D.E. Publicado em 10/11/2015 |
AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0000750-28.2015.4.04.0000/PR
RELATOR | : | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT |
AUTOR | : | TEREZA DE JESUS CARVALHO |
ADVOGADO | : | Marta de Fatima Melo |
: | Ana Lucia Monte Sião | |
REU | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. TEMPESTIVIDADE. DOCUMENTO NOVO. PREVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO DISPENSADO. DIREITO À AVERBAÇÃO DE TEMPO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL.
. A tese do trânsito em julgado por capítulos não encontra ressonância na jurisprudência da 3ª Seção desta Corte, eis que vigente no Superior Tribunal de Justiça o entendimento consolidado na Súmula 401, segundo o qual inicia-se o prazo decadencial quando não for mais cabível recurso do último pronunciamento judicial.
. Transitada em julgado a sentença rescindenda em 10.4.2013, é tempestiva a rescisória protocolizada em 12.02.2015.
. Na avaliação dos documentos apresentados como aptos a ensejar o juízo rescisório, em situações envolvendo trabalhadores rurais, o Superior Tribunal de Justiça tem adotado interpretação extensiva do preceito insculpido no art. 485, VII, do CPC, de modo a aceitar, para tal finalidade, documento preexistente à propositura da ação originária e a necessidade de solução pro misero, nas hipóteses em que poderia ser deferida a aposentadoria rural mediante a admissão de documento novo.
. Hipótese em que as certidões dos registros civis são aptas a lastrear a rescisão do acórdão com base no art. 485, VII, do CPC.
. Inocorre a carência de ação em face da ausência de prévio requerimento administrativo, uma vez que este somente passou a ser exigido após o trânsito em julgado da sentença rescindenda (RE 631.240). Ademais, a exigência não abrange as ações para concessão de benefício de trabalhador informal e a autarquia previdenciária, na contestação da rescisória, arrolou razões contrárias ao reconhecimento do tempo de serviço rural, de sorte que configurado o interesse de agir pela pretensão resistida.
. Reconhecido o direito à averbação do período reconhecido judicialmente, para fins de obtenção de futura aposentadoria, em face do não cumprimento de todos os requisitos para a concessão do benefício pretendido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, julgar procedente a ação rescisória e, em novo julgamento, julgar parcialmente procedente o pedido, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 29 de outubro de 2015.
Juiz Federal LUIZ ANTÔNIO BONAT
Relator
Documento eletrônico assinado por Juiz Federal LUIZ ANTÔNIO BONAT, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7864564v2 e, se solicitado, do código CRC 7D3C27D4. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Luiz Antônio Bonat |
Data e Hora: | 29/10/2015 18:34 |
AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0000750-28.2015.4.04.0000/PR
RELATOR | : | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT |
AUTOR | : | TEREZA DE JESUS CARVALHO |
ADVOGADO | : | Marta de Fatima Melo |
: | Ana Lucia Monte Sião | |
REU | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação rescisória ajuizada com fulcro no art. 485, VII, do CPC, visando à desconstituição da sentença proferida pelo Juízo Estadual da Comarca de Siqueira Campos-PR, na Ação Ordinária nº 0000305-81.2008.8.16.0163, que indeferiu a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, eis que ausente início de prova material quanto ao exercício de atividade rural no período entre 1969 a 1993. Alega a autora a existência de documentos novos que não foram juntados na ação originária por ignorar sua importância como prova para a concessão do benefício postulado.
Em contestação, o réu argúi, preliminarmente, a decadência, tendo em vista que, intimada a autora da sentença em 10.12.2012, com término do prazo recursal em 25.12.2012, o efetivo trânsito em julgado ocorreu em 27.12.2012. Deveria a rescisória ter sido ajuizada, "na hipótese mais favorável, até 21.01.2015, considerando a suspensão de prazos processuais entre 20.12.1014 e 20.01.2015"; todavia foi protocolizada em 12.02.2015. No mérito, sustenta que os documentos apresentados não se inserem no conceito do art. 485, VII, do CPC, seja porque não contemporâneos aos períodos de atividade rural que se busca provar, seja porque trazem elementos que já foram objeto de deliberação no feito originário. Na hipótese de rescisão da sentença, pugna pelo reconhecimento da falta de interesse de agir, considerando a ausência de prévio requerimento administrativo.
Apresentada a réplica, os autos foram encaminhados ao Ministério Público Federal, que emitiu parecer no sentido da improcedência do pedido.
É o relatório.
VOTO
DO JUÍZO RESCINDENDO
Tempestividade
Consoante o art. 495 do CPC, o direito de propor ação rescisória extingue-se em dois anos contados do trânsito em julgado da decisão, iniciado o cômputo do prazo a partir do momento em que não couber mais recurso, nos termos da Súmula 401 do STJ, verbis: "O prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível qualquer recurso do último pronunciamento judicial".
A tese do trânsito em julgado por capítulos, segundo a data de intimação da decisão rescidenda de cada uma das partes, não obstante o julgamento da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal no RE 666589/DF, não encontra ressonância na jurisprudência consolidada na 3ª Seção desta Corte, conforme se vê dos precedentes a seguir transcritos:
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL. COMPETÊNCIA DO STJ. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO. TRÂNSITO EM JULGADO. PRAZO BIENAL DECADENCIAL. 1. Na dicção do artigo 105, inciso I, alínea 'e', da Constituição Federal, compete ao Superior Tribunal de Justiça processar e julgar, originariamente, as ações rescisórias de seus julgados. 2. Ao julgar o recurso especial interposto contra acórdão desta Corte, o STJ pronunciou-se sobre o mérito da causa, mesmo que sem a expressa análise da decadência. Logo, é inafastável o reconhecimento da competência daquela Corte Superior para processar e julgar a ação rescisória, pois é o órgão recursal que, por último, enfrentou o mérito da causa. 3. Existindo erro na indicação do juízo competente, está autorizada a declinação da competência para processar e julgar a ação rescisória; recaindo o equívoco na indicação da decisão a ser rescindida, impõe-se a extinção do feito, sem julgamento de mérito, ante a impossibilidade de alteração do pedido. 4. Inaplicável o fatiamento ou o trânsito em julgado em capítulos para fins de contagem do prazo bienal de decadência para a interposição da ação rescisória. (TRF4, AR 0004860-07.2014.404.0000, Terceira Seção, Relatora p/ Acórdão Vânia Hack de Almeida, D.E. 27/07/2015)
AÇÃO RESCISÓRIA. PRAZO BIENAL PARA AJUIZAMENTO. DECADÊNCIA. 1. Ainda prevalece no Superior Tribunal de Justiça, por meio de manifestação de sua Corte Especial (REsp 736650/MT, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira), mesmo após o julgamento do RE n. 666.589/DF, DJe de 3.6.2014, pela Primeira Turma do STF, o entendimento consubstanciado na Súmula 401 daquela Corte Superior, no sentido de que "O prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível qualquer recurso do último pronunciamento judicial". 2. Hipótese em que a certidão da fl. 314, datada de 29-05-2014, dá conta de que o feito transitou em julgado nessa data, sendo tempestivo, portanto, o ajuizamento da ação rescisória em 12-12-2014. (TRF4, AR 0006664-10.2014.404.0000, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Marcelo Malucelli, D.E. 05/06/2015)
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. TRÂNSITO EM JULGADO POR CAPÍTULOS. INVIABILIDADE. VIOLAÇÃO DE LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. OCORRÊNCIA. DECADÊNCIA PARA REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DIREITO AO MELHOR BENEFÍCIO. ART. 103 DA LEI 8.213/91. ORIENTAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RE 626.489. 1. "Embora o julgamento da 1ª Turma do STF no RE 666589/DF, aplicando a tese do transito da sentença em capítulos para a contagem do prazo de dois anos para o ajuizamento da ação rescisória, mantém-se o reiterado entendimento da 3ª Seção, segundo o qual tal prazo somente flui depois do trânsito da última decisão proferida no processo, ao teor da Súmula 401/STJ. Decadência do art. 495 do CPC afastada." (TRF4, AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0000307-14.2014.404.0000, 3ª SEÇÃO, Des. Federal ROGERIO FAVRETO, POR MAIORIA, D.E. 21/01/2015, PUBLICAÇÃO EM 22/01/2015). (...) (TRF4 5015601-21.2014.404.0000, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Ricardo Teixeira do Valle Pereira, juntado aos autos em 16/03/2015)
Na hipótese dos autos, o trânsito em julgado ocorreu em 10.4.2013, conforme certidão da fl. 84-v e a rescisória foi ajuizada em 12.02.2015; tempestivamente, portanto.
Documento novo
Conforme o inciso VII do art. 485 do Código de Processo Civil, é rescindível a sentença de mérito na hipótese em que, posteriormente à prolação da sentença, o autor obtenha documento novo, cuja existência ignorava ou de que não pode fazer uso, capaz, por si só, de assegurar-lhe pronunciamento favorável.
Quanto ao tópico, leciona José Carlos Barbosa Moreira (Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro, vol. v, 6ª ed., 1994):
"Fosse qual fosse o motivo da impossibilidade de utilização, é necessário que haja sido estranho à vontade da parte. Esta deve ter-se visto impossibilitada, sem culpa sua, de usar o documento, v.g., porque lhe fora furtado, ou porque estava em lugar inacessível, ou porque não se pode encontrar o terceiro que o guardava, e assim por diante.(...)
Por "documento novo" não se deve entender aqui o constituído posteriormente. O adjetivo "novo" expressa o fato de só agora ser ele utilizado, não a ocasião em que veio a formar-se. Ao contrário: em princípio para admitir-se a rescisória, é preciso que o documento já existisse ao tempo do processo em que se proferiu a sentença. Documento "cuja existência" a parte ignorava é, obviamente, documento que existia; documento de que ela "não pode fazer uso" é, também, documento que, noutras circunstâncias, poderia ter sido utilizado, e portanto existia."
Importa consignar que, na avaliação dos documentos apresentados como aptos a ensejar o juízo rescisório, em situações envolvendo trabalhadores rurais, o Superior Tribunal de Justiça tem adotado interpretação extensiva do preceito insculpido no art. 485, VII, do CPC, de modo a aceitar para tal finalidade documentos preexistentes à propositura da ação originária, considerando as situações desiguais em que se encontram os trabalhadores rurais, e a necessidade de solução pro misero nas hipóteses em que poderia ser deferida a aposentadoria rural mediante a admissão do documento novo. Vejam-se os seguintes precedentes:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA. DOCUMENTO NOVO. ART. 485, INCISO VII, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. SOLUÇÃO PRO MISERO. PRECEDENTES.
1. Segundo a jurisprudência da 3.ª Seção desta Corte Superior de Justiça, levando em consideração as condições desiguais em que se encontram os trabalhadores rurais e, adotando a solução pro misero, devem ser considerados para efeito do art. 485, inciso VII, do Código de Processo Civil, os documentos colacionado aos autos, mesmo que preexistentes à propositura da ação originária.
2. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no Ag 1361956/PR, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 12/06/2012, DJe 25/06/2012)
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. AÇÃO RESCISÓRIA. DOCUMENTO NOVO. CERTIDÃO DE ÓBITO DO MARIDO DA AUTORA. QUALIFICAÇÃO COMO LAVRADOR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONFIGURADO. DOCUMENTO PREEXISTENTE À PROPOSITURA DA AÇÃO. IRRELEVÂNCIA. SOLUÇÃO PRO MISERO. SÚMULA N.º 149 DO STJ AFASTADA. PEDIDO PROCEDENTE.
1. A jurisprudência dominante desta Corte Superior se orienta no sentido de que é possível o acolhimento da ação rescisória, ante a juntada de documento novo, nas hipóteses como a dos autos, em que se pleiteia aposentadoria rural por idade, quando apresentada, além de outras provas, certidões, como a de casamento, nascimento ou óbito, em que se atesta o ofício de trabalhador rural do marido da demandante.
2. A Terceira Seção desta Corte Superior, levando em conta as condições desiguais pelas quais passam os trabalhadores rurais, tem adotado a solução pro misero, entendendo irrelevante o fato de o documento apresentado ser preexistente à propositura da ação. Dessa forma, o documento juntado aos autos é hábil à rescisão do julgado com base no artigo 485, inciso VII, do Código de Processo Civil, afastando-se a incidência da Súmula 149 do STJ. Precedentes.
3. Pedido julgado procedente com o restabelecimento do acórdão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.
(AR 2.197/MS, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/03/2012, DJe 13/04/2012)
AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA. CTPS. DOCUMENTO NOVO. SOLUÇÃO PRO MISERO. PEDIDO PROCEDENTE.
1. A anotação em Carteira de Trabalho e Previdência Social, que atesta a condição de trabalhadora rural da autora, constitui início razoável de prova documental, para fins de comprovação de tempo de serviço. Precedentes.
2. Embora preexistentes à época do ajuizamento da ação, a jurisprudência da 3ª Seção deste Tribunal fixou-se em que tais documentos autorizam a rescisão do julgado com base no artigo 485, inciso VII, do Código de Processo Civil, dadas as condições desiguais vivenciadas pelo trabalhador rural.
3. Pedido procedente.
(AR .800/SP, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/04/2008, DJe 06/08/2008)
AÇÃO RESCISÓRIA. DOCUMENTO NOVO E ERRO DE FATO. ARTS. 485, VI e 487, I, DO CPC. RURÍCOLA. DIFICULDADE DE OBTENÇÃO NA ÉPOCA PRÓPRIA. SOLUÇÃO PRO MISERO.
1. Segundo entendimento pretoriano - REsp 15.007/RJ - documento novo referido no inciso VI, do art. 485, do Código de Processo Civil, é, "em princípio, o já existente quando da decisão rescindenda, ignorado pelo interessado ou de impossível obtenção à época da utilização no processo, apresentando-se bastante para alterar o resultado da causa".
2. No caso específico do rurícola em virtude de suas desiguais e até mesmo desumanas condições de vida e de cultura, autoriza-se inferir, dado os percalços encontrados na busca, não obstante a existência do documento quando do ajuizamento da ação, cujo julgado ora se rescinde, a ausência de desídia ou negligência. Pode-se - ainda - sem margem de erro, concluir que sua existência era ignorada até mesmo em função das adversas condições de cultura.
3. A certidão de casamento, atestando a profissão do marido da autora como sendo a de lavrador, não levada em consideração pelo acórdão rescindendo, caracteriza a existência de erro de fato, capaz de autorizar a rescisão do julgado, erigindo-se em início razoável de prova material da atividade rurícola. Precedente desta Corte.
4. Matéria previdenciária. Compreensão ampla. Solução pro misero.
5. Rescisória procedente.
(AR .843/SP, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/11/2000, DJ 04/12/2000, p. 52)
Os documentos novos apresentados na rescisória são os seguintes:
1. Certidão de nascimento da autora em 16.8.1955, na qual seu pai está qualificado como lavrador (fl. 12);
2. Certidão do casamento contraído pelos pais da autora em 31.7.1944, na qual ambos são qualificados como lavradores, datada de 28.3.1977 (fl. 13);
3. Certificado de reservista do pai da autora de 1931, em que registrada a profissão de lavrador (fl. 14);
4. Certidão de casamento do irmão da autora, Pedro Cordeiro de Oliveira, em 05.6.1976, em que registrada como profissão lavrador (fl. 15);
5. Certidão de óbito do pai da autora, ocorrido em 12.11.1978, também com registro da profissão de lavrador (fl.16).
Com o propósito de aferir se os mencionados documentos reputados novos têm potencialidade para alterar a convicção manifestada pelo julgador singular no sentido da improcedência do pedido, impende reproduzir excerto da sentença rescindenda:
"No caso dos autos, não há prova material a demonstrar de forma suficiente o exercício da atividade rural pela autora no período de 1969 a 1993.
A autora trouxe sua certidão de casamento (fl. 09) na qual é qualificada como doméstica e a certidão de nascimento de sua filha na qual é qualificada como do lar (fl. 30). Não obstante seu marido tenha sido qualificado como lavrador, tal aspecto não é suficiente para demonstrar que a autora exerceu atividade rural em regime de economia familiar naquele período".
Como se vê, a improcedência decorreu da insuficiência da prova documental para corroborar o depoimento das testemunhas. Tendo em vista que para a prova do trabalho rural são aceitos tanto as certidões dos registros civis assim com os documentos em nome de terceiros, membros do grupo familiar, tenho que a documentação juntada à rescisória é apta a lastrear a rescisão do acórdão com base no art. 485, VII, do CPC.
Segundo o réu, os documentos dos itens 1 e 5, por terem data posterior ao julgado, não poderiam ter sido objeto de conhecimento pelo juiz da causa, o que impediria a rescisão com base neles. A alegação, todavia, não tem qualquer procedência, porquanto o conceito de documento novo implica justamente o fato de não ter sido apresentado à apreciação judicial no momento oportuno. Por outro lado, tudo indica que as mencionadas certidões (com data de 8.1.2015) constituam segunda via requerida para o propósito de instruírem a presente rescisória, tanto assim que na certidão de casamento da autora, de 5.6.76 (fl. 15), conta que "foram apresentados os documentos que se refere o Art. 180 ns. I- II-III-IV do Código Civil", ou seja, o registro de nascimento.
Presente a hipótese do inciso VII, do art. 485 do CPC, rescinde-se a sentença.
DO JUÍZO RESCISÓRIO
Prévio requerimento administrativo
Preliminarmente, afasto a carência de ação em face da ausência de requerimento administrativo, porque à época em que ajuizada a ação ordinária, em 2008, era pacífico o entendimento no sentido de sua desnecessidade como condição para acesso ao Judiciário, tendo em vista a notória resistência da autarquia previdenciária às teses jurídicas esposadas. O prévio requerimento somente passou a ser exigido a partir do julgamento, pelo E. Supremo Tribunal Federal, do Recurso Extraordinário nº 631.240, em 27/08/2014, após o trânsito em julgado da sentença rescindenda. Além disso, a hipótese em tela está abrangida pela exceção feita naquele julgado em que consignado que a exigência não abrange as ações para concessão de benefício para trabalhador informal. Acrescente-se o fato de que a autarquia previdenciária na contestação da rescisória arrolou razões contrárias ao reconhecimento do tempo de serviço rural, de sorte que configurado o interesse de agir pela pretensão resistida.
Do tempo de serviço rural
O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991 - independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência - está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99. Quando exercido em regime de economia familiar, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).
Pode o exercício do labor rural ser comprovado mediante a produção de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do disposto no art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, e na Súmula n.º 149 do STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário).
Cabe salientar que, embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo; ademais, não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas um documento que, juntamente com a prova oral, criando um liame com a circunstância fática que se quer demonstrar, possibilite um juízo de valor seguro.
Também não é necessário que o início de prova material seja contemporâneo à época dos fatos que se pretende comprovar, conforme se vê do § 3º, do art. 55 da Lei 8.213. Tal exigência implicaria introdução indevida em limites não estabelecidos pelo legislador, e que devem ser de pronto afastados.
Observa-se que as certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).
De outro lado, nada impede que sejam considerados os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural.
Em relação aos boias-frias, cujo trabalho rural é caracterizado por sua notória informalidade, comprometendo a prova da atividade e, por conseguinte, a obtenção do benefício previdenciário, a jurisprudência pacificada por esta Corte era no sentido de abrandar a exigência relativa ao início de prova material, admitindo, até mesmo, em situações extremas, a comprovação da atividade exclusivamente por meio de prova testemunhal. Todavia, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento, em 10-10-2012, do Resp nº 1.321.493/PR, representativo de controvérsia, firmou o entendimento de que se aplica também aos trabalhadores boias-frias a Súmula 149 daquela Corte.
No regime de economia familiar (§1º do art. 11 da Lei de Benefícios) em que os membros da família trabalham "em condições de mútua dependência e colaboração", os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não é "per se stante" para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo; ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também que irrelevante a remuneração percebida pelo cônjuge, que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.
No tocante ao trabalho do segurado especial em regime de economia familiar a partir dos 12 anos de idade, a Terceira Seção desta Corte ao apreciar os Embargos Infringentes em AC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, na sessão de 12-03-2003, firmou entendimento no sentido da possibilidade de seu cômputo, na esteira de iterativa jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tendo a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o AI n.º 529.694/RS, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, com decisão publicada no DJU de 11-03-2005, reconhecido o tempo de serviço agrícola ao menor de quatorze anos, não merecendo a questão maiores digressões.
A autora postulou o reconhecimento de tempo de serviço rural, em regime de economia familiar no período de 16.8.1969 a 30.8.1993, quando passou a trabalhar na Prefeitura Municipal de Salto do Itararé como Auxiliar de Serviços Gerais. Para a comprovação do trabalho rural, além dos documentos acima relacionados, juntou certidão de casamento seu casamento, em 1978, e certidão de nascimento da filha, em 1979, (fls. 24 e 25), nas quais o marido é qualificado como agricultou.
Do depoimento pessoal da autora, transcrito na sentença (fls. 80), constou:
"Tenho cinquenta e cinco anos; trabalho na creche desde 1993; antes de trabalhar no município eu trabalhava na lavoura com meus pais; eles eram arrendatários; até os quatorze anos eu estudei; depois fui na roça; a terra tinha três alqueires; plantava arroz, feijão e milho; era nós com meus irmãos; não tinha empregados; era tudo manual; o que produzia era vinte por cento do patrão, o resto meu pai guardava semente para plantar de novo e vendia; não tinha contrato; em 1978 eu casei com o empregado que trabalhava lá mesmo; era empregado de outra pessoa no mesmo sítio; continuamos trabalhando lá; época da colheita a gente também ajudava os vizinhos; daí fui trabalhar no município e meu marido continuou na lavoura um tempo; nunca tive terra própria; trabalhava de boia fria nos vizinhos; não era filiada sem sindicato e nem paguei carnê de INSS".
A prova testemunhal corrobora a pretensão exposta na inicial, uma vez que as testemunhas foram uníssonas em confirmar que a parte autora trabalhava nas lides rurais:
"A testemunha Levino Rodrigues Lopes (fl. 54), declarou que: 'Conheço ela faz quarenta anos da Corredeira; ela trabalhava com os pais na lavoura; eles plantavam arroz, feijão, milho, na terra do Pedro Acacio; era uns doze alqueires; essa época era solteira; ela casou e continuou trabalhando lá e logo o marido começou a trabalhar na Prefeitura e ela também; ela nunca teve terra; até ela começar a trabalhar na Prefeitura ela sempre trabalhou na lavoura; não tinha maquinário'.
José Eugênio Pereira (fl. 55): 'Conheço ela há mais de vinte anos; nós éramos vizinhos de sítio; ela trabalhava com o pai dela no sítio; ela era solteira, na lavoura de milho, feijão, arroz; não tinham empregados; o sítio era pequeno; não tinha equipamento mecanizado; depois de um tempo ela casou; hoje trabalha na creche.'"
Da análise do conjunto probatório, conclui-se que os documentos juntados constituem início de prova material, para o que, reitere-se, consideradas as peculiaridades do trabalho na agricultura, não se pode exigir que sejam apenas por si mesmos conclusivos ou suficientes para a formação de juízo de convicção. É aceitável que a prova contenha ao menos uma indicação segura de que o fato alegado efetivamente ocorreu, vindo daí a necessidade de sua complementação pela prova oral, a qual, como se viu, confirmou de modo coerente e preciso o trabalho rural da parte autora.
Reconhece-se, assim, o trabalho rural no período de 16.8.1969 a 1º.01.1980 (10 anos, 4 meses e 16 dias), data a partir da qual o marido da autora passou a trabalhar na Prefeitura Municipal de Itararé (fls.106-112).
Tendo em vista que a autora conta 14 anos, 6 meses e 24 dias de tempo de serviço perante a Prefeitura Municipal de Itararé (fl. 26), contabiliza o total de 24 anos 11 meses e 10 dias na DER (2008), tempo insuficiente para a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. Ademais, tratando-se da hipótese de contagem recíproca de tempo de serviço, necessária a Certidão de Tempo de Contribuição expedida para ao cômputo do tempo de serviço prestado no Regime Próprio de Previdência, conforme o art. 130 do Decreto nº 3.048/99.
Não cumprindo com todos os requisitos para a concessão do benefício, a parte autora tem direito à averbação dos períodos ora reconhecidos, para fins de obtenção de futura aposentadoria, julgando-se parcialmente procedente o pedido. Fica o INSS condenado ao pagamento de honorários advocatícios de 10% sobre o valor da causa na ação ordinária e na rescisória.
Ante o exposto, voto no sentido de julgar procedente a rescisória e, em novo julgamento, julgar parcialmente procedente o pedido.
Juiz Federal LUIZ ANTÔNIO BONAT
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/10/2015
AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0000750-28.2015.4.04.0000/PR
ORIGEM: PR 00003058120088160163
RELATOR | : | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT |
PRESIDENTE | : | Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz |
PROCURADOR | : | Dr. Marcus Vinícius Aguiar Macedo |
AUTOR | : | TEREZA DE JESUS CARVALHO |
ADVOGADO | : | Marta de Fatima Melo |
: | Ana Lucia Monte Sião | |
REU | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/10/2015, na seqüência 29, disponibilizada no DE de 19/10/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª SEÇÃO, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A SEÇÃO, POR UNANIMIDADE, DECIDIU JULGAR PROCEDENTE A RESCISÓRIA E, EM NOVO JULGAMENTO, JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT |
: | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA | |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
AUSENTE(S) | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA | |
: | Juiz Federal OSNI CARDOSO FILHO |
Jaqueline Paiva Nunes Goron
Diretora de Secretaria
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