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PREVIDENCIÁRIO. PRESTAÇÃO DE SAÚDE. MELANOMA MALIGNO. PEMBROLIZUMABE. MEDICAMENTO AUSENTE DAS LISTAS DE DISPENSAÇÃO DO SUS. TRATAMENTO ONCOLÓGICO PELA REDE...

Data da publicação: 07/07/2020, 05:38:36

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PRESTAÇÃO DE SAÚDE. MELANOMA MALIGNO. PEMBROLIZUMABE. MEDICAMENTO AUSENTE DAS LISTAS DE DISPENSAÇÃO DO SUS. TRATAMENTO ONCOLÓGICO PELA REDE PÚBLICA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. 1. A concessão de medicamento que não conste das listas de dispensação do Sistema Único de Saúde (SUS) deve atender aos seguintes requisitos: (a) a inexistência de tratamento ou medicamento, similar ou genérico, oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem resultado prático ao paciente ou sua inviabilidade, em cada caso, devido a particularidades que apresenta; (b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento para a moléstia especificada; (c) a sua aprovação pela ANVISA; e (d) a não-configuração de tratamento experimental. 2. É indevido o fornecimento de medicamento cuja superioridade terapêutica sobre os demais oferecidos pelo SUS não está comprovada. (TRF4, AG 5034039-22.2019.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator ADRIANE BATTISTI, juntado aos autos em 06/11/2019)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Agravo de Instrumento Nº 5034039-22.2019.4.04.0000/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

AGRAVANTE: MARLENI GOULART GELATTI

AGRAVADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

AGRAVADO: MUNICÍPIO DE SANTA MARIA/RS

AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

RELATÓRIO

Marleni Goulart Gelatti interpôs agravo de instrumento, com pedido de atribuição de efeito suspensivo, contra decisão (evento 60 do processo originário) que indeferiu o pedido de tutela provisória para que lhe seja fornecido o medicamento PEMBROLIZUMAB (Keytruda®) 25mg.

A agravante referiu que foi diagnosticada com Melanoma Maligno (CID 10 C43) em setembro de 2018 e que seu estado de saúde vem se agravando progressivamente, de tal modo que corre risco de morte. Apontou que o fármaco foi prescrito por médico oncologista vinculado ao UNACON Hospital Universitário de Santa Maria. Argumentou que o medicamento apresenta resposta clínica superior ao tratamento padrão oferecido pelo SUS para a sua patologia, e que não existem genéricos ou similares ao pembrolizumabe. Diante da negativa do pedido liminar anteriormente formulado (eventos 33 e 44 do processo originário) - por decisão mantida em grau recursal (AI nº 5017969-27.2019.4.04.0000) -, acrescentou que foi submetida a quimioterapia com o fármaco DACARBAZINA, fornecido pelo SUS, sem nenhuma melhora. Indicou, assim, a existência de fato novo que enseja a possibilidade de reconsideração do pedido. Apontou, ainda, precedente (decisão no processo nº 50032126220194047102 - evento 58, OUT4, origem) em que o mesmo magistrado de primeira instância deferiu a medicação a outro postulante. Requereu, assim, a imediata concessão, em tutela provisória, do medicamento indicado.

Foi indeferido o pedido de antecipação de tutela recursal.

Sem contrarrazões, vieram os autos.

VOTO

Os requisitos para o deferimento da tutela de urgência estão indicados no art. 300 do Código de Processo Civil, que assim dispõe:

A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

§ 1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.

§ 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.

§ 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.

Conclui-se, portanto, ser indispensável para o deferimento de provimento antecipatório não só a probabilidade do direito, mas também a presença de perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, aos quais se deverá buscar, na medida do possível, maior aproximação do juízo de segurança previsto na norma, sob pena de subversão da finalidade do instituto da tutela antecipatória.

No presente caso, verifica-se, a princípio, a existência do perigo de dano grave ou de difícil reparação. É que, conforme o laudo do médico assistente, a autora é portadora de melanoma maligno (CID10 C43), metastático e em progressão, de modo que a ausência do remédio requerido "pode ocasionar piora da doença e risco de morte" (origem, evento 1, LAUDO7). Assim, vislumbra-se o caráter emergencial do pedido.

Em relação à probabilidade do direito, cumpre observar que a Constituição Federal consagra a saúde como direito fundamental, seja ao contemplá-la como direito social no art. 6º, seja ao estabelecê-la como "direito de todos e dever do Estado", no art. 196. O constituinte assegurou, com efeito, a satisfação desse direito "mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos", bem como o "acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação."

Embora a aplicabilidade imediata das normas definidoras de direitos fundamentais seja imposta já pelo §1º do art. 5º da CF, no caso do direito à saúde, foi editada a Lei nº 8.080/90, a qual expressamente inclui, no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS), a assistência farmacêutica (art. 6º, I, d). Desse modo, a Política Nacional de Medicamentos e Assistência Farmacêutica integra a Política Nacional de Saúde, tendo como finalidade garantir a todos o acesso aos medicamentos necessários, quer interferindo em preços, quer fornecendo gratuitamente as drogas de acordo com as necessidades.

Daí não se depreende, todavia, a existência de direito subjetivo a fornecimento de todo e qualquer medicamento. Afinal, mesmo o direito à saúde, a despeito de sua elevada importância, não constitui um direito absoluto. A pretensão de cada postulante deve ser considerada não apenas sob perspectiva individual, mas também à luz do contexto político e social em que esse direito fundamental é tutelado. Isto é, a proteção do direito à saúde, sob o enfoque particular, não pode comprometer a sua promoção em âmbito coletivo, por meio das políticas públicas articuladas para esse fim.

A denominada “judicialização do direito à saúde” impõe, com efeito, tensões de difícil solução. De um lado, a proteção do núcleo essencial do direito à saúde e do “mínimo existencial” da parte requerente, intimamente ligado à dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, III). De outro, o respeito ao direito dos demais usuários do SUS e a atenção à escassez e à finitude dos recursos públicos, que se projetam no princípio da reserva do possível. Associado a este problema está, de modo mais amplo, o exame do papel destinado ao Poder Judiciário na tutela dos direitos sociais, conforme a Constituição Federal de 1988, que consagra, como se sabe, tanto a inafastabilidade do acesso à justiça (art. 5º, XXXV) como a separação dos Poderes (art. 2º).

A jurisprudência tem apontado parâmetros para equacionar essa contradição, orientando o magistrado no exame, caso a caso, das pretensões formuladas em juízo. Assume especial relevo, nesse contexto, a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na Suspensão de Tutela Antecipada nº 175, de relatoria do Min. Gilmar Mendes, após a realização de audiências públicas e amplo debate sobre o tema. Nesse precedente, foi assentado: esse direito subjetivo público é assegurado mediante políticas sociais e econômicas, ou seja, não há um direito absoluto a todo e qualquer procedimento necessário para a proteção, promoção e recuperação da saúde, independentemente da existência de uma política pública que o concretize” (STA 175 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2010, DJe-076 DIVULG 29-04-2010 PUBLIC 30-04-2010 EMENT VOL-02399-01 PP-00070).

Assim, cumpre examinar, primeiramente, se existe ou não uma política pública que abranja a prestação pleiteada pela parte. Se referida política existir - isto é, se o medicamento solicitado estiver incluído nas listas de dispensação pública do SUS -, não há dúvida de que o postulante tem direito subjetivo à concessão do fármaco, cabendo ao Poder Judiciário assegurar-lhe o seu fornecimento.

Todavia, se o medicamento requerido não constar nas listas de dispensação do SUS, extrai-se, do precedente mencionado, a necessidade de se observarem alguns critérios, quais sejam: (a) a inexistência de tratamento ou medicamento similar ou genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem resultado prático ao paciente ou sua inadequação a ele devido a peculiaridades que apresenta; (b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a moléstia que acomete o paciente; (c) a aprovação do medicamento pela ANVISA; e (d) a não configuração de tratamento experimental.

Atendidas esses requisitos, o medicamento deve ser concedido. Nessa hipótese, não constitui razão suficiente para indeferi-lo a mera invocação, pelo ente público, do princípio da reserva do possível. Nesse sentido, assentou o Min. Celso de Mello:

Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da "reserva do possível" - ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível - não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se, dolosamente, do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade.

(...) entre proteger a inviolabilidade do direito à vida e à saúde - que se qualifica como direito subjetivo inalienável a todos assegurado pela própria Constituição da República (art. 5º, "caput", e art. 196) - ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo, uma vez configurado esse dilema, que razões de ordem ético-jurídica impõem, ao julgador, uma só e possível opção: aquela que privilegia o respeito indeclinável à vida e à saúde humanas.

(...) a missão institucional desta Suprema Corte, como guardiã da superioridade da Constituição da República, impõe, aos seus Juízes, o compromisso de fazer prevalecer os direitos fundamentais da pessoa, dentre os quais avultam, por sua inegável precedência, o direito à vida e o direito à saúde. (STA 175, Rel. Min. Celso de Mello, DJE 30/04/2010)

Demais, o Superior Tribunal de Justiça julgou recentemente recurso especial repetitivo sobre a matéria (REsp 1657156/RJ, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 25/04/2018, DJe 04/05/2018), arrolando três requisitos para a concessão de medicamento não incluído em ato normativo do SUS, conforme se percebe a seguir:

Tema 106: A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; (iii) existência de registro na ANVISA do medicamento.

Houve modulação dos efeitos desta decisão, de modo a que se observe e exija a presença desses requisitos somente em ações distribuídas a partir da respectiva publicação.

Deduzidas essas considerações sobre a questão de fundo, passa-se ao exame do mérito do recurso.

A autora postula o fornecimento de Pembrolizumab (Keytruda®) 25mg para o tratamento de melanoma maligno (CID 10 C43).

O medicamento ora postulado integra o rol de fármacos já aprovados pela ANVISA, mas não pertence à Relação Nacional de Medicamentos Essenciais – RENAME e não faz parte de nenhum programa de medicamentos de Assistência Farmacêutica do SUS.

O relatório médico apresentado no processo originário (evento 1, LAUDO7) informa que a autora apresenta doença avançada por metástases cutâneas e indica tratamento oncológico com o uso de pembrolizumabe. Aponta a eficácia científica do fármaco indicado. O médico assistente - vinculado, sublinhe-se, ao Serviço de Hematologia e Oncologia do Hospital Universitário de Santa Maria, entidade qualificada como UNACON - embasa a prescrição do medicamento em estudos que apontam a superioridade da terapia com pembrolizumabe sobre a quimioterapia convencional (ipilimumab). Sustenta que a medicação indicada apresenta benefício em relação à sobrevida global e na sobrevida livre de progressão, bem como menor taxa de toxicidade.

O laudo pericial (origem, evento 31) confirma o diagnóstico e a prescrição desse tratamento. Deduz, a partir da literatura médica, que a medicação indicada possivelmente assegura sobrevida e melhor qualidade de vida aos pacientes.

A despeito das afirmações do profissional, é imperioso pontuar que, no caso, tal conclusão baseia-se em um único estudo clínico, de fase III, comparativo com outro medicamento também não disponível pelo SUS (ipilimumabe) e patrocinado pelo próprio laboratório fabricante. Aliás, sequer ficou claro se o estadiamento da autora é o mesmo dos pacientes pesquisados no referido estudo. Tampouco foi avaliado o custo-benefício.

A evidência apontada, portanto, é frágil para corroborar a afirmação de que a medicação, de fato, trará algum proveito efetivo à parte autora ou, mesmo, se é vantajosa comparativamente às fornecidas pelo SUS. Faltam estudos com qualidade metodológica que possam dar suporte à pretensão da autora.

Neste contexto, razão assiste ao MM. Juiz, ao ponderar: mesmo sensível à situação da paciente, a qual enfrenta quadro grave de saúde, estando esperançosa com o uso da medicação requerida, não é possível avançar na concessão de um medicamento sem divisar dados seguros que atestem a efetividade do fármaco.

Ainda que se considerasse caracterizada a maior efetividade do tratamento, o novo relatório médico trazido aos autos pela agravante (evento 1, LAUDO2) - de produção recente (05/08/2019) - embora tenha informado que a paciente "continua com piora da doença (progressão das lesões e dor no membro superior direito)" após ter realizado 4 ciclos de tratamento com dacarbazina, não deixou claro se houve o esgotamento das opções fornecidas pelo SUS.

Não é necessário que os fármacos disponibilizados pela rede pública sejam similares ao prembolizumabe, visto que não foi evidenciada a sua imprescindibilidade. O prembolizumabe não é a única alternativa para o fim a que se destina, existindo protocolos previstos no SUS para tratamento da doença que acomete a demandante.

O laudo pericial não indica que o tratamento disponibilizado na rede pública seria ineficaz para a condição da autora, e não aponta contraindicação às demais alternativas existentes.

Cumpre notar que a autora é portadora de melanoma maligno (CID10 C43), metastático e em progressão, em estágio IV, situação que difere daquela que ensejou o deferimento do pedido liminar pelo MM. Juiz no processo nº 50032126220194047102 - evento 58, OUT4, origem).

A propósito, o parecer técnico científico do E-NATJUS (Núcleo de Apoio Técnico ao Judiciário) mencionado pelo magistrado singular, elaborado em novembro de 2018 a pedido do Conselho Nacional de Justiça - CNJ, esclarece que:

O melanoma, apesar de representar apenas 1% dos casos de câncer de pele, é uma neoplasia com alto potencial metastático e altamente letal. A detecção de tumores primários que podem ser removidos por excisão de margens apresenta alto potencial de cura, enquanto que a presença de metástases representa pior prognóstico da doença. A evidência disponível sobre a eficácia e segurança do pembrolizumabe no tratamento do melanoma metastático possui algumas limitações. Os estudos demonstraram superioridade do pembrolizumabe quando comparado à quimioterapia ou ao ipilimumabe. Entretanto, são escassos os estudos com maior tempo de seguimento, com discreto benefício em termos de sobrevida global, após dois anos de seguimento, dos pacientes tratados com pembrolizumabe. Além disso, todos os ECR tiveram algum tipo de financiamento ou colaboração por parte do fabricante do medicamento. De maneira geral, no quesito toxicidade, o pembrolizumabe se mostrou uma opção terapêutica segura quando comparado à quimioterapia ou ao ipilimumabe. Por outro lado, deve-se considerar os registros de irAE, com relevantes morbidades como hipo e hipertireoidismo, e pneumonite, além de ocorrência de óbito em decorrência do uso do medicamento. Destaca-se que a terapia com pembrolizumabe está associada a um custo significativamente alto, associado a um risco considerável à segurança dos pacientes em uso do medicamento. A recomendação gerada a partir da análise das evidências levantadas é fraca a favor do pembrolizumabe.

Recentemente, a Turma Suplementar do Paraná entendeu, ainda, que não foi evidenciada a vantagem terapêutica do medicamento pretendido (AC nº 5036845-16.2018.404.7000, julgada na sessão de 23/04/2019), em caso análogo ao dos autos.

A perícia médica judicial realizada naquele processo foi enfática ao asseverar: "inexistência de comprovação da superioridade da droga ora demandada frente aos medicamentos dispensados no âmbito da política pública". Oportuno transcrever o seguinte trecho:

Trata-se da medicação KEYTRUDA® (Pembrolizumabe), liberada pela ANVISA (bula aprovada pela ANVISA em 19-10-2017). Suas indicações são para melanoma metastático ou irressecável em monoterapia e câncer de pulmão tipo não pequenas células com expressão de PD-l1. Trata-se de um anticorpo monoclonal que se liga à proteína de morte celular programada (PD-1) localizada nos linfócitos. Os tumores possuem uma proteína que bloqueia este receptor, impedindo os linfócitos de eliminar as células tumorais. Assim, a medicação permite que estas proteínas desliguem a atividade inibitória imunológica. Como conseqüência, podem ocorrer efeitos colaterais imunológicos.

A literatura médica citada em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28822576 demonstra um estudo de fase III, multicêntrico, randomizado denominado KEYNOTE 006. Os pacientes foram recrutados de 87 instituições em 16 países. Os 834 pacientes com melanoma avançado foram divididos em 3 braços: (a) Pembrolizumabe a cada 2 semanas; (b) Pembrolizumabe a cada 3 semanas e (c) Ipilimumabe. A sobrevida global em 24 meses foi de 55% no grupo (a), 55% no grupo (b) e 43% no grupo (c). A sobrevida livre de progressão de doença em 12 meses foi de 74,1% para o grupo (a), 68.4% para o grupo (b) e 58.2% para o grupo (c). Os autores citam que o estudo torna a medicação demandada o tratamento padrão para melanoma avançado.

O estudo denominado KEYNOTE 002 comparou os pacientes com melanoma avançado para receberem (a) Pembrolizumabe ou (b) quimioterapia padrão com Dacarbazina, Temozolomida, Carboplatina, Paclitaxel ou associação de Carboplatina + Paclitaxel. Não houve vantagem da medicação demandada na sobrevida global (sobrevida média de 13,4 meses versus 11,0 meses). Fonte: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28961465.

QUESITOS

Do Juízo.

a) a política pública prevista no SUS para a moléstia.

Resposta. O melanoma metastático é considerado incurável. O tratamento inicial desta neoplasia é realizado apenas com cirurgia. Quando há doença irressecável ou metastática, é empregada a terapia paliativa. A quimioterapia convencional envolve as medicações Docetaxel, Carboplatina, Dacarbazina ou imunoterapia com Interferon ou Inter leucina.

b) existência, ou não, de protocolo clínico aprovado pela CONITEC quanto ao fármaco e a moléstia.

Resposta. Não houve avaliação da CONITEC para a medicação demandada.

c) a existência, ou não, de estudos clínicos com elevado nível de evidência quanto ao tratamento proposto, a partir da Medicina Baseada em Evidência, especialmente se há Revisão Sistemática que justifique a prescrição médica em substituição ao tratamento existente no âmbito do SUS.

Resposta. Sim. A literatura médica citada em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28822576 demonstra um estudo de fase III, multicêntrico, randomizado denominado KEYNOTE 006. Os pacientes foram recrutados de 87 instituições em 16 países. Os 834 pacientes com melanoma avançado foram divididos em 3 braços: (a) Pembrolizumabe a cada 2 semanas; (b) Pembrolizumabe a cada 3 semanas e (c) Ipilimumabe. A sobrevida global em 24 meses foi de 55% no grupo (a), 55% no grupo (b) e 43% no grupo (c). A sobrevida livre de progressão de doença em 12 meses foi de 74,1% para o grupo (a), 6 8.4% para o grupo (b) e 58.2% para o grupo (c). Os autores citam que o estudo torna a medicação demandada o tratamento padrão para melanoma avançado. Há revisão sistemática publicada em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28883738 para o tratamento do melanoma com inibidores de “checkpoint” (classe de medicação que inclui o Pembrolizumabe). A revisão incluiu um total de 3.628 pacientes e confirmou a efetividade deste grupo de medicações sobre a terapia suportiva. No entanto, outro estudo comparativo com Dacarbazina não demonstrou vantagem em termos de sobrevida global ( https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28961465 ).

d) conclusão quanto à indispensabilidade, ou não, do tratamento postulado e eventuais riscos pela submissão ao tratamento oficial, em detrimento daquele postulado judicialmente.

Resposta. Não há como afirmar que a medicação seja absolutamente indispensável. Embora se trate de fármaco moderno (grupo de terapia alvo), o estudo KEYNOTE002 demonstrou ausência de ganho estatisticamente significativo na sobrevida global (https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28961465). Além disto, o melanoma metastático é uma doença incurável e a quimioterapia convencional pode ser mantida.

e) aumento da expectativa de vida com o uso do fármaco pleiteado (em meses) ou a probabilidade de cura.

Resposta. Os estudos que compararam a medicação demandada com outra denominada IPILIMUMABE demonstraram um discreto ganho de sobrevida global. Entretanto, quando a medicação foi comparada com a quimioterapia convencional, o estudo KEYNOTE 002 não demonstrou ganho de sobrevida (sobrevida média de 13,4 meses versus 11,0 meses – sem significância estatística).

Considerando a existência de alternativa terapêutica a ser fornecida pelo SUS, e levando-se em conta que se refere a um tratamento paliativo, cuja maior probabilidade, caso se atinja o resultado esperado, é acrescentar algum curto periodo de tempo livre de progressão da doença à paciente, bem como tendo em vista o fato de ser um medicamento de alto custo, entende-se como indevida a sua dispensação.

Cabe destacar que o tratamento de escolha é livre ao paciente e bastante comum em atendimentos privados. Contudo, não há direito à obtenção judicial de tratamento de escolha. Para que se imponha um ônus ao SUS de um tratamento de alto custo, como o requerido, com duração indeterminada, é necessária a demonstração cabal da imprescindibilidade, o que não ocorre na hipótese dos autos.

Ao enfrentar caso semelhante (AI nº 5026045-40.2019.4.04.0000), a MMª. Juíza Federal Convocada Gisele Lemke observou, com propriedade:

Não é demais lembrar que as políticas públicas de saúde são editadas no exercício da competência administrativa dos entes públicos, por meio de atos administrativos abstratos (por oposição aos concretos) e discricionários (por oposição aos vinculados, como é exemplo o ato de aposentadoria de um servidor público). No caso das políticas de saúde se está diante do que Celso Antônio Bandeira de Mello classifica como ato discricionário quanto a seu conteúdo. Daí se infere que as políticas públicas na área da saúde não podem ser desconsideradas pelo Poder Judiciário, a não ser quando contrariem a lei (o que não ocorre na política de saúde em discussão nestes autos), porquanto se está diante do exercício de competência discricionária do Poder Executivo. Por conseguinte, não cabe à parte nem ao perito judicial pretender substituir a política pública existente, mas apenas aferir se ela está sendo devidamente cumprida ou se, esgotados os meios de tratamento nela previstos, seria justificável a utilização de outros meios de tratamento (sejam medicamentos, órteses, próteses, etc., de fora da lista oficial).

Repare-se que não se trata aqui de negar acesso da parte autora à assistência pública de saúde, mas, sim, reconhecer que, para a obtenção do medicamento oncológico, deve ser demonstrado o esgotamento das alternativas terapêuticas disponibilizadas pelo Sistema Único de Saúde, assim como evidenciada a vantagem terapêutica do fármaco requerido, ônus da qual a agravante não se desincumbiu.

Apesar da urgência e da aparente concordância do médico perito com a indicação do medicamento pleiteado, não é possível, neste momento processual, determinar a sua imediata concessão, tendo em vista que os elementos carreados aos autos não demonstram a insuficiência da política pública.

Cuida-se, inclusive, de entendimento sedimentado no Enunciado 14 da I Jornada de Direito da Saúde do Conselho Nacional de Justiça, que afirma: "Não comprovada a inefetividade ou impropriedade dos medicamentos e tratamentos fornecidos pela rede pública de saúde, deve ser indeferido o pedido não constante das políticas públicas do Sistema Único de Saúde."

Em face do que foi dito, voto por negar provimento ao agravo de instrumento.



Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001426163v2 e do código CRC 9cbcc150.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ADRIANE BATTISTI
Data e Hora: 6/11/2019, às 14:25:34


5034039-22.2019.4.04.0000
40001426163.V2


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:38:35.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Agravo de Instrumento Nº 5034039-22.2019.4.04.0000/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

AGRAVANTE: MARLENI GOULART GELATTI

AGRAVADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

AGRAVADO: MUNICÍPIO DE SANTA MARIA/RS

AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PRESTAÇÃO DE SAÚDE. MELANOMA MALIGNO. PEMBROLIZUMABE. MEDICAMENTO AUSENTE DAS LISTAS DE DISPENSAÇÃO DO SUS. TRATAMENTO ONCOLÓGICO PELA REDE PÚBLICA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.

1. A concessão de medicamento que não conste das listas de dispensação do Sistema Único de Saúde (SUS) deve atender aos seguintes requisitos: (a) a inexistência de tratamento ou medicamento, similar ou genérico, oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem resultado prático ao paciente ou sua inviabilidade, em cada caso, devido a particularidades que apresenta; (b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento para a moléstia especificada; (c) a sua aprovação pela ANVISA; e (d) a não-configuração de tratamento experimental.

2. É indevido o fornecimento de medicamento cuja superioridade terapêutica sobre os demais oferecidos pelo SUS não está comprovada.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 05 de novembro de 2019.



Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001426164v3 e do código CRC 1c02c3d9.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ADRIANE BATTISTI
Data e Hora: 6/11/2019, às 14:25:34


5034039-22.2019.4.04.0000
40001426164 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:38:35.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 05/11/2019

Agravo de Instrumento Nº 5034039-22.2019.4.04.0000/RS

RELATORA: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI

PRESIDENTE: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

PROCURADOR(A): MAURICIO PESSUTTO

AGRAVANTE: MARLENI GOULART GELATTI

ADVOGADO: LEANDRO MOURA ROVEDDER (OAB RS069340)

ADVOGADO: MILENA JOBIM ALMEIDA (OAB RS070199)

AGRAVADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

AGRAVADO: MUNICÍPIO DE SANTA MARIA/RS

AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 05/11/2019, às 13:30, na sequência 166, disponibilizada no DE de 15/10/2019.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI

Votante: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI

Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:38:35.

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