes da Lei 8.213/91.
Quanto aos beneficiários, o art. 16 da Lei 8.213/91 delimita quem são os dependentes do segurado:
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave; (Redação dada pela Lei 13.146, de 2015).
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave; (Redação dada pela Lei 13.146, de 2015).
§ 1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.
§ 2º .O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.
§ 3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada
O deferimento do benefício independe de carência, conforme estabelecido no art. 26 da Lei de Benefícios.
Cumpre registrar que a legislação aplicável é a vigente na data do óbito, em consonância com o princípio tempus regit actum.
CASO CONCRETO
A parte autora requer a concessão de pensão por morte em virtude do falecimento de Valdir Schuindt, ocorrido em 31/08/2016, na condição de esposa e filha menor (evento 1.5).
O requerimento administrativo, protocolado em 08/09/2016, foi indeferido, sob o argumento de que não comprovada a condição de segurado do de cujus (evento 1.11).
A presente ação foi ajuizada em 07/04/2021.
Não houve questionamento sobre a qualidade de dependentes das autoras: Angelina Aparecida era esposa do de cujus desde 2004 (certidão de casamento, evento 1.9) e Laura era filha menor impúbere, nascida em 07/06/2011, com cinco anos de idade na data do falecimento.
A controvérsia recursal cinge-se à comprovação da qualidade de segurado do instituidor que, segundo a parte autora, esteve incapacitado após o último vínculo empregatício, de forma que manteve a qualidade de segurado.
QUALIDADE DE SEGURADO
O falecido teve vários vínculos empregatícios registrados, sendo o último como assistente contábil no período de 07/2011 a 09/2011 (evento 1.8).
As demandantes alegam que o instituidor esteve incapacitado desde então, vindo a ser internado de 11/2013 a 12/2013, em virtude do uso abusivo de álcool (evento 1.13-16).
O óbito ocorreu em 08/2016, em decorrência de parada cardiorrespiratória e infarto agudo do miocárdio (evento 1.5).
Em face de uma eventual cessação no recolhimento das contribuições previdenciárias, a Lei 8.213/91, em seu art. 15, prevê um período de graça, que pode ser estendido em algumas situações:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
Sobre a comprovação do desemprego estritamente por meio de registro no Ministério do Trabalho e da Previdência Social, vale destacar que o STJ pacificou o entendimento no sentido de que o referido registro não deve ser tido como o único meio de prova da condição de desempregado, especialmente considerando que, em âmbito judicial, prevalece o livre convencimento motivado do Juiz e não o sistema de tarifação legal de provas.
Na mesma linha, a Súmula 27 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, admitindo outros meios de prova, até mesmo a oral:
Súmula 27 - A ausência de registro em órgão do Ministério do Trabalho não impede a comprovação do desemprego por outros meios admitidos em Direito.
Cumpre registrar que a proteção previdenciária, inclusive no que concerne à prorrogação do período de graça, é voltada ao trabalhador em situação de desemprego involuntário, em conformidade com o disposto no artigo 201, III, da Constituição Federal, e no artigo 1º da Lei 8.213/1991, verbis:
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: (...)
III - proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;
Art. 1º. A Previdência Social, mediante contribuição, tem por fim assegurar aos seus beneficiários meios indispensáveis de manutenção, por motivo de incapacidade, desemprego involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente.
Estampa a jurisprudência desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO. MANUTENÇÃO. INCAPACIDADE LABORAL. PROVA. 1. São três os requisitos para a concessão dos benefícios previdenciários por incapacidade: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento do período de carência, salvo nos casos excepcionados por lei; 3) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença). 2. A proteção previdenciária, no que se refere à prorrogação do período de graça, é destinada ao trabalhador em situação de desemprego involuntário, como preceituam o artigo 201, III, da Constituição Federal e o artigo 1º da Lei 8.213/1991. Verificado que a rescisão do último vínculo empregatício se deu por iniciativa do empregador, incide a hipótese de prorrogação do período de graça. Precedentes. 3. Comprovadas a incapacidade para o exercício de atividade laboral e a qualidade de segurado na data de início da incapacidade, o segurado faz jus à concessão do benefício. (TRF4 5028132-42.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator para Acórdão MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 29/04/2021)
Tendo o último contrato laboral encerrado em 09/2011, o falecido manteve a qualidade de segurado até 15/11/2012. A única prova colacionada sobre a incapacidade data de 06/11/2013 (internação por etilismo), sendo que o óbito ocorreu em 08/2016.
Nesse contexto, se mostra necessário comprovar:
a) se é caso de prorrogação do período de graça por desemprego involuntário previamente à internação, haja vista que o instituidor não havia vertido mais de 120 contribuições ao sistema antes do óbito; e
b) se após a alta hospitalar, em 12/2013, o de cujus permaneceu incapacitado para o labor até falecer, em 08/2016.
Entretanto, não foi produzida prova sobre a alegada situação de desemprego. Não há dados nos autos sobre a saída do último emprego - se por iniciativa do empregado ou do empregador -, tampouco comprovação de eventual recebimento de seguro-desemprego. Outrossim, não há provas sobre a continuidade ou não da incapacidade após o término da internação hospitalar, em 12/2013.
Assim, em face da deficiência do conjunto probatória, é de ser anulada a sentença para que reaberta a instrução processual a fim de que produzidas provas sobre o alegado desemprego involuntário após o término do vínculo laborativo encerrado em 09/2011 e sobre a continuidade ou não da inaptidão laboral após a internação hospitalar, encerrada em 12/2013, oportunizando-se à parte autora a juntada de documentos complementares, a realização de eventual oitiva de testemunhas e a produção de perícia médica indireta, caso o magistrado de origem julgue oportuno.
De ofício, anulada a sentença e determinado o retornos dos autos à origem para que reaberta a instrução processual.
Prejudicada a apelação.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por, de ofício, anular a sentença, determinar a reabertura da instrução processual e julgar prejudicada a apelação da parte autora, nos termos da fundamentação.
Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004315070v7 e do código CRC d95b6e10.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5004497-28.2021.4.04.7003/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
APELANTE: ANGELINA APARECIDA BASAGLIA SCHUINDT (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. qualidade de segurado. prorrogação do período de graça. desemprego involuntário. incapacidade. comprovação. necessidade. Anulação da sentença. REabertura da instrução processual.
1. A concessão de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) ocorrência do evento morte; b) condição de dependente de quem objetiva a pensão; c) demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito. O benefício independe de carência e é regido pela legislação vigente à época do falecimento.
2. Cônjuge, companheiro e filho não emancipado menor de 21 anos ou inválido ou com deficiência grave ou mental ou intelectual tem dependência econômica presumida, nos termos do § 4º do art. 16 da Lei de Benefícios.
3. O art. 15 da Lei 8.213/91 prevê em seu § 2º a extensão do período de graça para manutenção da qualidade de segurado no caso de desemprego involuntário, a ser demonstrado por qualquer meio de prova. Inteligência do art. 201, III, da Constituição e do art. 1º da Lei de Benefícios.
4. Caso em que não foi produzida prova sobre a alegada situação de desemprego involuntário, tampouco sobre a continuidade da incapacidade laborativa após a internação hospitalar por etilismo, razão pela qual é de ser anulada a sentença para reabertura da instrução processual. Prejudicada a apelação.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, de ofício, anular a sentença, determinar a reabertura da instrução processual e julgar prejudicada a apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 05 de março de 2024.
Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004315071v4 e do código CRC f3d8da6a.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 27/02/2024 A 05/03/2024
Apelação Cível Nº 5004497-28.2021.4.04.7003/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PROCURADOR(A): CAROLINA DA SILVEIRA MEDEIROS
APELANTE: ANGELINA APARECIDA BASAGLIA SCHUINDT (AUTOR)
ADVOGADO(A): MARILENA MUNIZ TEIXEIRA (OAB PR017538)
ADVOGADO(A): CAMILA MUNIZ OLIVEIRA DA SILVA (OAB PR073174)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 27/02/2024, às 00:00, a 05/03/2024, às 16:00, na sequência 630, disponibilizada no DE de 16/02/2024.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DE OFÍCIO, ANULAR A SENTENÇA, DETERMINAR A REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL E JULGAR PREJUDICADA A APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 14/03/2024 08:01:25.